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Desenvolvimento e confiabilidade de instrumento para mensuração dos fatores psicossociais determinantes do consumo de sal entre hipertensos

Resumos

Este estudo teve como objetivo apresentar a análise da validade de conteúdo e da confiabilidade de um instrumento para estudo dos fatores determinantes do consumo de sódio entre hipertensos, baseado na extensão da Teoria do Comportamento Planejado. O instrumento foi submetido à validade de conteúdo por 3 juízes e pré-teste com 5 sujeitos. O instrumento final, composto por 3 comportamentos relacionados ao consumo de sal e pelas variáveis psicossociais correspondentes, foi aplicado a 32 sujeitos para avaliação da consistência interna e da estabilidade temporal (intervalo de 15 dias). Foram observados coeficientes alfa de Cronbach>0,70 para a maioria das variáveis e coeficientes de correlação intraclasse significativos, apontando para a estabilidade temporal dos conceitos mensurados. O instrumento desenvolvido mostrou evidências de validade de conteúdo e de confiabilidade.

dieta hipossódica; reprodutibilidade dos testes; enfermagem


This study aimed to present the content validity and reliability analyses of an instrument to study the determinant factors of salt consumption among hypertensive subjects, based on an extension of the Theory of Planned Behavior. Content validity was assessed by 3 experts and a pre-test was carried out with 5 subjects. The final tool, comprising 3 different behaviors related to salt consumption and corresponding psychosocial variables, was applied to 32 subjects for internal consistency and temporal stability (15-day interval) analysis. Cronbach's alpha coefficients > 0.70 and significant intra-class correlation coefficients were observed for most variables, indicating the temporal stability of the measured concepts. The developed instrument exhibited evidence of both content validity and reliability.

diet; sodium-restricted; reproducibility of results; nursing


Este estudio tuvo como objetivo presentar el análisis de validez de contenido y de confiabilidad de un instrumento para estudiar los factores determinantes del consumo de sodio entre hipertensos, basado en la extensión de la Teoría del Comportamiento Planificado. El instrumento fue sometido a validez de contenido por 3 jueces y a una prueba piloto con 5 sujetos. El instrumento final, compuesto por 3 comportamientos relacionados al consumo de la sal y por las variables psicosociales correspondientes, fue aplicado a 32 sujetos para evaluación de la consistencia interna y de la estabilidad temporal (intervalo de 15 días). Fueron observados coeficientes alfa de Cronbach>0,70 para la mayoría de las variables y coeficientes de correlación entra clases significativas, que apuntaron la estabilidad temporal de los conceptos mensurados. El instrumento desarrollado mostró evidencias de validez de contenido y de confiabilidad.

dieta hiposódica; reproducibilidad de resultados; enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Desenvolvimento e confiabilidade de instrumento para mensuração dos fatores psicossociais determinantes do consumo de sal entre hipertensos1

Marília Estevam CornélioI; Maria Cecília Bueno Jayme GallaniII; Gaston GodinIII; Roberta Cunha Matheus RodriguesII; Roberto Dela Rosa MendesI; Wilson Nadruz JuniorIV

IFaculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, Brasil: Enfermeira/o, Mestranda/o, e-mail: mariliamec@yahoo.com.br, titodrm@yahoo.com.br

IIFaculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, Brasil: Enfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Associado, e-mail: ceciliag@fcm.unicamp.br, robertar@fcm.unicamp.br

IIIUniversité Laval, Canadá: Professor Doutor, e-mail: gaston.godin@fsi.ulaval.ca

IVFaculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, Brasil: Médico, Doutor em Clínica Médica, Professor Doutor, e-mail: wilnj@fcm.unicamp.br

RESUMO

Este estudo teve como objetivo apresentar a análise da validade de conteúdo e da confiabilidade de um instrumento para estudo dos fatores determinantes do consumo de sódio entre hipertensos, baseado na extensão da Teoria do Comportamento Planejado. O instrumento foi submetido à validade de conteúdo por 3 juízes e pré-teste com 5 sujeitos. O instrumento final, composto por 3 comportamentos relacionados ao consumo de sal e pelas variáveis psicossociais correspondentes, foi aplicado a 32 sujeitos para avaliação da consistência interna e da estabilidade temporal (intervalo de 15 dias). Foram observados coeficientes alfa de Cronbach>0,70 para a maioria das variáveis e coeficientes de correlação intraclasse significativos, apontando para a estabilidade temporal dos conceitos mensurados. O instrumento desenvolvido mostrou evidências de validade de conteúdo e de confiabilidade.

