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Acessibilidade ao tratamento de tuberculose: avaliação de desempenho de serviços de saúde

Resumos

O objetivo deste estudo foi analisar a acessibilidade dos pacientes ao tratamento de tuberculose (TB) em Ribeirão Preto, cidade do interior paulista. Trata-se de estudo de avaliação de serviços de saúde, de abordagem quantitativa. Foram entrevistados 100 pacientes que iniciaram o tratamento de TB entre 2006-2007, utilizando questionário estruturado, baseado no Primary Care Assessment Tool (PCAT). Os dados foram submetidos à análise de variância. Observaram-se avaliações positivas em relação à acessibilidade organizacional, porém, o desempenho dos serviços de saúde foi pouco satisfatório no oferecimento de vale-transporte e na necessidade da utilização de transporte no deslocamento até à unidade de saúde, gerando custos indiretos aos pacientes. Os serviços com maior número de doentes atendidos foram aqueles que apresentavam maior irregularidade na realização de visitas domiciliares, demonstrando que a disponibilidade de recursos (humanos, materiais e tempo) e a organização da atenção podem influenciar na acessibilidade ao tratamento.

Tuberculose; Terapia Diretamente Observada; Avaliação de Serviços de Saúde; Acessibilidade aos Serviços de Saúde


The aim of this study was to assess the accessibility of patients to the treatment of tuberculosis in Ribeirão Preto, countryside of São Paulo State. Evaluation study type, with a quantity approach. Interviews with 100 patients initiated on anti-tuberculosis chemotherapy between 2006-2007 were conducted, using a structured questionnaire based on the Primary Care Assessment Tool (PCAT). Data were analyzed through variance analysis. There was a positive feedback regarding to organizational accessibility, however, the performance of health services has been unsatisfactory in providing transportation vouchers and in addressing the need to use transport for displacement to the health unit, resulting in indirect costs to patients. The services with the highest number of patients treated were those with higher irregularity in the conduct of home visits, showing that the availability of resources (human, material and time) and the organization of care may influence the accessibility to treatment.

Tuberculosis; Directly Observed Therapy; Health Services Evaluation; Health Services Accessibility


El objetivo de este estudio fue analizar la accesibilidad de los pacientes al tratamiento de tuberculosis (TB) en Ribeirao Preto, ciudad del interior del estado de Sao Paulo. Se trata de un estudio de evaluación de servicios de salud, con abordaje cuantitativo. Fueron entrevistados 100 pacientes que iniciaron el tratamiento de TB entre 2006-2007, utilizando un cuestionario estructurado basado en el Primary Care Assessment Tool (PCAT). Los datos fueron sometidos al análisis de varianza. Fueron observadas evaluaciones positivas en relación a la accesibilidad organizacional, sin embargo, el desempeño de los servicios de salud fue poco satisfactorio en el ofrecimiento de ayuda de dislocamiento y en la necesidad de la utilización de transporte en el traslado hasta la unidad de salud, generando costos indirectos a los pacientes. Los servicios con mayor número de enfermos atendidos fueron los que presentaban mayor irregularidad en la realización de visitas domiciliares, demostrando que la disponibilidad de recursos (humanos, materiales y tiempo) y la organización de la atención pueden influir en la accesibilidad al tratamiento.

Tuberculosis; Terapia por Observación Directa; Evaluación de Servicios de Salud; Accesibilidad a los Servicios de Salud


ARTIGO ORIGINAL

Acessibilidade ao tratamento de tuberculose: avaliação de desempenho de serviços de saúde

Tiemi ArakawaI; Ricardo Alexandre ArcêncioII; Beatriz Estuque ScatolinIII; Lúcia Marina ScatenaIV; Antônio Ruffino-NettoV; Tereza Cristina Scatena VillaVI

IEnfermeira. E-mail: tiemi.a@gmail.com

IIEnfermeiro, Doutor em Enfermagem, Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: ricardo@eerp.usp.br

IIIEnfermeira, Mestranda, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: scatolin@eerp.usp.br

IVProfessor Doutor, Departamento de Medicina Social, Universidade Federal do Triângulo Mineiro, MG, Brasil. E-mail: lmscatena@uol.com.br

VMédico, Professor Titular, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: aruffino@fmrp.usp.br

VIEnfermeira, Doutora em Enfermagem, Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: tite@eerp.usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

