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Revisão sistemática do tratamento tópico da úlcera venosa

Resumos

Pacientes com úlcera venosa podem conviver com essa situação durante vários anos, sem obter a cicatrização da lesão se o tratamento não for adequado. A prática profissional, baseada em evidências, produz resultados efetivos para o paciente e para os serviços. O estudo visou realizar revisão sistemática para avaliar o método mais eficaz para melhorar o retorno venoso e o melhor tratamento tópico da úlcera. Buscou-se estudos indexados em oito bases de dados utilizando-se os descritores úlcera de perna, úlcera venosa e similares. A amostra constituiu-se de 33 estudos primários e 2 estudos de metanálise. Identificou-se diversidade de tratamentos que foram agrupados em terapia compressiva (54,3%) e tratamento tópico (45,7%). Evidenciou-se que a terapia compressiva aumenta a taxa de cicatrização da úlcera devendo ser usado em pacientes sem comprometimento arterial. Não é claro qual a melhor terapia tópica, porém, as diferentes opções devem ser associadas à terapia compressiva.

ulcera varicosa; medicina baseada em evidências; literatura de revisão


Venous ulcer patients can experience this situation for several years without achieving healing if treatment is inadequate. Evidence-based professional practice generates effective results for patients and services. This research aimed to carry out a systematic review to assess the most effective method to improve venous return and the best topic treatment for these ulcers. Studies were collected in eight databases, using the following descriptors: leg ulcer, venous ulcer and similar terms. The sample consisted of 33 primary studies and two Meta-analyses. A wide range of treatments was identified, grouped in compression therapy (54.3%) and topical treatment (45.7%). It was evidenced that compression therapy increases ulcer healing rates and should be used in patients with intact arteries. There is no consensus about the best topical treatment, although different options should be associated with compression therapy.

varicose ulcer; evidence-based medicine; review literature


Pacientes con úlcera venosa pueden convivir con esta situación durante varios años, sin obtener la cicatrización de la herida caso el tratamiento no sea adecuado. La práctica profesional basada en evidencias produce resultados efectivos para el paciente y para los servicios. La finalidad del estudio fue realizar una revisión sistemática para evaluar el método más eficaz para mejorar el retorno venoso y el mejor tratamiento tópico de la úlcera. Se buscaron estudios indexados en ocho bases de datos, mediante los descriptores úlcera de pierna, úlcera venosa y similares. La muestra incluyó 33 estudios primarios y 2 estudios de metanálisis. Se identificó una diversidad de tratamientos que fueron agrupados en terapia compresiva (54,3%) y tratamiento tópico (45,7%). Fue evidenciado que la terapia compresiva aumenta la tasa de cicatrización de la úlcera y que debe ser usado en pacientes sin comprometimiento arterial. No queda claro cual es la mejor terapia tópica. Sin embargo, las diferentes opciones deben ser asociadas a la terapia compresiva.

úlcera varicosa; medicina basada en evidencia; literatura de revisión


ARTIGOS DE REVISÃO

Revisão sistemática do tratamento tópico da úlcera venosa

Eline Lima BorgesI; Maria Helena Larcher CaliriII; Vanderlei José HaasIII

IEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil, e-mail: eborges@ufmg.br

IIEnfermeira, Professor Livre-Docente, e-mail: mhcaliri@eerp.usp.br

IIIDoutor em Ciências, Professor, e-mail: haas@eerp.usp.br. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

RESUMO

Pacientes com úlcera venosa podem conviver com essa situação durante vários anos, sem obter a cicatrização da lesão se o tratamento não for adequado. A prática profissional, baseada em evidências, produz resultados efetivos para o paciente e para os serviços. O estudo visou realizar revisão sistemática para avaliar o método mais eficaz para melhorar o retorno venoso e o melhor tratamento tópico da úlcera. Buscou-se estudos indexados em oito bases de dados utilizando-se os descritores úlcera de perna, úlcera venosa e similares. A amostra constituiu-se de 33 estudos primários e 2 estudos de metanálise. Identificou-se diversidade de tratamentos que foram agrupados em terapia compressiva (54,3%) e tratamento tópico (45,7%). Evidenciou-se que a terapia compressiva aumenta a taxa de cicatrização da úlcera devendo ser usado em pacientes sem comprometimento arterial. Não é claro qual a melhor terapia tópica, porém, as diferentes opções devem ser associadas à terapia compressiva.