Descritores: dieta hipossódica; reprodutibilidade dos testes; enfermagem

INTRODUÇÃO

As mudanças ocorridas no padrão alimentar com menor consumo de vegetais e aumento da ingestão de carnes e, recentemente, de produtos industrializados(1) têm resultado em consumo de sal acima do limite recomendado em diferentes grupos populacionais(2-3). Estudo recente(3) constatou consumo diário de sal entre 13 e 17g em pacientes hipertensos, sendo que de 40 a 55% do consumo de sal foi decorrente da adição do nutriente aos alimentos, durante ou após seu preparo, sendo observado, ainda, consumo frequente de alimentos com alto teor de sal. Esse consumo em muito supera o limite recomendado de 6g de sal/dia para indivíduos normotensos, ou de 4g de sal/dia para portadores de hipertensão arterial(4).

O consumo excessivo de sal, por sua vez, tem sido associado à maior gravidade da hipertensão arterial e hipertrofia ventricular(5), o que levou ao estabelecimento das recomendações internacionais para o limite do consumo de sódio, como intervenção não farmacológica no tratamento da hipertensão arterial(6). A recomendação sobre a necessidade de restrição do consumo dietético de sal é reconhecida por pacientes hipertensos. Muitos relatam ainda seguir dieta com pouco sal, como já apontado em estudos anteriores(7-8). A mensuração efetiva desse comportamento, entretanto, aponta para o consumo ainda muito elevado do nutriente nessa população, o que ratifica que as mudanças do padrão alimentar não são fáceis de serem atingidas e mantidas. Acumulam-se evidências de que os programas educacionais com maior chance de sucesso são aqueles direcionados à ação sobre os fatores que atuam sobre a motivação para agir(9).

No campo da psicologia social, encontram-se modelos conceituais que proporcionam as bases para a compreensão dos comportamentos em saúde. Em geral, observa-se que os sujeitos que aderem ou não a determinados comportamentos variam muito entre si, com destaque para os fatores cognitivos, descritos como os determinantes mais importantes da motivação para agir e, por consequência, do comportamento(10). Dentre as teorias que procuram entender e predizer os comportamentos em saúde, a Teoria do Comportamento Planejado(11) (Theory of Planned Behavior - TPB) tem sido amplamente utilizada, inclusive para os comportamentos relacionados à alimentação(12-13). De acordo com a TPB, o comportamento é função da intenção de agir (efetivar o comportamento) e da percepção de controle sobre o comportamento. A intenção, um dos antecedentes imediatos do comportamento, é determinada por três variáveis: a atitude relacionada ao comportamento, a norma subjetiva e o controle comportamental percebido (CCP)(11). A idéia central do modelo pode ser expressa na equação: C ≈ I <= A + NS + CCP (onde: C = comportamento; I = intenção; A = atitude; NS = norma subjetiva; CCP = controle comportamental percebido).

A aplicação dos modelos sociocognitivos motivacionais se faz por meio da aplicação de instrumentos baseados em escalas psicométricas que visam mensurar a magnitude dos fatores relacionados ao comportamento sob estudo e de suas correlações e, como todo instrumento para medida de variáveis psicossociais, necessita demonstrar propriedades psicométricas como confiabilidade e validade adequadas(14).

Apesar da ampla recomendação de restrição do consumo de sódio, da constatação de consumo elevado do nutriente em diferentes populações, não se encontram disponíveis na literatura nacional e internacional instrumentos com base teórica que se proponham a avaliar os fatores determinantes do comportamento alimentar de consumo de sódio. Dessa maneira, este estudo teve como finalidade apresentar a análise da validade de conteúdo e da confiabilidade de um instrumento para estudo dos determinantes do comportamento de consumo de sódio, entre hipertensos.

MÉTODO

Desenvolvimento do instrumento

O instrumento foi delineado após extenso levantamento bibliográfico sobre pesquisas que utilizaram as teorias sociocognitivas no estudo de comportamentos alimentares e pesquisas específicas sobre os fatores que interferem no consumo de sal. A TPB foi a base teórica utilizada, com adição de outras variáveis relacionadas ao comportamento alimentar (autoeficácia, hábito e ambiente) ou ao consumo de sal especificamente (preferências alimentares, determinantes hedônicos e avaliação da qualidade da dieta). Foram realizadas as medidas diretas dos constructos envolvidos(11).

