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Envolvimento dos pais nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas

Resumos

OBJETIVO:

analisar respostas de pais e profissionais de saúde sobre o envolvimento dos pais no cuidado da criança hospitalizada.

MÉTODO:

estudo exploratório, com análise qualitativa dos dados, fundamentado no quadro conceitual do cuidado em saúde em pediatria.

RESULTADOS:

três dimensões do envolvimento foram destacadas: cotidiano dos cuidados com a saúde da criança, perspectivas do envolvimento dos pais e continuidade dos cuidados, com aspectos relacionados à presença e à participação dos pais, benefícios à criança e família, necessidades de informação, responsabilização, direito à saúde, infraestrutura hospitalar, realização de cuidados, comunicação entre pais e serviços de saúde, aprendizagem compartilhada e seguimento após a alta hospitalar.

CONCLUSÃO:

o envolvimento dos pais nos cuidados de saúde admite múltiplos significados para os pais, enfermeiros e médicos, com desafios para desenvolver com e para os pais estratégias singulares, mobilizando competências parentais e contribuindo para ampliar autonomia e tomadas de decisão nos cuidados com a saúde da criança.

Criança Hospitalizada; Pais; Enfermagem


OBJECTIVE:

to analyze the answers of parents and health care professionals concerning the involvement of parents in the care provided to hospitalized children.

METHOD:

exploratory study based on the conceptual framework of pediatric healthcare with qualitative data analysis.

RESULTS:

three dimensions of involvement were highlighted: daily care provided to children, opinions concerning the involvement of parents, and continuity of care with aspects related to the presence and participation of parents, benefits to the child and family, information needs, responsibility, right to healthcare, hospital infrastructure, care delivery, communication between the parents and health services, shared learning, and follow-up after discharge.

CONCLUSION:

the involvement of parents in the care provided to their children has many meanings for parents, nurses and doctors. Specific strategies need to be developed with and for parents in order to mobilize parental competencies and contribute to increasing their autonomy and decision-making concerning the care provided to children.

Child, Hospitalized; Parents; Nursing


OBJETIVO:

comprender las experiencias de padres/madres de niños y adolescentes con cáncer, en tratamiento.

MÉTODO:

investigación cualitativa, basada en la fenomenología existencial de Heidegger, siendo entrevistados 13 padres de ocho pacientes, menores de 19 años, asistidos por una asociación de beneficencia.

RESULTADOS:

del análisis surgieron tres temáticas: "Experimentando los problemas del tratamiento"; "Temiendo la posibilidad de asustarse" y "Experimentando el descuido del otro". Evidenciamos que durante y después del tratamiento los padres experimentaban el miedo a lo desconocido y la incertidumbre del porvenir de sus hijos, especialmente al observar la muerte de otros niños; también, experimentan la indiferencia de los profesionales de los servicios de salud local, así sintiéndose desamparados e inseguros.

CONCLUSIÓN:

consideramos indispensable que los profesionales del área de la salud, con destaque para los de enfermería, reflexionen sobre sus acciones de cuidados orientadas a los padres de hijos con cáncer, reconociendo sus necesidades existenciales y objetivando auxiliarlos en su facticidad.

Niño Hospitalizado; Padres; Enfermería


Introdução

A participação dos pais nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas é tema que vem sendo pesquisado, destacando o hospital como um ambiente não familiar e que traz mudanças nos papéis parentais( 11. Aein F, Alhani F, Kazemnejad A. Parental participation and mismanagement: a qualitative study of child care in Iran. Nurs Health Sci. 2009;11(3):221-7.

2. Sikorova L, Kucova J. The needs of mothers to newborns hospitalized in intensive care units. Biomed Pap Med Fac Univ Palacky Olomouc Czech Repub. 2012;156(4):330-6.