Descritores: ulcera varicosa; medicina baseada em evidências; literatura de revisão

INTRODUÇÃO

As úlceras de perna podem ser desencadeadas por diversos fatores como por alterações vasculares, metabólicas e hematológicas, sendo, que em inúmeros países industrializados, a principal causa é a insuficiência venosa crônica com conseqüente surgimento da úlcera venosa de perna(1).

O transtorno fisiopatológico determina a hipertensão venosa, varizes secundárias, edema e alterações tróficas, cuja expressão máxima é a úlcera, que representa, aproximadamente, de 70 a 90% do total das úlceras de perna(1-2).

Embora seja difícil determinar o número exato de úlceras de pernas, na população de norte-americanos de mais de 65 anos, é estimado o aumento de 12%, encontrado em 1988, para aproximadamente 22%, em 2030. A incidência de insuficiência venosa crônica é de aproximadamente 5,9% e a prevalência de úlcera venosa é em torno de 1% no mundo ocidental, sendo mais freqüente nos idosos(3). No Reino Unido, o estudo realizado no Distrito de Harrow, identificou prevalência global de úlceras de pernas de 0,18%, sendo que 38% apresentavam evidências de incompetência do sistema venoso profundo, 43% do sistema venoso superficial, 31% tinham sinais de isquemia e apenas 10% não evidenciaram sinais de insuficiência arterial ou venosa(4).

No Brasil, os estudos a respeito de prevalência e incidência de úlceras de perna ainda são tímidos. Um dos estudos foi realizado no município de Botucatu (São Paulo), cuja prevalência foi de aproximadamente 1,5% de casos de úlceras venosas ativas ou cicatrizadas(5).

Na prática dos serviços de saúde, observa-se que o portador de úlcera venosa é atendido com freqüência para consultas médicas, trocas de curativos com sucessivas mudanças do tratamento tópico e, às vezes, sem a associação de qualquer terapia de compressão. O paciente pode conviver com essa situação desgastante durante vários anos, sem obter a cicatrização da úlcera. Na atualidade, destaca-se a necessidade da prática profissional ser embasada em evidências para produzir resultados efetivos para o paciente e para os serviços. No entanto, os profissionais ainda encontram dificuldades para a utilização da prática baseada em evidências. Ressalta-se que a utilização desse referencial para amparar a prática exige a disponibilidade de resultados de pesquisas com fortes evidências, e essa não é a realidade nessa área, na maioria dos países. Para reverter essa situação pode-se recorrer à revisão sistemática, que tem a finalidade de reduzir a grande quantidade de resultados de pesquisas disponíveis, traduzindo-as em recomendações, permitindo aos profissionais se manterem atualizados, além de subsidiar a escolha das intervenções(6).

OBJETIVO

Dessa forma, esta pesquisa visou realizar revisão sistemática de estudos primários e de metanálises a respeito do tratamento tópico de úlcera venosa de perna, com o intuito de responder a um conjunto de questões, apresentadas na prática clínica, entre as quais: 1. qual é o método mais eficaz para melhorar o retorno venoso? 2. Quais são os tratamentos tópicos recomendados para a úlcera venosa?

MÉTODOS

Estratégia de busca para identificação dos estudos

Realizou-se o levantamento bibliográfico de publicações indexadas ou catalogadas nas bases de dados PUBMED, DEDALUS, BDENF, LILACS, CINAHL, COCHRANE, National Guideline Clearing House - (NGC) e Sigma Theta Thau International Registry of Nursing Research. Também utilizou-se a busca inversa, que é um método de seleção de documentos a partir da bibliografia de documentos primários recuperados na busca anterior(6)

Para a busca bibliográfica, utilizou-se os descritores ou palavras-chave: úlcera de perna/ úlcera venosa/úlcera de estase/úlcera varicosa e similares em inglês e espanhol. A delimitação da busca considerou o termo tratamento tópico. O levantamento foi realizado no período de março a junho de 2003 e a primeira seleção dos artigos foi feita pela análise dos resumos.

Para a localização das publicações foi utilizado o serviço de comutação bibliográfica das bibliotecas nacionais, a consulta ao Portal de Periódicos da Capes, o sistema de busca google e os acervos particulares de pesquisadores que trabalham na área temática. Para a seleção das publicações, foram considerados os critérios: enfoque em seres humanos, idiomas português, espanhol e inglês, período de publicação de 1993 a 2003 e o limite para localização da publicação no País até outubro de 2003.