Definição das variáveis psicossociais

O instrumento foi elaborado, primeiramente, com a definição do comportamento de consumo de uma dieta com baixo teor de sal: considere que uma dieta com pouco sal é: - Não adição de sal no preparo da dieta habitual; - Não utilização do acréscimo do sal nos alimentos já preparados (ou o uso do sal à mesa); e, também, - Evitar consumir alimentos que contêm grande quantidade de sal (sódio) como salgadinhos, comida industrializada, carnes pré-salgadas (como carne seca, bacalhau, frios e embutidos), obedecendo aos seguintes elementos: ação (comportamento), alvo, contexto e tempo(11). A partir do comportamento, foram formuladas as afirmativas para mensuração da intenção e dos seus determinantes.

Validade de conteúdo

A primeira versão do instrumento foi submetida à avaliação por três juízes, com reconhecido saber no estudo de comportamentos em saúde e com experiência em validação de instrumentos de medida, para avaliação da adequação conceitual e clareza de seus itens. Essa versão foi aplicada a cinco sujeitos com características semelhantes às da população alvo, com o objetivo de identificar palavras ou questões inapropriadas ou de difícil compreensão(15). Verificou-se que, para os sujeitos que não preparavam a própria refeição, a questão genérica sobre consumo de sódio era pouco compreendida. Além disso, em nova discussão com os juízes, apreendeu-se que o consumo de sódio, por se tratar de categoria comportamental abrangendo diferentes ações(16), não poderia ser definido por meio de uma questão única, levando à divisão do comportamento em três ações distintas, a seguir.

Comportamento 1 - adição de, no máximo, 4 gramas de sal, o que corresponde a 1 colher de chá não muito cheia, no preparo de todas as refeições feitas ao longo do dia (café da manhã, almoço, jantar e lanches). Comportamento 2 - evitar adicionar sal aos alimentos já preparados, bem como evitar o uso do saleiro à mesa e Comportamento 3 - evitar o consumo de alimentos com alto teor de sal, como frios, enlatados, embutidos, carne seca.

Foi, ainda, recomendado a pesquisa do comportamento 1 somente entre os sujeitos que preparam a própria refeição, uma vez que não seria coerente investigar os determinantes de comportamento que o sujeito não executa. Como o número de pacientes do sexo masculino que preparam a refeição é restrito, foi recomendado restringir a pesquisa do comportamento 1 a pacientes do sexo feminino, responsáveis pelo preparo da refeição.

Alguns itens da variável hábito foram modificados. O item avaliado como redundante (Eu não tenho que pensar para fazer) foi retirado e as frases que continham "não" em sua formulação (exemplo: me faz sentir estranho se eu não fizer) foram reformuladas, visando facilitar sua compreensão. O instrumento final foi novamente pré-testado junto a cinco sujeitos da população alvo, com constatação de melhora substancial da compreensão dos comportamentos e das variáveis relacionadas, sem necessidade de modificações adicionais.

Instrumento

O instrumento foi composto por três comportamentos relacionados ao consumo de sal e suas respectivas variáveis psicossociais: intenção, atitude, norma subjetiva, controle comportamental percebido, autoeficácia e hábito (essa variável somente para os comportamentos 1 e 2) e por variáveis gerais, oriundas de outros modelos ou descritas como relacionadas ao consumo de sal.

Comportamento - Os três comportamentos foram mensurados por meio da questão: nos últimos 2 meses o que melhor descreve seu comportamento de [descrição dos comportamentos 1, 2 ou 3] (1) todos os dias da semana, (2) na maioria dos dias da semana, (3) de vez em quando, (4) raramente, (5) nunca. Para o cômputo final do escore, os valores obtidos nas respostas são invertidos, para manter a uniformidade na interpretação dos escores (quanto mais elevado, maior a favorabilidade ao comportamento).

Intenção - Foi avaliada por meio de seis itens para cada comportamento, mensurados por meio de uma escala tipo Likert, de cinco pontos (exemplo: eu tenho intenção de [descrição do comportamento] nos próximos 2 meses definitivamente não[1] - definitivamente sim[5]).

Atitude - A atitude foi mensurada utilizando cinco escalas de diferencial semântico com pares de adjetivos bipolares como resposta de uma única questão para cada comportamento, de cinco pontos (exemplo: para mim [descrição do comportamento] nos próximos 2 meses é: ruim [1] - bom [5], traz prejuízo [1] - traz benefício [5], desagradável [1] - agradável [5], chato [1]- prazeroso [5], bobagem [1] - sensato [5]).

Norma subjetiva - A norma subjetiva foi avaliada por meio de quatro questões, com resposta em escalas tipo Likert de cinco pontos (exemplo: pessoas que são importantes para mim acham que eu: definitivamente não devo [1] - definitivamente devo [5] [descrição do comportamento] nos próximos 2 meses).

