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Necessidades em saúde: a interface entre o discurso de profissionais de saúde e mulheres vitimizadas1 1 Artigo extraído da tese de doutorado "Violência de gênero e necessidades em saúde: limites e potencialidade da Estratégia Saúde da Família", apresentada ao Programa Interunidades de Pós-graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo e Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil. Apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasil, processo nº 402519/2008-6 e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Brasil, processo nº 2012/2442-0.

Resumos

Objetivo:

compreender os limites e as possibilidades avaliativas da Estratégia Saúde da Família no que tange ao reconhecimento de necessidades em saúde de mulheres que vivenciam violência.

Método:

trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, fundamentado na perspectiva de gênero e que adotou necessidades em saúde como categoria analítica. Os dados foram coletados por entrevistas com profissionais de saúde e mulheres usuárias de um serviço de saúde e analisados a partir do método de análise do discurso.

Resultados:

o encontro entre os discursos de mulheres usuárias e de profissionais do serviço de saúde revelaram como interface necessidades propriamente humanas, a exemplo da autonomia e do vínculo. A compreensão sobre necessidades limitada ao reconhecimento de agravos de ordem física ou psíquica, assim como a predominância do reconhecimento de necessidades de manutenção da vida à frente das necessidades propriamente humanas revelaram-se nos discursos dos profissionais como importantes limitações das práticas.

Conclusão:

destaca-se a perspectiva de gênero enquanto ferramenta que deve ser agregada ao cotidiano das práticas profissionais em saúde para confirmar ou negar o caráter transformador da assistência em vigor no que concerne ao reconhecimento e enfrentamento das necessidades em saúde das mulheres.

Violência Contra a Mulher; Programa Saúde da Família; Determinação de Necessidades de Cuidados de Saúde


Objective:

to understand the limits and the evaluative possibilities of the Family Health Strategy regarding the recognition of the health needs of women who experience violence.

Method:

a study with a qualitative approach, grounded in the perspective of gender, and which adopted health needs as the analytical category. The data were collected through interviews with health professionals and women who made use of a health service, and were analyzed using the method of discourse analysis.

Results:

the meeting between the discourses of women who use the services and the professionals of the health service revealed, as the interface, human needs, as in the example of autonomy and of bonds. The understanding regarding the needs was limited to the recognition of health problems of physical and psychological natures, just as the predominance of the recognition of needs for maintaining life in the light of essentially human needs was revealed in the professionals' discourses as an important limitation of the practices.

Conclusion:

emphasis is placed on the perspective of gender as a tool which must be aggregated to the routine of the professional practices in health so as to confirm or deny the transformative character of the care in place regarding the recognition and confronting of the women's health needs.

Violence Against Women; Family Heath Program; Needs Assessment


Objetivo:

comprender los límites y las posibilidades evaluativas de la Estrategia Salud de la Familia en lo que se refiere al reconocimiento de necesidades de la salud de mujeres que experimentan violencia.

Método:

se trata de un estudio de abordaje cualitativo, fundamentado en la perspectiva de género y que adoptó necesidades de la salud como categoría analítica. Los datos fueron recolectados a través de entrevistas con profesionales de la salud y mujeres usuarias de un servicio de salud y analizados a partir del método del análisis del discurso.

Resultados:

el encuentro entre los discursos de mujeres usuarias y de profesionales del servicio de salud reveló como puntos en común necesidades propiamente humanas, por ejemplo la autonomía y el vínculo. La comprensión sobre necesidades limitada al reconocimiento de daños de orden física o psíquica, así como la predominancia del reconocimiento de necesidades del mantenimiento de la vida al frente a las necesidades propiamente humanas se revelaron en los discursos de los profesionales como importantes limitaciones de las prácticas.

Conclusión:

se destaca la perspectiva de género como una herramienta que debe ser agregada a lo cotidiano de las prácticas profesionales de la salud para confirmar o negar el carácter transformador de la asistencia en vigor, en lo que concierne al reconocimiento y enfrentamiento de las necesidades de la salud de las mujeres.