Critérios para selecionar os estudos para a revisão

- Sujeitos participantes

Foram incluídos somente os estudos cuja amostra era constituída por sujeitos adultos e idosos com úlceras venosas ou descritas como úlcera de estase ou úlcera varicosa, excluindo-se aquele de etiologia arterial, mista, diabética ou vasculite.

- Intervenções

Foram incluídos estudos que avaliassem tratamento que visasse à melhoria do retorno venoso, como bandagem ou meias de compressão, ou o tratamento tópico com a oclusão da área lesada. Foram excluídos os estudos que abordassem tratamento tópico não disponível comercialmente no Brasil, como o uso de fatores de crescimento, cultura de células e aqueles estudos cujo desfecho não foi declarado ou explicitado na publicação.

- Resultados ou desfechos medidos

Foram consideradas como medidas de avaliação da eficácia do tratamento as seguintes variáveis dependentes: redução da área lesada (cm2), taxa de cicatrização, tempo médio de permanência da cobertura, número de bactérias na lesão, reincidência, redução da circunferência do tornozelo, nível de pressão fornecido pela terapia compressiva.

- Delineamento dos estudos

Foram selecionados estudos de diversos delineamentos, classificados conforme o nível de evidência proposto por Stetler e colaboradores(7): nível I - estudos de metanálise de múltiplos estudos controlados; nível II - estudo experimental individual; nível III - estudo quase-experimental, controlado e não aleatorizado - grupo pré e pós-teste; nível IV - estudo não experimental, como pesquisa correlacional descritiva e qualitativa, ou estudo de caso; nível V - relato de caso ou dados obtidos sistematicamente, de qualidade verificável ou dados de programas de avaliação. Não foram considerados os artigos de opinião de autoridades respeitadas ou de opinião de comitês de peritos, classificados como estudos de nível VI.

Métodos de Revisão

Para sistematizar a análise da qualidade dos estudos primários, foi criado um instrumento amparado em preceitos metodológicos(8-9). Foram coletados dados referentes ao periódico (título, idioma, data da publicação), ao autor (nacionalidade, formação, local de atuação) e ao estudo (financiamento da pesquisa, tipo de estudo, objetivo, características da amostra, desenho, tipo de intervenção, variáveis, tipo de análise, resultados, conforme desfechos eleitos, limitações e recomendações). Para a avaliação crítica dos estudos secundários (revisões sistemáticas), além dos dados referentes ao periódico, ao autor e ao estudo, também se classificou os artigos em análise descritiva ou metanálise, conforme o tipo de síntese empregada na análise dos dados(10).

O processo de avaliação crítica dos artigos consistiu na leitura do estudo na íntegra e, em seguida, em sua avaliação e preenchimento dos instrumentos de coleta de dados. Cerca de 50% dos artigos selecionados foram analisados pelo segundo autor para validação do processo, com a busca do índice de concordância. Qualquer discordância foi resolvida com a discussão. Estudos que foram publicados em duplicata, ou encontrados em mais de uma base de dados, foram considerados somente uma vez.

Para a análise dos dados, após a codificação apropriada das variáveis de cada estudo, utilizou-se o processo de validação por dupla digitação. Uma vez validados, os dados foram exportados e analisados no programa Statistical Package for the Social Science (SPSS). Os dados resultantes de cada estudo selecionado foram sintetizados e, a seguir, foi realizada revisão sistemática qualitativa, uma vez que os estudos diferiam no delineamento, na questão de investigação, e na forma de realizar a intervenção e mensurar o desfecho.

RESULTADOS

Caracterização dos estudos

A amostra foi constituída por 33 estudos primários e 2 estudos de metanálise, perfazendo o total de 35. Os estudos abordaram diversidade de tratamentos tópicos para a úlcera venosa, sendo que 19 (54,3%) estudos eram referentes à terapia compressiva e 16 (45,7%) relacionados a terapia tópica (Tabela 1).

Do total dos estudos, 6 (17,1%) eram sobre o uso do sistema de bandagem de quatro camadas. Entretanto, também foram encontrados estudos sobre outras formas de terapia compressiva, sendo 3 (8,6%) bandagem de curta extensão, 3 (8,6%) compressão pneumática e 2 (5,7%) referentes à bota de Unna.

Quanto aos estudos sobre a terapia tópica, 5 (14,3%) abordaram o tratamento com hidrocolóide, 3 (8,6%) com gel essaven, 2 (5,7%) com hidrofibra e 6 (17,1%) abordaram tratamentos diversos.

Quanto ao delineamento de pesquisa, a maioria dos estudos era experimental com aleatorização (54,3%), seguidos dos estudos quase-experimentais (20%). Ressalta-se que apenas 2 estudos eram metanálises (5,7%).

