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Autocuidado de pessoas com diabetes mellitus atendidas em serviço de urgência no México

Resumos

Este estudo teve por objetivos determinar a capacidade de autocuidado de pessoas com diabetes mellitus tipo 2 e relacionar esse distúrbio com algumas variáveis sociodemográficas e clínicas. Participaram 251 pessoas que ingressaram em um hospital de urgência no México, em 2007. Os dados foram obtidos mediante entrevista domiciliar dirigida, utilizando-se de formulário, questionário e Escala de Capacidade de Autocuidado. Para a análise, utilizou-se estatística descritiva e correlacional. Os resultados mostraram que 83 (33,5%) sujeitos apresentaram boa capacidade de autocuidado e 168 (66,5%) capacidade regular. Obteve-se correlação diretamente proporcional entre capacidade de autocuidado e anos de estudo (r=0,124; p<0,05) e negativa para religião (rs=-0,435; p<0,05) e tempo de evolução da doença (r=-0,667; p<0,05). Conclui-se que a maioria das pessoas com diabetes mellitus tipo 2 apresentou capacidade de autocuidado regular. A capacidade de autocuidado está vinculada a múltiplas variáveis, que merecem atenção dos profissionais de saúde quando da proposição de programas de educação.


This study examines the self-care ability of type 2 diabetes mellitus patients and relates it to sociodemographic and clinical variables. The study included 251 patients who were cared for by an emergency service in Mexico, in 2007. Data were obtained through structured interviews held at participants’ households, through a form, a questionnaire and the Self-Care Ability Scale. Descriptive and correlation statistics were used for data analysis. The results show that 83 (33.5%) individuals displayed good self-care ability and 168 (66.5%) individuals displayed regular ability. A directly proportional correlation was found between self-care ability and schooling (r=0.124; p<0.05), as well as a negative correlation for religion (rs=-0.435; p<0.05) and duration of disease evolution (r=-0.667; p<0.05). The conclusion is that most of the individuals with type 2 diabetes mellitus displayed regular ability for self-care. Self-care ability is related to multiple variables that should be taken into account by health professionals when suggesting educational programs.

Self Care; Diabetes Mellitus; Nursing; Health Services; Autocuidado; Diabetes Mellitus; Enfermagem; Serviços de Saúde; Autocuidado; Diabetes Mellitus; Enfermería; Servicios de Salud


Este estudio tuvo por objetivos determinar la capacidad de autocuidado de personas con diabetes mellitus tipo 2 y relacionar esa capacidad con algunas variables sociodemográficas y clínicas. Participaron 251 personas que ingresaron en un hospital de urgencia en México, en 2007. Los datos fueron obtenidos mediante entrevista domiciliar dirigida, utilizándose de formulario, cuestionario y Escala de Capacidad de Autocuidado. Para el análisis se utilizó estadística descriptiva y correlacional. Los resultados mostraron que 83 (33,5%) sujetos presentaron buena capacidad de autocuidado y 168 (66,5%) capacidad regular. Se obtuvo una correlación directamente proporcional entre capacidad de autocuidado y años de estudio (r=0,124; p<0,05) y una correlación negativa con la religión (rs=-0,435; p<0,05) y tiempo de evolución de la enfermedad (r=-0,667; p<0,05). Se concluye que la mayoría de las personas con diabetes mellitus tipo 2 presentó una capacidad de autocuidado regular. La capacidad de autocuidado está vinculada a múltiples variables, que merecen atención de los profesionales de salud cuando se realiza la proposición de programas de educación.


ARTIGO ORIGINAL

Autocuidado de pessoas com diabetes mellitus atendidas em serviço de urgência no México1

Irasema Romero BaquedanoI; Manoel Antônio dos SantosII; Tatiane Aparecida MartinsIII; Maria Lúcia ZanettiIV

IEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, convênio com a Facultad de Enfermería y Obstetrícia de Celaya, Universidad de Guanajuato, Celaya, México. E-mail: irasemaromero@hotmail.com

IIPsicólogo, Doutor em Psicologia, Professor Doutor, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: masantos@ffclrp.usp.br

IIIAluna do Curso de Licenciatura em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: tatiane.martins@usp.br

IVEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: zanetti@eerp.usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este estudo teve por objetivos determinar a capacidade de autocuidado de pessoas com diabetes mellitus tipo 2 e relacionar esse distúrbio com algumas variáveis sociodemográficas e clínicas. Participaram 251 pessoas que ingressaram em um hospital de urgência no México, em 2007. Os dados foram obtidos mediante entrevista domiciliar dirigida, utilizando-se de formulário, questionário e Escala de Capacidade de Autocuidado. Para a análise, utilizou-se estatística descritiva e correlacional. Os resultados mostraram que 83 (33,5%) sujeitos apresentaram boa capacidade de autocuidado e 168 (66,5%) capacidade regular. Obteve-se correlação diretamente proporcional entre capacidade de autocuidado e anos de estudo (r=0,124; p<0,05) e negativa para religião (rs=-0,435; p<0,05) e tempo de evolução da doença (r=-0,667; p<0,05). Conclui-se que a maioria das pessoas com diabetes mellitus tipo 2 apresentou capacidade de autocuidado regular. A capacidade de autocuidado está vinculada a múltiplas variáveis, que merecem atenção dos profissionais de saúde quando da proposição de programas de educação.

Descritores: Autocuidado; Diabetes Mellitus; Enfermagem; Serviços de Saúde.

Introdução

Diferentes definições de autocuidado são dadas em contextos culturais e sociais específicos(1). Nas Américas, o autocuidado refere-se às ações que as pessoas adotam em benefício de sua própria saúde, sem supervisão médica formal. É definido como práticas realizadas pelas pessoas e famílias, mediante as quais são promovidos comportamentos positivos de saúde, na prevenção de enfermidades e no tratamento dos sintomas(1).

Historicamente, a Enfermagem tem como um de seus objetivos a educação das pessoas para o autocuidado(1). O autocuidado é definido como função reguladora que os indivíduos utilizam, deliberadamente, para manutenção dos requisitos vitais, do desenvolvimento e funcionamento integral(2).

A habilidade para desempenhar o autocuidado é desenvolvida durante o curso da vida diária, por meio de processo espontâneo de aprendizagem, no amadurecimento da curiosidade intelectual, com a instrução e supervisão de outros e mediante a experiência de medidas de autocuidado(3).

O autocuidado também é considerado como parte do estilo de vida das pessoas, o qual é compreendido como padrões de conduta que se refletem na forma de interagir dos indivíduos com seu meio social(3). O conceito de estilo de vida é amplo e envolve os padrões que surgem da seleção de opções disponíveis às pessoas, segundo as circunstâncias sociais e econômicas, e as facilidades com que elas podem eleger outras alternativas. Assim, a escolha de um estilo de vida saudável implica em ações concretas de autocuidado, tais como a automedicação, o autotratamento, o apoio social e o cuidado em situação de enfermidade no ambiente da pessoa(3).

A Organização Mundial da Saúde recomenda a educação para o autocuidado com vistas à prevenção e ao tratamento das enfermidades crônicas(1). A educação para o autocuidado a pessoas com problemas crônicos de saúde deve promover o suporte para o desenvolvimento das habilidades de autocuidado, a fim de corresponsabilizá-las por sua saúde e ajudá-las a aprender a conviver melhor com a enfermidade, modificar ou manter os hábitos saudáveis, estimular a autoconfiança para se sentir melhor, seja qual for a gravidade da enfermidade.

O autocuidado é estratégia eficaz para a redução dos custos em saúde, colaborando para a redução do número de admissões hospitalares e das consultas de urgência, uso racional dos medicamentos e melhor relação entre o profissional de saúde e o paciente(1).

Nesse contexto, o autocuidado em saúde é definido como as medidas que cada pessoa, de forma individual, toma para proteger seu bem-estar físico, mental e social. O autocuidado tem como fundamento a crença de que o homem é capaz de cuidar de sua saúde e compreende uma série de ações para manter a saúde física e mental, prevenir enfermidades, satisfazer as necessidades físicas e psicológicas, recorrer à consulta médica ou automedicar-se(1).

Ao considerar que as pessoas com diabetes mellitus apresentam condição crônica de saúde, que exige cuidados permanentes para manutenção de sua qualidade de vida e controle metabólico, percebe-se a necessidade de desenvolver habilidades de autocuidado para o manejo da doença. Em particular para as pessoas com diabetes mellitus tipo 2, cuja prevalência está associada ao estilo de vida, e, assim, a introdução de mudanças nos hábitos diários pode constituir estratégia efetiva para a prevenção de doenças decorrentes(4).

