Acessibilidade / Reportar erro

Evolução clinica de pacientes internados em decorrência do primeiro episódio da Síndrome Coronariana Aguda

Resumos

OBJETIVO: avaliar a evolução clínica de pacientes internados pelo primeiro episódio da síndrome coronariana aguda (SCA), segundo sua manifestação clínica. MÉTODOS: foram coletados dados de 234 pacientes internados entre maio de 2006 e julho de 2009, em decorrência do primeiro episódio de uma SCA, mediante consultas aos prontuários. RESULTADOS: a maioria (59,8%) foi internada devido ao infarto agudo do miocárdio (IAM). No grupo com IAM, 19,3% apresentaram complicações e 12,8% no grupo com angina instável (AI) (p=0,19). A realização de angioplastia foi maior entre os pacientes com IAM do que com AI (p=0,02) e a cirurgia de revascularização foi mais realizada entre os pacientes com AI (p=0,03). A maioria (227 - 97%) sobreviveu ao evento coronariano. Entre os sete pacientes que morreram na internação, quatro tinham IAM (2,9%) e três AI (3,2%). CONCLUSÕES: houve maior número de complicações entre os infartados e a realização de revascularização do miocárdio foi diferente nos dois grupos.

Síndrome Coronariana Aguda; Evolução Clínica; Mortalidade; Enfermagem


AIM: to assess the clinical evolution of patients hospitalized due to the first episode of Acute Coronary Syndrome (ACS) according to its clinical manifestation. METHODS: data were collected from 234 patients, hospitalized between May 2006 and July 2009 due to the first episode of an ACS, by consulting their medical records. RESULTS: 234 patients were hospitalized, 140 (59.8%) due to Acute Myocardial Infarction (AMI). In the group with AMI, 19.3% presented complications, against 12.8% in the group with Unstable Angina (UA) (p=0.19). Angioplasty levels were higher among patients with AMI than with UA (p=0.02) and coronary artery bypass graft surgery was more frequent among UA patients (p=0.03). The majority (227; 97%) survived after the coronary event. Among the seven patients who died during the hospitalization, four had AMI (2.9%) and three UA (3.2%). CONCLUSIONS: A larger number of complications were found among infarction victims and the accomplishment of coronary artery bypass graft surgery differed between the groups.

Acute Coronary Syndrome; Clinical Evolution; Mortality; Nursing


OBJETIVO: evaluar la evolución clínica de pacientes internados por el primer episodio del Síndrome Aguda de Coronarias según su manifestación clínica. MÉTODOS: Fueron colectados datos de 234 pacientes internados entre mayo de 2006 y julio de 2009 debido el primer episodio de una ACA mediante consultas a los prontuarios. RESULTADOS: La mayoría (59,8%) internó debido al Infarto Agudo del Miocardio (IAM). En el grupo con IAM, 19,3% presentaron complicaciones y 12,8% en el grupo con Angina Inestable (AI)(p=0,19). La realización de angioplastia fue mayor entre los pacientes con IAM de lo que con AI (p=0,02) y la cirugía de revascularización fue más realizada entre los pacientes con AI (p=0,03). La mayoría (227; 97%) sobrevivió al evento de las coronarias. Entre los siete pacientes que murieron en la internación, cuatro tenían IAM (2,9%) y tres AI (3,2%). CONCLUSIONES: Hubo mayor número de complicaciones entre los infartados y la realización de revascularización del miocardio fue diferente en los dos grupos.

Síndrome Coronario Agudo; Evolución Clínica; Mortalidad; Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Evolução clinica de pacientes internados em decorrência do primeiro episódio da Síndrome Coronariana Aguda

IEnfermeira, MSc, Hospital Zona Sul de Londrina, PR, Brasil

IIEnfermeira, PhD, Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Brasil

IIIPhD, Professor Associado, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Brasil

IVPhD, Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

VPhD, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: avaliar a evolução clínica de pacientes internados pelo primeiro episódio da síndrome coronariana aguda (SCA), segundo sua manifestação clínica.

MÉTODOS: foram coletados dados de 234 pacientes internados entre maio de 2006 e julho de 2009, em decorrência do primeiro episódio de uma SCA, mediante consultas aos prontuários.

