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Planos de ação e de enfrentamento de obstáculos relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa em coronariopatas

Resumos

OBJETIVO: analisar os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos, relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa, elaborados por pacientes coronariopatas, em seguimento ambulatorial, e identificar as barreiras percebidas para adoção desse comportamento. MÉTODO: os participantes (n=59) foram convidados a elaborar planos de ação (action planning) e de enfrentamento de obstáculos (coping planning) para o comportamento de adesão aos medicamentos cardioprotetores e de alívio dos sintomas. RESULTADOS: foram evidenciados planos de ação específicos para a tomada dos medicamentos que associaram o comportamento a marcadores temporais e ao ciclo vigília/sono. Os obstáculos mais frequentemente relatados foram o esquecimento e a ausência de rotina nas atividades de vida diária. Os planos de enfrentamento, elaborados para superar o esquecimento, foram os mais específicos. CONCLUSÃO: os achados deste estudo subsidiam a aplicação da implementação da intenção para otimizar a adesão de coronariopatas à terapia medicamentosa.

Enfermagem; Uso de Medicamentos; Comportamento; Técnicas de Planejamento; Doença das Coronárias


OBJECTIVE: to analyze the action and coping plans related to the behavior of adhering to drug therapy, developed by coronary heart disease (CHD) outpatients, and to identify the barriers perceived to adopting this behavior. METHODS: the participants (n=59) were invited to formulate action plans and coping plans for the behavior of adhering to the cardio-protective medications and the symptom-relief medications. RESULTS: specific action plans for taking the medications associated with temporal markers and the sleep-wake cycle were shown. The most frequently reported obstacles were forgetfulness and absence of routine in daily living activities. The coping plans for overcoming forgetfulness were the most specific. CONCLUSION: this study's findings support the application of implementation intentions aimed at optimizing adherence to drug therapy among patients with CHD.

Nursing; Drug Utilization; Behavior; Planning Techniques; Coronary Disease


OBJETIVO: analizar los planes de acción y de enfrentamiento de obstáculos relacionados al comportamiento de adhesión a la terapia medicamentosa, elaborados por pacientes con coronariopatía en seguimiento de ambulatorio e identificar las barreras percibidas para adopción de este comportamiento. MÉTODO: los participantes (n=59) fueron invitados a elaborar planes de acción (action planning) y de enfrentamiento de obstáculos (coping planning) para el comportamiento de adhesión a los medicamentos cardio-protectores y de alivio de los síntomas. RESULTADOS: fueron evidenciados planes de acción específicos para la tomada de los medicamentos que asociaron el comportamiento a marcadores temporales y al ciclo vigilia sueño. Los obstáculos más frecuentemente relatados fueron el olvido y la ausencia de rutina en las actividades de vida diaria. Los planes de enfrentamiento elaborados para superar el olvido fueron los más específicos. CONCLUSIÓN: los hallazgos de este estudio subvencionan la aplicación de la implementación de la intención para optimizar la adhesión de pacientes con coronariopatía a la terapia medicamentosa.

Enfermería; Utilización de Medicamentos; Conducta; Técnicas de Planificación; Enfermedad Coronaria


ARTIGO ORIGINAL

Planos de ação e de enfrentamento de obstáculos relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa em coronariopatas

IRN, MSc

IIPhD, Professor Associado, Departamento de Enfermagem, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Brasil

IIIRN, PhD

IVPhD, Pós-doutoranda, Departamento de Enfermagem, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: analisar os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos, relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa, elaborados por pacientes coronariopatas, em seguimento ambulatorial, e identificar as barreiras percebidas para adoção desse comportamento.

MÉTODO: os participantes (n=59) foram convidados a elaborar planos de ação (action planning) e de enfrentamento de obstáculos (coping planning) para o comportamento de adesão aos medicamentos cardioprotetores e de alívio dos sintomas.

RESULTADOS: foram evidenciados planos de ação específicos para a tomada dos medicamentos que associaram o comportamento a marcadores temporais e ao ciclo vigília/sono. Os obstáculos mais frequentemente relatados foram o esquecimento e a ausência de rotina nas atividades de vida diária. Os planos de enfrentamento, elaborados para superar o esquecimento, foram os mais específicos.

CONCLUSÃO: os achados deste estudo subsidiam a aplicação da implementação da intenção para otimizar a adesão de coronariopatas à terapia medicamentosa.

Descritores: Enfermagem; Uso de Medicamentos; Comportamento; Técnicas de Planejamento; Doença das Coronárias.