Cabe à equipe multiprofissional de saúde ajudar a pessoa com diabetes a desenvolver habilidades de autocuidado para o manejo da doença, a fim de que mantenha adequado controle metabólico, de modo a prevenir ou protelar as complicações crônicas advindas da doença(5). A presença do profissional é particularmente importante quando ocorrem situações em que a pessoa tem dificuldade para se responsabilizar pelo cuidado consigo mesma.

Nessa vertente, para atuação efetiva, o profissional precisa conhecer as variáveis relacionadas ao autocuidado. Estudos têm abordado essas questões, investigando as variáveis relacionadas ao acesso à informação e conhecimento, satisfação com os serviços de saúde, apoio familiar, entre outros fatores psicossociais relevantes(5-9).

Diante do exposto, este estudo focaliza as variáveis relacionadas à capacidade de autocuidado em pessoas atendidas em um serviço de urgência de um hospital geral, a fim de fornecer subsídios para a reestruturação da atenção à população com diabetes, no México, no contexto do Modelo Integrado de Atenção em Saúde (MIDAS)(10). Trata-se de modelo comunitário de atenção integral, orientado para as necessidades de saúde da população. Pressupõe a formação de compromissos que articulam o cuidado profissional à capacidade de autocuidado do usuário(10).

Conhecer as variáveis relacionadas ao autocuidado possibilita identificar as possíveis barreiras para a adesão das pessoas com diabetes tipo 2 ao tratamento instituído, assim como propor estratégias educativas para o fortalecimento do autocuidado na população estudada.

Desse modo, este estudo teve como objetivos determinar a capacidade de autocuidado de pessoas com diabetes mellitus tipo 2 e relacionar tal capacidade ao sexo, faixa etária, anos de estudo, religião, tempo de evolução da doença e participação em grupo de apoio.

Material e Métodos

Este estudo, descritivo e transversal, foi realizado no Serviço de Urgências do Hospital Regional de Mérida do Instituto de Previdência e Serviços Sociais para os Trabalhadores do Estado (ISSSTE), na cidade de Mérida, Yucatán, México, no período de janeiro a dezembro de 2007.

A amostra foi selecionada por conveniência. Os critérios de inclusão foram pessoas com diagnóstico de diabetes mellitus tipo 2, de ambos os sexos, com idade entre 30 e 80 anos, residentes na cidade de Mérida, atendidos no Serviço de Urgências do referido hospital, no período de 12 meses, definido pelo estudo, e que concordaram em participar voluntariamente da pesquisa. Os critérios de exclusão foram: pessoas com diabetes mellitus tipo 2 que, depois de três visitas consecutivas no domicílio, não foram encontradas, mudaram de endereço ou que morreram no transcurso da investigação.

Das 382 pessoas com diabetes mellitus tipo 2, atendidas no serviço, 131 não preencheram os critérios de inclusão estabelecidos na presente pesquisa. A amostra foi constituída por 251 pessoas com diabetes tipo 2, cujas características atenderam os critérios de elegibilidade.

Instrumentos de coleta de dados

Foram utilizados como instrumentos de coleta de dados: um formulário de registro para obtenção da lista de pacientes (data da internação, nome do paciente, número do prontuário, endereço e motivo da hospitalização), um questionário contendo questões fechadas relativas às variáveis sociodemográficas e clínicas, elaborado pela pesquisadora com base em estudo anterior(9) (sexo, idade, escolaridade, estado civil, ocupação, religião e tempo de diagnóstico clínico da doença) e uma escala de capacidade de autocuidado(11).

A Escala de Capacidade de Autocuidado é instrumento elaborado e validado no México(11). É uma escala de tipo Likert, contendo 25 itens para avaliar os requisitos de autocuidado universal, de desenvolvimento e desvio da saúde, com nível de confiabilidade satisfatório (alpha de Crombach de 0,86). Para avaliar a capacidade de autocuidado atribuiu-se o valor de três pontos aos itens assinalados como "sempre", dois pontos às respostas "frequentemente", um ponto às respostas "algumas vezes" e zero às respostas "nunca". Ao final, realizou-se a somatória de pontos obtidos em todos os itens e se comparou esse escore com os indicadores propostos como segue: muito boa (57-75), boa (38-56), regular (19-37) e ruim (0-18). A pontuação máxima do instrumento é de 75 pontos.