O objetivo deste estudo foi analisar a acessibilidade dos pacientes ao tratamento de tuberculose (TB) em Ribeirão Preto, cidade do interior paulista. Trata-se de estudo de avaliação de serviços de saúde, de abordagem quantitativa. Foram entrevistados 100 pacientes que iniciaram o tratamento de TB entre 2006-2007, utilizando questionário estruturado, baseado no Primary Care Assessment Tool (PCAT). Os dados foram submetidos à análise de variância. Observaram-se avaliações positivas em relação à acessibilidade organizacional, porém, o desempenho dos serviços de saúde foi pouco satisfatório no oferecimento de vale-transporte e na necessidade da utilização de transporte no deslocamento até à unidade de saúde, gerando custos indiretos aos pacientes. Os serviços com maior número de doentes atendidos foram aqueles que apresentavam maior irregularidade na realização de visitas domiciliares, demonstrando que a disponibilidade de recursos (humanos, materiais e tempo) e a organização da atenção podem influenciar na acessibilidade ao tratamento.

Descritores: Tuberculose; Terapia Diretamente Observada; Avaliação de Serviços de Saúde; Acessibilidade aos Serviços de Saúde.

Introdução

A Organização Mundial de Saúde (OMS) destaca a importância da dimensão organizacional e de desempenho dos serviços de saúde nas ações de controle à tuberculose (TB), afirmando que o problema não está nas formas de detecção e tratamento, mas, sim, na forma de organização dos serviços de saúde para detectar e tratar os casos de TB(1). A estratégia DOTS (Directly Observed Therapy, Short-course), hoje expandida pelo plano STOP-TB, reforça essa ideia ao se constituir enquanto política para o controle da TB inserida no sistema de saúde, ao invés de simplesmente protocolo de abordagem clínica(2).

A atenção à TB implica, ainda, lidar com doença considerada como condição crônica, que exige habilidades específicas para atendimento diferenciado, por se tratar de doença de longa duração(3). Sabe-se que a falta de adesão ao tratamento da tuberculose, que dura, no mínimo, 6 meses, consiste em um dos aspectos mais desafiadores do controle da doença, pois repercute no aumento dos índices de mortalidade, incidência e multidrogarresistência(4).

Estudos nacionais e internacionais mostram que a obtenção do sucesso terapêutico se estende além da eficácia farmacológica, existindo obstáculos à continuidade ao cuidado em saúde, durante o tratamento da TB, relacionados tanto a fatores intrínsecos à terapêutica quanto ao paciente, e ao modo como o serviço se organiza para prestar assistência(5-6). Soma-se o fato de que a adesão ao tratamento extrapola a abordagem que reduz as necessidades de saúde de um indivíduo aos aspectos clínicos e biológicos, uma vez que a TB é doença diretamente associada e influenciada pela estrutura social, vivenciada pelos que dela adoecem(7).

A acessibilidade constitui elemento importante para explicar as variações no uso de serviços de saúde, e representa dimensão relevante nos estudos sobre a avaliação do desempenho de serviços de saúde e da qualidade da atenção(8). Os fatores que predispõem ou não o uso dos serviços têm influência nos resultantes de saúde do indivíduo, e seu estudo favorece a escolha de estratégias para a adequação das necessidades da população e a demanda de cuidados(9). Enquanto caráter ou qualidade do que é acessível, a acessibilidade difere do conceito acesso, compreendida como "entrada, ato de ingressar"(10). O conceito de acessibilidade avança na abrangência do conceito de acesso para além da entrada nos serviços, pois acessibilidade não se restringe à mera disponibilidade de recursos em um determinado momento/lugar ou apenas ao uso ou não de serviços de saúde, mas indica também o grau de ajuste entre as necessidades dos pacientes e os serviços utilizados(11).

Nessa perspectiva, é fundamental conhecer como os usuários avaliam o atendimento a eles prestado, para repensar e intervir sobre a forma de organização dos serviços, visando maior qualidade na assistência, uma vez que "qualquer definição de um sistema de assistência à saúde deve considerar as dimensões da acessibilidade a fim de que os avanços teóricos, relativos à organização setorial, se transformem em práticas no interior dos serviços"(9).

O objetivo deste estudo foi avaliar a acessibilidade de pacientes ao tratamento de TB, em diferentes unidades de referência, de uma cidade do interior paulista (Ribeirão Preto, SP.

Materiais e Métodos

O estudo integrou projeto multicêntrico, desenvolvido pela Área de Pesquisa Operacional da Rede Brasileira de Pesquisa em Tuberculose/REDE-TB, realizado em cinco municípios prioritários para o controle da TB da Região Sudeste e Nordeste. Trata-se de estudo avaliativo, de recorte quantitativo. De acordo com o referencial teórico utilizado, a dimensão acessibilidade foi categorizada em acessibilidade organizacional, acessibilidade econômica e acessibilidade geográfica(11). De acordo com essas categorias, foram construídos os indicadores, mostrados na Figura 1.


