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Dilemas éticos vivenciados por enfermeiros apresentados em publicações de enfermagem

Resumos

Trata-se de revisão sistemática da literatura, realizada em artigos da área da enfermagem, contidos no banco de dados SCIELO, e que abordaram o tema "ética". Teve como objetivo identificar os dilemas éticos da enfermagem a partir de revisão de literatura em publicações da área, no período de 2002 a 2006. Localizou-se quarenta publicações, das quais foram selecionadas dezessete. A análise dos artigos permitiu a organização das categorias: ética, o sistema de saúde e a prática de enfermagem, ética e o ensino-aprendizagem na enfermagem, ética e o cuidado de enfermagem. Percebeu-se que os autores atribuíram às questões éticas abordagem multidimensional, no entanto, considerou-se, aqui, necessária maior atenção a respeito dos aspectos éticos que permeiam a prática de enfermagem. Ficou clara a necessidade de mais estudos que evidenciem novos dilemas éticos vivenciados por enfermeiros, no sentido de contribuir para mudança de atitude, implicando na qualidade da prática profissional.

ética; enfermagem; ética de enfermagem


This systematic literature review used nursing studies about "ethics" published in the SCIELO database. The objective was to identify the ethical dilemmas of nursing, based on a literature review of nursing publications between 2002 and 2006. Forty publications were found, of which seventeen were selected. The analysis of the articles permitted the organization of the following categories: ethics, the health system and nursing practice; ethics and nursing teaching-learning; ethics and nursing care. We noticed that the authors attributed a multidimensional approach to ethical issues. However, we considered it necessary to pay closer attention to the ethical aspects involved in nursing practice. There is a clear need for further studies, showing new ethical dilemmas experienced by nurses, so that they can contribute to a change in attitude, with outcomes for professional practice.

ethics; nursing; ethics, nursing


Se trata de una revisión sistemática de la literatura, realizada en artículos del área de la enfermería, contenidos en el banco de datos SCIELO, y que abordaron el tema "ética". El estudio tuvo como objetivo identificar los dilemas éticos de la enfermería a partir de una revisión de la literatura en publicaciones sobre esa área, en el período de 2002 a 2006. Se localizaron cuarenta publicaciones, de las cuales fueron seleccionadas diecisiete. El análisis de los artículos permitió la organización de las categorías en: ética, el sistema de salud y la práctica de enfermería, ética y la enseñanza-aprendizaje en la enfermería y, ética y el cuidado de enfermería. Se percibió que los autores realizaron, sobre las cuestiones éticas, un abordaje multidimensional, entretanto, se consideró necesario, en este estudio, dar mayor atención a los aspectos éticos que se encuentran frecuentemente en la práctica de enfermería. Quedó clara la necesidad de realizar otros estudios que pongan en evidencia nuevos dilemas éticos vivenciados por enfermeros, en el sentido de contribuir para el cambio de actitud, que implicaría en mejorar la calidad de la práctica profesional.

ética; enfermería; ética de enfermería


ARTIGO DE REVISÃO

IUniversidade Federal do Ceará, Brasil: Enfermeira, Mestre em Enfermagem em Saúde Comunitária, e-mail: adelanemonteiro@hotmail.com

IIUniversidade Federal do Ceará, Brasil: Enfermeira, Mestre em Enfermagem em Saúde Comunitária, Enfermeira da Maternidade Escola Assis Chateaubriand

IIIUniversidade Federal do Ceará, Brasil: Enfermeira, Professor Titular da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem

IVUniversidade Federal do Ceará, Brasil: Doutor em Enfermagem, Docente da Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem

RESUMO

Trata-se de revisão sistemática da literatura, realizada em artigos da área da enfermagem, contidos no banco de dados SCIELO, e que abordaram o tema "ética". Teve como objetivo identificar os dilemas éticos da enfermagem a partir de revisão de literatura em publicações da área, no período de 2002 a 2006. Localizou-se quarenta publicações, das quais foram selecionadas dezessete. A análise dos artigos permitiu a organização das categorias: ética, o sistema de saúde e a prática de enfermagem, ética e o ensino-aprendizagem na enfermagem, ética e o cuidado de enfermagem. Percebeu-se que os autores atribuíram às questões éticas abordagem multidimensional, no entanto, considerou-se, aqui, necessária maior atenção a respeito dos aspectos éticos que permeiam a prática de enfermagem. Ficou clara a necessidade de mais estudos que evidenciem novos dilemas éticos vivenciados por enfermeiros, no sentido de contribuir para mudança de atitude, implicando na qualidade da prática profissional.