Introdução

Nas últimas três décadas, evidências comprovaram que o tratamento com betabloqueadores, inibidores de enzima conversora (IECA) ou inibidores do receptor de angiotensina (ARA II), antiagregantes plaquetários e hipolipemiantes reduz eventos cardiovasculares e mortalidade após síndrome coronária aguda(1). No entanto, a baixa ou não adesão à terapia cardioprotetora, após evento isquêmico, tem sido frequentemente documentada e associada ao aumento da morbimortalidade cardiovascular(2). Intervenções para melhorar a adesão à terapia medicamentosa têm sido desenvolvidas e avaliadas(3). Dentre elas, destacam-se aquelas baseadas em pressupostos teóricos, especialmente nas teorias cognitivo-sociais, nas quais a intenção ou motivação, para realizar determinado comportamento, é o principal determinante da ação. No entanto, intenções positivas nem sempre se traduzem no comportamento desejado(4). Embora a intenção seja um forte preditor do comportamento, há relatos de um hiato na relação intenção/comportamento, ou seja, pessoas com intenção positiva falham na execução do comportamento(5). Dessa forma, estratégias como a implementação da intenção (do inglês implementation-intention) têm sido utilizadas como ferramenta para auxiliar pessoas motivadas a transformar intenções positivas em ação(6).

O conceito de implementação da intenção se refere à formação de planos de ação que especificam quando, onde e como realizar o comportamento. São definidos como planos condicionais que antecipam uma situação crítica e especificam como agir nessa situação(4). Uma vez que a representação mental dessa situação torna-se altamente ativada, o controle do comportamento é delegado para pistas situacionais específicas que, quando presentes, deflagram a ação, aumentando a probabilidade de que o comportamento seja efetivado(7).

O planejamento de quando, onde e como agir, porém, não aborda as respostas habituais às situações cotidianas que surgem frente à pressão social. Nesse contexto, utiliza-se o coping planning(8), estratégia focada na transposição de barreiras, que combina planos prospectivos (if/then) com estratégias de enfrentamento, isto é, se (if) a barreira y ocorrer, então (then) o comportamento x é realizado para superá-la. Representa uma união mental entre situações de risco antecipadas e respostas de enfrentamento adequadas. Indivíduos que planejam como manejar situações de risco têm maior probabilidade de manter o comportamento na vigência de dificuldades(8).

A formulação de planos de implementação da intenção tem sido efetiva em promover comportamentos em saúde, como atividade física(6,9), consumo de frutas e vegetais(10), dentre outros. Na literatura há relatos sobre a importância de se explorar a qualidade dos planos de ação e de enfrentamento, elaborados em estudos de intervenção(7,11). Dessa forma, pretende-se, neste estudo, analisar os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos, elaborados por coronariopatas, em relação à adesão medicamentosa cardioprotetora e de alívio de sintomas, recomendada no tratamento da doença arterial coronária (DAC), bem como identificar as barreiras percebidas para adoção desse comportamento. Espera-se que os achados deste estudo subsidiem a aplicação da implementação de intenção para otimizar a adesão à terapia medicamentosa na coronariopatia.

Objetivos

Por meio deste estudo, objetivou-se analisar os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa cardioprotetora e de alívio dos sintomas, elaborados por pacientes coronariopatas em seguimento ambulatorial, bem como identificar as barreiras percebidas para adoção desse comportamento.

Método

Sujeitos e procedimentos

Os dados deste estudo derivaram de estudo mais amplo(12) que avaliou a efetividade de estratégias de planejamento na adesão medicamentosa e qualidade de vida de coronariopatas. Trata-se de estudo experimental, no qual foram incluídos 115 coronariopatas com idade superior a 18 anos, com manifestação clínica prévia de infarto do miocárdio, ou angina, em período superior a seis meses do último evento isquêmico, em seguimento ambulatorial em dois hospitais do interior do Estado de São Paulo. O tamanho da amostra foi determinado com base em estudo-piloto (n=30), considerando-se, como variável resposta, a mudança da medida da proporção da adesão (final/inicial), bem como o nível de significância de 5% (α=0,05) e o poder do teste de 80% (1- β). Foi estimada amostra de 60 sujeitos para cada grupo, com a finalidade de detectar a mesma diferença na média da porcentagem da proporção de adesão (final/inicial) entre os grupos intervenção (5,13) e controle (0,99), observada no estudo-piloto. Foram incluídos aqueles com comunicação verbal efetiva, em uso contínuo, há pelo menos um mês, de dois medicamentos orais para tratamento da coronariopatia. Foram excluídos aqueles que apresentaram um novo evento isquêmico em período inferior a seis meses do início da coleta de dados e aqueles cujo tratamento medicamentoso tenha sido suspenso. Os pacientes foram randomizados nos grupos controle (GC=56) e intervenção (GI=59). O GI foi submetido às estratégias de Planejamento da Ação e de Enfrentamento de Obstáculos e os pacientes do GC receberam o cuidado de rotina, que consistiu em consultas médicas de seguimento. Neste estudo, analisaram-se os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos, elaborados pelos 59 pacientes que participaram do GI.