3. Huhtala M, Korja R, Lehtonen L, Haataja L, Lapinleimu H, Munck P, et al. Parental psychological wellbeing and cognitive development of very low birth weight infants at 2 years. Acta Paediatric. 2011;100:1555-60.
- 44.Torquato IMB, Jonas MF, Collet N, Pinto MB, Santos NCCB, Morais GSN. A doença e a hospitalização infantil: compreendendo o impacto na dinâmica familiar. Rev Enferm UFPE On Line. [Internet]. 2012 [acesso 17 fev 2013]; 6(11):2641-8. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/search/results
http://www.revista.ufpe.br/revistaenferm...
). A hospitalização de crianças constitui um evento em que há necessidade de maior comunicação, informação adequada( 44.Torquato IMB, Jonas MF, Collet N, Pinto MB, Santos NCCB, Morais GSN. A doença e a hospitalização infantil: compreendendo o impacto na dinâmica familiar. Rev Enferm UFPE On Line. [Internet]. 2012 [acesso 17 fev 2013]; 6(11):2641-8. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/search/results
http://www.revista.ufpe.br/revistaenferm...
- 55. Araújo YB, Collet N, Moura FM, Nobrega RD. Conhecimento da família acerca da condição crônica na infância. Texto e Contexto Enfermagem. 2009; 18(3):498-505. ) e negociação de cuidados, havendo barreiras e facilidades para a participação dos pais( 66. Power N, Franck L. Parent participation in the care of hospitalized children: a systematic review. J Adv Nurs. 2008;62(6):622-41. ).

Os conhecimentos acerca das necessidades dos pais durante o acompanhamento da criança doente, em contexto hospitalar, permitem salientar o interesse e envolvimento dos pais nos cuidados de saúde em pediatria, de modo a contribuir para a atenção à saúde qualificada e humanizada( 77. Ferreira PL, Melo EMOP, Reis G, Mello DF. Validação e análise da precisão da versão em português do Needs of Parents Questionnaire. J Pediatria. 2010;86(3):221-7. ).

No presente meio de divulgação científica, observam-se publicações recentes que destacam a importância de se analisar como os pais, cuidadores e profissionais de saúde reconhecem os eventos adversos nas circunstâncias de cuidado da criança hospitalizada, apontando as mudanças na organização das instituições de saúde para uma cultura de segurança( 88. Wegner W, Pedro ENR. Patient safety in care circumstances: prevention of adverse events in the hospitalization of children. Rev. Latino-Am. Enferm. 2012;20:427-34. ), o exercício da parentalidade positiva baseado nas necessidades dos pais, para melhorar a prática clínica( 99. Lopes MSOC, Dixe MACR. Positive parenting by parents of children up to three years of age: development and validation of measurement scales. Rev. Latino-Am. Enferm. 2012;20(4):787-95. ), bem como a importância de relatos de crianças sobre as interações com os profissionais para a compreensão da experiência hospitalar( 1010. Norena Peña AL, Cibanal JL. The experience of hospitalized children regarding their interactions with nursing professionals. Rev. Latino-Am. Enferm. 2011;19(6):1429-36. ).

O conhecimento das necessidades dos pais, do significado de envolvimento nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas, bem como a perspectiva dos profissionais de saúde sobre essas temáticas são pouco conhecidos na realidade portuguesa. Assim, o presente estudo tem por objetivo analisar as respostas de pais ou cuidadores e profissionais de saúde (enfermeiros e médicos) sobre o envolvimento dos pais no cuidado da criança hospitalizada em hospitais de Portugal.

Método

Trata-se de estudo exploratório, com análise qualitativa dos dados, fundamentado no quadro conceitual do cuidado de saúde em pediatria( 1111. Kristjánsdóttir G. Perceived importance of needs expressed by parents of hospitalized two- to six- year-olds. Scand J Caring Sci. 1995;9(2):95-103. ), com foco no reconhecimento das necessidades dos pais durante a hospitalização da criança, na perspectiva do direito e responsabilização, para análise do significado do envolvimento dos pais no cuidado da criança hospitalizada.

No âmbito da hospitalização de crianças, os cuidados de saúde em pediatria não se reduzem a uma perspectiva individual: abrangem a criança doente, os pais, outras pessoas significativas e o contexto sociocultural( 1111. Kristjánsdóttir G. Perceived importance of needs expressed by parents of hospitalized two- to six- year-olds. Scand J Caring Sci. 1995;9(2):95-103. ). Nessa abordagem, os pais e a família são compreendidos como cidadãos por direito próprio e como os principais cuidadores das crianças. Em circunstância de doença, essa relação bilateral adquire um novo ator, o profissional de saúde, com o qual a criança e os pais necessitam interagir.

