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Adaptação cultural e validação da medida "Diabetes Quality of Life for Youths" de Ingersoll e Marrero para a cultura brasileira

Resumos

O objetivo deste estudo foi realizar a adaptação da medida "Diabetes Quality of Life for Youths (DQOLY)" para a cultura brasileira e analisar suas propriedades psicométricas. A adaptação cultural incluiu as fases: tradução, retro-tradução, revisão por comitê e pré-teste. O instrumento adaptado foi aplicado a 124 adolescentes com diabetes mellitus tipo 1. Os resultados de confiabilidade indicaram alphas de Cronbach adequados (0,8695 para o domínio Satisfação, 0,8658 para o Impacto, 0,8387 para Preocupações e 0,9333 para o total), com a exclusão de 3 itens inconsistentes. O teste-reteste demonstrou não haver diferença significativa entre duas aplicações do instrumento em períodos diferentes (p>0,05). A validação foi demonstrada pelas estratégias: conteúdo, convergente, fatorial e discriminante. Todas as sub-escalas indicaram correlações positivas entre si (p<0,001) e com a auto-percepção do estado de saúde (p<0,001). O presente estudo sugere que a versão do DQOLY é uma medida confiável e válida para o uso no Brasil.

diabetes mellitus tipo 1; qualidade de vida; adolescente; estudos de validação


The aim of this study was to adapt the "Diabetes Quality of Life for Youths (DQOLY)" measure into Brazilian culture and to analyze its psychometric properties. The cross-cultural adaptation included the phases of translation, backtranslation, committee review, and pretesting. The adapted instrument was applied to 124 type 1 diabetes mellitus´adolescents. The reliability results showed adequate Cronbach's alpha coefficients (0.8695 for Satisfaction domain, 0.8658 for Impact, 0.8387 for Worries and 0.9333 for total), with the exclusion of 3 inconsistent items. The test-retests showed no significant difference between two instrument's applications in different periods (p>0.05). The validity was demonstrated by the strategies: content, convergent, factorial and discriminant. All subscales showed positive correlations between itselves (p<0.001) and with the adolescents' self-perception of their health status (p<0.001). The present study suggests that this version of the DQOLY is a reliable and valid measure for its use in Brazil.

diabetes mellitus, type 1; quality of life; adolescent; validation studies


El objetivo de este estudio fue realizar la adaptación para la cultura brasileña del instrumento "Diabetes Quality of Life for Youths (DQOLY)" y analizar su capacidad psicométrica. La adaptación cultural constó de: traducción, retrotraducción, revisión por el comité y el pre-test. El instrumento adaptado fue aplicado en 124 adolescentes con diabetes mellitus tipo 1. La confiabilidad tuvo un alpha de Cronbach adecuado para el dominio Satisfacción (0,8695), de 0,8658 para el Impacto, de 0,8387 para las Preocupaciones y de 0,9333 para todo el instrumento, siendo excluidos 3 ítems inconsistentes. La prueba/ reprueba demostró no existir diferencia significativa entre las dos aplicaciones del instrumento durante periodos diferentes (p>0,05). La validación fue demostrada por las estrategias: contenido, convergencia, factorial y discriminación. Todas las sub-escalas tuvieron correlaciones positivas entre sí (p<0,001) y con la auto-percepción del estado de salud (p<0,001). El presente estudio concluye que la versión del DQOLY es una forma de medición confiable y válida para ser usada en el Brasil.

diabetes mellitus tipo 1; calidad de vida; adolescente; estudios de validación


ARTIGO ORIGINAL

IDoutoranda, Enfermeira, Hospital Universitário, e-mail: tatiananovato@hotmail.com

IIProfessor assistente, e-mail: sogrossi@usp.br

IIIProfessor, e-mail: mikimura@usp.br. Escola de Enfermagem da Universidade de Sao Paulo, Brazil