Considerando o delineamento e o tipo de tratamento, dos 19 estudos experimentais, 6 (31,58%) eram sobre terapia compressiva e 13 (68,42%) sobre terapia tópica. Destaca-se que 4 (21,1%) dos estudos eram sobre o uso do hidrocolóide, 2 (10,5%) sobre a hidrofibra, 2 (10,5%) sobre o gel essaven e 2 (10,5%) sobre a bota de Unna. No grupo com delineamento quase-experimental, foram encontrados 7 estudos, sendo 5 referentes à terapia compressiva e 2 à terapia tópica. Na categoria de estudo exploratório-descritivo, todos os 4 eram sobre o tratamento com o sistema de bandagem de 4 camadas. Quanto aos relatos de caso, 2 eram a respeito do tratamento com bandagem de curta extensão, ou compressão pneumática, e um sobre o uso do hidrocolóide.

Os 2 estudos de metanálise foram referentes à terapia compressiva. Um, com amostra de 22 estudos, avaliou a efetividade e custo-efetividade de bandagens e meias de compressão no tratamento de úlcera(11), e o outro, com amostra de 2 estudos, avaliou o efeito das meias ou bandagens de compressão na prevenção da recorrência(12).

Na categoria de estudos sobre terapia compressiva também foram encontrados 6 estudos clínicos controlados com aleatorização. O número de pacientes desses estudos variou de 22 a 80. Os estudos compararam diversas terapias de compressão, como: bandagem de compressão de longa extensão comparada com bandagem de compressão de curta extensão(13), bota de Unna, associada à compressão pneumática intermitente, com somente bota de Unna(14), sistema de compressão de bandagem de 4 camadas comparado a sistema de compressão de bandagem de curta extensão(15), sistema de compressão de bandagem de quatro camadas Charing Cross, com um sistema alternativo de compressão de bandagem de três camadas(16), bota de Unna com cirurgia minimamente invasiva(17) e bota de Unna e bandagem de compressão(18). Os principais desfechos avaliados foram a taxa de cicatrização da úlcera (4 estudos ) e o nível de compressão fornecido pela bandagem (1 estudo).

Nos 5 estudos quase-experimentais sobre terapia compressiva, em 4 o número de participantes variou de 17 a 44 e um estudo considerou como amostra o número de pernas dos pacientes (n=42). Esses estudos compararam a compressão pneumática intermitente, fornecida por 30' e 60'(19), aplicação de calor radiante ou não(20), bandagem de compressão elástica, longa extensão com bandagem de compressão inelástica, curta extensão com bandagem de compressão de 4 camadas(21), 2 sistemas alternativos de compressão de multicamadas(22) e comparação de 3 tipos de meias de compressão classe II, com 25 a 35mmHg(23). Avaliaram como desfecho principal o nível de compressão fornecido pela bandagem ou meia, a taxa de cicatrização, o fluxo sangüíneo da pele em descanso, o volume venoso e o índice de enchimento capilar e a redução da área lesada.

Os 4 estudos sobre terapia compressiva com delineamento descritivo-exploratório propunham: avaliar a relação entre o padrão de incompetência venosa e a cura da ferida com os pacientes em uso de bandagem de compressão de 4 camadas(24), determinar a taxa de cicatrização e o custo do tratamento com a terapia compressiva(25), determinar a taxa de cicatrização com o uso do sistema de bandagem de compressão de quatro camadas, Charing Cross(26) e avaliar a efetividade do sistema de bandagem quatro camadas, Parema(27). A amostra dos estudos variou de 50 a 438 sujeitos e um contou como amostra 198 pernas.

Dos estudos de relato de caso, um descreveu 2 casos de uso de compressão pneumática intermitente(28) e o outro o uso de bandagem de curta extensão(29).

Os estudos que abordaram a terapia tópica da úlcera venosa, 1 era relato de caso e 15 eram estudos clínicos prospectivos controlados. Desses, 2 eram quase-experimentais. A amostra dos estudos foi composta por úlcera venosa ou pelo paciente portador de úlcera venosa.