O estudo foi desenvolvido em serviços de pediatria de três hospitais de Portugal, sendo um especializado em crianças e dois distritais com serviços de pediatria. Na coleta de dados, foi aplicado um questionário com perguntas abertas aos pais ou cuidadores, enfermeiros e médicos. O contato com os pais ou cuidadores foi feito por um dos investigadores durante a hospitalização das crianças. Foram incluídos os que estavam presentes, acompanhando a criança hospitalizada, com internação há mais de 48 horas e que soubessem ler e escrever o português. Foram excluídos pais/cuidadores cujos filhos se encontravam em fase terminal, pais que estivessem sem condições emocionais para responder ao questionário, de acordo com uma avaliação prévia dos enfermeiros responsáveis pelos serviços, e pais imigrantes sem domínio da língua portuguesa falada e escrita. Em relação à coleta de dados com enfermeiros e médicos, os critérios de inclusão foram: enfermeiros que exerciam suas funções há mais de seis meses em unidades de pediatria, médicos pediatras e médicos internos da especialidade de pediatria, com mais de dois anos de prática.

A opção foi entregar o questionário em envelope fechado a todos os que reuniam os critérios de inclusão. Aos pais ou cuidadores foram efetuadas as seguintes questões abertas: "O que entende por envolvimento dos pais nos cuidados de saúde quando um(a) filho(a) está hospitalizado(a)?" (Q1); "De quais cuidados ao seu filho(a) gostaria de participar?" (Q2); "O que acha que poderia ser feito para melhorar a assistência à criança durante e após a hospitalização?" (Q3). Aos profissionais de saúde propuseram-se as seguintes questões: "O que entende por envolvimento dos pais nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas?" (Q4); "Que estratégias utilizam para envolver os pais nos cuidados de saúde às crianças durante a internação?" (Q5); "Em relação ao seu hospital, o que acha que deveria ser feito para melhorar o envolvimento dos pais nos cuidados de saúde à criança durante e após a hospitalização?" (Q6); "Em relação ao seu hospital, o que acha que deveria ser feito para melhorar a assistência às crianças durante a hospitalização?" (Q7).

O método de amostragem foi de conveniência. A amostra foi constituída por 660 pais/acompanhantes e 95 profissionais de saúde, tendo-se obtido taxas de resposta às questões abertas do questionário que variaram entre 7 e 81% (Tabela 1). Este estudo é parte de uma investigação de validação de um instrumento de avaliação das necessidades dos pais( 77. Ferreira PL, Melo EMOP, Reis G, Mello DF. Validação e análise da precisão da versão em português do Needs of Parents Questionnaire. J Pediatria. 2010;86(3):221-7. ), com essa dimensão de amostra.

Tabela 1
Taxa de respostas às questões abertas do questionário, Portugal, 2011

A análise dos dados foi pautada na análise de conteúdo, apoiada pela utilização do programa QSR N8NUD*IST (Qualitative Research Software Non-Numerical Unstructured Data Indexing Search Theorizing)( 1212. Bazeley P. Qualitative data analysis with NVivo. London: Sage Publications; 2007. ). Os procedimentos consistiram na indexação das informações relativas às respostas das questões abertas, com codificação em uma lógica de estrutura em árvore, cujos ramos, designados como nodes, são considerados dimensões, as quais vão se subdividindo em domínios, categorias e subcategorias. Esse processo permitiu realçar temas e unidades de registro, possibilitando o estudo de opiniões, atitudes, valores e crenças( 1313. Turato ER. Métodos qualitativos e quantitativos na área da saúde: definições, diferenças e seus objetos de pesquisa. Rev Saúde Pública. 2005;39(3):507-14. ).

Nesta investigação, foram seguidos os procedimentos éticos recomendados, incluindo a autorização pelos Conselhos Diretores e Comitês de Ética em Pesquisa e a assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) de todos os participantes.