Procedimento

Primeiramente, realizou-se revisão das fichas das pessoas com diabetes mellitus tipo 2, que foram atendidos no hospital regional Mérida, no período estipulado para o estudo. Após essa revisão, foram localizados os prontuários dos pacientes e registrados nos formulários os dados referentes à data de internação, nome, número do prontuário, endereço e motivo da hospitalização. De posse dos endereços, foram realizadas visitas domiciliares para esclarecer ao paciente e aos seus familiares os objetivos do estudo. Caso concordassem em participar da investigação, solicitava-se a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Os dados sociodemográficos e clínicos foram obtidos mediante aplicação individual do questionário aos sujeitos, realizada pela pesquisadora no domicílio, em 2007.

Uma vez encerrada a coleta de dados sociodemográficos e clínicos, foi aplicada a Escala de Capacidade de Autocuidado. A aplicação dos instrumentos teve duração média de 30 minutos e ocorreu no ambiente domiciliar, em aposento reservado, escolhido pelo próprio sujeito.

Para a organização e análise dos dados, utilizou-se o programa estatístico SPSS, versão 12.0, e estatística descritiva. Para a estatística descritiva correlacional utilizou-se o r de Pearson para estabelecer a relação entre as variáveis de proporção ou intervalo e a correlação de Spearman para as variáveis ordinais, com nível de significância p<0,05.

O estudo foi conduzido dentro dos padrões exigidos pela Declaração de Helsinque e aprovado pelo Comitê de Bioética da Faculdade de Enfermagem e Obstetrícia de Celaya, México, mediante a emissão de declaração assinada pela presidenta e pela secretária do Comitê de Bioética da Faculdade de Enfermagem e Obstetrícia.

Resultados

A Tabela 1 mostra a caracterização das variáveis sociodemográficas e clínicas dos sujeitos.

Ao analisar a capacidade de autocuidado das pessoas com diabetes tipo 2, obteve-se o valor mínimo de 25 pontos e o máximo de 43 pontos, média de 35,72±3,69.

De acordo com a proposta de classificação da Escala de Capacidade de Autocuidado, as respostas foram agrupadas e categorizadas em: muito boa, boa, regular e ruim. Os dados obtidos em relação à capacidade de autocuidado (Tabela 2) mostraram que 83(33,5%) das pessoas com diabetes tipo 2 apresentaram boa capacidade de autocuidado e 168(66,5%) capacidade regular.

Quanto à capacidade de autocuidado, relacionada ao sexo (Tabela 3), observou-se que 47(18,7%) mulheres apresentaram boa capacidade de autocuidado e 83(33,1%), regular. Quanto aos homens, 37(14,7%) apresentaram boa capacidade de autocuidado e 84(33,5%), regular.

Quanto à capacidade de autocuidado, tendo como variável a faixa etária (Tabela 4), encontrou-se que apresentaram boa capacidade de autocuidado 26(10,3%) sujeitos na faixa etária de 70 a 80 anos, 25(10,0%) de 50 a 59 anos, 22(8,8%) de 60 a 69 anos, 10(4,0%) entre 40 a 49 anos e um (0,4%) de 30 a 39 anos.

Em relação à capacidade de autocuidado, classificado como regular, observou-se que, desses, 60(23,9%) sujeitos estavam na fase etária de 70 a 80 anos, 52(20,7%) de 60 a 69, 36(14,3%) de 50 a 59 anos, 12(4,8%) de 40 a 49 anos e sete (2,8%) de 30 a 39 anos (Tabela 4).