Violencia Contra La Mujer; Programa Salud de La Familia; Evaluación de Necesidades


Introdução

No Brasil, a Estratégia Saúde da Família (ESF) tem constituído a pedra angular para a viabilização do Sistema Único de Saúde (SUS), facilitando a aproximação entre profissionais de saúde e clientela de áreas de abrangência definidas descortinando, dessa forma, problemas que anteriormente permaneciam na desinformação dos serviços, a exemplo da violência de gênero(11. Oliveira CC, Fonseca RMGS. Práticas dos profissionais das equipes de saúde da família voltadas para as mulheres em situação de violência sexual. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(4): 605-12.). No coletivo, essa estratégia representa o marco mais fértil de implementação das práticas em saúde coletiva no Brasil, configurando-se como o locus privilegiado para o reconhecimento de necessidades em saúde que, articulados às demais instâncias da rede de atenção a saúde, buscam atender a essas necessidades(22. Egry EY, Oliveira MAC, Ciosak SI, Maeda ST, Barrrientos DMS, Fonseca RMGS et al. Instrumentos de avaliação de necessidades em saúde aplicáveis na estratégia de Saúde da Família. Rev Esc Enferm USP. 2009; 43(spe2):1181-6. ).

No âmbito da atenção à saúde das mulheres, a ESF constitui espaço de concretização da Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher (PNAISM). A atenção à saúde, considerando as desigualdades de gênero, assim como o reconhecimento e enfrentamento de necessidades que vão além da especificidade biológica e reprodutiva, considerando as especificidades sociais, são princípios que norteiam a atual política. Entretanto, os processos de trabalho que concretizam essas políticas têm sido contraditórios, uma vez que as práticas acabam se traduzindo, na maior parte das vezes, no atendimento de aspectos biológicos do corpo feminino(33. D'Oliveira AFPL, Schraiber LB, Hanada HDJ. Atenção integral à saúde de mulheres em situação de violência de gênero: uma alternativa para a atenção primária em saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(4):1037-50.).

No que concerne à saúde das mulheres, a vulnerabilidade feminina diante de certos agravos está mais relacionada com a situação de discriminação na sociedade do que a fatores biológicos. A construção histórica e social das relações de gênero tem imputado às mulheres condições de vida precárias e subalternas, determinantes significativos de seu processo saúde-doença. Os níveis de pobreza e condições de vida na sociedade se transformam, ao longo da história, com uma tendência desfavorável às mulheres. Esse processo, é permeado pela a subvalorização do trabalho feminino, pelo aumento do número de mulheres chefes de família, constituindo o maior número de famílias pobres na sociedade, pela violência de gênero e pela sobrecarga da tripla jornada de trabalho. Esses fenômenos, exemplificam processos destrutivos na vida das mulheres, que têm estreita relação com as suas necessidades em saúde(44. Guedes RN, Fonseca RMGSo, Egry EY. Limites e possibilidades avaliativas da estratégia saúde da família para a violência de gênero. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(2):304-11.).

A violência de gênero, embora se caracterize como um fenômeno relacional entre homens e mulheres, incide principalmente sobre as mulheres, constituindo uma questão de saúde. Estima-se (55. Minayo MCS. A inclusão da violência na agenda da saúde: trajetória histórica. Ciênc Saúde Coletiva. 2006;11:1259-67.) que esse problema seja maior causa de mortes em mulheres de 15 a 44 anos que o câncer, a malária, os acidentes de trânsito e as guerras. Ainda há uma estimativa brasileira de que pelo menos 35% das queixas que as mulheres levam aos serviços de saúde estejam relacionadas com algum tipo de violência(55. Minayo MCS. A inclusão da violência na agenda da saúde: trajetória histórica. Ciênc Saúde Coletiva. 2006;11:1259-67.).

Mulheres que vivenciam violência apresentam problemas e necessidades de saúde particulares, de modo que as práticas em saúde voltadas para elas devem tomar como objeto de trabalho as necessidades geradas por processos de vida comuns a esse grupo social. Considera-se que o trabalho para reconhecer e atender às necessidades de saúde das mulheres que vivenciam violência deve pressupor a desnaturalização das desigualdades entre os sexos e promover o empoderamento das mulheres.