Resultados

Caracterização da amostra

Em relação aos acompanhantes da criança, a amostra foi constituída por mães (82%), pais (17%) e apenas 1% de outros acompanhantes, com média de idade de 33 anos, 86% casados ou vivendo em união de fato, com agregado familiar constituído por 3 a 4 pessoas (78%), nível de instrução de ensino básico completo ou secundário incompleto (63%), a maioria com o rendimento familiar <1000€ (68%), nível socioeconômico de Graffar razoável/bom (82%) e residindo a menos de 50km do hospital (88%).

Em relação aos profissionais de saúde, 86% eram enfermeiros, 14% médicos, 93% mulheres, com idade entre 24 e 56 anos, 35% tinham qualificação pediátrica e 76% exerciam a profissão há mais de 6 anos.

Taxonomia dos resultados

Os resultados emergiram da sistematização dos dados, em um processo de apreensão de significados sobre o envolvimento dos pais nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas, que derivaram as dimensões, domínios e categorias (Figura 1).

Figura 1
Apresentação das dimensões, domínios e categorias sobre o envolvimento dos pais nos cuidados de saúde

A frequência relativa de cada dimensão é dada na Figura 2, para cada uma das amostras de pais/acompanhantes e profissionais de saúde.

Figura 2
Distribuição das unidades de registro de cada dimensão pelos pais/acompanhantes e pelos profissionais de saúde

Da análise dos dados qualitativos sobressaíram três dimensões significantes: (i) o cotidiano dos cuidados de saúde em relação à criança no hospital, (ii) perspectivas de envolvimento dos pais nos cuidados com a saúde da criança hospitalizada e (iii) continuidade dos cuidados com a saúde da criança após a hospitalização, apresentadas a seguir, discriminando as unidades de registro para Pais (P) e para Profissionais de Saúde (PS).

O cotidiano dos cuidados de saúde em relação à criança no hospital

O cuidado cotidiano aborda aspectos sobre as estratégias e abordagens desenvolvidas na interação pais/profissionais de saúde e relativos ao ambiente e aos recursos humanos da unidade de internação, com destaque para o diálogo.

É muito importante a comunicação em conjunto, médico, enfermeira e pais.(P 88)

Diálogo aberto durante as visitas com o médico e enfermeiros responsáveis pelo tratamento e acompanhamento. (P 204)

Aliados à comunicação, o ensino e as orientações também foram estratégias apontadas pelos profissionais, com enfoque na educação em saúde e na capacitação dos pais para os cuidados com a criança.

É importante partilhar com eles conhecimentos e informações, levando-os a participar nos cuidados, através de educação para a saúde, apoiando-os e aconselhando-os sempre. (PS 34)

O enfermeiro de referência é mencionado como uma forma de organização dos cuidados de enfermagem.

Deveria haver um enfermeiro de referência que acompanhasse sempre a criança e a família para que os pais também se sintam à vontade para expor dúvidas e receios, permitindo, assim, um melhor envolvimento nos cuidados à criança. (PS 12)

Na infraestrutura hospitalar, as condições de alojamento, espaço e privacidade da criança no hospital são apontadas. Os pais consideram o ambiente desajustado às necessidades da criança e do respectivo acompanhante.

Melhores condições: ar condicionado, casas de banho melhores, camas melhores, mesas melhores para comer.(P 305)

Durante a hospitalização não há um local privado para fazer a integração e a colheita de dados à mãe/criança, ou fazer qualquer confidência que necessite de mais calma e ambiente. (P 5)

Quanto aos recursos humanos, os entrevistados ressaltam a dotação de enfermeiros, médicos e outros técnicos.

É importante que a dotação de pessoal fosse revista sempre que há necessidade de maiores horas de cuidados, isto é, o número de profissionais não pode ser o mesmo quando há 5 crianças internadas e quando há 20 crianças. (PS 21)

Deveria haver mais pessoal de enfermagem e pessoal médico para terem tempo suficiente para todas as funções inerentes ao internamento. (PS 27)

Os relatos enfatizam a necessidade de aumentar o número de enfermeiros e médicos, com ajuste consoante ao número de crianças doentes e às atividades específicas, voltadas para a criança.