Quanto à capacidade de autocuidado, relacionada aos anos de estudo (Tabela 5), observou-se que dos 94(37,5%) sujeitos que completaram de um a seis anos de estudo (equivalentes ao ensino primário no México), 29(11,5%) tinham boa capacidade de autocuidado e 65(26,0%), regular. Dos 62(24,7%) sujeitos que completaram de sete a nove anos de estudo (secundário), 17(6,8%) apresentaram boa capacidade de autocuidado e 45(17,9%), regular. Das 59(23,5%) pessoas que completaram de 10 a 12 anos de escolaridade (preparatório), 22(8,8%) mostraram boa capacidade de autocuidado e 37(14,7%), regular. Das 36(14,3%) pessoas que tinham curso superior – 13 anos ou mais de estudo, 16(6,4%) apresentaram boa capacidade de autocuidado e 20(7,9%), regular.

Considerando a capacidade de autocuidado, relacionada à religião professada, obteve-se que, das 84(33,5%) pessoas que apresentaram boa capacidade de autocuidado, 80(31,9%) eram católicas, três (1,2%) evangélicos e um (0,4%) mórmon. Dos 167(66,5%) sujeitos com capacidade de autocuidado regular, 85(33,8%) são católicos, 41(16,3%) evangélicos, 19(7,6%) testemunhas de Jeová, 10(4,0%) mórmons, dois (0,8%) budistas e 10 (4,0%) ateus.

Em relação à capacidade de autocuidado, relacionada ao tempo de diagnóstico clínico da doença, observou-se que, dos 84(33,5%) sujeitos que apresentaram boa capacidade de autocuidado, 44(17,6%) tinham de um a 10 anos de doença, 36(14,4%) de 11 a 20 anos e quatro (1,5%) 21 anos ou mais. Dos 167(66,5%) sujeitos que apresentaram regular capacidade de autocuidado, 17(6,7%) tinham de um a 10 anos de diagnóstico clínico da doença, 48(19,1%) de 11 a 20 anos e 102(40,7%), 21 anos ou mais.

Ao analisar a correlação entre capacidade de autocuidado e número de anos estudados (r=0,124; p<0,05), obteve-se correlação diretamente proporcional entre essas duas variáveis, ou seja, quanto maior o número de anos estudados, maior é a capacidade de autocuidado dos sujeitos.

Considerando a correlação entre capacidade de autocuidado e religião, encontrou-se correlação negativa (rs=-0,435; p<0,05), ou seja, quanto menor a crença expressa pela religião, maior a capacidade de autocuidado.

Quanto à capacidade de autocuidado, relacionada ao tempo de diagnóstico clínico do diabetes mellitus, obteve-se correlação inversamente proporcional entre menor tempo de evolução da doença e maior capacidade de autocuidado dos sujeitos de estudo (r=-0,667; p<0,05).

Discussão

Existem, atualmente, recomendações para o desenvolvimento das habilidades de autocuidado da pessoa com diabetes mellitus para o controle de sua enfermidade(10). Para tanto, é necessário que a pessoa com diabetes mellitus tenha participação ativa no monitoramento da sua doença: escolha de alimentos, número de refeições, qualidade e quantidade de alimento ingerido, regularidade de atividade física, automonitorização da glicemia capilar, exame dos pés, uso de medicamentos nos horários e doses corretas, retorno periódico à consulta médica, conhecimento de sinais e sintomas de hipoglicemia e hiperglicemia, entre outros cuidados.

Ao analisar a capacidade de autocuidado das pessoas com diabetes mellitus tipo 2, obteve-se pontuação média de 35,72±3,69 pontos. Ao investigar as categorias referentes ao autocuidado da Escala de Capacidade de Autocuidado, obteve-se que 33% dos sujeitos apresentaram boa capacidade para o autocuidado e 67%, regular. Nenhum apresentou capacidade para o autocuidado considerada muito boa ou ruim.

Ao analisar a pontuação obtida pelos sujeitos, em relação à capacidade de autocuidado, é preciso considerar a média de idade superior a 65 anos dos sujeitos do estudo. Pessoas que se encontram nessa faixa etária têm exigências de autocuidado relacionadas à própria fase do ciclo vital, bem como a presença de comorbidades, exigindo apoio e acompanhamento próximo dos familiares(12).

A pontuação obtida em relação à capacidade de autocuidado remete à reflexão de que as pessoas com diabetes mellitus tipo 2 podem ter baixa motivação para o autocuidado e/ou limitações frente às incapacidades relacionadas às comorbidades e às complicações crônicas. Nessa direção, a literatura aponta que, quando a pessoa com diabetes apresenta alguma incapacidade e/ou limitação, a presença do profissional é fundamental para estimular sua motivação e ajudá-la a desenvolver habilidades para o autocuidado(8).