Descritores: ética; enfermagem; ética de enfermagem

INTRODUÇÃO

Uma série de ameaças paira sobre a raça humana nesse milênio, incluindo perigos nuclear e ecológico, o desregramento da economia mundializada, droga, AIDS etc. As ciências e as técnicas modernas produzem mudanças qualitativas no agir do homem. As novas tecnologias engendram crescimento brutal dos poderes do homem, tornando-o objeto de suas técnicas. Tudo isso se converte em ameaça, exigindo reformulação ética para o nosso tempo(1).

Com a modernidade, surge a ética aplicada, referindo-se à bioética, à ética dos negócios, à ética da mídia, entre outras. Porém, a condição humana necessita desenvolver nova ética ou ética do futuro, complexa, que tenha como base a existência humana. Trata-se da ética da cumplicidade, da complexidade, da (com)paixão, da responsabilidade, (re)ligação/integração, da compreensão, solidariedade, do cuidado, do amor(2).

Por outro lado, todas essas transformações também contribuem para que se utilize exacerbadamente a palavra ética, distorcendo o seu significado original ou mesmo banalizando o seu uso, o que acarreta diminuição de sua importância. Daí a necessidade de se questionar como pensar a ética hoje, diante da rápida evolução desordenada enfrentada pela sociedade, pois vive-se um tempo de contradições e o mundo não pára de se transformar, ficando difícil saber para onde está caminhando a humanidade(2).

Nesse sentido, o ensino e os conteúdos discutidos nas escolas e universidades precisam acompanhar essa evolução, pois, ao atuar nessa realidade, o profissional acaba se deparando com situações que envolvem questões éticas. Na enfermagem, ciência do cuidado humano, é indispensável a reflexão sobre essas questões, já que, freqüentemente, os enfermeiros enfrentam dilemas de cunho ético em seu cotidiano, denotando a existência de divergências entre a teoria e a prática.

A enfermagem tem suas atividades orientadas por princípios e normas contidos no Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem. Aos Conselhos de Enfermagem compete a fiscalização do exercício profissional, incluindo decisões sobre questões que envolvem a ética profissional, assim como a orientação para a formação das comissões de ética e o apoio no cumprimento de seu papel nos hospitais.

Mesmo com os códigos, leis e princípios estabelecidos, torna-se desafio o desempenho da prática de enfermagem, pois as referências que existem não acompanham essa evolução das coisas e do mundo, e os conteúdos não abordam os importantes dilemas éticos que se apresentam no desempenho cotidiano das atividades de saúde.

O reconhecimento de situação dilemática pode ser entendido como passo importante na constituição de sujeitos éticos, pois, muitas vezes, sequer se percebe os conflitos, os problemas ou dúvidas. Ou não se consegue enxergar, ou se fica indiferente. Problematizar o cotidiano, perceber as dificuldades, contradições, elaborar questionamentos é o primeiro passo para se falar em ética(3).

Nesse sentido, o presente estudo tem o seguinte objetivo: identificar os dilemas éticos da enfermagem a partir de revisão de literatura em publicações da área, no período de 2002 a 2006.

PERCURSO METODOLÓGICO

Trata-se de revisão sistemática retrospectiva da literatura(4) no período de 2002 a 2006, a partir de artigos da área da enfermagem, que abordaram o tema "ética". O levantamento bibliográfico se deu por meio de pesquisa efetuada via internet, junto à BVS/BIREME (Biblioteca Virtual em Saúde do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde), através de um dos principais bancos de dados, a SCIELO (Scientific Eletronic Library Online).

Investigou-se as revistas brasileiras indexadas nessa base de dados, utilizando como palavras-chaves: ética e enfermagem. No intuito de se obter visão atual das questões éticas envolvidas na prática dos profissionais de enfermagem, selecionou-se os artigos dos últimos cinco anos que abordaram o tema. Os estudos foram procurados na íntegra, lidos e analisados segundo roteiro composto de dados referentes às características do trabalho e às questões éticas apontadas. Foram levantados os aspectos éticos abordados nos artigos selecionados e realizada interpretação e organização das categorias empíricas. A análise foi realizada mediante a comparação dos dilemas éticos encontrados e pela reflexão a respeito da prática de enfermagem, fundamentadas em literatura pertinente sobre o tema.

RESULTADOS

Localizou-se quarenta publicações inicialmente, das quais dezessete foram selecionadas, pois respondiam aos objetivos do estudo. Quase a metade do achado correspondia a estudos de reflexão (Tabela 1).