Perspectivas de envolvimento dos pais no cuidado em relação à saúde da criança hospitalizada

As perspectivas de envolvimento englobam aspectos sobre a presença, participação, necessidades e benefícios para a criança e pais, necessidades de informação, responsabilização e direito à saúde, realização de cuidados e ajuda aos profissionais de saúde.

Para alguns pais, o envolvimento significa apenas o acompanhamento constante e companhia para a criança.

O envolvimento é fazer companhia à criança e estar com ela 24 horas.(P 23)

Os pais devem estar presentes porque as crianças enquanto estão hospitalizadas gostam que os pais estejam com elas. (P 451)

O envolvimento ligado à ideia de participação indica a oportunidade dos pais de fazer parte dos cuidados de forma ativa e esclarecida e como parceria.

Uma participação ativa nos cuidados. Um diálogo aberto com os profissionais de saúde. Uma informação minuciosa da evolução do estado de saúde do nosso filho. (P 204)

A parceria de cuidados centrada na criança é, de fato, uma mais-valia para o bem-estar da criança. (PS 64)

Os registros dos pais expressam algumas particularidades sobre uma participação efetiva nas unidades de pediatria, com ensino e supervisão dos profissionais, de forma personalizada e ajustada ao contexto da criança, centrada na família e indutora na tomada de decisões.

Entendo que os pais devem participar em todos os cuidados, desde que se sintam preparados para o fazer e sempre com a supervisão dos médicos e enfermeiros. (P 254)

Entendo que não deve ser permitido de uma forma estandardizada, uma vez que nem todos os pais reagem da mesma forma. (P 316)

A presença e a participação dos pais durante a hospitalização também remetem às necessidades e benefícios ligados à criança, em busca de segurança.

Entendo por envolvimento dos pais nos cuidados de crianças hospitalizadas a participação dos pais em todas as tarefas realizadas e o fornecimento de informações relativas à criança, nomeadamente brincadeiras preferidas, rituais para adormecer e durante a alimentação. O envolvimento dos pais permite preservar o espaço emocional e as trocas afetivas de modo a estimular a relação entre criança, pais e enfermeira.(PS 53)

Há situações em que os pais esgotam as suas energias para estarem presentes. Deve haver nesses casos algum discernimento, porque os pais também precisam de muito apoio. (PS 56)

A presença e a participação pressupõem informação, que reporta para a necessidade de os pais terem conhecimento clínico da situação de saúde da criança.

Entendo que os pais deveriam ter total conhecimento, serem informados e esclarecidos claramente sobre a doença, a causa da doença e possíveis consequências, de forma a contribuir e também decidir o que fazer para combater a doença e estar preparado para futuras situações.(P 603)

O envolvimento dos pais é relacionado à responsabilidade atribuída a eles e ao seu direito de participar nas decisões.

Entendo que os pais têm a obrigação e o direito de acompanhar permanentemente o filho, como uma forma de permitir-lhe a melhor manutenção das condições emocionais a que estava habituada, auxiliando a compreensão das sensações físicas novas que lhe estão a acontecer.(P 658)

Após devidamente informados opinarem sobre os tratamentos, prós e contras e não serem apenas elementos passivos que aceitam ordens.(PS 8)

O envolvimento dos pais na hospitalização de crianças também foi exposto como realização de alguns procedimentos.

O envolvimento dos pais nos cuidados é estarem ativamente nos cuidados de higiene e conforto, estar atento às horas de medicação, estar atento ao posicionamento. (PS 66)

A ajuda aos profissionais de saúde, por meio da cooperação em procedimentos e vigilância permanente da criança, também aparece como envolvimento que contribui para diminuir a carga de trabalho profissional e como um processo de negociação.

