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Diagnóstico oportuno da tuberculose nos serviços de saúde de diversas regiões do Brasil

Resumos

OBJETIVO: analisar o primeiro contato do doente com os serviços de saúde para o diagnóstico oportuno da tuberculose (TB), em diferentes regiões do Brasil. MÉTODO: trata-se de estudo de coorte transversal, em 6 municípios das Regiões Sudeste, Sul e Nordeste. Para a coleta utilizaram-se fontes secundárias e entrevista com os doentes. Os dados foram analisados por meio de técnicas descritivas e análise fatorial de correspondência múltipla. RESULTADOS: a Atenção Primária à Saúde apresentou maior tempo e menor proporção de diagnósticos. Os serviços associados ao diagnóstico, na primeira consulta, foram os serviços especializados e os Programas de Controle da TB, que oferecem consulta e exames no próprio local. CONCLUSÃO: faz-se necessária a organização do trabalho de forma integrada, entre as equipes dos diferentes serviços, para as ações de controle da TB. Na Atenção Primária à Saúde, é preciso ainda observar o grau de incorporação e sustentabilidade na execução dessas ações à prática diária dos serviços.

Tuberculose; Diagnóstico; Avaliação de Serviços de Saúde; Atenção Primária à Saúde


OBJECTIVE: To analyze the infected person's first contact with the health services, for the early diagnosis of tuberculosis (TB) in different regions of Brazil. METHOD: a cross-sectional study undertaken in 6 municipalities in the South-east, South and North-east regions of Brazil. Data collection involved secondary sources and interviews with the patients. The data was analyzed using descriptive techniques and multiple correspondence factor analysis. RESULTS: Primary Health Care (PHC) presented the longest time to diagnosis and the lowest proportion of diagnoses. The services associated with diagnosis in the first consultation were the specialized services and the Tuberculosis Control Programs, which offer consultations and tests on-site. CONCLUSION: For the control of TB, it is necessary to organize the work in an integrated way between the different services' teams. In Primary Health Care, it is also necessary to observe the extent of incorporation and sustainability in the implementation of these actions into the health services' daily practice.

Tuberculosis; Diagnosis; Health Services Evaluation; Primary Health Care


OBJETIVO: Analizar el primer contacto del paciente con los servicios de salud para el diagnóstico oportuno de la tuberculosis (TB) en diferentes regiones de Brasil. MÉTODO: Estudio transversal en seis ciudades en el sudeste, sur y noreste. La recolección de datos utilizó fuentes secundarias y entrevistas con los pacientes. Los datos fueron analizados utilizando técnicas descriptivas y el análisis factorial de correspondencias múltiples. RESULTADOS: La Atención Primaria obtuve menor proporción de diagnósticos y mayor tiempo. Los servicios asociados con el diagnóstico en la primera visita fueron los servicios especializados y los Programas de Control de la Tuberculosis, que ofrecen consultas y exámenes in situ. CONCLUSIÓN: Es necesaria la organización del trabajo integrado entre los equipos de los diferentes servicios para las acciones de control. En la Atención Primaria, es necesario también observar el grado de desarrollo y sostenibilidad en la aplicación de estas medidas a la práctica diaria de los servicios.

Tuberculosis; Diagnóstico; Evaluación de los Servicios de Salud; Atención Primaria de la Salud


ARTIGO ORIGINAL

Diagnóstico oportuno da tuberculose nos serviços de saúde de diversas regiões do Brasil

Tereza Cristina Scatena VillaI; Maria Amélia Zanon PonceII; Anneliese Domingues WysockiIII; Rubia Laine de Paula AndradeIV; Tiemi ArakawaV; Beatriz Estuque ScatolinIII; Maria Eugenia Firmino BrunelloV; Aline Ale BeraldoIII; Lucia Marina ScatenaVI; Aline Aparecida MonroeVII; Reinaldo Antonio da Silva SobrinhoVIII; Lenilde Duarte de SáIX; Jordana de Almeida NogueiraIX; Marluce Maria de Araújo AssisX; Roxana Isabel Cardozo-GonzalesXI; Pedro Fredemir PalhaXII

IPhD, Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

IIPhD, Professor, Faculdade Ceres, Brasil

IIIDoutoranda, Programa Interunidades de Pós-graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo e Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil

IVPhD, Enfermeira, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

VDoutoranda, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil

VIPhD, Professor Doutor, Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil

VIIPhD, Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil

VIIIPhD, Professor Doutor, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Brasil

IXPhD, Professor Doutor, Universidade Federal da Paraíba, Brasil

XPhD, Professor Titular, Universidade Estadual de Feira de Santana, Brasil

XIPhD, Professor Doutor, Universidade Federal de Pelotas, Brasil

XIIPhD, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: analisar o primeiro contato do doente com os serviços de saúde para o diagnóstico oportuno da tuberculose (TB), em diferentes regiões do Brasil.

MÉTODO: trata-se de estudo de coorte transversal, em 6 municípios das Regiões Sudeste, Sul e Nordeste. Para a coleta utilizaram-se fontes secundárias e entrevista com os doentes. Os dados foram analisados por meio de técnicas descritivas e análise fatorial de correspondência múltipla.

RESULTADOS: a Atenção Primária à Saúde apresentou maior tempo e menor proporção de diagnósticos. Os serviços associados ao diagnóstico, na primeira consulta, foram os serviços especializados e os Programas de Controle da TB, que oferecem consulta e exames no próprio local.

CONCLUSÃO: faz-se necessária a organização do trabalho de forma integrada, entre as equipes dos diferentes serviços, para as ações de controle da TB. Na Atenção Primária à Saúde, é preciso ainda observar o grau de incorporação e sustentabilidade na execução dessas ações à prática diária dos serviços.

Descritores: Tuberculose; Diagnóstico; Avaliação de Serviços de Saúde; Atenção Primária à Saúde.

RESUMEN

OBJETIVO: Analizar el primer contacto del paciente con los servicios de salud para el diagnóstico oportuno de la tuberculosis (TB) en diferentes regiones de Brasil.

MÉTODO: Estudio transversal en seis ciudades en el sudeste, sur y noreste. La recolección de datos utilizó fuentes secundarias y entrevistas con los pacientes. Los datos fueron analizados utilizando técnicas descriptivas y el análisis factorial de correspondencias múltiples.

RESULTADOS: La Atención Primaria obtuve menor proporción de diagnósticos y mayor tiempo. Los servicios asociados con el diagnóstico en la primera visita fueron los servicios especializados y los Programas de Control de la Tuberculosis, que ofrecen consultas y exámenes in situ.

CONCLUSIÓN: Es necesaria la organización del trabajo integrado entre los equipos de los diferentes servicios para las acciones de control. En la Atención Primaria, es necesario también observar el grado de desarrollo y sostenibilidad en la aplicación de estas medidas a la práctica diaria de los servicios.

Descriptores: Tuberculosis; Diagnóstico; Evaluación de los Servicios de Salud; Atención Primaria de la Salud.

Introdução

O Brasil permanece entre os 22 países com mais alta carga de tuberculose (TB) no mundo(1), apresentando, em 2011, o total de 69.245 casos da doença(2), o segundo maior número de doentes de todo o Continente Americano. Apesar do fato de que, ao longo de 10 anos, a taxa de incidência da doença ter sido reduzida em 15,4% (de 42,8 casos por 100 mil habitantes, em 2001, para 36/100.000, em 2011) e a de mortalidade em 23,4% (3,1 óbitos em 100 mil habitantes, no ano 2001, para 2,4/100.000, em 2011), a TB permanece como importante problema de saúde pública.

A TB constitui a quarta causa de óbito por doenças infecciosas e a principal causa de morte em pessoas vivendo com HIV/Aids(3). A taxa de cura em pacientes bacilíferos ainda está aquém das metas preconizadas (70,3%, em 2010)(1) e a detecção de casos, apesar dos progressivos avanços (de 55% dos casos esperados, em 2008, para 88% ,em 2010)(2), ainda suscita lacunas, uma vez que a taxa é calculada a partir de estimativas da OMS e de que pouco se sabe acerca do tempo em que a detecção do caso suspeito é estabelecida.

Uma detecção de casos ineficiente expressa que indivíduos continuam e continuarão adoecendo sem serem identificados pelos serviços de saúde, transmitindo continuamente a doença a outras pessoas. O atraso no diagnóstico da TB, além de afetar a persistência do bacilo na sociedade, influencia também o prognóstico dos indivíduos adoecidos, podendo levar à ocorrência de resistência a drogas e à morte(3).