RESULTADOS: a maioria (59,8%) foi internada devido ao infarto agudo do miocárdio (IAM). No grupo com IAM, 19,3% apresentaram complicações e 12,8% no grupo com angina instável (AI) (p=0,19). A realização de angioplastia foi maior entre os pacientes com IAM do que com AI (p=0,02) e a cirurgia de revascularização foi mais realizada entre os pacientes com AI (p=0,03). A maioria (227 - 97%) sobreviveu ao evento coronariano. Entre os sete pacientes que morreram na internação, quatro tinham IAM (2,9%) e três AI (3,2%).

CONCLUSÕES: houve maior número de complicações entre os infartados e a realização de revascularização do miocárdio foi diferente nos dois grupos.

Descritores: Síndrome Coronariana Aguda; Evolução Clínica; Mortalidade; Enfermagem.

Introdução

As doenças cardiovasculares (DCV) são as principais causas de morbimortalidade no mundo, com projeções crescentes para as próximas décadas. Foram responsáveis por quase 30% de todos os óbitos em 2004, atingindo quase 32% das mortes entre as mulheres e 27% entre os homens(1). No Brasil, registros indicam preocupação com a manifestação das DCVs em idades mais precoces e alertam para o aumento acelerado da patologia nos próximos anos, devido ao envelhecimento da população(2-3). Dentre as DCVs estão as doenças isquêmicas, com destaque para a síndrome coronariana aguda (SCA), que abrange o infarto agudo do miocárdio (IAM) – com e sem supradesnivelamento do segmento ST, e a angina instável (AI)(4). Em 2009, foram documentados 76.481 óbitos associados à SCA, considerando-se somente os óbitos por AI e IAM, correspondendo a 7% do total de óbitos, e representando 24% das mortes por doenças do aparelho circulatório(5). Desde 1950, a mortalidade hospitalar por IAM vem apresentando queda, mas dados do Datasus ainda mostram taxa de 15%, índice esse considerado elevado, se comparado à taxa de 3,6% de estados norte-americanos, em 2000(6).

Os índices decrescentes de mortalidade, registrados nos últimos anos, estão vinculados à introdução de novas modalidades terapêuticas na área da saúde que resultaram na redução da morbidade e permitiram maior sobrevida aos pacientes coronariopatas, com destaque para as terapias de reperfusão do miocárdio e desenvolvimento de novos fármacos. Apesar dos significativos avanços, a SCA ainda representa uma das questões de saúde pública mais relevantes da atualidade.

O objetivo do presente estudo foi avaliar a evolução clínica dos pacientes, durante a internação decorrente do primeiro episódio da SCA, no que se refere à presença de complicações, realização de procedimentos de revascularização do miocárdio e mortalidade, segundo a manifestação clínica da síndrome (IAM ou AI).

Métodos

Estudo descritivo e exploratório desenvolvido em um hospital público de ensino, de alta complexidade, localizado no interior do Estado de São Paulo, o qual presta assistência predominantemente a pacientes do Sistema Único de Saúde. A amostra foi constituída dos 234 pacientes que foram internados em decorrência do primeiro episódio de uma SCA, entre maio de 2006 e julho de 2009, e que participaram de um estudo anterior realizado nessa instituição(7). Os dados apresentados no presente trabalho foram coletados mediante consultas aos prontuários desses participantes, entre fevereiro e agosto de 2011, após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da referida instituição, para a continuidade do seguimento dos pacientes previamente investigados.

Os dados da caracterização sociodemográfica foram os já existentes no banco de dados do estudo anterior e encontram-se na Tabela 1. Para caracterização clínica apresentada neste estudo, as pesquisadoras coletaram as informações dos 234 prontuários dos pacientes referentes à presença de comorbidades cardiovasculares prévias, datas da internação e da alta (para posterior cálculo do tempo de internação), presença de complicações durante a internação (sim/não), realização de procedimentos de revascularização do miocárdio (trombólise química, intervenção coronariana percutânea – ICP e cirurgia de revascularização do miocárdio – CRVM) e datas da submissão aos procedimentos de revascularização (posterior cálculo do tempo de espera para a revascularização). A variável-desfecho da internação foi categorizada em óbito durante a internação ou alta com seguimento ambulatorial (no hospital de estudo ou transferência para outro serviço de saúde).