Este estudo foi desenvolvido em Ribeirão Preto, município de grande porte, na região oeste do interior do Estado de São Paulo, SP. Nesse município, a assistência a indivíduos adoecidos por TB é realizada por meio de equipes especializadas do programa municipal de controle da TB (PCT), atuantes em unidades de referência (unidades básicas, unidades distritais de saúde e centros de referência), localizadas em cada um dos 5 distritos de saúde existentes.

Quatro unidades de referência (identificadas pelas siglas A, B, C e D) participaram do estudo. Previamente, um censo da população de indivíduos adoecidos por TB, em tratamento no município, foi realizado, resultando em 167 casos. Foram excluídos pacientes com TB pertencentes à população carcerária do município, os não residentes no município de estudo e os menores de 18 anos. No total, participaram do estudo 100 indivíduos em tratamento nas unidades de referência do município de 2006 a 2007.

Realizaram-se entrevistas com os indivíduos, por meio da aplicação de questionário semiestruturado, baseado nos instrumentos componentes do Primary Care Assessment Tool (PCAT), validado no Brasil(12) e adaptado para as ações de controle da tuberculose(13). Esse instrumento contém questões sobre cada dimensão essencial da atenção primária à saúde-APS (porta de entrada, acesso, vínculo, coordenação, enfoque na família, elenco de serviços e formação profissional). Para análise da acessibilidade ao tratamento, foram consideradas questões alocadas nas dimensões acesso e elenco de serviços.

Cada pergunta do questionário foi respondida segundo uma escala de possibilidades preestabelecida - escala Likert – na qual os valores de 1 a 5 registraram o grau de relação de preferência ou concordância das afirmações. Os indicadores criados para cada pergunta correspondem ao valor médio, obtido pela somatória de todas as respostas de todos os pacientes entrevistados, dividido pelo total de respondentes. O desempenho de cada indicador foi classificado como: valores médios próximos de 1 e 2 - desempenho insatisfatório, para valores próximos de 3 - regular e para valores próximos de 4 e 5 - desempenho satisfatório. Os indicadores foram então analisados, individualmente, e comparados entre as quatro unidades de saúde. Para avaliar a acessibilidade ao tratamento nas unidades de referência, os dados foram submetidos à análise de variância (one-way ANOVA). A suposição de igualdade de variância (homocedasticidade) requerida pela ANOVA foi verificada pelo teste de Bartlett. A análise de variância foi aplicada, portanto, nas variáveis que satisfizeram as pressuposições de independência, homocedasticidade e normalidade. Para aquelas variáveis que apresentaram violação dos critérios para o uso da ANOVA, aplicou-se o teste não-paramétrico de Kruskall-Wallis.

O nível de significância estatística adotado, em todos os testes, foi de 5%. Atendendo à Resolução 196/96, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (Protocolo) e foi cadastrado no SISNEP/CONEP – Conselho Nacional de Ética em Pesquisa.

Resultados

Tabela 1

Nos resultados acima descritos, pode-se identificar que as unidades estudadas obtiveram comportamentos semelhantes nos seguintes indicadores: "facilidade na obtenção de consultas médicas de controle" e "oferecimento de medicamentos durante o tratamento" (avaliados como satisfatórios na percepção dos pacientes); "oferecimento de cesta básica", "espera média de consulta médica maior que 60 minutos" e "perda do dia de trabalho devido a consulta médica" (avaliados como desempenho regular); "utilização de transporte motorizado no deslocamento até a unidade de saúde" (avaliado como desempenho insatisfatório).

Em relação à distância entre a unidade de referência e o domicílio do doente, foi observada diferença estatística significativa entre o comportamento das unidades (Figura 2). Por meio da aplicação do teste de comparação de médias (teste de Tukey), observou-se que a unidade B obteve os menores escores quando comparada à unidade D, que teve o melhor desempenho. A unidade B é a que apresenta maior área de abrangência, totalizando o atendimento de 136.906 habitantes.


Quanto ao benefício do vale-transporte, que apresentou desempenho insatisfatório para o município, houve diferença estatística significativa no comportamento das quatro unidades estudadas, e o teste de Tukey mostrou que as unidades A e B apresentam menor frequência no oferecimento desse benefício. 77% dos pacientes na unidade A e 62,5% na unidade B relatam que o serviço nunca ofereceu esse tipo de auxílio. São também as unidades A e B que demonstram piores avaliações quando comparadas às unidades C e D, em relação à despesa custo com transporte no deslocamento até a unidade de referência.