Considera-se que o diabetes mellitus é doença de alta complexidade e que a maioria das pessoas com o tipo 2 é diagnosticada em sua fase adulta, o que impõe um desafio para os educadores em saúde frente às peculiaridades do processo de aprendizagem de indivíduos adultos, com vistas a garantir intervenções efetivas que realmente favoreçam a incorporação do autocuidado para o manejo da doença.

O diagnóstico de uma enfermidade crônica, tal como o diabetes mellitus tipo 2, implica que a pessoa deve adotar comportamentos de autocuidado por toda a vida, introduzindo mudanças no estilo de vida que sejam compatíveis com seu próprio conceito de qualidade de vida. Diante dessa circunstância, pode ocorrer o abandono de parte ou de todo o tratamento prescrito(13). Por ser doença que requer atenção permanente, a adesão ao tratamento tende a ser baixa e, consequentemente, o controle metabólico é insatisfatório. Estudo mostrou que somente pequena fração de pessoas com diabetes tipo 2 realiza seguimento regular nas instituições de saúde, e apenas de 25 a 40% alcançam o controle metabólico desejado(10).

O conhecimento é outra variável crítica que pode justificar a pontuação obtida pelos sujeitos no que se refere às habilidades para o autocuidado. Estudo realizado, acerca da importância do conhecimento sobre diabetes mellitus para o autocuidado, mostrou que o baixo nível de informação sobre a doença e sua etiologia dificulta o processo de aprendizagem, prejudica a prevenção e diagnóstico precoce e aumenta a predisposição para outras complicações(7).

Quanto à capacidade de autocuidado em função da faixa etária, há que se considerar que a idade é fator importante quando da percepção das barreiras ambientais para adesão ao tratamento. Quanto maior é a idade, menor é a percepção das barreiras ambientais. Em contrapartida, as pessoas mais jovens são aquelas que menos percebem as barreiras ambientais(14).

O incremento absoluto da população, no México, constitui, em si mesmo, desafio para o sistema de saúde. A mudança da pirâmide etária mostra que a população mexicana está envelhecendo. Em relação aos problemas de saúde da população adulta, de 45 a 64 anos e da população idosa, pode-se concluir que a demanda está em franco crescimento, com desdobramentos de ordem econômica e organizacional(10). O país está passando por transição demográfica e epidemiológica. Os profissionais de saúde precisam repensar as estratégias efetivas para o atendimento a pessoas idosas, considerando suas especificidades nessa fase do ciclo vital(10).

A idade é fator que interfere nas necessidades de saúde durante o desenvolvimento do ciclo vital. A pessoa com diabetes mellitus tipo 2, ao receber o diagnóstico na fase adulta, já têm valores, crenças e hábitos conformados. O aparecimento do diabetes nessa fase da vida pode trazer resistências às mudanças, o que pode explicar, em parte, os dados obtidos na presente investigação(2). Portanto, a idade é variável importante na avaliação da capacidade de autocuidado, quando da proposição da educação em diabetes para o manejo da doença e, consequentemente, é variável relevante que pode influenciar a adesão ao tratamento proposto.

Outro aspecto a considerar é a proporção de indivíduos, no México, que desenvolvem o diabetes tipo 2 antes dos 40 anos de idade(15). Considerando que esses indivíduos têm maior risco para desenvolver complicações crônicas, já que estão expostos aos efeitos da hiperglicemia por período de tempo prolongado, o impacto para o Sistema de Saúde do México pode se tornar insustentável. É preciso que as normas que direcionam a atenção às pessoas com diabetes no país sejam consolidadas com urgência.

Quanto à capacidade de autocuidado em função dos anos de estudo, observou-se que os sujeitos com níveis de escolaridade mais elevados mostraram boa capacidade de autocuidado e que o autocuidado é influenciado pelos anos de estudo dos sujeitos. Espera-se que, quanto maior o número de anos de estudos, melhor seja a capacidade de autocuidado(1). Assim, pessoas que receberam maior número de anos de educação formal tendem a apresentar maior conhecimento e habilidades para o cuidado em saúde, bem como melhor capacidade para bem relacionar-se com a equipe de saúde(5).