Estudo realizado no Município de São Paulo, em dezenove serviços de atenção primária, nos quais foram ouvidas 3.193 mulheres, mostrou que a vivência de violência física e/ou sexual por parceiro íntimo na vida foi de 45,3% das mulheres, de modo que uma em cada três mulheres usuárias já havia sofrido violência na vida(66. Schraiber LB, D'Oliveira AFPL, Couto MT, Hanada H, Kiss LB, Durand JG, et al. Violência contra mulheres entre usuárias de serviços públicos de saúde da Grande São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41(3):359-67. ). No entanto, a violência ainda consiste um fenômeno invisibilizado enquanto demanda nesses serviços. Estudo que investigou as práticas profissionais da ESF voltadas para mulheres que vivenciam violência(11. Oliveira CC, Fonseca RMGS. Práticas dos profissionais das equipes de saúde da família voltadas para as mulheres em situação de violência sexual. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(4): 605-12.), detectou que os profissionais reconhecem a importância de acolher as mulheres que trazem essa demanda, porém se sentem impotentes e temerosos em se envolver com a situação. Essa impotência é reiterada em diversos outros estudos com recorte semelhante quando se referem a atitudes e práticas profissionais relacionados à violência de gênero(77. Fonseca RMGS, Leal AERB, Skubs T, Guedes RN, Egry EY. Domestic violence against women from the perspective of the community health agent. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(6):974-80.-88. Schraiber LB. Necessidades de saúde, políticas públicas e gênero: a perspectiva das práticas profissionais. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2635-44.) .

Diante do exposto, argumenta-se que na perspectiva de uma prática generificada(99. Fonseca RMGS, Guedes RNG, Pereira KCM, ZALAF Pesquisa de gênero na produção de enfermagem: contribuição do Grupo de Pesquisa Gênero, Saúde e Enfermagem da EEUSP. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(esp2):1690-5. ) de atenção à saúde encontram-se as diversas possibilidades de investigação que o universo das mudanças na área de saúde e a perspectiva de gênero comportam. Neste estudo, destacamos as mudanças que se operam no âmbito da atenção às necessidades em saúde das mulheres que vivenciam violência, em São Paulo.

O presente estudo teve por objetivo compreender os limites e as possibilidades avaliativas da Estratégia Saúde da Família no que tange ao reconhecimento de necessidades em saúde de mulheres que vivenciam violência.

Método

Tratou-se de um estudo de abordagem qualitativa, realizado em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) que opera sob a Estratégia Saúde da Família (ESF), localizada no distrito de Capão Redondo, em São Paulo (SP). Trata-se de uma região com altos índices de violência de todos os tipos e baixa qualidade de vida.

Os dados foram coletados por meio de entrevistas em profundidade com 22 profissionais de saúde que compunham as equipes multiprofissionais e com 13 mulheres usuárias do serviço que vivenciaram situações de violência de gênero, selecionados segundo diferentes critérios de inclusão: entre os profissionais de saúde, buscou-se a inclusão de pelo menos um profissional de cada categoria das cinco equipes integrantes da UBS que constituiu o cenário do estudo, respeitados o interesse e a disponibilidade para participar do estudo. Entre as mulheres usuárias, foram convidadas aquelas que, no período destinado a essa etapa específica de coleta de dados, aguardavam algum tipo de atendimento na sala de espera do serviço de saúde. Aquelas que, ao tomarem conhecimento da pesquisa, manifestaram interesse em participar, tiveram entrevista agendada, para um momento posterior. As entrevistas foram realizadas pela pesquisadora, individualmente, em uma sala de atendimento do serviço de saúde e, posteriormente, gravadas, transcritas e submetidas à análise do discurso.

O estudo adotou como referencial teórico o campo conceitual da Saúde Coletiva, tendo como base a concepção marxiana de necessidades(1010. Heller A. Teoria de las necesidades en Marx. 2. ed. Barcelona: Penínsola; 1986.) e o recorte de gênero na determinação do processo saúde-doença das mulheres. Para o recorte apresentado no presente artigo, os resultados foram analisados segundo a categoria analítica necessidades em saúde.

O estudo teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (Processo 822/2009/CEP/EEUSP).

Resultados

A partir da análise dos depoimentos de mulheres e profissionais de saúde, foram identificados os temas emergentes a partir dos núcleos de sentido do texto que permitiam a organização dos blocos temáticos de significação que orientaram a construção das categorias empíricas apresentadas a seguir.