Figura 3


Em relação à realização da visita domiciliar (VD) aos pacientes em tratamento, foram também as unidades C e D que obtiveram avaliação satisfatória, tendo 82 e 93% dos pacientes, respectivamente, sempre recebendo visitas domiciliares. Por outro lado, observou-se desempenho insatisfatório nas unidades A e B, onde, respectivamente, 28 e 25% dos entrevistados relataram que nunca receberam VD.

Figura 4


Discussão

Quando um problema de saúde exige atendimento, o sistema de saúde deve estar organizado de forma a garantir que a atenção, ao primeiro contato, seja atingida, e que essa atenção seja contínua e possa satisfazer as aspirações do indivíduo que dela precise(14). O oferecimento de consultas médicas com facilidade, sejam essas consultas de controle (mensais) ou emergenciais (no prazo de até 24 horas), pode indicar que as unidades de referência mantêm a regularidade das consultas de controle, garantindo o acompanhamento da evolução do tratamento de TB, e, também, garantem agilidade em situações eventuais, possibilitando o atendimento quando o indivíduo apresenta necessidade. O aparecimento de reações adversas aos medicamentos é situação comum em pacientes que se encontram na fase inicial do tratamento, fato que implica cuidados e atenção especial por parte da equipe de saúde responsável. A espera por consulta médica, avaliada como satisfatória neste estudo, também representa elemento facilitador à continuidade da atenção, uma vez que estreitamento da relação médico/paciente e melhor organização do atendimento diminuem o tempo de espera para a consulta(15).

A demora no atendimento e horários incompatíveis com os turnos no emprego podem levar à necessidade de perda do dia de trabalho pelo paciente. A literatura ressalta que a rigidez na rotina de atendimento, por parte dos serviços de saúde, agrava as dificuldades econômicas e sociais vivenciadas pelos indivíduos portadores de TB(16-17). O tratamento de tuberculose impõe carga financeira significante aos doentes, muitos desses sem condições para arcar com gastos adicionais por serem responsáveis pelo ganho de sua família(18). Quando se reconhece a influência de fatores socioeconômicos na adesão ao tratamento de TB, percebe-se que, mesmo quando o tratamento é gratuito, a ausência de benefícios, ou suporte, para cobrir gastos com transporte, moradia e comida pode obstruir a continuidade do tratamento(19). O oferecimento de suporte como vale-transporte e cesta básica exige dos serviços de saúde articulação com outros equipamentos de serviço social, e exemplifica a inter-relação da acessibilidade organizacional e econômica(20-21).

O fato de que o tratamento dos indivíduos adoecidos pela TB é realizado de forma centralizada, em unidades de referência, pode explicar o desempenho favorável em relação à maioria dos indicadores da acessibilidade organizacional. Os PCTs, implementados nas unidades de saúde, possuem equipe própria e especializada, que trabalha sob esquema de ambulatório, com dias e/ou horários específicos para a assistência à TB. Após o ingresso do paciente ao PCT e início do tratamento, o atendimento é feito diretamente por essa equipe, o que facilita a obtenção de consultas e o fluxo do atendimento no cenário dos serviços de saúde.

Concentrar o atendimento à terapêutica em unidades de referência, no entanto, também pode gerar obstáculos em relação à distância entre o domicílio do paciente e o serviço de saúde onde o tratamento é feito, gerando obstáculos à acessibilidade geográfica. É necessário considerar, entretanto, que apenas a distância do serviço de saúde pode não significar barreira relevante, uma vez que é observada a preferência de alguns indivíduos para se tratarem longe do domicílio, por se sentirem mais confortáveis, devido ao estigma relacionado à doença(22). Apesar disso, os desdobramentos que a distância implica, como a necessidade de utilização de transporte motorizado para o deslocamento até as unidades de saúde e a consequente perda de tempo, energia e dinheiro com o mesmo, podem gerar diversos obstáculos. O desempenho insatisfatório ou regular de indicadores como "utilização de transporte motorizado no deslocamento até a unidade de saúde", "despesas com transporte até a unidade de saúde" e "realização do tratamento na unidade mais próxima do domicílio" evidencia lacuna na acessibilidade de doentes de TB em tratamento, gerando deficiências na assistência.