Os tratamentos eram diversificados e comparou-se: cobertura de hidrofibra com alginato de cálcio(30), poliuretano não adesivo com hidrocelular(31), 2 tipos de hidrocolóide(32), espuma de poliuretano com hidrocolóide, ambos associados com bandagem de alta compressão(33), hidrocolóide com gaze, ambos associados com bota de Unna(34), hidrofibra com alginato de cálcio, ambos associados com bandagem de compressão classe C3(35), aplicação de ultra-som com placebo, ambos associados com cobertura de hidrocolóide(36), tratamento tópico associado à estimulação a laser, comparado com tratamento tópico associado a placebo, comparado com somente tratamento tópico(37), enxerto de cultura de criopreservado epidérmico com cobertura de hidrocolóide(38), fator de crescimento com sulfadiazina de prata e com placebo(39), dois estudos de gel essaven com placebo(40-41), mupirocina com veículo(42).

Os dois estudos não aleatorizados compararam gel essaven com placebo(43) e a associação de hidrocolóide com PVP-I(44). O estudo de caso era um estudo piloto para avaliar as propriedades do hidrocolóide(45).

Nível de evidência

Do total dos estudos analisados, a maioria (54,3%) tinha evidência de nível II e a minoria (5,7%) evidência de nível I.

Quanto ao tipo de tratamento, destaca-se que, dos 2 estudos de nível I, um abordou a terapia compressiva de forma geral, e o outro, o uso da meia de média e alta compressão. Dos 19 estudos de nível de evidência II, 4 (21,1%) eram sobre o tratamento com hidrocolóide e 2 sobre cada tema: hidrofibra, gel essaven, bota de Unna.

Desfechos avaliados

Em 22 (62,9%) estudos, os autores não declararam o desfecho primário (variável dependente principal) e consideraram dois ou mais desfechos. Os desfechos mais freqüentemente avaliados foram a redução da área lesada e a taxa de cicatrização. Dos 19 estudos experimentais com aleatorização, 4 (21,1%) apresentavam desfecho primário, ao passo que os outros 15 (78,9%) tinham 3 ou mais desfechos. Entre os estudos quase-experimentais, apenas 1 (14,3%) tinha um desfecho, 5 (71,5%) tinham dois ou três desfechos.

Cálculo da amostra/ relevância estatística e clínica

A informação sobre o cálculo da amostra não estava presente na maioria (77,1%) dos estudos e, em 5 (14,3%) estudos, esse dado não se aplicava devido ao tipo de delineamento, como nas metanálises e relatos de caso. Assim, dos 35 estudos, somente 8 apresentavam resultados estatisticamente significativos e apenas 2 (25%) descreviam o cálculo do tamanho da amostra. Dois (25%) estudos eram sobre o tratamento com hidrofibra e os demais eram sobre outras terapias tópicas como pomada mupirocina, hidrocolóide, aplicação de ultra-som, uso de terapia compressiva, bota de Unna, compressão pneumática correspondendo a 1 (12,5%) estudo cada.

DISCUSSÃO

Visando a cicatrização da úlcera venosa, o tratamento para a melhoria do retorno venoso deve ser prestado por médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde com a cooperação do paciente e é primordial o uso da terapia de compressão, uma vez que a mesma aumenta a taxa de cicatrização de úlceras venosas, comparado com o tratamento sem compressão(11). A terapia compressiva deve ser aplicada, de modo consistente, para melhorar a efetividade do cuidado e reduzir os custos do tratamento(11,24). Os profissionais que utilizam o sistema devem ser capacitados(15), uma vez que a compressão aplicada inadequadamente pode predispor os pacientes a complicações.

A compressão graduada pode controlar ou reduzir a insuficiência venosa(1), entretanto só deve ser utilizada para cicatrizar úlceras venosas não complicadas(11,25), isto é, pacientes que apresentem o índice de pressão tornozelo/braço e"0,8(15). Existem situações em que a compressão graduada está contra-indicada como nos casos de insuficiência arterial moderada e severa, carcinoma, bem como em pacientes que estejam desenvolvendo trombose venosa profunda(1).

A melhor taxa de cicatrização foi obtida com a utilização de bandagem de alta compressão (40mmHg) ao invés de bandagem de baixa compressão ou bandagem de compressão não elástica(11). Como primeira escolha para tratamento de úlceras venosas não complicadas, deve-se utilizar o sistema de alta compressão graduado de multicamadas capaz de sustentar a compressão (40mmHg), por, ao menos, uma semana(11). Até o momento, o sistema original de bandagem de compressão de quatro camadas Charing Cross, comparado com outros sistemas de bandagem de compressão de multicamadas para os mesmos níveis de compressão, não apresentou diferenças em benefícios tais como taxa de cicatrização, conforto e tempo de permanência(11,15-16,27).