As dificuldades para o alcance de detecção eficaz de casos de TB estão mais relacionadas à forma como os serviços de saúde se organizam, para detectar e tratar os casos de TB, do que propriamente aos meios diagnósticos em si(4). Os múltiplos fatores que levam à demora na obtenção de cuidado e no diagnóstico da doença refletem a complexidade no controle da TB, pois desempenham importante papel tanto nos aspectos intrínsecos ao doente de TB, que envolvem o significado de estar doente e a percepção dos sinais e sintomas, como o acesso aos serviços de saúde e a atenção recebida nesses locais(5-6).

Estudos mostram que o tipo de serviço de saúde procurado pelo doente de TB, o tipo de serviço que elucida o caso e os meios diagnósticos empregados podem ser determinantes no tempo de resolução do problema(7).

Ao olhar especificamente para o tipo de serviço de saúde procurado pelo indivíduo, converge-se ao primeiro contato desses com o sistema de saúde, ou seja, à porta de entrada dos usuários para obtenção de assistência. A atenção ao primeiro contato envolve a prestação de serviços que sejam acessíveis (uma característica estrutural ou de capacidade da atenção) e a utilização desses serviços quando surge necessidade de atenção (uma característica do processo ou desempenho da atenção), podendo ocorrer em todos os níveis do sistema, embora seja essencialmente uma característica da Atenção Primária à Saúde (APS)(8). O primeiro contato do portador de TB, ou seja, sua porta de entrada ao sistema de saúde é fundamental para garantir o acesso ao diagnóstico da doença.

Utilizou-se como eixo teórico para a discussão dos resultados do presente estudo o conceito de APS, no contexto brasileiro, considerada como elemento reordenador da assistência em saúde e porta de entrada preferencial do sistema, supondo que seja capaz de identificar, diagnosticar e tratar os casos de TB na comunidade(9).

Nesse cenário, a TB é considerada condição crônica em função de sua persistência no tempo e impõe, dentre muitos desafios, o diagnóstico oportuno dos casos suspeitos, evidenciando a necessidade dos diversos serviços que atuam como porta de entrada ao sistema de saúde serem habilitados para o reconhecimento de problemas de saúde(8,10-12).

No Brasil, estudos(13-14) apontam a influência das diferenças regionais e dos modelos de organização da assistência à saúde, na consecução da detecção de casos e adequado manejo da TB. Nesse sentido, o desempenho dos serviços de APS, no controle da doença, mostra que os diferentes modelos de assistência presentes nos municípios agregam especificidades locais (político/organizacional/humano) que os tornam heterogêneos na dinâmica do lidar com a doença(15-16).

Considerando a diversidade dos sistemas locais de saúde, as disparidades regionais e as desigualdades no acesso aos serviços de saúde que caracterizam a realidade brasileira, o presente estudo teve como objetivo analisar o primeiro contato do doente com os serviços de saúde, para o diagnóstico oportuno da TB, em diferentes regiões do Brasil.

Métodos

Este é um estudo de coorte transversal, realizado em 6 municípios prioritários para o controle da TB, nas Regiões Sudeste, Sul e Nordeste do Brasil: Ribeirão Preto (RP), SP, São José do Rio Preto (SJRP), SP, Pelotas (PEL), RS, Foz do Iguaçu (FI), PR, João Pessoa (JP), PB, e Feira de Santana (FS), BA. Esses municípios foram escolhidos intencionalmente de forma a selecionar diversas realidades no desenvolvimento de ações de controle da TB, no sistema de saúde local, e foram caracterizados de acordo a população, organização dos serviços que compreendem as portas de entrada ao sistema de saúde e incidência da TB (Tabela 1).