Para processamento e análise estatística dos dados, foi utilizado o programa IBM Statistical Package for the Social Sciencies (SPSS), versão 20.0. Foram realizadas análises descritivas de frequência simples para variáveis nominais ou categóricas e de tendência central (média e mediana) e dispersão (desvio-padrão) para as variáveis contínuas.

O teste qui-quadrado foi usado para verificar possíveis associações entre a manifestação clínica da SCA (AI ou IAM) e as variáveis: sexo, idade agrupada, presença de complicações e o tipo de procedimento de revascularização (realização de ICP e realização de CRVM). O teste exato de Fisher foi realizado para analisar possível relação entre a manifestação da SCA e o desfecho da primeira internação. O teste t de Student foi usado para comparar a duração da internação e os tempos médios para a realização de procedimentos de revascularização, considerando-se a manifestação clínica da SCA. O nível de significância adotado foi de 5%.

Resultados

Dos 234 pacientes que se internaram pela primeira vez devido à manifestação da SCA, constatou-se que 140 (59,8%) foram diagnosticados com IAM e os demais (94; 40,2%) com AI. A caracterização sociodemográfica dos participantes encontra-se na Tabela 1. Em relação à idade, no grupo com IAM havia maior porcentagem de pacientes com até 59 anos (59,3%) do que no grupo com AI (50%), não sendo essa diferença estatisticamente significante (p=0,16). Houve predomínio do sexo masculino em ambos os grupos; no entanto, a diferença foi estatisticamente significante (p<0,001) no grupo dos infartados (75,7%), quando comparado ao grupo com AI (59,6%).

As comorbidades cardiovasculares prévias à internação mais freqüentes, entre os pacientes infartados e com AI, foram: hipertensão arterial (62,9 e 80,9%, respectivamente); obesidade/sobrepeso (61,5 e 60,6%), dislipidemias (34,3 e 52,1%) e diabetes (28,6 e 43,6%). Os pacientes permaneceram internados em média por 11 dias (dp=11,2; intervalo de dois a 71). Ao se comparar as médias do tempo de internação, constatou-se que o tempo foi maior no grupo com AI (média=12,5; dp=13,4) do que no grupo com IAM (média =10; dp=9,2), mas essa diferença não foi estatisticamente significante (p=0,12) (Tabela 2). Entre eles, 39 (16,7%) apresentaram algum tipo de complicação durante a primeira internação. No grupo dos 140 pacientes com IAM, houve maior número de indivíduos com complicações (19,3%) do que entre os 94 com AI (12,8%). Entretanto, o teste de associação entre as variáveis, manifestação da SCA e presença de complicações durante a primeira internação não obteve resultado estatisticamente significante (p=0,19). As complicações mais frequentes, encontradas nos registros feitos nos prontuários dos participantes foram: parada cardiorrespiratória revertida (21; 35,6%), arritmias cardíacas como fibrilação e flutter atrial (12; 20,3%) e aquelas relacionadas aos procedimentos de revascularização do miocárdio (ICP e CRVM), tais como pseudoaneurismas (3; 5,1%), infecção no local da punção do cateter (3; 5,1%), laceração arterial (2; 3,4%) e deiscência/infecção em ferida operatória (2; 3,4%). Houve pacientes que apresentaram mais de uma complicação no período abordado.

Em relação aos resultados sobre os procedimentos de revascularização dos quais foram submetidos os pacientes internados pela primeira vez, em decorrência da SCA, observou-se que a trombólise química foi realizada em 64 pacientes (44,3% dos 140 pacientes infartados) que foram diagnosticados com IAM, com supradesnivelamento do segmento ST. Considerando-se os 234 pacientes, 134 (57,3%) foram submetidos à ICP e apenas 25 (10,7%) à CRVM. A realização da ICP foi maior entre os pacientes com IAM do que entre os pacientes com AI (p=0,02), enquanto com relação à CRVM, esse procedimento foi mais realizado entre os pacientes com AI do que entre os infartados (p=0,03) (Tabela 3). O tempo decorrido entre a data da internação e a data da realização do procedimento de revascularização do miocárdio também foi investigado entre os grupos. Verificou-se que o tempo para realização de CRVM foi mais longo que para ICP, havendo diferença entre as modalidades da SCA, porém, não estatisticamente significativa (Tabela 2).