Ajudar os enfermeiros a controlar antibióticos, medir temperatura e etc., cuidados que a nós não custa e a eles ajuda. (P 106)

É deixar que os pais participem nos cuidados prestados aos filhos, após o enfermeiro ter exemplificado e sob vigilância da enfermagem. Para isso tem que existir negociação. (PS 12)

Os relatos mostram que o envolvimento decorre de uma autorização por parte dos profissionais de saúde, sugerindo que o propósito de compartilhar os cuidados com os pais está centrado neles próprios e não em conjunto com os pais.

Continuidade dos cuidados relacionados à saúde da criança após a hospitalização

Para a continuidade dos cuidados relacionados à saúde da criança, após a hospitalização, foram destacados os aspectos sobre a inter-relação entre pais e serviços de saúde, nomeadamente, com uma aprendizagem partilhada, e com apoio para o cuidado realizado em casa e na realização de visitas domiciliares. O processo de aprendizagem de cuidados de saúde durante a hospitalização é valorizado pelos pais para a continuidade dos cuidados da criança no domicílio, enfatizando a dimensão da comunicação para a resolução de dificuldades.

Aprender algumas coisas que são importantes e que nós até podemos fazer em casa. (P 463)

Depois da hospitalização da criança devia haver uma linha de apoio com a equipe que os tratou para o caso de haver alguma dúvida ou complicação em casa. (P 140)

Aprender a fazer pensos quando temos que os fazer em casa. (P 54)

[...] é importante aprender e participar em todos os cuidados, menos nos de enfermagem porque estes competem aos técnicos. Participo no banho, tomada de medicação, pois vou ter que os fazer quando regressar a casa. (P 278)

A continuidade da atenção à saúde da criança também é vinculada à preparação para a alta, para fortalecer o cuidado em casa e o lidar com a doença.

É durante a internação que se inicia a preparação para a alta; os pais devem ser orientados e ensinados a lidar com a doença do filho. Procurar saber se há dúvidas, reforçar a importância da continuidade de cuidados, de recorrer ao centro de saúde, das consultas e se necessário recorrer ao serviço de internação.(PS 6)

[...] devemos participar em todos os cuidados: banho e higiene, alimentação, avaliar temperatura que vamos fazer depois da alta.(P 311)

[...] os cuidados básicos de higiene, os quais temos que fazer em casa após a alta. Será sempre uma forma de aprendizagem. (P 593)

O envolvimento ligado à responsabilização dos pais assume um caráter particularmente importante para assegurar a continuidade dos cuidados.

Assegurarmo-nos de que a segurança, a autonomia e a responsabilidade estão presentes nos pais, para darem continuidade aos cuidados dos filhos. (PS 34)

Os pais devem envolver-se completamente nos cuidados dos seus filhos para que, quando forem para casa, poderem prestar toda a assistência que necessitam.(P 242)

A visita domiciliária é apontada como prática relevante, estabelecendo interfaces entre a família, o hospital e os centros de saúde.

Após a alta é efetuado um telefonema para a enfermeira de família do centro de saúde da área de residência, onde se faz um resumo da internação e se comunica o tipo de relação que existe entre mãe e filho. Em crianças de risco estamos agora a dar início às visitas domiciliárias, feitas pela enfermeira do hospital, em conjunto com a do centro de saúde. (PS 11)

Após a hospitalização deveria haver uma visita e contato com os técnicos em casa.(P 725)

Discussão

A presença e a participação dos pais no cuidado de crianças hospitalizadas permitem, de certo modo, uma aproximação aos profissionais de saúde, situação em que a comunicação e a compreensão mútuas assumem papel fundamental, aspectos enfatizados neste estudo e que estão em consonância com outras investigações( 44.Torquato IMB, Jonas MF, Collet N, Pinto MB, Santos NCCB, Morais GSN. A doença e a hospitalização infantil: compreendendo o impacto na dinâmica familiar. Rev Enferm UFPE On Line. [Internet]. 2012 [acesso 17 fev 2013]; 6(11):2641-8. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/search/results
http://www.revista.ufpe.br/revistaenferm...
- 55. Araújo YB, Collet N, Moura FM, Nobrega RD. Conhecimento da família acerca da condição crônica na infância. Texto e Contexto Enfermagem. 2009; 18(3):498-505. , 1414. Fegran L, Helseth S. The parent-nurse relationship in neonatal intensive care unit context: closeness and emotional involvement. Scand J Caring Sci. 2009;23(4):667-73. ).