Para selecionar os participantes do estudo, previamente a coleta foi conduzida por meio do levantamento dos doentes em tratamento nos locais de estudo, no período de novembro de 2008 a novembro de 2009, utilizando-se dados do Sinan, do sistema de informação TB-WEB e/ou registros dos Programas de Controle da Tuberculose (PCT) municipais. A partir dessas informações, os doentes que atendessem os critérios de inclusão (maiores de 18 anos, residentes nos municípios de estudo, fora do sistema prisional) eram contatados e convidados para participar do estudo. A entrevista com o portador de TB foi realizada tanto no serviço de saúde quanto no domicílio do entrevistado, de acordo com a data e horário de preferência desse. A amostra mínima estimada para cada município foi calculada através do programa Statistica (usando os comandos Several means, ANOVA 1-Way) e considerando os parâmetros: número de municípios=6; probabilidade do erro tipo I=0,05; probabilidade do erro tipo II=0,10; medida padronizada do tamanho do efeito=0,2 (raiz quadrada da soma dos quadrados do efeito padronizado dividido pelo número de graus de liberdade do efeito - RMSSE); parâmetro não centralizado=2,4(17). Considerando taxa de não resposta de 25%, obteve-se que, no mínimo, 98 doentes de cada município deveriam participar do estudo.

O total de 598 sujeitos (RP=98, SJRP=99, FI=100, PEL=101, JP=100, FS=100) aceitou participar da pesquisa, excluindo-se os doentes que não sabiam informar o primeiro serviço de saúde procurado.

Os dados foram coletados no período de julho a novembro de 2009, por meio da aplicação de um questionário estruturado, desenvolvido com base nos componentes do Primary Care Assessment Tool (PCAT), elaborado e validado para avaliar os aspectos críticos da APS(8). Esse instrumento foi adequado e validado para a avaliação da APS no Brasil(18) e adaptado para a atenção à TB(19). O questionário buscava recuperar o trajeto do doente desde o momento em que apresentou os sinais e sintomas da TB até a procura pelos serviços de saúde e diagnóstico.

Os serviços de saúde foram agrupados e classificados neste estudo de acordo com a organização do processo de trabalho, horário de atendimento, tipo de qualificação profissional da equipe de saúde, densidade e complexidade tecnológica para o atendimento ao usuário mostrados a seguir.

-Atenção Primária à Saúde (APS): composta pelas unidades básicas de saúde (UBS) e unidades de saúde da família (USF) e caracterizada pelo atendimento de demanda espontânea e programada, funcionamento em horário comercial, presença de equipe generalista e recursos de baixa densidade tecnológica.

-Pronto atendimento (PA): composto pelas unidades de pronto atendimento, caracterizadas pelo atendimento de livre demanda, funcionamento 24 horas por dia, presença de equipe emergencialista e média densidade tecnológica, com apoio diagnóstico local (raio X e laboratório).

-Serviços especializados (SE): composto por consultórios particulares e hospitais, com presença de média e alta densidade tecnológica, equipes especializadas e apoio diagnostico.

-Ambulatório do Programa de Controle da Tuberculose (PCT): ambulatórios de referência para o acompanhamento dos casos de TB, presença de média densidade tecnológica, equipes especializadas e apoio diagnóstico.

As variáveis utilizadas no estudo foram: primeiro serviço de saúde procurado para o diagnóstico; tempo decorrido desde a primeira procura pelo serviço até o diagnóstico (tempo de diagnóstico); diagnósticos realizados no primeiro serviço de saúde procurado; serviço que diagnosticou o caso, baciloscopia de escarro solicitada no primeiro serviço de saúde procurado; raio X solicitado no primeiro serviço de saúde procurado; tipo de serviço que mais solicitou baciloscopia de escarro.

Na análise descritiva, a variável tempo de diagnóstico foi analisada por meio da mediana e foi categorizada em atraso (50% dos valores que antecedem a mediana) e não atraso (50% dos valores que sucedem à mediana). As demais variáveis foram analisadas por distribuição de frequência.

A análise fatorial de correspondência múltipla foi utilizada para investigar a relação entre os municípios de estudo e o atraso no diagnóstico com as variáveis: primeiro serviço de saúde procurado; serviço de saúde que diagnosticou o caso; diagnóstico no primeiro serviço de saúde procurado; solicitação de baciloscopia e solicitação de raio X.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (Protocolo nº0984/2008), atendendo às recomendações contidas na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde.

Resultados

A partir das entrevistas, encontrou-se que os primeiros serviços de saúde mais procurados pelos doentes foram a APS e o PA, sendo que, no município de PEL, houve equivalência na procura entre APS e SE. FS também se destacou na procura pelos SEs (Tabela 2).