Investigando qual havia sido o desfecho da primeira internação, constatou-se que, dos 234 pacientes, 227 (97%) sobreviveram ao evento coronariano e sete (3%) morreram durante a hospitalização (Tabela 3). Os pacientes sobreviventes foram encaminhados para seguimento ambulatorial no próprio serviço hospitalar ou em outras unidades de saúde. Entre os sete pacientes que foram a óbito no período, quatro pertenciam ao grupo com IAM, correspondendo a 2,9% do total de infartados, e três tinham diagnóstico de AI, correspondendo a 3,2% desse grupo. Seis deles tiveram como causas da morte eventos diretamente relacionadas à doença arterial coronariana (DAC). Entre os sete óbitos, nenhum realizou ICP e cinco foram submetidos à CRMV, caracterizando uma mortalidade pós-CRVM de 20%. O tempo médio para a realização da cirurgia foi de 20 dias. Cabe ressaltar que o tempo médio entre a cirurgia e o óbito foi de quatro dias (um paciente faleceu durante o procedimento cirúrgico; três pacientes faleceram no terceiro dia de pós-operatório e um deles morreu após 11 dias). Dias antes da ocorrência do óbito, cinco dos sete pacientes apresentaram como complicações arritmia cardíaca, parada cardiorrespiratória revertida, pneumonia nosocomial e distúrbio de coagulação após circulação extracorpórea.

Discussão

O objetivo do presente estudo foi avaliar a evolução clínica dos 234 pacientes, durante a internação decorrente do primeiro episódio da SCA, no que se refere à presença de complicações, realização de procedimentos de revascularização do miocárdio (trombólise química, ICP e CRVM) e o desfecho da internação (óbito ou alta para seguimento ambulatorial), segundo a manifestação clínica da síndrome, ou seja, IAM ou AI.

A caracterização dos participantes quanto ao predomínio de pacientes do sexo masculino e mais idosos também foi semelhante àquela obtida em outros estudos com pacientes coronariopatas(8-10). Tais variáveis são fortemente associadas à evolução clínica dos pacientes coronarianos e a mortalidade pela SCA.

No que se refere à manifestação clínica da SCA, constatou-se que o diagnóstico mais comum foi o de IAM (59,8%). Essa proporção reflete o padrão da SCA encontrada em outros estudos(10-11), mas difere de outras populações que apresentaram a AI como a causa mais frequente de hospitalizações(12-14). Como a instituição é um serviço terciário, isso pode ter influenciado o resultado devido à seleção prévia decorrente do processo de regulação médica, presente na rede local.

A média obtida no estudo para o tempo de internação dos pacientes foi de 12,5 dias para o grupo com AI e de 10 dias para o grupo com IAM. Essas médias foram maiores do que as observadas em outros estudos internacionais, considerando os casos de AI (média de 8,3 dias), mas semelhante aos dos pacientes com IAM (média de 9,7 dias) (12). Ressalta-se que o resultado obtido também se apresentou maior que os obtidos em estudos nacionais(14-16). Diante desse panorama, é preciso avaliar, por meio de outros estudos, se os motivos para o longo tempo de permanência na instituição, onde o estudo foi realizado, estão relacionados à evolução clínica dos pacientes atendidos, à condução terapêutica ou se existem problemas organizacionais e estruturais, como agendamento de exames, recursos humanos e materiais, que estão contribuindo para a maior permanência dos pacientes nesse hospital. De modo intuitivo, pode-se sugerir que o tempo prolongado pode decorrer em parte da presença de regulação médica no sistema de encaminhamento, já que, pela hierarquização existente, os casos de pacientes com apresentação clínica mais grave costumam ser regulados para esta instituição, objeto deste estudo. Um aspecto que reforça tal hipótese é o elevado número de paradas cardiorrespiratórias desta amostra.

As complicações afetaram principalmente os infartados, sendo as mais frequentes a parada cardiorrespiratória e arritmias cardíacas (fibrilação e flutter atrial). Em outros estudos, os resultados mostraram que 67,1% dos participantes apresentaram complicações, sendo que 14,8% estavam relacionadas ao ritmo cardíaco(10) e à ocorrência de fibrilação ou flutter atrial foi de 8% entre os infartados e de 5% para os pacientes com AI(8).