O envolvimento dos pais nos cuidados de saúde de crianças hospitalizadas apresenta múltiplas formas de expressão. Quando a comunicação entre os profissionais de saúde e a família é eficaz, há redução da ansiedade dos pais e maior propensão para o seu envolvimento, o que favorece a adesão aos tratamentos, o processo de enfrentar a doença e de autonomia dos pais( 55. Araújo YB, Collet N, Moura FM, Nobrega RD. Conhecimento da família acerca da condição crônica na infância. Texto e Contexto Enfermagem. 2009; 18(3):498-505. ).

As orientações e capacitação efetuadas por enfermeiros aos pais de crianças hospitalizadas tendem a gerar sentimentos de maior segurança para realizar os cuidados em relação ao filho, valorizando mais a participação e a responsabilidade( 99. Lopes MSOC, Dixe MACR. Positive parenting by parents of children up to three years of age: development and validation of measurement scales. Rev. Latino-Am. Enferm. 2012;20(4):787-95. , 1515. Molina RC, Marcon SS. Benefícios da permanência de participação da mãe no cuidado ao filho hospitalizado. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(4):856-64. ). A presença dos pais ou acompanhante é referida como fonte de proteção e segurança para a criança( 1010. Norena Peña AL, Cibanal JL. The experience of hospitalized children regarding their interactions with nursing professionals. Rev. Latino-Am. Enferm. 2011;19(6):1429-36. , 1616. Murakami R, Campos CJG. Importância da relação interpessoal do enfermeiro com a família de crianças hospitalizadas. Rev Bras Enferm. 2011;64(2):254-60. ).

Em contexto hospitalar, há preocupação com a gestão dos recursos humanos, levando as organizações hospitalares a definirem estratégias que permitam conciliar eficiência nos cuidados, redução dos custos, qualidade da assistência e satisfação dos usuários( 1515. Molina RC, Marcon SS. Benefícios da permanência de participação da mãe no cuidado ao filho hospitalizado. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(4):856-64. ). Apesar dos cuidados centrados na criança e família serem o paradigma dos cuidados em enfermagem pediátrica da atualidade, estudo( 1717. Trajkovski S, Schmied V, Margaret V, Jackson D. Neonatal nurses' perspectives of family-centered care: a qualitative study. J Clin Nurs. 2012;21:2477-87. ) demonstra que os enfermeiros necessitam de suporte organizacional e orientação específica para aplicar esses princípios na prática clínica, o que pode consubstanciar um obstáculo ao envolvimento dos pais. Outros estudos demonstram, por um lado, a falta de privacidade e o isolamento familiar e, por outro, a satisfação e gratidão dos pais pela oportunidade de permanecer junto da criança e de participar dos cuidados do filho hospitalizado( 66. Power N, Franck L. Parent participation in the care of hospitalized children: a systematic review. J Adv Nurs. 2008;62(6):622-41. , 1515. Molina RC, Marcon SS. Benefícios da permanência de participação da mãe no cuidado ao filho hospitalizado. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(4):856-64. ).

A proposta de enfermeiro de referência pode estar centrada na autonomia e responsabilidade do enfermeiro para liderar o processo de cuidados, em colaboração com outros enfermeiros, trazendo uma visão ampliada e de continuidade da assistência durante a internação, com avaliação, planejamento, execução, evolução e supervisão( 1818. Assis M, Collet N, Sila K, Moura F. Cotidiano da família no enfrentamento da condição crônica na infância. Acta Paul Enferm. 2010;23(3):359-65. ).