Observa-se, em relação ao tempo decorrido desde a primeira procura pelo serviço até o diagnóstico, que o PCT apresentou menor tempo, com exceção do município de PEL, onde foi identificado tempo mediano de 20 dias. Destaca-se que o maior tempo encontrado nesse intervalo foi de 22,5 dias para aqueles pacientes que procuraram a APS em SJRP e de 30 dias para os indivíduos que buscaram a APS em PEL.

Identificou-se, ainda, que todos os usuários (100%) que procuraram o PCT, como primeiro serviço de saúde, obtiveram o diagnóstico da TB nesse mesmo local. Entre as unidades de APS, a menor proporção de diagnóstico realizado no primeiro serviço de saúde procurado foi em FS (8,6%) e a maior em SJRP (46,7%). Já no PA, a menor proporção foi encontrada também em FS (12,5%) e a maior em PEL (44,4%). No SE, a menor proporção encontrada foi em FI (30,0%) e a maior em SJRP (80,0%).

O serviço de saúde que mais diagnosticou os casos de TB foi o PCT, com exceção de SJRP, em que a maioria dos diagnósticos ocorreu nos SEs. Em relação à solicitação de exames diagnósticos no primeiro serviço procurado, observou-se que o raio X foi o exame mais solicitado. Destaca-se o PCT na solicitação de baciloscopia.

A aplicação da análise fatorial privilegiou as dimensões 1 e 2 com valores próprios de 0,315 e 0,249. Por meio da Tabela 3, foram determinadas as variáveis que pertenciam a cada dimensão, conforme a maior contribuição absoluta (Cos2). Dessa forma, a dimensão 1 foi composta por variáveis mais relacionadas ao desempenho dos serviços de saúde e explica 23,6% da variabilidade dos dados: diagnóstico no primeiro serviço de saúde procurado; solicitação de baciloscopia; solicitação de raio X. A dimensão 2 foi composta por variáveis relacionadas aos municípios/serviços de saúde e explica 15,5% da variabilidade dos dados: primeiro serviço de saúde procurado; serviço de saúde que diagnosticou o caso.

As variáveis selecionadas para as dimensões 1 e 2 foram localizadas por meio de coordenadas no plano fatorial (Figura 1), e permaneceram representadas nesse plano. Analisando-se o plano fatorial, foram observadas as seguintes associações: atraso: município de SJRP; não realização do diagnóstico no primeiro serviço de saúde procurado; não solicitação de raio X; não atraso: município de RP; PCT como primeiro serviço de saúde procurado, após o início dos sintomas da TB; realização do diagnóstico no pronto atendimento; realização do diagnóstico no primeiro serviço de saúde procurado; solicitação de baciloscopia; solicitação de raio X.


No lado positivo da dimensão 1 "desempenho" estão os doentes de RP, FI e JP que obtiveram o diagnóstico no primeiro serviço de saúde procurado e tiveram os exames de baciloscopia e raio X solicitados, ou seja, apresentaram melhor desempenho para o diagnóstico da TB.

A posição favorável de FI e JP, nessa dimensão, não significa que os serviços de saúde possuíam ótimas condições de acesso ao diagnóstico, visto que não há associação com o não atraso.

Discussão

A literatura aponta que os serviços de APS e de PA são os mais procurados ao início dos sintomas de TB, no entanto, o sistema hospitalar e os serviços de saúde privados também se constituem como porta de entrada ao diagnóstico da doença, uma vez que alguns oferecem acesso direto à consulta médica e/ou serviço de PA(5-6,20). Nesse sentido, destaca-se que essa realidade também foi encontrada no presente estudo.

A APS foi menos representativa na detecção dos casos de TB, apresentando maior atraso e menor proporção de diagnósticos, com exceção do município de SJRP, sendo que esse serviço foi o segundo que mais diagnosticou os casos da doença. Ressalta-se, ainda, que a descentralização da atenção à TB nos municípios de JP e FS não foi decisiva para a realização do diagnóstico na APS, uma vez que o PCT foi o serviço que mais diagnosticou. Nesse sentido, verifica-se que, independente do modelo de organização dos sistemas locais de saúde, com alta cobertura de ESF ou com unidades tradicionais, a resolutividade do nível primário no diagnóstico da TB depende do grau de incorporação e sustentabilidade na execução das ações de controle da doença à prática diária dos serviços(21).