RESUMO

O objetivo deste estudo foi realizar a adaptação da medida "Diabetes Quality of Life for Youths (DQOLY)" para a cultura brasileira e analisar suas propriedades psicométricas. A adaptação cultural incluiu as fases: tradução, retro-tradução, revisão por comitê e pré-teste. O instrumento adaptado foi aplicado a 124 adolescentes com diabetes mellitus tipo 1. Os resultados de confiabilidade indicaram alphas de Cronbach adequados (0,8695 para o domínio Satisfação, 0,8658 para o Impacto, 0,8387 para Preocupações e 0,9333 para o total), com a exclusão de 3 itens inconsistentes. O teste-reteste demonstrou não haver diferença significativa entre duas aplicações do instrumento em períodos diferentes (p>0,05). A validação foi demonstrada pelas estratégias: conteúdo, convergente, fatorial e discriminante. Todas as sub-escalas indicaram correlações positivas entre si (p<0,001) e com a auto-percepção do estado de saúde (p<0,001). O presente estudo sugere que a versão do DQOLY é uma medida confiável e válida para o uso no Brasil.

Descritores: diabetes mellitus tipo 1; qualidade de vida; adolescente; estudos de validação

INTRODUÇÃO

Diabetes Mellitus (DM) tipo 1 é uma das doenças crônicas mais comuns na infância e adolescência(1). Evidências clínicas, bioquímicas e epidemiológicas confirmam que a manutenção dos parâmetros glicêmicos em níveis próximos aos normais reduz a incidência e a severidade das complicações em longo prazo do diabetes(2). Este estrito controle glicêmico requer comportamentos de auto-cuidado que não são facilmente incorporados, especialmente durante a adolescência.

A dificuldade na realização destes comportamentos de auto-cuidado e a manutenção do controle metabólico adequado podem ser atribuídos às mudanças nos aspectos sócio-emocionais, cognitivos e fisiológicos durante a adolescência(3). Por isso, outros aspectos, além do controle metabólico, começaram a servir como parâmetros de sucesso do tratamento, considerando que o convívio com a doença e as demandas relacionadas ao controle glicêmico, insulinoterapia, dieta e exercícios físicos têm forte impacto, não somente no funcionamento fisiológico, mas também no funcionamento psicossocial do adolescente.

A avaliação da qualidade de vida (QV) tem sido considerada um parâmetro importante na compreensão deste impacto(4) porque fornece dados para o desenvolvimento de intervenções mais efetivas pela avaliação das repercussões da condição de cronicidade na perspectiva do indivíduo. Acredita-se que contemplando as percepções individuais de QV facilita-se a adesão ao tratamento(5).

A medida Diabetes Quality of Life(DQOL) foi o instrumento específico pioneiro de avaliação da qualidade de vida, e consiste das quatro subscalas: satisfação, impacto da doença na vida diária, preocupações relacionadas à doença, e preocupações vocacionais(6). Com o intuito de determinar a especificidade do contexto de vida dos jovens diabéticos, este instrumento foi adaptado(5) com a inclusão de questões relacionadas à rotina dos jovens como a escola e preocupações com o futuro, e foi denominado Diabetes Quality of Life for Youths (DQOLY).

Por meio da busca nas bases de dados Medline, Lilacs e Embase não se identificou nenhum instrumento específico construído ou adaptado para a cultura brasileira com a finalidade de avaliar a QV dos jovens com diabetes. Desta forma, os objetivos do presente estudo foram realizar a adaptação cultural e a validação da medida DQOLY para a cultura brasileira e determinar a relação existente entre seus escores e as variáveis sócio-demográficas, clínicas e a auto-percepção do estado de saúde.

MÉTODO

O estudo foi realizado em duas fases: adaptação cultural (fase 1) e análise da confiabilidade e validade (fase 2).

O DQOLY é um instrumento específico desenvolvido para avaliar a qualidade de vida de jovens com diabetes mellitus tipo 1. O questionário consiste de 51 itens divididos nas subscalas ou domínios Satisfação, Impacto e Preocupações, com 17, 23 and 11 itens, respectivamente. São questões do tipo Likert com cinco opções de respostas, que variam de muito satisfeito a muito insatisfeito na subscala Satisfação e de nunca a sempre nas subscalas Impacto e Preocupações. O menor escore corresponde à "melhor QV', exceto para uma questão invertida na subscala Impacto. Além disso, uma questão relacionada à percepção da saúde comparada aos outros adolescentes foi adicionada ao instrumento(5).