Controle comportamental percebido - A percepção de controle sobre o comportamento foi mensurado com emprego de quatro questões para cada comportamento, com respostas em escala tipo Likert de cinco pontos (exemplo: a decisão de [descrição do comportamento] nos próximos 2 meses depende só de mim: discordo totalmente [1] - concordo totalmente [5]).

Autoeficácia- A autoeficácia foi mensurada por três itens, com utilização de escala tipo Likert de cinco pontos (exemplo: eu confio na minha capacidade de [descrição do comportamento] discordo totalmente [1] - concordo totalmente [5]).

Hábito - O hábito foi mensurado com emprego de 10 itens somente para os comportamentos 1 e 2, ou seja, hábito de adicionar mais que 4 gramas de sal no preparo das refeições e após preparo, bem como o uso do saleiro à mesa. As opções de resposta foram apresentadas em escala tipo Likert de cinco pontos (exemplo: [adicionar mais que 4 gramas de sal no preparo dos alimentos] é algo que faço frequentemente: discordo totalmente [1] - concordo totalmente [5]).

Preferências alimentares - Para a avaliação das preferências alimentares, foram empregadas duas questões, com opção de resposta de um a cinco (exemplo: em geral, eu tenho preferência pelos alimentos: 1- salgados, 2 - doces, 3 - amargos, 4 - ácidos, 5 - não tenho preferência).

Determinantes hedônicos - Relacionado ao prazer de comer e ao paladar, os determinantes hedônicos foram mensurados por dois itens, com resposta em escala de cinco pontos (exemplo: para mim, os alimentos com pouco sal são: muito insossos [1] - muito saborosos [5]).

Autoavaliação da qualidade da dieta - A avaliação da dieta foi mensurada por um único item com resposta em escala de cinco pontos (exemplo: considerando seu tratamento para pressão alta, como você avalia a sua alimentação em relação ao consumo de sal? [1] muito ruim - [5] muito boa).

Ambiente - O ambiente se refere à acessibilidade do sujeito a alimentos com alto e baixo teor de sal. Foi mensurado por dois itens com escala tipo Likert com pontuação de um a cinco (exemplo: em geral, você acha que tem acesso fácil a alimentos com pouco sal? discordo totalmente [1] - concordo totalmente [5]).

Avaliação da confiabilidade - A versão final do instrumento foi aplicada a 32 sujeitos para análise de sua confiabilidade, segundo os critérios da homogeneidade (consistência interna), utilizando-se o alfa de Cronbach, e da estabilidade, com emprego do teste-reteste. Valores de coeficiente alfa acima de 0,70 foram considerados como indicadores de alta consistência(17). Quinze dias após a aplicação inicial, o instrumento foi reaplicado aos mesmos 32 sujeitos, para verificação da concordância das respostas às questões nos dois momentos, por meio da análise do coeficiente de correlação intraclasse (ICC) e do coeficiente Kappa ponderado para um item da variável preferências alimentares, por ser uma variável nominal.

Aspectos éticos - O projeto e o termo de consentimento livre e informado, assinado pelo participante antes da entrevista, obtiveram parecer favorável pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas - UNICAMP (CEP n° 563/2006).

RESULTADOS

Participaram dessa fase da pesquisa 32 hipertensos com média de idade de 55,13 (±7,86) anos, sendo 50% do sexo feminino, 53,1% casados, com média de escolaridade de 7,2 (±3,62) anos, tempo médio de diagnóstico de hipertensão arterial de 14,7 anos (±11,6).

Consistência interna

A Tabela 1 mostra as médias dos escores totais e dos itens, bem como os valores de alfa de Cronbach de cada constructo relacionado aos três comportamentos. A maior parte das variáveis apresentou escores acima de 4,0 para os três comportamentos, apontando a favorabilidade do grupo estudado para o consumo de dieta com baixo teor de sal. Exceção foi observada para a variável hábito (comportamentos 1 e 2) que apresentou escores médios inferiores que as demais, sugerindo haver costume de acrescentar sal ao preparo dos alimentos ou àqueles já preparados, de maneira automática, sem passar pelo crivo da razão.

Quanto à análise de confiabilidade, a maioria das variáveis dos comportamentos 1, 2 e 3 apresentaram valores de alfa de Cronbach acima de 0,70, com exceção da variável norma subjetiva, com alfas entre 0,58 e 0,67. Nos três comportamentos, a retirada do item quatro resultou em melhora substancial do coeficiente.