Considera-se que o uso da APS é desencadeado basicamente pelos indivíduos e que os problemas e necessidades apresentados pelos mesmos são pouco definidos e precisam ser reconhecidos(8). A partir desse pressuposto, compreende-se que os profissionais da APS precisam estar atentos a uma gama maior de doenças e agravos em saúde, considerando-se que, por isso, muitos casos de TB passam despercebidos pelo serviço.

Cabe destacar, ainda, que o maior atraso no diagnóstico encontrado na APS e no PCT em PEL pode estar relacionado às falhas na retaguarda laboratorial, posto que a rede pública de saúde do município apresenta deficiências no sistema logístico e de informação para a busca das amostras e divulgação dos resultados dos exames. Dessa forma, evidencia-se que a organização do sistema de saúde influencia diretamente na agilidade para o diagnóstico da doença(22).

A baixa resolutividade das principais portas de entrada ao sistema de saúde, APS e PA, para o diagnóstico no primeiro serviço procurado evidencia a necessidade de estruturação e fortalecimento da rede de atenção à saúde, bem como de qualificação dos profissionais, através da efetivação da educação permanente em saúde(21), para o atendimento inicial do usuário, coerente com as políticas que priorizam o controle da doença. Ressalta-se que, para a consecução do diagnóstico oportuno da TB, ainda são encontradas barreiras que envolvem a debilidade quantitativa de recursos humanos, rotatividade de profissionais e sobrecarga de trabalho na APS(23) e nos serviços de PA.

Em relação à solicitação de exames diagnósticos, verificou-se valorização do raio X em detrimento da baciloscopia de escarro. Essa situação é reflexo da indução de incorporação de tecnologias mais densas e sofisticadas na área da saúde, resultando em ônus aos escassos recursos destinados à área da saúde. No contexto atual, apesar da discussão acerca da necessidade de incorporação de novas tecnologias para o diagnóstico de TB, a baciloscopia de escarro ainda permanece como recurso de baixo custo e imprescindível para a detecção de casos, visto que é capaz de diagnosticar de 60 a 80% dos casos pulmonares(24).

Frente ao exposto, acredita-se que, para o controle efetivo da TB, todos os serviços de saúde que se configuram como porta de entrada ao sistema devem estar preparados para a suspeição e diagnóstico da doença e, principalmente, para determinar os fluxos dos usuários no sistema de saúde, integrar os serviços que compõem a rede de atenção de modo que seja assegurada a efetivação do diagnóstico e a continuidade da assistência.

Pode ser apontado como limitação do estudo o fato de apenas um dos municípios da pesquisa possuir sistema de informação que permitia identificar os locais de atendimento do doente nos serviços de saúde. Sendo assim, o estudo contou apenas com informações primárias, fornecidas pelos próprios doentes, o que pode, de alguma forma, prejudicar a coleta de informações em virtude do viés de memória. Entende-se, assim, que a possibilidade de complementar as informações com registros secundários de sistemas de informações bem preenchidos poderiam enriquecer a pesquisa.

Conclusão

Neste estudo, identificou-se como principal porta de entrada os serviços de APS e PA, contudo, a maior parte dos diagnósticos de TB ocorreu nos PCTs e SEs. Nesse sentido, ressalta-se a necessidade da conformação da rede de atenção à saúde nos distintos cenários, possibilitando a organização do trabalho de forma integrada entre os serviços para o diagnóstico oportuno da TB.

Ressalta-se, ainda, que o presente estudo contribui para o avanço científico na pesquisa avaliativa de serviços de saúde, focando a atividade operacional, uma vez que, no momento que oferece subsídios necessários para elaboração de novas estratégias técnicas e gerenciais, para otimizar a detecção de casos nos diversos pontos do sistema, tendo como base o conhecimento acerca dos tipos de serviços mais procurados e o desempenho dos mesmos.

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  • 1
    El diagnóstico oportuno de la tuberculosis en los servicios de salud de varias regiones de Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      06 Ago 2012
    • Aceito
      10 Out 2012
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