A violência de gênero e sua relação com as necessidades relacionadas às condições de vida na compreensão dos profissionais de saúde

A análise dos depoimentos revela o reconhecimento de necessidades relacionadas à manutenção da vida como moradia, trabalho, alimentação, hábitos, entre outros, conforme revelam os depoimentos que seguem.

Assistência em relação à alimentação e à renda [...] e conseguir moradia (Profissional 4).

Ela tem necessidade de segurança [...] (Profissional 2).

Ela precisa primeiro parar com a droga que ela usa e melhorar também a alimentação (Profissional 1).

Ela tem vícios que não consegue largar porque vive praticamente dentro de uma "boca" (Profissional 1).

Uma região onde tem muito bandido e ela morre de medo que ele mate a mãe dela. Então, ela fica se sujeitando a esse indivíduo [...]. É um bandido muito procurado (Profissional 3).

A família, a situação em que vive, o contexto da casa, as condições [...]. Se tem uma boa alimentação (Profissional 3).

A estrutura familiar foi relacionada às necessidades em saúde, destacando, entre os casos, famílias em que outros membros vivenciam violência doméstica; mulheres que negligenciam o cuidado com a casa e com os filhos; membros da família com transtorno mental; gravidez na adolescência e conflitos familiares.

São várias situações que geram essa violência, não é só o desemprego. É muita coisa, a desestrutura familiar, a mãe que abandonou o pai com vários filhinhos, o filho que é bandido [...] (Profissional 7).

Alguns entrevistados apontaram para significados que culpabilizam as mulheres como responsáveis pela violência vivenciada.

A mulher se sujeita a muitas coisas por conta de gostar de alguém. Essa atitude tem que ser mudada, elas têm que começar a se valorizar [...] só apanha mesmo quem quer, ela podia deixar essa pessoa (Profissional 13).

Por outro lado, alguns discursos também revelaram possibilidades de reconhecimento de necessidades relacionadas a condições de vida mais vinculadas aos determinantes sociais.

Necessidades sociais [...] por não ter um componente orgânico grave. É mais um reflexo de uma questão social doentia, onde o paciente acaba perdendo o sono por que não consegue administrar a pouca renda que tem, etc. (Profissional 20).

A autonomia como necessidade estruturante para o enfrentamento da violência

Os discursos apontaram, em alguns aspectos, o reconhecimento pelos profissionais de saúde de necessidades que remetem à autonomia. Os significados trazidos nos relatos conformam essa necessidade relacionada à mulher como sujeito de sua vida, assim como à necessidade de fortalecimento para o manejo dos conflitos.

Foi constatado também o reconhecimento por alguns profissionais de necessidades que remetem a condições que potencializam o fortalecimento e a autonomia das mulheres como imprescindíveis para o enfrentamento da violência, a exemplo da autoestima, assim como das necessidades relacionadas à produção social como condição para autonomia e libertação das mulheres.

Necessidade de manejo dos conflitos para que possam se tornar um aprendizado e um desafio para que ela continue dando conta da vida (Profissional 21).

O caso da dependência financeira, tentar com a assistente social outras atividades para ela poder produzir, não ficar dependente do marido [...] (Profissional 22).

Depoimentos de mulheres que vivenciam violência também revelaram a produção social como necessidade intrinsecamente relacionada à autonomia e ao enfrentamento da situação de opressão que marca sua reprodução social.

Preciso de um trabalho [...]. No momento, a minha única solução é viver ao lado dele do jeito que eu estou vivendo. Esperar o bebê nascer, procurar um emprego e ver o que eu faço. Vai ser complicado, com um bebê (Usuária 11).

A medicalização das necessidades em saúde: a mobilização do saber biologicista como instrumento de trabalho em saúde na atenção às mulheres vitimizadas

Quando não reduzidas ao corpo, as necessidades foram traduzidas em necessidades relacionadas à saúde mental, revelando ainda o enfoque fragmentado e fatorial da saúde pública na ótica dos serviços de saúde.

A saúde da mulher está bem. Ela só é magrinha. O exame dela hoje estava tudo bem, não deu anemia, não deu nada. Ela vive rindo [...] Mas, se ela quer marcar (consulta) toda semana, quem sou eu para impedir? (Profissional 7).