Os resultados obtidos em relação à VD, onde as unidades de referência com maior número de pacientes atendidos eram as que apresentavam pior desempenho em relação à frequência de VD, demonstram essa deficiência. Para o serviço de saúde, cobrir uma área de abrangência extensa implica em irregularidade na realização das visitas domiciliares. Esses resultados são semelhantes a outros estudos realizados sobre o desempenho de serviços de saúde em relação ao tratamento supervisionado(23-24). Profissionais das unidades de saúde que concentram grande número de doentes por TB, com área de maior abrangência, relatam maior dificuldade para a execução do DOT no domicílio, em virtude da responsabilidade de supervisionar maior número de doentes e da necessidade de deslocamento até o domicilio, em tempo disponível restrito(23).

A realização de visitas domiciliares exige, dos serviços de saúde, reorganização de suas atividades internas e a existência de estrutura mínima (viatura, motorista e profissional de saúde supervisor), necessária para desenvolver as atividades do tratamento de TB no domicílio do paciente e, ao mesmo tempo, garantir a continuidade das atividades executadas no âmbito do serviço(25).

O cuidado em saúde à TB, incluindo o planejamento das visitas domiciliares, precisa considerar as necessidades e preferências do doente e o contexto em que o mesmo vive(25). Além do objetivo de supervisionar a ingesta da medicação, é necessário enfatizar que as visitas domiciliares e a estratégia do TS são compostas de outros elementos, como avaliação dos contatos, apoio psicossocial, dentre outros, os quais são fundamentais para a adesão ao tratamento e prevenção da doença no contexto familiar.

Conseguir atuar, no entanto, em uma lógica que privilegie assistência centrada no paciente, considerando suas singularidades e sua autonomia frente ao processo terapêutico, pode se tornar tarefa difícil para serviços de saúde com demanda que supera seus recursos e sua estrutura.

A observação direta do doente por um profissional de saúde, isoladamente, pode ser intervenção que só atende o problema do acesso pela ótica do serviço de saúde. Intervenções, no âmbito das barreiras organizacionais que se limitam a resolver apenas problemas mecânicos, acabam por não se voltar ao comprometimento e à responsabilidade referente ao serviço em relação à autonomia e aos direitos do usuário.

Ações de controle à TB, com foco no conceito ampliado de saúde, portanto, requerem que a gestão de sistemas e serviços considere a combinação de atividades integradas e especializadas, de forma que seja possível assegurar um modelo de atenção que considere o caráter debilitante da TB. O bom desempenho dos serviços de saúde em relação à acessibilidade ao tratamento depende de um conjunto formado por qualificação contínua dos profissionais, garantia de estrutura mínima para atuação das equipes e integração de esforços entre os diferentes atores responsáveis pelo controle da TB(24), visando a otimização e a adequação dos recursos existentes às necessidades diversas dos indivíduos adoecidos pela tuberculose.

Prover acesso e cuidado a todos é desafio que pertence ao novo paradigma da saúde pública e da atenção primária à saúde. Essa tarefa, por fim, acaba por atender a necessidades específicas das ações em tuberculose (TB), uma vez que o diagnóstico e o tratamento eficiente dos doentes é a base primordial para o controle da doença.

Considerações finais

Os serviços de saúde, atuantes no acompanhamento do tratamento dos doentes, organizados de forma centralizada e contando com equipes especializadas, apresentaram desempenho satisfatório em relação à maioria dos indicadores de acessibilidade organizacional. Contudo, este estudo identificou a existência de deficiências no manejo dos custos indiretos, impostos ao indivíduo adoecido pela TB, como gastos com o transporte no deslocamento até a unidade de saúde e insuficiente oferecimento de ações de suporte social (como vale-transporte e cestas básicas). A avaliação insatisfatória, referente à distância entre a unidade que realiza o TS e o domicílio do doente e a irregularidade no oferecimento de visitas domiciliares para supervisão do tratamento, pode estar relacionada às dificuldades operacionais de organização da atenção e de recursos (humanos, materiais e tempo) das equipes.

Os resultados reforçam a necessidade de pesquisas avaliativas, de modo a reorientar as práticas de atenção à TB, auxiliando no processo de formulação de novas estratégias para identificação de barreiras à continuidade do cuidado pelo paciente.

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  • Corresponding Author:
    Tereza Cristina Scatena Villa
    Universidade de São Paulo. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
    Departamento Materno-Infatil e Saúde Pública
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011

    Histórico

    • Recebido
      11 Fev 2010
    • Aceito
      26 Jun 2011
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