Fase 1: Adaptação Cultural

A permissão para traduzir o DQOLY para o português foi obtida de um dos autores do DQOLY, Dr Gary Ingersoll. Esta fase foi conduzida de acordo com os métodos preconizados na literatura(7).

A tradução do instrumento para o português foi realizada de forma independente por dois tradutores brasileiros que conheciam os objetivos do estudo. As duas versões em português geraram uma única versão após o consenso dos autores (DQOLY 1) e então, foi submetida à retrotradução, realizada por outros dois tradutores, residentes nos Estados Unidos e Inglaterra. Eles não tiveram contato com o instrumento original, gerando assim, a versão DQOLY 2. Subseqüentemente, esta versão foi submetida a um comitê de juízes, composto por 6 especialistas em diabetes, com domínio no idioma inglês. Eles compararam cada item do instrumento original com a versão traduzida em relação às equivalências semântica/idiomática com o intuito de garantir a tradução correta.

Após este processo, a versão DQOLY 3 foi gerada e submetida a um outro comitê composto por 5 especialistas em adaptação de instrumentos. Apenas a versão DQOLY 3 estava disponível e eles tiveram que verificar a equivalência cultural, que está relacionada com o contexto e experiências de vida na população brasileira, e a equivalência conceitual, que é a verificação da manutenção dos conceitos do instrumento original na versão traduzida. Foram considerados consistentes itens com 80% de concordância em todas as análises de equivalência. Outra versão foi gerada após estas análises: DQOLY 4 e foi aplicada a 12 adolescentes que responderam ao instrumento e sugeriram modificações para melhorar a compreensibilidade de alguns itens. A versão DQOLY 5 foi submetida às análises de confiabilidade e validade e à partir deste momento, denominaremos IQVJD (Instrumento de Qualidade de Vida para Jovens com Diabetes).

Fase 2: Análises de Confiabilidade e Validade

O instrumento foi aplicado entre novembro de 2003 e maio de 2004 no Ambulatório de Diabetes do Instituto da Criança, Ambulatório de Diabetes do Hospital das Clínicas e na Liga de Controle do Diabetes da Disciplina de Endocrinologia, serviços estes pertencentes à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), centros de referência no tratamento do DM.

A versão brasileira do instrumento foi aplicada a adolescentes com DM tipo 1 e os resultados forneceram dados para as análises de confiabilidade e validade. Os jovens responderam às questões do instrumento enquanto aguardavam consulta médica na sala de espera dos serviços já citados. O instrumento foi auto-administrado.

A amostra foi composta por 124 pacientes (65 do sexo feminino, 59 do masculino). A média de idade foi 14,74(± 2,11) e variou de 12 a 18 anos de idade. A duração da doença variou de 1 a 16 anos (média 6,2 ± 3,93).

Confiabilidade: representa a reproducibilidade dos resultados obtidos pelo instrumento em diferentes condições(8). A confiabilidade do IQVJD foi avaliada pela análise do teste-reteste. Catorze dos pacientes incluídos na amostra responderam ao instrumento uma segunda vez num período que variou de 15 a 20 dias da primeira aplicação. A confiabilidade também foi testada pela análise da consistência interna total e das subscalas com a utilização do coeficiente alfa de Cronbach. Os critérios utilizados para a exclusão de itens inconsistentes foram: baixa correlação (<0,2) ou correlações negativas, exceto para itens invertidos.

Validade é a propriedade do instrumento em medir o que se propõe(8). Tendo como base os dados obtidos na avaliação da equivalência conceitual, a validade de conteúdo foi determinada com a utilização do índice de validade de conteúdo (IVC)(9) calculado para cada par de especialistas, como demonstrado a seguir:

É desejável que o IVC seja superior a 0.8, o que indica concordância adequada entre os especialistas(9).

A validade de construto foi determinada baseada na validade convergente. A hipótese adotada foi que haveria correlação positiva entre as variáveis auto-estima e qualidade de vida(10). Esta validade foi determinada pela correlação dos escores obtidos pela aplicação do IQVJD e da escala de Auto-Estima de Rosenberg. Esta última, validada para a população brasileira(11), foi auto-administrada. A validade de construto também foi verificada pela análise fatorial, apesar do tamanho limitado da amostra.