Verificou-se que o número de artigos encontrados, abordando problemas éticos do cotidiano da enfermagem foi restrito, considerando que a produção científica internacional, nesse mesmo período, correspondeu, praticamente, a três vezes mais. No entanto, se se levar em conta a quantidade de periódicos indexados nessas bases de dados, pode-se perceber que essa diferença não foi tão considerável. Também houve concordância nos assuntos abordados pelos estudos de outros países e aqueles da literatura brasileira.

Levantou-se, entre os principais problemas apontados pelas pesquisas, questões como a desumanização no cuidado ao paciente, assim como a violação de seus direitos, a falta de acesso aos serviços de saúde e as condições e relações de trabalho da enfermagem e a relação autoritária que permeia a prática educativa. Identificou-se que a filosofia e os princípios do sistema de saúde, assim como a forma de organização dos serviços são fatores que contribuem para o surgimento de dilemas de caráter ético. A prática de enfermagem, inserida nesse contexto, se torna vulnerável aos conflitos que podem ocorrer, necessitando de embasamento para a resolução das questões que deveriam ser discutidas desde a formação profissional.

DISCUSSÃO

As principais questões levantadas nas investigações embasaram a constituição de três categorias: ética, o sistema de saúde e a prática de enfermagem, ética e o ensino-aprendizagem na enfermagem, ética e o cuidado de enfermagem, discutidas a seguir.

Ética, o sistema de saúde e a prática de enfermagem

Os aspectos éticos discutidos nessa categoria relacionam-se à prática do profissional de enfermagem, tendo em vista a orientação do sistema nacional de saúde.

A institucionalização do sistema de saúde vigente no país representa processo de mudança na prática da atenção à saúde, que exige dos profissionais, gestores e usuários transformações de cunho ético.

A construção do Sistema Único de Saúde no Brasil implica em reviravolta ética, configurando-se não somente numa nova equipe técnico-assistencial, mas em novo processo de trabalho marcado por prática ética, humana e vinculada ao exercício da cidadania(5). A nova orientação do modelo assistencial vem impondo a implantação gradativa e crescente de rede de cuidados, cuja organização exige complexa estrutura de serviço comunitário articulado a recursos territoriais, culturais e sociais. Nesse sentido, configura-se a tarefa radical da construção de nova ação de saúde, implicando em ruptura paradigmática, conceitual e ética(5).

A enfermagem está inserida nesse contexto e vivencia crise de paradigma em sua prática, pois os profissionais ainda atuam desenvolvendo cultura fundamentada no modelo hegemônico de produzir saúde, centrado na queixa-conduta e pautado numa clínica empobrecida, reproduzindo o modelo médico.

Há necessidade de mudanças nas condutas profissionais, as quais devem se orientar não apenas para o tratamento das doenças, mas contribuindo para a adoção de atitudes que possam melhorar o perfil de saúde do cliente e sua família. Portanto, reconhece-se que o momento atual exige transformações na dinâmica de trabalho, na interação serviço/profissional/cliente(6).

Todas essas propostas, no entanto, entram em contradição no que se refere à visão idealizada e às condições de trabalho enfrentadas pelo pessoal de enfermagem: a baixa remuneração; sobrecarga de trabalho, acúmulo de funções e jornadas duplas e até triplas de trabalho; a precariedade de recursos materiais e a insuficiência de recursos humanos; a insegurança no trabalho; o envolvimento com a doença e a morte e, ainda, dificuldades de comunicação e relacionamento da equipe de enfermagem com a equipe médica(3). Também o relacionamento interpessoal entre os profissionais e o serviço é permeado por relações assimétricas com características de autoritarismo e submissão. Esse modelo hierárquico, somado às condições de trabalho, acaba contribuindo para a falta de humanização da assistência de enfermagem.

Estudos brasileiros, em consonância com estudos estrangeiros, identificaram que os profissionais de saúde apontam os problemas éticos em relação aos membros da equipe de trabalho como mais importantes que aqueles decorrentes da relação com o usuário e suas famílias, tanto no âmbito da atenção básica como nos serviços de atenção secundária e terciária(7-8).

Vale ressaltar que o Sistema Único de Saúde assume o compromisso ético de desenvolvimento de política de promoção da saúde, pautada na integralidade e gestão participativa e que tem como um de seus eixos temáticos as condições e relações de trabalho(9).

O sistema de saúde brasileiro apresenta ainda fragilidades que acabam por gerar problemas éticos, os quais também são realidades em países desenvolvidos. Destaca-se, aqui, aqueles relacionados às dificuldades com os serviços de referência e contra-referência, ao acesso a serviços, a procedimentos complementares, tanto em nível ambulatorial como para internação e a respeito do fornecimento de medicamentos(10).