Estabilidade (teste-reteste)

A Tabela 2 apresenta os valores de ICC para cada variável psicossocial, referente aos três comportamentos e para as variáveis adicionais gerais, coeficiente de Kappa para a variável nominal. As variáveis dos comportamentos 1 e 2 apresentaram ICC>0,44, apontando para estabilidade temporal. O constructo intenção de ambos os comportamentos apresentou tendência à estabilidade temporal.

No comportamento 3, todas as variáveis apresentaram coeficientes significativos, indicando estabilidade temporal, o mesmo observado para as questões gerais, que apresentaram valores de ICC superiores a 0,45 e coeficiente Kappa ponderado de 0,64.

DISCUSSÃO

O objetivo deste estudo foi testar as propriedades psicométricas de um instrumento desenvolvido para o estudo dos determinantes do comportamento alimentar de consumo de sódio entre pacientes hipertensos. A etapa de validade de conteúdo apontou que o consumo de sal deveria ser avaliado não somente sob a perspectiva de um único comportamento, mas, sim, de acordo com três comportamentos distintos que resultam no consumo final de sal. O sódio está presente nos alimentos in natura, no sal que é adicionado no preparo dos alimentos, no uso do saleiro à mesa, e, de modo bastante concentrado, nos alimentos industria-lizados(18). Essa característica particular do consumo de sódio agrega complicações inclusive para a estimativa da quantificação do seu consumo(3).

De maneira global, os dados apontaram ainda evidências de que as medidas das variáveis psicossociais que formam a intenção dos três comportamentos, bem como a medida da própria intenção, trata-se de medidas confiáveis, segundo os critérios da homogeneidade e da estabilidade. Algumas considerações podem ser feitas quanto ao desempenho psicométrico de algumas delas. A norma subjetiva, nos três comportamentos, apresentou o mesmo item como pouco relacionado ao escore total: sinto pressão social para [comportamento 1, 2 ou 3], mostrando que, embora conceitualmente adequada, não foi interpretada pelos pacientes de maneira consistente com os demais itens que compõem o constructo, portanto, na continuidade do estudo, pode ser um item a ser excluído da avaliação da variável, nos três comportamentos.

Sobre a estabilidade temporal, todos os conceitos mensurados mostraram evidências de estabilidade no intervalo pesquisado, o que é importante para estudos subsequentes que visem analisar a evolução natural dessas percepções, ou que busquem avaliar o efeito de intervenções educativas para sua modificação(12).

O desenvolvimento de escalas para mensurar os fatores que subsidiam o comportamento de consumo de sal, principalmente em hipertensos, que se beneficiam significativamente com a adoção de dieta com baixo teor de sal, tem várias implicações para a prática educativa do enfermeiro. Medidas confiáveis e válidas são necessárias para que o enfermeiro possa desenhar e avaliar programas de orientação baseados em teorias oriundas de ciências sociais e comportamentais(10) e, portanto, com maior chance de efetividade.

Antes do emprego desse instrumento, entretanto, se faz necessário o diagnóstico relativo ao consumo de sal: sua quantificação, seguida da identificação das fontes que contribuem para o consumo excessivo, como realizado em estudos pregressos(3). A etapa seguinte consiste no diagnóstico dos determinantes psicossociais de cada comportamento. Embora sejam comportamentos complementares, os fatores que subsidiam sua execução podem ser diferentes. Assim, cada comportamento pode requerer intervenção específica sobre os fatores que lhe são determinantes. Portanto, a identificação dos fatores que motivam o sujeito a adotar ou não a dieta com baixo teor de sal fornece subsídios para direcionar a elaboração e implementação das intervenções(10). Além disso, os fatores preditores podem diferir de acordo com as populações ou subgrupos populacionais.

O uso das escalas, nesse sentido, deve ser útil para detectar tais diferenças, direcionar intervenções específicas e, ainda, servir como referência para a avaliação da efetividade das intervenções implementadas em diferentes grupos populacionais(19).

Em conclusão, as escalas para mensuração dos determinantes do consumo de sódio entre hipertensos, dado pelos comportamentos de adição de sal no preparo das refeições, adição de sal nos alimentos já preparados (uso do saleiro à mesa) e consumo de alimentos com alto teor de sal, mostraram evidências de confiabilidade, consistência interna e estabilidade nessa fase de avaliação e devem ser úteis como ferramenta diagnóstica nas intervenções educativas em saúde.

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  • 1
    This research was supported by FAPESP (Process #06/58789-5)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Out 2009

    Histórico

    • Recebido
      17 Abr 2008
    • Aceito
      28 Jul 2009
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