A validade discriminante foi analisada para determinar se o instrumento tem a propriedade da discriminação de grupos, pela comparação dos escores do IQVJD entre pacientes com pior hemoglobina glicada (HbA1c >7) e melhor controle glicêmico (HbA1c <7). A Hemoglobina glicada (HbA1c) foi escolhida como parâmetro de controle metabólico para testar a validade discriminante porque profissionais tendem a relacionar o controle metabólico adequado do diabetes com a QV, como apresentado em alguns estudos(12-13). Os escores total e por subscalas foram comparados.

Procedimentos Estatísticos

Os dados foram tabulados em um banco de dados do Excel e processados com o auxílio do programa Statistical Package for Social Sciences, versão 10.0. O nível de significância adotado foi de 0,05. Os seguintes testes foram utilizados: T-pareado para análise do teste-reteste; Coeficiente de correlação de Pearson para a validade de construto; Teste T de Student para a validade discriminante e Coeficiente de correlação de Spearman para a determinação das correlações entre as subscalas do IQVJD e a auto-percepção do estado de saúde.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (processo nº. 282/2003). O anonimato e a possibilidade de desistência do estudo a qualquer momento foram garantidos aos participantes que assinaram ao termo de Consentimento Livre e Informado.

RESULTADOS

Fase 1: Adaptação cultural

Nesta fase, alterações nos itens do instrumento foram introduzidas com as sugestões dos pacientes, pesquisadores e especialistas com o intuito de melhorar a compreensibilidade dos itens e, em geral, não envolveram o conteúdo de nenhum item. Um item, em especial, mereceu maior atenção por estar relacionado à direção de veículos. No Brasil, por lei, as pessoas com idade inferior a 18 anos não podem dirigir. O autor do instrumento original sugeriu a manutenção deste item até a análise de confiabilidade para verificar o quanto este item estaria relacionado com os demais da escala. Os resultados estão descritos a seguir.

Fase 2: Análise das Propriedades Psicométricas

Confiabilidade

Os resultados da consistência interna, dados pelos coeficientes alfa de Cronbach do instrumento adaptado, foram 0,8695 para a subscala Satisfação, 0,8658 para Impacto e 0,8387 para Preocupações. Nas subscalas Satisfação e Preocupações todas as correlações foram significativas e positivas. No domínio Impacto, o item 7, "Com que freqüência você se sente bem consigo mesmo", demonstrou-se invertido, e o item, "Com que freqüência seu diabetes o impede de dirigir um carro", apresentou a menor correlação com a subscala (0,1432) e foi excluído.

Pela análise do IQVJD total, já com a inclusão das alterações, dois itens da subscala Impacto apresentaram baixas correlações com os outros itens da escala total. Os itens inconsistentes, (12 e 21), foram "Com que freqüência você tem que explicar aos outros o que significa ter diabetes?" (0,1910) e "Com que freqüência você acha que seus pais te protegem muito?"(0,1959). A exclusão destes itens alterou o alpha de Cronbach total de 0,9313 para 0,9333 e o coeficiente para o domínio Impacto de 0,8627 para 0,8658. A análise da consistência interna permitiu a reelaboração do instrumento que agora inclui 17 itens no domínio Satisfação, 20 no Impacto e 11 no Preocupações e um total de 48 itens.

Considerando que as opções de respostas para cada item variam de 1 a 5, escores de 17 a 85 poderiam ser obtidos no domínio Satisfação, 20 a 100 no domínio Impacto, e 11 a 55 no domínio Preocupações, com o escore total podendo variar de 48 a 240. Para facilitar a interpretação, os escores foram transformados em uma escala de 0 a 100%, com os menores escores indicando melhor QV.

Outra estratégia para determinar a confiabilidade do instrumento foi o teste-reteste, Os dados foram comparados, com o instrumento contendo as alterações já descritas e a inversão do item 7 da subscala Impacto. Os resultados estão apresentados na Tabela 1.

Validade

A análise da equivalência conceitual, realizada durante a fase de adaptação cultural pelo comitê de cinco especialistas, forneceu dados para a determinação da validade de conteúdo do instrumento. As análises das subscalas do instrumento e do total apresentaram IVC inferior a 0,8 em alguns itens indicados por um dos especialistas, demonstrando que a concordância não foi unânime.