Em relação aos procedimentos de revascularização, a proporção de pacientes submetidos à trombólise foi semelhante àquela obtida por outros pesquisadores(12). Resultados de um estudo brasileiro mostraram que a revascularização química é utilizada mais frequentemente nos hospitais públicos (3,8 vezes mais) do que nos particulares, os quais priorizaram o uso de ICP primária nos casos de IAM com supradesnivelamento do segmento ST(10). O uso de trombolíticos deve ser incentivado por ser um recurso terapêutico de baixo custo, fácil acesso e eficaz na redução da mortalidade do IAM(10), notadamente onde a ICP não estiver disponível.

No presente estudo, 57,3% dos 234 participantes foram submetidos à ICP e apenas 10,7% à CRVM. A realização da ICP foi maior entre os pacientes com IAM do que entre os pacientes com AI (p=0,02), enquanto que, em relação à CRVM, esse procedimento foi mais realizado entre os pacientes com AI do que entre os infartados (p=0,03).

Observa-se, por meio de outros estudos, que os pacientes infartados são frequentemente mais submetidos a procedimentos de revascularização (ICP ou CRVM) que os pacientes com AI(11,14,17). Os estudos internacionais GRACE(11) e ENACT(12) identificaram maior realização de ICP nos hospitais de ensino, como a instituição do presente estudo. Em contrapartida, estudo nacional descobriu que os procedimentos de revascularização são mais frequentemente realizados nos hospitais particulares do que nos públicos, em todas as classes diagnósticas da SCA. Surpreendentemente, os resultados apontaram que, embora os hospitais particulares tenham realizado quase a totalidade das ICP e CRVM, não houve diferença significativa na taxa de mortalidade entre os hospitais, o que induz a se pensar sobre a utilização de procedimentos invasivos nas SCAs(10).

Com relação à sobrevivência dos pacientes internados, em decorrência da primeira manifestação clínica da SCA, a taxa de mortalidade hospitalar foi equivalente às taxas de países europeus, como Reino Unido e Bélgica(8). Dados do estudo GRACE(11) apontam taxas de 7 a 6% para IAM e de 3% para AI. No mesmo estudo, a região Argentina/Brasil apresentou taxas de mortalidade hospitalar de 12% para IAM e 4% para AI, bem acima dos índices das outras regiões avaliadas. Em relação aos dados nacionais, verificou-se taxa de mortalidade semelhantes a centros de referência cardiológica(14,17) e inferiores a hospitais gerais(10,18). Esses achados sugerem que o tratamento da SCA no hospital do presente estudo tem sido realizado de forma eficiente em nível hospitalar, com mortalidade semelhante a registros de referência. Entretanto, a mortalidade hospitalar pós-CRVM de 20% foi superior a outras instituições(13,16,19-20). Estudo de abrangência nacional identificou taxa de 7,2%(21). No Rio de Janeiro, as letalidades ajustadas nos hospitais pesquisados variaram entre 1,9 e 11,2%(19). Em outro estudo, a mortalidade em 30 dias dos pacientes submetidos à CRVM foi de 6,4%(16). Pesquisadores observaram que, enquanto a mortalidade hospitalar geral era de 10,9%, após a CRVM, a taxa foi de 13,7% em um hospital de ensino estadual e de 14,3% em um hospital de ensino federal. Em dois hospitais especializados para atendimento cardiológico, as taxas foram quase 50% menores (7 e 7,4%)(13). Novas investigações são necessárias para averiguar essa desigualdade.

Para finalizar, destaca-se como limitações do estudo o uso de dados secundários (prontuários dos pacientes) e a não estratificação de risco do paciente na determinação da taxa de mortalidade. A heterogeneidade dos registros realizados pelos profissionais de saúde, nos prontuários dos pacientes, dificultou a coleta de dados ou mesmo impossibilitou a obtenção de outros dados que seriam importantes para o estudo em que se propõe avaliar a evolução clínica desses pacientes.