Enfermeiros, atuantes na área da assistência, convivem com essa realidade no cotidiano. Percebese o sofrimento da população que se tenta acolher e entende-se o quanto é humilhante e desumano essa situação, merecendo a atenção da enfermagem, como profissionais e também como seres humanos.

Deve-se lembrar que esses problemas éticos decorrentes do sistema de saúde têm relação direta com a ética na gestão dos serviços. Salienta-se que, geralmente, os serviços de saúde são gerenciados por enfermeiros. Dessa forma, a prática de enfermagem, enquanto gerência, precisa ser repensada, buscando-se propostas pautadas em princípios éticos, democráticos e que focalizem, no processo de trabalho, o profissional e o cliente. Trata-se de gerência participativa dos serviços de saúde, fundamentada no diálogo, compreendendo o trabalhador de saúde e o cliente como sujeitos(11).

Diante do exposto, considera-se que a enfermagem precisa se sentir responsável pela atual situação de saúde em que se encontra o país, e que ela, a enfermagem, deve reconhecer o papel importante que sua prática representa para a concretização do novo sistema de saúde, que se constitui em desafio nos dias atuais, tendo em vista sua filosofia ética e humanitária.

Ética e o ensino-aprendizagem da enfermagem

Entre as questões éticas evidenciadas nos artigos no campo do ensino, destacam-se aquelas relacionadas às dificuldades na relação professor-aluno e ao paradoxo ensino-prática.

Os entraves na relação professor-aluno foram ressaltados pelos alunos em suas percepções acerca do processo de formação do curso de enfermagem. Essa oportunidade de expor seus pensamentos se deu a partir da lógica do Projeto Político Pedagógico (PPP). Esse é centrado na formação crítico-reflexiva com qualidade política de sujeitos que possam atuar na transformação da realidade. O PPP é a expressão coletiva de qual escola se quer ter e qual tipo de aluno se quer formar. É instrumento das intenções de todos que constituem a escola, pensando em sua função educativa de forma ampla e nas suas relações com a sociedade. Todo esse processo visa a oferta de serviço educacional de qualidade na perspectiva intelectual, cultural, social, ética e política(12).

A construção do PPP, no entanto, é um desafio, pois ainda há limites na relação professor-aluno, a qual se apresenta, muitas vezes, como autoritária. Os docentes resistem a políticas como essa, adotando postura repressiva em relação à opinião dos alunos, não permitindo a ação reflexiva, de forma que a crítica possa ser construída.

Novas competências éticas e profissionais, portanto, são exigidas para aquele que ensina. Pode-se citar entre elas: acompanhar a progressão da aprendizagem, capacidade para trabalhar em equipe, participar da administração da escola, informar e envolver os pais no processo, utilizar novas tecnologias e enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão.

Para isso, torna-se necessário compreender a relação professor-aluno mais além da condição daquele que ensina e daquele que aprende. O professor e o aluno são sujeitos que se constroem na história. Essa relação educativa, que envolve educador-educando, só pode ter significado concreto quando entendida como prática social, sempre pressupondo uma visão de mundo(12).

Com relação ao conteúdo que deve permear as discussões entre professores e alunos, percebe-se a necessidade de transformação tanto do conteúdo quanto da prática, subordinado ao fluxo de transformação da própria realidade. É isso que sustenta a construção de um projeto de ensino e de cuidado construído a partir da necessidade de saúde e baseado em princípios éticos, pois, diante de tantas mudanças ocorridas na sociedade, torna-se evidente o paradoxo entre o ensino e a ação. O curso de graduação requer educação ética mais abrangente, devendo haver espaço para a discussão de casos clínicos relacionados à ética e para estudo aprofundado do Código de Ética(12). Assim, serão possibilitados a reflexão e o respeito de valores, desenvolvendo a consciência ética dos estudantes.

Ética e o cuidado de enfermagem

O cuidar eticamente do outro é atitude que leva à reflexão. Várias questões nesse sentido foram abordadas nos artigos, tendo em vista que o cuidar constitui a essência da profissão de enfermagem. Ao cuidar de um paciente é preciso que o profissional o veja como ser humano, com suas necessidades afetadas, encontrando-se fragilizado, merecendo, portanto, respeito e atenção. No entanto, a evolução do trabalho da enfermagem é comparada ao processo de evolução da sociedade (desumanização), culminando em cuidado descompromissado. A falta de cuidado e o cuidado incorreto são agravos à pessoa humana e estão diretamente relacionadas à falta de ética(13).

A atitude ética do profissional para com o paciente está presente cada vez que ele reconhece seus clientes como pessoas iguais a ele, que precisam ser ouvidas e compreendidas para que exista a interação e, por conseguinte, o cuidado efetivo. É importante que os profissionais respeitem seus direitos e exercitem o autocuidado com o objetivo de incentivarem autonomia e a auto-estima daqueles que cuidam(13).