Coleta de dados

Os dados foram coletados no período que compreendeu entre junho de 2010 e maio de 2011. Os participantes responderam a um questionário validado para obtenção de dados demográficos e clínicos e à versão brasileira da Morisky Self-Reported Measure of Medication Adherence Scale(13), para mensuração dos fatores relacionados à não adesão medicamentosa cardioprotetora, bem como aos medicamentos de alívio dos sintomas da coronariopatia. A adesão medicamentosa foi avaliada pela proporção de adesão e avaliação global da adesão(14).

Instrumentos de coleta de dados

- Morisky Self-Reported Measure of Medication Adherence Scale(15): composta por quatro questões relativas à não adesão ao tratamento medicamentoso - esquecimento, descuido, interrupção do uso do medicamento por perceber melhora e interrupção da terapia, pela percepção de piora do quadro clínico. Na versão utilizada, as respostas são estruturadas em escalas tipo Likert, com quatro ou cinco opções de resposta, cuja somatória gera um escore que varia de quatro a 18; quanto menor o escore maior a favorabilidade à adesão(13).

- Proporção de adesão medicamentosa(14): construído para identificar e quantificar os medicamentos e sua forma de utilização. Engloba as variáveis: 1. nome, dosagem e posologia dos medicamentos prescritos; 2. descrição da forma de utilização de cada medicamento, de acordo com a dose e posologia, nas 24 horas anteriores à entrevista; 3. descrição da utilização dos medicamentos tomados na semana anterior à entrevista e 4. descrição do uso dos medicamentos tomados no mês prévio à entrevista. A adesão foi calculada com base nas doses omitidas, autorrelatadas, por meio do cálculo: [(doses prescritas – doses perdidas) x 100/doses prescritas](16). Foram considerados "aderentes" os que obtiveram percentagem de consumo de medicamentos prescritos, maior ou igual a 80%(17). Para os que faziam uso de mais de um medicamento, a proporção da adesão foi calculada pela média das percentagens de adesão a cada medicamento(14). A proporção da adesão foi analisada como variável contínua e binária - dose adequada (dose utilizada >80% da dosagem prescrita) e dose insuficiente (dose utilizada <80% da dosagem prescrita).

- Avaliação global da adesão: foram avaliados o número e a frequência dos medicamentos ingeridos e sua associação com marcadores temporais - jejum, café da manhã, almoço e jantar. Assim, a adesão global, segundo a dosagem e cuidados, foi avaliada com base na seguinte classificação: grupo I (posologia e cuidados adequados à prescrição); grupo II (posologia adequada e cuidados inadequados); grupo III (posologia insuficiente e cuidados adequados) e grupo IV (posologia e cuidados inadequados). Foi considerado "cuidado inadequado", o uso de um ou mais medicamento cuja posologia e associação com marcadores temporais não estivessem de acordo com a prescrição. Foram considerados "aderentes" os pacientes classificados no grupo I e "não aderentes", os classificados nos grupos II, III, e IV(14).

Metodologia das estratégias de intervenção: planos de ação e de enfrentamento de obstáculos

Após a obtenção de dados clínicos e sociodemográficos, de qualidade de vida relacionada à saúde e adesão à terapêutica medicamentosa, os participantes do GI eram convidados a elaborar, em conjunto com o pesquisador, os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos relacionados à adesão aos medicamentos cardioprotetores e de alívio dos sintomas. A construção desses planos baseou-se em pressupostos teóricos do implementation-intention(6) e em estudo prévio realizado na cultura brasileira(9). Em uma planilha específica para esse fim, os pacientes elaboraram até três planos de ação sobre quando, onde e como pretendiam tomar os medicamentos e apontaram até três possíveis obstáculos para a realização do comportamento. Para cada um dos obstáculos listados foram elaboradas, de uma a três, estratégias para superá-los, devido à dificuldade dos sujeitos, com idade avançada e baixa cognição, para memorizar as estratégias planejadas(18). Todos os planos eram registrados manualmente na planilha, pelo pesquisador, e arquivados individualmente.