Precisava passar no psicólogo por causa do choro [...] tomar alguma medicação, ela não tá dormindo (Profissional de saúde 5).

Os resultados apresentados revelam que mesmo quando a mulher verbaliza para o profissional de saúde a violência sofrida, ou que este a identifique de outras formas, como pelas lesões físicas, conforme constatamos, o profissional não toma o problema como demanda do campo da saúde.

Me senti desamparado em não saber lidar com a situação, por que a questão é mais social do que médica e como a gente não tem serviço social aqui no PSF, a gente fica meio perdido, a gente acaba sendo um "tapa buraco" (Profissional 5).

Os depoimentos também revelaram sentimento de impotência dos profissionais de saúde diante de problemas e necessidades que fogem à lógica medicalizadora dominante, conforme retrata o depoimento a seguir.

Uma sensação de "opa!" precisaria de outras medidas para um resultado, para que aquela pessoa tivesse uma vida mais digna [...] Eu me sinto sem medida para poder ajudar em vários casos (Profissional 20).

A dimensão relacional do trabalho em saúde: O vínculo enquanto possibilidade de fortalecimento das mulheres vitimizadas

A dimensão relacional do trabalho em saúde foi enfatizada nos discursos como necessidade relacionada à escuta e à criação de vínculos enquanto possibilidade de fortalecimento das mulheres que vivenciam violência. Nesta pesquisa, parte significativa dos profissionais, assim como das mulheres usuárias do serviço, refere-se à necessidade das mulheres que vivenciam violência de ter em quem possam confiar, que possam ouvi-las e acolhê-las no serviço de saúde.

Às vezes ela pensa que tá doente, marca consulta, vem aqui, às vezes ela vem aqui e diz que acha que tá com dor na barriga, mas na verdade eu acho que ela quer é conversar [...] (Profissional 7).

[...] sempre arranjava alguma situação para vir, acho que para sair de casa, ter um apoio (Profissional de saúde 10).

Precisa de um espaço que ela possa trocar as suas experiências com as de outras pessoas (Profissional 21).

Nos discursos das mulheres, a escuta e o vínculo também emergiram como necessidades em saúde sentidas e reconhecidas.

Esse posto já me ajuda porque, a partir da hora que eu saio de casa, eu sou tão feliz. E só saio de casa para vir no posto ou pegar leite pro menino (Usuária 10).

Eu tô precisando mesmo de uma pessoa que entenda, eu sou difícil de chorar, de me abrir com alguém, é muito difícil [choro] (Usuária 7).

Nos discursos das mulheres, a superação de traumas, o respeito, a alegria e a felicidade foram necessidades reconhecidas com possibilidades de potencialização a partir do acolhimento, vínculo e escuta no serviço de saúde. A partir desse aspecto, compreendemos que, ao falar de necessidades sentidas, as mulheres enfatizam necessidades propriamente humanas, assim como valorizam a face humana das práticas profissionais ao referirem-se à necessidade em saúde.

O que eu mais precisava era que as pessoas me respeitassem e eu tivesse paz na minha vida. Eu peço a Deus todo dia. Eu queria ter alegria (Usuária 5).

Precisava tirar da minha mente. Quero voltar a ter uma vida normal, ser uma pessoa alegre, feliz (Usuária 4).

Discussão

A análise dos depoimentos revela que o reconhecimento das necessidades pelos profissionais de saúde remete às condições de vida como determinantes do processo saúde-doença, porém limitam seu significado a condições externas ao ser humano, mediante uma compreensão multifatorial de meio ambiente.

A estrutura familiar, reconhecida pelos profissionais de saúde como determinante da violência, concretiza grande parte da reprodução social, de modo que os profissionais compreendem sua composição desestruturada como um aspecto relacionado também à determinação da violência e se relaciona a condições de vida comuns entre as famílias do território de abrangência do cenário do estudo. Também é observada a responsabilização das mulheres por essa determinação advinda de uma estrutura familiar que sai dos moldes da família nuclear ideal, socialmente legitimada.

Alguns entrevistados apontaram para a determinação da violência centrada na dimensão singular, em que a mulher, ou a situação é compreendida como causa ou desencadeante da violência, numa visão acrítica e desgenerificada do problema. Os significados revelados nos depoimentos desvelam as condições de vida cerceadas por uma compreensão centrada no indivíduo, em sua dimensão singular.