Na verificação da validade convergente, o coeficiente de alpha de Cronbach obtido para a escala de auto-estima foi 0,8862, considerado adequado para esta análise. Os resultados da correlação apresentados na tabela 1 indicaram que quanto pior o escore de QV, pior o escore da medida de auto-estima.

A validade fatorial foi determinada pela análise dos componentes principais que resultam em cargas fatoriais que indicam o quanto cada item está associado a cada subscala. Este método permitiu o agrupamento das questões de acordo com as correlações entre elas. Utilizou-se a rotação oblíqua, que permite a correlação entre os fatores. A solução com três componentes produziu um percentual de explicação de apenas 37,5%, com a maior parte dos itens melhor alocados no primeiro componente. A medida de adequação da amostra dada pelo KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) foi de 0,786, indicando razoabilidade dos dados para a análise fatorial(14).

A validade discriminante demonstrou diferença significativa entre os escores de QV quando pacientes com níveis adequados e inadequados de HbA1c foram comparados, exceto para o domínio Satisfação (p=0,082)(Tabela 1).

Escores obtidos pela aplicação do IQVJD

O escore médio transformado obtido nesta amostra foi 26,59(±14,37) para a subscala Satisfação; 31,44(±15,54) para Impacto; 32,44(±20,89) para Preocupações e 29,95 (±14,37) para o IQVJD total. Correlações positivas e significativas foram observadas entre as subscalas, indicando que estas não são independentes, e entre o escore total e por domínios com a auto-percepção do estado de saúde. (Tabela 1).

DISCUSSÃO

Nos últimos anos, a avaliação da QV tem se tornado essencial na área da saúde e muitos instrumentos para a sua avaliação têm sido desenvolvidos, a grande parte em inglês(15). Não existem medidas específicas, adaptadas à cultura brasileira, disponíveis para a avaliação da QV dos adolescentes com DM, e por isso, no presente estudo, as recomendações preconizadas na literatura para a adaptação cultural(7) e validação do DQOLY(8-9) foram seguidas.

Os coeficientes alpha de Cronbach adequados obtidos nas subscalas Satisfação e Preocupações e a ausência de correlações negativas favoreceram a manutenção dos itens originais. A correlação negativa do item do domínio Impacto, "Com que freqüência você se sente bem consigo mesmo?", com os demais confirmou sua inversão, e por isso, este escore deve ser interpretado inversamente na análise subsequente. A fraca correlação entre o item do domínio Impacto, "Com que freqüência seu diabetes o impede de dirigir um carro?" , e os demais itens, provavelmente se deu pelo fato desta atividade ser proibida, por lei, aos menores de 18 anos e foi, por isso, excluído. Estas alterações aumentaram notoriamente o alpha de Cronbach desta subscala (de 0,8289 a 0,8627).

A consistência interna do IQVJD total, incluindo as modificações, foi elevada (0,9313). A exclusão de 2 itens da subscala Impacto, que apresentaram baixas correlações, aumentaram o alpha de Cronbach da subscala e total. A análise da consistência interna da medida DQOLY original, resultou no coeficiente de alpha de Cronbach de 0,85; 0,83 and 0,82 para os domínios Satisfação, Impacto e Preocupações, respectivamente(5). Em um estudo multicêntrico(12), em que o DQOLY foi aplicado a 2101 adolescentes com DM tipo 1, os coeficientes de alpha de Cronbach obtidos foram: 0,92 para o domínio Satisfação; 0,79 para o Impacto e 0,84 para Preocupações. Em outro estudo, em que o DQOLY foi aplicado a 69 adolescentes, valores de 0,88 e 0,82 foram reportados para as subscalas Satisfação e Preocupações, respectivamente(16).

O teste-reteste indicou a estabilidade temporal do instrumento. A confiabilidade o IQVJD foi demonstrada.

A análise da validade de conteúdo indicou que a concordância entre os especialistas não foi unânime, devido às respostas discordantes de um especialista. Os itens foram revistos e considerados adequados para a confirmação da validade de conteúdo do instrumento.