Conclusão

Ao se comparar a evolução clínica dos 234 pacientes internados pelo primeiro episódio da SCA, segundo a manifestação clínica da doença (AI ou IAM), constatou-se que a presença de complicações ocorreu com maior frequência entre os pacientes com IAM. A realização de procedimentos de revascularização do miocárdio foi diferente nos dois grupos. A ICP foi maior entre os pacientes com IAM, enquanto a CRVM foi mais frequente entre os pacientes com AI. Verificou-se que a mortalidade observada foi menor do que as apresentadas em outros estudos.

Considera-se, aqui, que os resultados desta pesquisa são importantes para os profissionais da saúde em geral e, em particular, para aqueles que assistem os pacientes com SCA. Eles ampliam os conhecimentos sobre o perfil desse grupo de pacientes atendidos em decorrência do primeiro episódio de SCA em um hospital geral, de nível terciário, assim como ocorre a evolução clínica desde a internação até a alta hospitalar.

Referencias

15. Sant'Anna FM, Alvarez FS, Bruno RV, Brito MB, Menezez S, Correa WB Filho, et al. Desfechos Hospitalares em Pacientes Submetidos a Intervenção Coronária Percutânea na Vigência de Síndromes Coronárias Agudas Atendidos em Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) – Resultados de um Centro de Cardiologia Terciário. Rev Bras Cardiol Invas. 2010;18(1):30-6.