Alguns estudos apresentaram taxa de cicatrização de úlceras venosas similares, utilizando bandagens de quatro camadas e de curta extensão(11,20-21) com a ressalva de que a última necessita de apoio externo de uma camada de retenção como a bandagem auto-aderente, que pode resultar em complicações em membros com dimensões extremas(21,28). Outros estudos demonstraram taxas melhores com as bandagens de quatro camadas comparadas com bandagem de pasta de Unna, associada à bandagem auto-aderente(11).

Em relação à bandagem de compressão pneumática intermitente, os resultados sugeriram que ela é benéfica no tratamento da úlcera venosa e deve ser considerada como terapia adjunta. Mas essa recomendação não é consenso, uma vez que não foram percebidas diferenças com o seu uso em todos os estudos analisados(28).

O uso da bandagem de calor radiante mostra ser seguro e eficiente para pacientes internados com úlcera venosa recalcitrante, mas requer mais avaliações para investigar sua eficácia, enquanto tratamento ambulatorial(19).

Quanto à terapia tópica, não foram encontradas evidências indicando qual é a melhor. Os resultados dos estudos sugerem o uso de uma cobertura simples, não aderente, de baixo custo e aceitável pelo paciente e, como opções de tratamento, são apresentadas as coberturas de espumas de poliuretano, hidrocolóide, alginato de cálcio(30-35). A cobertura de hidrofibra ou alginato de cálcio deve ser usada nas úlceras venosas intensamente exsudativas(29,34) e a de espuma de poliuretano ou hidrocolóide as úlceras que apresentem volume de exsudato de pouco a moderado(30-32).

Caso a cobertura de hidrocolóide seja usada associada à bandagem de pasta de óxido de zinco (bota de Unna), recomenda-se aplicar por último uma bandagem de compressão gradiente(34).

Em síntese, as coberturas devem estar associadas à terapia compressiva para o tratamento de úlcera venosa. Afirma-se que uma percentagem de redução da área da ferida maior que 30%, nas primeiras duas semanas de tratamento, prediz a cicatrização(34).

Pacientes com úlcera extensa ou associada com o comprometimento arterial podem ser beneficiados com as técnicas de cicatrização adjuvante, tais como pele humana e revascularização arterial, quando possível(25). Para os pacientes com comprometimento primário do sistema venoso superficial, é sugerido o procedimento cirúrgico minimamente invasivo para a correção(17).

Para reduzir as taxas de recorrência de úlcera, recomenda-se o uso de meias de compressão elásticas (35 a 45mmHg)(23), tanto as de alta (45 a 50mmHg) quanto moderada (30 a 40mmHg) compressão(12).

CONCLUSÃO

Os resultados sugerem que o tratamento com compressão aumenta a taxa de cicatrização de úlceras venosas, quando comparado com o tratamento sem compressão e resulta em cicatrização confiável, custo efetivo na maioria dos pacientes, portando, deve ser usada no tratamento de portadores de úlcera venosa. A alta compressão só deve ser usada em pacientes sem comprometimento arterial (ITB>0,8). O não uso de meias de compressão está associado com a recorrência da úlcera. Os resultados dos estudos também não permitem concluir qual o melhor tratamento tópico para úlcera venosa.

Os estudos foram de variados delineamentos, com uso de vários produtos. A amostra, na maioria dos estudos, não foi calculada e o tamanho, geralmente pequeno, não permitiu a realização de testes estatísticos. Foram avaliados diversos desfechos no mesmo estudo e diferentes desfechos entre os estudos. O tempo de acompanhamento e avaliação do tratamento foi curto, variando geralmente de dias a semanas. Vários estudos apresentaram limitações, como a falta de explicação sobre o método de aplicação do sistema de compressão ou o tratamento tópico, bem como o profissional responsável pela realização do procedimento, falta de dados relacionados ao local da realização do estudo e as características do paciente.

Torna-se necessário a realização de mais estudos clínicos randomizados e controlados, com amostra calculada a priori, amparada no desfecho primário, e com medida objetiva dos resultados, de preferência com avaliação de apenas um desfecho principal.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos o apoio financeiro concedido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo Programa de Qualificação Institucional (PQI) e a Fundação de Amparo a Pesquisa (Fapesp) pelo recurso para divulgação dos resultados do estudo em evento internacional - Sigma Theta Tau International 38th Biennial Convention - Indianapolis, Indiana USA, 2005.

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    Eline Lima BorgesI; Maria Helena Larcher CaliriII; Vanderlei José HaasIII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      22 Ago 2007
    • Recebido
      16 Out 2006
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