A determinação da correlação entre a medida de QV e a escala de auto-estima demonstrou a validade convergente do IQVJD. Correlações positivas e significativas entre as medidas de QV e auto-estima, como neste estudo, foram reportadas em outro(17) quando o DQOLY e o Offer's Self-Esteem Inventory foram aplicados a 77 adolescentes com DM tipo 1. Resultados similares foram demonstrados pela aplicação de uma medida de QV (Vécu et Santé Perçue de l´Adolescent - VSP-A) a adolescentes franceses utilizando-se de um questionário de auto-estima (Echelle Toulousaine d´Estime de Soi ETES) para a determinação da validade convergente(10). Estes resultados indicam que os conceitos de QV e auto-estima estão relacionados.

A análise fatorial foi realizada para determinar a pertinência dos itens nas subscalas. Os resultados obtidos mostram que a solução com três componentes não corresponde às três subscalas do DQOLY. Apenas oito dos 48 itens estiveram locados no segundo ou terceiro componentes. Entretanto, a alocação destes itens no primeiro componente poderia ser aceitável, caracterizando o instrumento como unidimensional. Este resultado não é conclusivo pela ausência de análises similares com o mesmo instrumento.

A validade discriminante demonstrou que, em adolescentes com melhor controle metabólico, o diabetes foi associado ao menor impacto, menores preocupações, e melhor QV (p<0.05). Os resultados da análise discriminante concordam com outros estudos. Uma correlação positiva entre os escores das três subscalas e o DQOLY total com níveis adequados de HbA1c foram reportados em outra pesquisa(12). Um estudo demonstrou que adolescentes com níveis menores de HbA1c apresentaram melhores escores nos domínios Satisfação e Preocupações(13). Outra investigação reportou uma correlação positiva entre o bom controle metabólico e melhores escores no domínio Satisfação e para o DQOLY total, além da correlação positiva entre a HbA1c média coletada durante todo o ano seguinte com todas as subscalas e o DQOLY total(16). Embora os resultados destes estudos indiquem que o melhor controle metabólico está associado com a melhor QV, outros não confirmam esta relação(3,5).

Os resultados obtidos pela aplicação do IQVJD na amostra estudada foram similares aos reportados em outros estudos(3,5). A análise do IQVJD, baseada nos escores transformados, demonstrou que todos os escores da amostra estiveram abaixo dos 50%, indicando boa QV. Os escores médios transformados do DQOLY publicados por um estudo multicêntrico(12) foram: 25(± 18) para a subscala Satisfação, 25(± 11) para a subscala Impacto e 19(± 16) para a subscala Preocupações. A comparação desses resultados com o deste estudo demonstrou maiores escores médios para as três subscalas (pior QV), com as maiores diferenças observadas no domínio Impacto (32,44 ± 20,89) e a menor diferença para o domínio Satisfação (26,59 ± 14,65).

A correlação positiva entre as subscalas demonstrou que elas não são independentes, isto é, quanto mais satisfeitos estão os adolescentes, menor o impacto causado pelo diabetes e menores as preocupações relacionadas à doença.

As correlações positivas observadas entre as subscalas e o escore total do IQVJD com a auto-percepção do estado de saúde estão de acordo com outros estudos(3,5,12,18), isto é, quanto melhor a percepção do estado de saúde pelo adolescente, melhor sua QV.

As análises do IQVJD demonstraram boas propriedades psicométricas em termos de confiabilidade e validade. É importante ressaltar que a validação de um instrumento não pode ser esgotada em um único estudo(8). Portanto, aplicações posteriores do IQVJD são necessárias. Considerando que este é o primeiro estudo brasileiro em que este instrumento foi empregado, sugerimos a manutenção dos itens 12 e 21 da subscala Impacto em futuras aplicações, com o intuito de determinar se as inconsistências entre estes itens e os demais do instrumento se confirmam.

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  • Adaptação cultural e validação da medida "Diabetes Quality of Life for Youths" de Ingersoll e Marrero para a cultura brasileira

    Tatiana de Sá NovatoI; Sonia Aurora Alves GrossiII; Miako KimuraIII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Abr 2008

    Histórico

    • Aceito
      14 Jan 2008
    • Recebido
      06 Ago 2007
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