  • 1
    World Health Organization (WHO). The global burden of disease: 2004 update 2008 [Internet]. 2008 [acesso 6 jan 2012]. Disponível em: http://www.who.int/healthinfo/global_burden_disease/2004_report_update/en/index.html
  • 2. Azambuja MR, Foppa M, Maranhão MFC, Achutti AC. Impacto econômico dos casos de doença cardiovascular grave no Brasil: uma estimativa baseada em dados secundários. Arq Bras Cardiol. [periódico na Internet]. 2008 [acesso 15 mar 2012];91(3):163-71. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/abc/v91n3/05.pdf
  • 3
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Saúde Brasil 2005: uma análise da situação de saúde no Brasil. 2005. Brasília (DF); 2006.
  • 4. Anderson JL, Adams CD, Antman EM, Bridges CR, Califf RM, Casey DE, et al. ACC/AHA 2007 guidelines for the management of patients with unstable angina/non-ST-Elevation myocardial infarction: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. [periódico na Internet]. 2007 [acesso 10 jan 2012];50(7):e1-e157. Disponível em: http://content.onlinejacc.org/cgi/reprint/50/7/652.pdf
  • 5. Teich V, Araújo DV. Estimativa de custo da síndrome coronariana aguda no Brasil. Rev Bras Cardiol. [periódico na Internet]. 2011 [acesso 6 jan 2012];24(2):85-94. Disponível em: http://sociedades.cardiol.br/socerj/revista/2011_02/a_2011_v24_n02_02estimativa.pdf
  • 6
    Ministério da Saúde (BR). Linha do cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio na rede de atenção às urgências e Protocolo clínico Síndromes Coronarianas Agudas [Internet]. 2011 [acesso 6 jan 2012]. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/protocolo_sindrome_coronaria.pdf
  • 7. Marosti CA, Dantas RAS, Schmidt A, Rossi LA. Health-related quality of life in patients admitted after a first episode of acute coronary syndrome. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2011;19:1106-13.
  • 8. Fox KAA, Carruthers KF, Dunbar DR, Graham C, Manning JR, Raedt H, et al. Underestimated and under-recognized: the late consequences of acute coronary syndrome (GRACE UKBelgian Study). Eur Heart J. [periódico na Internet]. 2010 [acesso 13 fev 2012];31:2755-64. Disponível em: from:http://eurheartj.oxfordjournals.org/content/early/2010/08/26/eurheartj.ehq326.full.pdf+html
  • 9. Hueb W, Soares PR, Gersh BJ, Cesar LAM, Luz PL, Puig LB, et al. The medicine, angioplasty, or surgery study (MASS-II): a randomized, controlled clinical trial of three therapeutic strategies for multivessel coronary artery disease. J Am Coll Cardiol. [periódico na Internet]. 2004 [acesso15 mar 2011];43(10):1743-51. Disponível em: http://content.onlinejacc.org/cgi/reprint/43/10/1743.pdf
  • 10. Reis AF, Salis LHA, Macrini JRL, Dias AMC, Chilinque MGL, Saud CGM, et al. Síndrome Coronariana Aguda: morbimortalidade e prática clínica em pacientes do município de Niterói (RJ). Rev SOCERJ. [periódico na Internet]. 2007 [acesso 20 mar 2012];20(5):360-71. Disponível em: http://sociedades.cardiol.br/socerj/revista/2007_05/a2007_v20_n05_art06.pdf
  • 11. Fox KAA, Goodman SG, Klein W, Brieger D, Steg PG, Dabbous O, et al. Management of acute coronary syndromes. Variations in practice and outcome Findings from the Global Registry of Acute Coronary Events (GRACE). Eur Heart J. [periódico na Internet]. 2002 [acesso 13 jan 2012];23:117789. Disponível em: http://eurheartj.oxfordjournals.org/content/23/15/1177.full.pdf
  • 12. Fox KAA, Cokkinos DV, Deckers J, Keil U, MaggianiA, Steg G. The ENACT study: a pan-European survey of acute coronary syndromes. Eur Heart J. [periódico na Internet]. 2000 [acesso 4 mar 2012];21:1440-9. Disponível em: http://eurheartj.oxfordjournals.org/content/21/17/1440.full.pdf+html
  • 13. Oliveira TML, Oliveira GMM, Klein CH, Silva NAS, Godoy PH. Mortality and complications of coronary artery bypass grafting in Rio de Janeiro, from 1999 to 2003. Arq Bras Cardiol. [periódico na Internet]. 2010 [acesso 10 jan 2012];95(3):303-12. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/abc/v95n3/en_aop08610.pdf
  • 14. Santos ES, Minuzzo L, Pereira MP, Castillo MT, Palacio MA, Ramos RF, et al. Acute coronary syndrome registry at a cardiology emergency center. Arq Bras Cardiol. [periódico na Internet]. 2006 [acesso 3 mar 2012]; 87(5):544-549. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/abc/v87n5/en_07.pdf
  • 16. Santos ES. Escore de risco Dante Pazzanese para Síndrome Coronariana Aguda sem supradesnivelamento do segmento ST [tese de doutorado]. São Paulo (SP): Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2008. 144 p.
  • 17. Soares JS, Pena FM, Pires Jr HR, Chaves APM, Inácio BO, Barcelos AF, et al. Análise do Tratamento da Síndrome Aguda em Centro Cardiológico do Norte Fluminense. Rev Soc Cardiol Estado do Rio de Janeiro. 2009;22(3):230-4.
  • 18. Villela P, Santos VF, Pimenta LVWA, Figueroa JDLP, Carvalho DRM, Oliveira GMM, et al. Estratégias invasiva ou não-invasiva e associação com eventos clinicamente relevantes no seguimento pós-alta de pacientes internados com síndrome coronariana aguda. Rev SOCERJ. 2008;21(3):154-9.
  • 19. Godoy PH, Klein CH, Silva NAS, Oliveira GMM, Fonseca TMP. Letalidade na cirurgia de revascularização do miocárdio no Estado do Rio de Janeiro - SIH/SUS - no Período 1999-2003. Rev SOCERJ. 2005;18(1):23-9.
  • 20. Mesquita ET, Ribeiro A, Araújo MP, Campos LAA, Fernandes MAF, Colafranceschi AS, et al. Indicators of healthcare quality in isolated coronary artery bypass graft surgery performed at a tertiary cardiology center. Arq Bras Cardiol. 2008;90(5):350-4.
  • 21. Noronha JC, Travassos C, Martins M, Campos MR, Maia P, Panezzuti R. Avaliação da relação entre volume de procedimentos e a qualidade do cuidado: o caso de cirurgia coronariana no Brasil. Cad Saúde Pública. [periódico na Internet]. 2003 [acesso 17 mai 2012];19(6):1781-9. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2003000600022&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
  • 1
    Gislaine Pinn GilI; Carina Aparecida Marosti DessotteII; André SchmidtIII; Lídia Aparecida RossiIV; Rosana Aparecida Spadoti DantasV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      07 Jun 2012
    • Aceito
      13 Set 2012
    Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
    E-mail: rlae@eerp.usp.br