Análise dos dados

Os dados de caracterização foram submetidos às análises estatísticas descritivas. Os planos foram submetidos à análise quantiqualitativa, que correspondeu à categorização e tabulação dos planos e barreiras relatados, com posterior agrupamento por similaridade de temas ou ideias, sendo determinada a frequência com que foram relatados.

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa envolvidos (Pareceres nº802/2009 e nº001-11). Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

Caracterização sociodemográfica, clínica e de adesão à terapia medicamentosa

A amostra (n=59) foi constituída, em sua maioria, por homens (67,8%), com média de idade de 63,4 (8,9) anos, caucasoides (72,9%), com média de 5,5 (4,0) anos de estudo, que viviam com companheiros (89,8%), inativos (76,3%), com renda mensal familiar média de 3,6 (3,2) salários-mínimos. A maioria (74,6%) tinha história pregressa de infarto do miocárdio, além de média de 5,1 (1,9) condições clínicas associadas. Grande parte dos sujeitos utilizava média de 6,8 (2,0) tipos de medicamentos associados, ao dia, média de 3,5 (0,6) medicamentos cardioprotetores e 0,9 (0,7) medicamentos de alívio de sintomas, em média. Os pacientes foram considerados aderentes pelo critério da proporção de adesão e mostraram favorabilidade para adesão pela escala de Morisky. No entanto, somente 19 (32,2%) pacientes relataram utilizar dose >80% e adotar os cuidados necessários para o uso adequado dos medicamentos, o que aponta para a não adesão, segundo esse critério de avaliação (Tabela 1).

Descrição dos planos de ação e de enfrentamento de obstáculos

Os planos de ação mais frequentemente elaborados em relação a quando tomar os medicamentos foram aqueles que associaram a tomada dos medicamentos a marcadores temporais, como refeições (café da manhã, almoço e jantar) e o ciclo vigília/sono (ao se levantar e antes de ir dormir). Quanto a onde implementar o comportamento, houve maior frequência de planos que associaram a tomada de medicamentos a um determinado local (em casa ou no local de trabalho), embora planos para tomar os medicamentos em qualquer local também tenham sido evidenciados. Com respeito a como tomar os medicamentos, destacaram-se planos que associaram a tomada dos medicamentos às refeições (Tabela 2).

As barreiras percebidas para a tomada de medicamentos e os planos para superação dessas estão apresentados nas Tabelas 3, 4 e 5. Constatou-se que os sujeitos apontaram barreiras para a tomada dos medicamentos em diferentes situações, ou seja, no cotidiano, durante as atividades de trabalho e no lazer. No cotidiano, as barreiras mais frequentemente apontadas foram o esquecimento (46,9%), a ausência de rotina para associar a tomada da medicação às atividades cotidianas (26,0%) e o desconhecimento sobre a doença (7,3%). Durante as atividades de trabalho, destacaram-se as barreiras relacionadas à necessidade de pausa no trabalho (33,3%), de rotina para as refeições durante o trabalho para associar a tomada dos medicamentos a esse marcador (25,0%), além do esquecimento (12,5%). Também foi elevada a frequência do esquecimento (73,3%) no lazer. Foi observada a formulação de maior número de planos para o esquecimento de tomar os medicamentos no cotidiano, destacando-se o plano - "Associar a tomada de medicação a marcadores temporais (refeições) ao longo do dia" (25,0%).

Discussão

O objetivo do presente estudo foi descrever os planos de ação e de enfrentamento de obstáculos elaborados por coronariopatas em seguimento ambulatorial, relacionados ao comportamento de adesão à terapia medicamentosa cardioprotetora e de alívio de sintomas, indicada no tratamento da DAC.

A formulação de planos de ação e de planos de enfrentamento de obstáculos pode ser efetiva na implementação da intenção de diferentes comportamentos em saúde. Entretanto, o emprego dessa estratégia implica que as pessoas sejam capazes de elaborar planos que levem à mudança de comportamento(7). Há relatos de que a qualidade dos planos influencia na efetividade da adoção do comportamento almejado(7,11). Estudo pregresso(19) mostrou que participantes que foram guiados/orientados pelo pesquisador para elaboração dos planos para aderir à atividade física formularam planos mais completos e precisos comparados a planos autoelaborados pelos pacientes. Além disso, foi evidenciada associação entre os planos mais completos e nível mais elevado de atividade física, após seis meses de seguimento.

Assim, no presente estudo, a baixa escolaridade associada às recomendações de estudo prévio(6) contribuíram para decisão de que os planos fossem elaborados em conjunto com o pesquisador, de maneira não diretiva, norteados pela questão: quando, onde e como você planeja tomar as medicações prescritas para o tratamento do seu problema no coração, considerando suas atividades do dia a dia? Embora alguns planos tenham sido elaborados de maneira independente, a maioria foi elaborada em conjunto com o pesquisador, respeitando-se o desejo dos pacientes nos planos formulados. Em decorrência da elaboração conjunta, os planos foram completos, englobando quando, onde e como a ação seria implementada.