No discurso dos profissionais, constatou-se que as necessidades em saúde estão relacionadas a condições de vida precárias, desemprego, falta de acesso a renda, moradia, alimentação e dependência química. Os achados despontam fortemente as condições sociais de exclusão às quais estão submetidas famílias que vivem nas periferias das grandes cidades.

Assim, necessidades relacionadas e produzidas nessa estrutura social são passíveis de captação, mesmo antes da expressão individual que se apresenta travestida em demanda no serviço de saúde. Mediante os processos de desgaste evidenciados no território, esta característica deve ser o fundamento de toda a organização das práticas no sentido de superar o modelo vigente de atenção medicalizada, fragmentada e individualista.

Os discursos remeteram à autogestão pessoal, à motivação interna individual e à tomada de decisão como necessidades que se relacionam à autonomia para a emancipação da opressão feminina. Entretanto, nessa noção, pode estar implícito o risco de reducionismo, que se traduz na desresponsabilização do serviço em relação ao problema.

Os significados trazidos nos relatos conformam a autonomia enquanto necessidade relacionada à mulher como sujeito de sua vida, assim como à necessidade de fortalecimento para o manejo dos conflitos. Em vários depoimentos, a autonomia apareceu relacionada à conquista da independência financeira e do trabalho no mundo público e revelou-se como necessidade das mulheres para sua transformação e libertação da opressão e violência. Esse foi um aspecto convergente com os discursos dos profissionais. Ao revelar um discurso que aponta para a autonomia, os entrevistados superam a compreensão de necessidades de manutenção da vida, apontando para necessidades propriamente humanas, o que significa um recorte de objeto que se amplia, indicando uma qualidade que se revela nos discursos, ainda que nos limites anteriormente mencionados.

Estudos demonstram que as mulheres que vivenciam violência têm algo a mais a dizer além das queixas que trazem aos serviços de saúde, ou seja, nas relações de gênero, a dominação masculina tenta impor silêncio às mulheres envolvidas em relações violentas, de modo que, quando buscam os serviços de saúde, trazem um discurso indireto e quase sempre falam de outras queixas(44. Guedes RN, Fonseca RMGSo, Egry EY. Limites e possibilidades avaliativas da estratégia saúde da família para a violência de gênero. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(2):304-11., 88. Schraiber LB. Necessidades de saúde, políticas públicas e gênero: a perspectiva das práticas profissionais. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2635-44.). Esse aspecto pode ser explicado também pelas respostas que as mulheres, historicamente, têm recebido dos serviços de saúde, de modo que, quando suas necessidades são traduzidas em demandas por assistência a agravos instalados, os serviços instauram essas necessidades às mulheres. Assim, elas mesmas as traduzem em demandas físicas no intuito de serem acolhidas pelo serviço.

As necessidades em saúde trazidas pelas mulheres foram reconhecidas pelos profissionais como demandas relacionadas às necessidades de assistência a agravos de ordem física, o que traduzimos no que pode ser denominado de medicalização das necessidades em saúde. Os relatos apontam para o reconhecimento de necessidades reduzidas à saúde reprodutiva das mulheres, num recorte individual. Foi significativa a menção à necessidade de atendimento especializado em saúde mental, revelando o que outras pesquisas também apontam a dicotomia mente-corpo no trabalho em saúde(33. D'Oliveira AFPL, Schraiber LB, Hanada HDJ. Atenção integral à saúde de mulheres em situação de violência de gênero: uma alternativa para a atenção primária em saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(4):1037-50.,88. Schraiber LB. Necessidades de saúde, políticas públicas e gênero: a perspectiva das práticas profissionais. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2635-44.,1111. Oliveira CC, Fonseca RMGS. Health family professionals' practices toward women in sexual violence situations. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(4):605-12.) . Desse modo, quando um problema não está inscrito no corpo ou foge à lógica medicalizadora, como acontece com a violência, está inscrito na mente e requer atenção específica na área de saúde mental.