Frente à complexidade da doença, a escolaridade é variável que deve ser considerada no planejamento de programas de educação em diabetes que visem o desenvolvimento de habilidades de autocuidado. Nessa vertente, os profissionais de saúde devem considerar essa variável e buscar estratégias de ensino diversificadas, inovadoras, que sejam capazes de mobilizar as pessoas com diabetes na busca de seu autocuidado.

Ao analisar a capacidade de autocuidado, em relação à crença religiosa, deve-se considerar que as pessoas podem colocar em um ente superior a responsabilidade para o cuidado em saúde. Quando a pessoa delega essa responsabilidade, pode valorizar pouco a aquisição de conhecimentos, habilidades e motivação para o autocuidado. Desse modo, o desenvolvimento da capacidade para o autocuidado fica limitado, pois é considerado questão externa ao sujeito. Nesse caso, cabe aos profissionais de saúde buscar estratégias para a incorporação da responsabilidade do sujeito com o seu cuidado.

A condição de doença crônica coloca as pessoas com diabetes tipo 2 frente à necessidade de autocuidado durante toda a vida. Essa condição é um dos fatores determinantes para o seguimento do tratamento proposto. Quando a capacidade de autocuidado está prejudicada, uma das consequências pode ser o controle metabólico insatisfatório. Estudo mostrou que somente pequena parcela de pessoas com diabetes faz regularmente seu seguimento nos serviços de saúde, e que apenas de 25 a 40% delas têm controle metabólico satisfatório(16).

Nessa direção, cabe à equipe multiprofissional de saúde fortalecer a capacidade de autocuidado das pessoas com diabetes mellitus, mediante a implementação de estratégias educacionais inovadoras que possibilitem a aquisição de conhecimentos e desenvolvimento de atitudes para o manejo do tratamento, a fim de obter bom controle metabólico(17).

Conclusão

Os resultados obtidos permitiram determinar que a maioria das pessoas com diabetes mellitus tipo 2 apresentou capacidade de autocuidado regular (66,5%) e está relacionada a variáveis sociodemográficas e clínicas.

Quanto à capacidade de autocuidado em relação ao sexo, verificou-se que as mulheres investigadas apresentaram melhor capacidade de autocuidado do que os homens. Encontrou-se melhor capacidade de autocuidado dos sujeitos na faixa etária de 70 a 80 anos. Em relação à escolaridade, verificou-se que as pessoas com até seis anos de estudo apresentaram melhor capacidade de autocuidado, bem como aquelas que se referiram como católicos. Em relação ao tempo da doença, obteve-se que, quanto mais tempo a pessoa tem o diabetes mellitus, pior é sua capacidade de autocuidado.

Esses resultados apontam que a capacidade de autocuidado da pessoa com diabetes mellitus tipo 2 está vinculada a múltiplos fatores, merecendo a atenção dos profissionais de saúde quando da proposição de programas de educação. Os achados obtidos no presente estudo avançam na compreensão dos fatores sociais e culturais como dimensões importantes para o autocuidado.

A escassez de estudos, focalizando a capacidade de autocuidado no controle do diabetes mellitus tipo 2, constituiu-se em limitação para a compreensão das implicações dos resultados obtidos no presente estudo para o contexto mexicano. Nessa direção, há necessidade de desenvolvimento de outros estudos, no México, que contemplem outras variáveis que podem estar relacionadas à capacidade de autocuidado, para futuras comparações.

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  • Corresponding Author:
    Maria Lúcia Zanetti
    Universidade de São Paulo. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto.
    Departamento de Enfermagem Geral e Especializada.
    Av. Bandeirantes, 3900, Campus Universitário
    Bairro Monte Alegre
    CEP: 14040-902 Ribeirão Preto, SP, Brasil.
    E-mail:
  • 1
    Article extracted from Doctoral Dissertation "Fatores relacionados ao autocuidado de pessoas com diabetes tipo 2 no Serviço de Urgência do Hospital Regional Mérida, Yucatán, México", presented to Programa de Pós-graduação em Enfermagem Fundamental, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, WHO Collaborating Centre for Nursing Research Development, SP, Brazil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      04 Ago 2009
    • Aceito
      03 Maio 2010
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