É direito do paciente o esclarecimento sobre a natureza e os objetivos dos procedimentos diagnósticos, preventivos e terapêuticos, bem como ser informado sobre sua invasibilidade, duração do tratamento, seus benefícios e prováveis desconfortos, e dos possíveis riscos físicos, psicológicos, econômicos e sociais. O enfrentamento dessas situações requer relação de solidariedade, crescimento mútuo entre pares, que buscam se tornar mais sujeitos(3,14).

Dessa forma, a conduta da enfermagem deve ser no sentido de resguardar esses direitos, porém, ainda são observadas situações nas quais não há respeito à autonomia dos usuários e onde predomina a falta de informação ao paciente e seus familiares. A falta de diálogo, de informação, ou informação ineficiente, constitui um dos motivos mais fortes na justificativa dos pacientes quanto à sua falta de condições para participar do processo de tomada de decisão sobre seu tratamento, bem como no cuidado ou planejamento de sua assistência(3,15).

O Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem preconiza, nos artigos 17, 18 e 20, que são responsabilidades e deveres do enfermeiro: prestar adequadas informações e esclarecimentos à pessoa, família e coletividade a respeito de sua saúde, tratamento e assistência de enfermagem prestada; quanto aos seus direitos, possíveis riscos, benefícios e intercorrências que possam ocorrer; respeitar e reconhecer o direito da pessoa, ou de seu representante legal, de decidir sobre sua saúde, tratamento e seu bem-estar(15-16).

Situações específicas como o atendimento à criança, ao adolescente, ao idoso, a realização de cirurgias e informação de diagnósticos graves, que sugerem risco iminente de vida, são ações capazes de gerar conflitos vivenciados cotidianamente pelos enfermeiros(17). Esses conflitos também são evidenciados em pesquisas de países estrangeiros e são permeados por questões éticas como sigilo e confidencialidade, violência, maus-tratos e abuso sexual, direitos sociais, os quais requerem dos profissionais de saúde atitudes que não encontram respaldo na ética tradicional e hegemônica, necessitando da busca de fundamentação, documentação, consulta e acima de tudo reflexão bioética(18).

Percebe-se o quanto a falta de ética e suas implicações podem estar presentes no cotidiano dos enfermeiros, não podendo mais esses permanecerem alheios às atitudes que correspondem à não observância dos direitos do paciente e o grave desrespeito ao ser humano, fato que infringe os preceitos que norteiam a prática do cuidado de enfermagem.

Torna-se necessário, portanto, a re-humanização da prática de enfermagem, para que essa atue baseada na interação, na ternura, no afeto e no amor, unindo o valor técnico ao valor ético, combinando razão e coração. Para isso, é fundamental a integração da dimensão espiritual às atividades diárias do profissional como fator determinante para sua atuação, assim como indutor para a melhor qualidade de vida pessoal e profissional do enfermeiro(19).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se que, diante de tantas transformações que estão ocorrendo na sociedade, o profissional de enfermagem está envolvido em dilemas de cunho ético em seu cotidiano, participando tanto de forma passiva como ativa de ações nas quais o desrespeito ao ser humano é evidente.

Considera-se, aqui, diante deste estudo, que, apesar da abordagem multidimensional (política, social, cultural e espiritual) que vem sendo atribuída ao tema pelos pesquisadores, se faz ainda necessária uma reflexão e que seja atribuída maior atenção acerca dos aspectos éticos que permeiam a prática de enfermagem, não devendo os profissionais ficarem alheios às questões éticas com as quais se deparam. Novos estudos precisam ser elaborados no sentido de evidenciar os principais problemas éticos enfrentados, de forma que os enfermeiros possam ser alertados para mudança de atitude, implicando na qualidade da prática profissional.

Conclui-se que esse tema deve fazer parte das discussões de todos: alunos, profissionais, docentes, clientes, de forma que se possa compreender e construir nova ética, baseada no cuidado humano, essência da enfermagem.

REFERÊNCIAS

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Recebido em: 29.8.2007

Aprovado em: 29.9.2008

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  • Dilemas éticos vivenciados por enfermeiros apresentados em publicações de enfermagem

    Maria Adelane Alves MonteiroI; Régia Christina Moura BarbosaII; Maria Graziela Teixeira BarrosoIII; Neiva Francenely Cunha VieiraIV; Ana Karina Bezerra PinheiroIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Fev 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Aceito
      29 Set 2008
    • Recebido
      29 Ago 2007
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