As famílias demonstram cada vez mais interesse em ser incluídas nos cuidados, o que implica o estabelecimento de vínculos e de parcerias e a valorização da capacidade de escuta dos profissionais de saúde, o que contribui para a humanização dos cuidados de saúde à criança hospitalizada( 11. Aein F, Alhani F, Kazemnejad A. Parental participation and mismanagement: a qualitative study of child care in Iran. Nurs Health Sci. 2009;11(3):221-7. - 22. Sikorova L, Kucova J. The needs of mothers to newborns hospitalized in intensive care units. Biomed Pap Med Fac Univ Palacky Olomouc Czech Repub. 2012;156(4):330-6. , 1919. Faquinello P, Higarashi IH, Marcon SS. O atendimento humanizado em unidade pediátrica: percepção do acompanhante da criança hospitalizada. Texto Contexto - Enferm. 2007;16(4):609-16. ).

A presença dos pais, apesar de incentivada nas instituições de saúde, pode ser pautada por alguns receios dos profissionais quanto à participação deles nos cuidados, no que diz respeito à "transferência" de competências dos profissionais para os pais. Estudo( 2020. Melo E, Martins F, Pleno A, Fontoura C, Seabra F. Cuidados centrados na criança e família: o papel do enfermeiro de referência. Linhas de Saúde. 2009;1:24-6. ) aponta que a atenção humanizada na hospitalização está relacionada à capacidade de abordar os sujeitos de forma holística e igualitária, e atendimento não humanizado é permeado por atitudes que valorizam regras hospitalares, falta de atenção e baixa empatia por parte dos profissionais.

Na perspectiva dos profissionais de saúde, os pais podem participar dos cuidados, mediante alguns pressupostos, nomeadamente, após explicação prévia do procedimento, seguida de exemplificação por parte dos enfermeiros, e depois de terem oportunidade para execução com supervisão dos enfermeiros, a realização de procedimentos técnicos pelos pais envolve processos de aprendizagem mais complexos( 1818. Assis M, Collet N, Sila K, Moura F. Cotidiano da família no enfrentamento da condição crônica na infância. Acta Paul Enferm. 2010;23(3):359-65. ) para lidar com novos contextos e exigências( 1515. Molina RC, Marcon SS. Benefícios da permanência de participação da mãe no cuidado ao filho hospitalizado. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(4):856-64. ), considerando-se os pais parceiros nos cuidados relacionados à criança.

Na presente investigação, o entendimento é que a delegação de alguns cuidados não significa desresponsabilização profissional, pois implica supervisão e compartilhamento de cuidados, com oportunidade para identificar dificuldades e efetuar promoção da saúde.

A produção do cuidado com a criança no hospital exige parceria e consideração por outros saberes (da família e da criança), a partir da ação dos sujeitos envolvidos no processo e para o fortalecimento das competências da família( 2121. Collet N. Sujeitos em interação no cuidado à criança hospitalizada: desafios para a Enfermagem Pediátrica. Rev Bras Enferm. 2012;65:7-8. ).

Considerações finais

Os paradigmas atuais de assistência à criança preconizam a presença dos pais nas unidades de saúde hospitalares, a sua participação na assistência e o envolvimento em todo o processo de vida da criança, reforçando a parentalidade, o fortalecimento da inserção dos sujeitos no cuidado e na prática dos direitos humanos.

Os pais estão ávidos de informação, valorizando todos os aspectos relativos ao estado de saúde da criança e o conhecimento das implicações que a doença pode ter no seu futuro. Os profissionais de saúde, ao terem uma perspectiva pouco clara daquilo que os pais valorizam, reduzem a possibilidade de resposta efetiva às suas necessidades, o que sugere contribuir para aumentar a ansiedade e insegurança dos pais.

É de fundamental importância que os profissionais de saúde se apropriem dessas mudanças e de novos conhecimentos para incorporarem nas suas práticas estratégias promotoras do envolvimento e da participação dos pais nos cuidados de saúde, de acordo com as necessidades de cada criança e família, compartilhando saberes, promovendo saúde e contribuindo para cuidados humanizados e de qualidade.

Este trabalho constitui um contributo para o conhecimento do envolvimento dos pais nos cuidados ligados à saúde da criança hospitalizada, sendo necessário continuar a investigar, nomeadamente sobre estratégias promotoras do envolvimento, bem como considerar a perspectiva do envolvimento das crianças nos seus cuidados de saúde.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    26 Maio 2013
  • Aceito
    06 Jan 2014
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