Ensaio clínico, controlado e randomizado testou o impacto da implementação da intenção em mudanças clinicamente relevantes da atividade física diária entre adultos da população da Holanda. Uma das razões apontadas para a baixa efetividade da intervenção foi o fato de os planos terem sido elaborados pelos participantes, de forma autônoma, o que pode ter influenciado a especificidade e a qualidade dos planos elaborados(20).

Estudiosos(21) também hipotetizam que planos específicos são mais prováveis de promover a ação intencionada quando comparados aos elaborados de forma genérica. Essa premissa se apoia na ideia de que, pela descrição detalhada da situação crítica e da ação a ser realizada, a situação de risco pode ser facilmente reconhecida e deflagrar a ação previamente planejada(7,11). Estudo(7) relata que planos instrumentais (capazes de promover a mudança do comportamento e viáveis para implementação da intenção, no contexto em que foram elaborados) e com elevado grau de especificidade (cuja descrição da situação se caracteriza pela riqueza de detalhes, facilitando o reconhecimento da situação de risco e a implementação da ação) resultaram em maior probabilidade de abstinência ao tabaco, quando comparado aos planos pouco específicos e não instrumentais.

No presente estudo, a análise dos planos evidenciou que foi formulado maior número de planos para o esquecimento de tomar os medicamentos no dia a dia. Além disso, observa-se que os planos relacionados ao esquecimento, nas diferentes situações (no cotidiano, no trabalho e no lazer), eram detalhados e pertinentes ao contexto, exceto o plano de memorizar os nomes dos medicamentos e seus respectivos horários, de acordo com a prescrição médica, considerado pouco provável para propiciar a mudança de comportamento em população com média de idade elevada e com baixo nível de escolaridade. No entanto, também foram observados planos genéricos, principalmente para a ausência de rotina no cotidiano, bem como para a dificuldade para conciliar a tomada dos medicamentos com as atividades do trabalho. Observa-se que tais planos podem gerar dificuldade de implementação na vigência da situação de risco. Pode-se hipotetizar que a elaboração mais frequente de planos genéricos tenha relação com o baixo nível de escolaridade da população estudada.

Por outro lado, há relato(7) de que a superespecificação das ações não necessariamente resulta em efeitos benéficos, quando um, ou mais, componente da ação desejada não está presente ou não pode ser realizado. Assim, a elaboração de planos múltiplos e específicos parece se associar a maior efeito da intervenção. No presente estudo, entretanto, não foi possível analisar o número de planos elaborados, uma vez que foi solicitado que os participantes elaborassem até três planos de ação, conforme recomendado em estudo prévio(6).

São escassos os estudos sobre planos para adesão medicamentosa. Um estudo(21) que testou a efetividade das estratégias de planejamento na adesão à antibioticoterapia também encontrou, entre as barreiras para a adesão, o esquecimento e a necessidade de mudanças na rotina. Seus achados sugerem, no entanto, que a implementação da intenção é útil para o manejo da não adesão de causa não intencional, como o esquecimento, porém, pouco efetiva na promoção de comportamentos complexos, como a mudança de rotina.

São inúmeros os esforços, atualmente, para compreender a não adesão ao tratamento medicamentoso, mas esse é um desafio ainda a ser alcançado, pois os mecanismos envolvidos no comportamento de adesão são complexos(22).

A análise futura dos resultados da efetividade da implementação da intenção entre coronariopatas contribuirá para o refinamento dessa estratégia, com vistas à sua replicação na prática clínica.

Conclusão

Os achados evidenciaram a elaboração de planos de ação completos e específicos que associaram a tomada de medicamentos aos marcadores temporais e ao ciclo vigília/sono. Observou-se a elaboração de planos de enfrentamento específicos para superar o esquecimento de tomar os medicamentos e de planos genéricos para a falta de rotina para atividades cotidianas, relacionadas à tomada dos medicamentos. Esses achados fornecem subsídios para aplicação da implementação da intenção em estudos de intervenção, destinados à promoção da adesão à terapia medicamentosa entre coronariopatas.

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  • 1
    Laura Bacelar de Araujo LourençoI; Roberta Cunha Matheus RodriguesII; Thaís Moreira SpanaIII; Maria Cecília Bueno Jayme GallaniII; Marilia Estevam CornélioIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Jan 2012
    • Aceito
      03 Set 2012
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