A medicalização revelada nos depoimentos pode se traduzir em uma maior prescrição de analgésicos, tranquilizantes e encaminhamentos para serviços de saúde mental para mulheres que vivem em situação de violência, ainda que o diagnóstico não seja registrado. Desse modo, como a raiz do problema não é tematizada, estas condutas podem acabar por fortalecer processos destrutivos, além de não ajudar o enfrentamento do problema(33. D'Oliveira AFPL, Schraiber LB, Hanada HDJ. Atenção integral à saúde de mulheres em situação de violência de gênero: uma alternativa para a atenção primária em saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(4):1037-50.).

A medicalização, identificada nos discursos dos profissionais, ao falarem sobre necessidades reconhecidas, não foi convergente com os discursos das mulheres ao falarem sobre necessidades sentidas. Portanto, os resultados apresentados revelam que, mesmo quando a mulher verbaliza para o profissional de saúde a violência sofrida, ou que este a identifique de outras formas, como pelas lesões físicas, o profissional não toma o problema como demanda do campo da saúde.

Os discursos remetem a significados que relacionam problemas sociais como atribuição de serviços específicos dessa área, compreendendo que, quando atua nesses aspectos, o profissional de saúde está preenchendo uma lacuna que não seria sua atribuição. Assim, pensar em necessidades em saúde de mulheres que vivenciam violência como necessidades isoladas nos indivíduos e nas famílias e, ainda, como problema social cuja atenção compete a outros campos e não ao da saúde, é permanecer numa situação abstrata que desconsidera e não intervém no enfrentamento dos determinantes da saúde.

A Saúde Coletiva constitui o campo teórico-prático que articula as ciências da saúde com as ciências sociais, sendo uma área que se ocupa dos aspectos sociais relacionados ao processo saúde-doença, que interagem, dialeticamente, com os aspectos biológicos, psíquicos e subjetivos. Questiona o reducionismo que naturaliza o social e reproduz a interpretação medicalizante do adoecimento e das ações em saúde, interpretando e atuando sobre os determinantes da saúde nas dimensões singular (individual), particular (dos grupos) e estrutural (da estrutura política e ideológica da sociedade mais ampla) da realidade.

Divergindo desse quadro interpretativo, a realidade medicalizadora, captada nos discursos aqui apresentados, reproduz o saber instrumental biologicista e multifatorial, centrado no indivíduo e na doença. Além disso, a violência aparece sob uma compreensão desgenerificada e naturalizada. Essa realidade resulta de todo um processo histórico de construção da atenção à saúde na nossa sociedade e por consequência, de uma formação acadêmica ainda nos moldes biomédicos e androcêntricos.

Mesmo quando enunciada, a violência doméstica não é reconhecida, nem tomada na definição de necessidades pelos profissionais de saúde para o trabalho, já que não existem ações técnicas previstas para isto(44. Guedes RN, Fonseca RMGSo, Egry EY. Limites e possibilidades avaliativas da estratégia saúde da família para a violência de gênero. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(2):304-11.). Se, por um lado, as mulheres que vivenciam violência buscam os serviços de saúde trazendo demandas sobre outras queixas, por outro, isso representa um desafio a ser alcançado pelos serviços de saúde: a tradução dessas demandas nas necessidades que as produzem, considerando a violência e a subalternidade de gênero como determinantes desse processo. Esses achados reforçam a importância do desenvolvimento de medidas de reconhecimento da violência e das necessidades por ela produzidas nas diversas instâncias de atenção às mulheres. Os relatos dos profissionais revelam a impotência sentida ao se depararem com a violência enquanto problema que foge do campo de ação fundado sob a lógica medicalizadora da saúde.

Neste estudo, a interface entre o discurso de profissionais de saúde da ESF e as mulheres vitimizadas pela violência de gênero, no que concerne ao reconhecimento de necessidades em saúde, revela as necessidades relacionadas à autonomia, ao vínculo e à escuta como aspectos comuns nos discursos de profissionais de saúde e mulheres vitimizadas. Esse aspecto aponta para as necessidades propriamente humanas na intersecção entre os significados que as necessidades em saúde assumem para os dois grupos de sujeitos. No que concerne às mulheres vitimizadas, foi predominante o reconhecimento das necessidades propriamente humanas (paz, superação de traumas, felicidade, alegria, vida sem violência). As necessidades medicalizadas, as relacionadas às condições de vida e à manutenção da vida, reveladas nos discursos de profissionais de saúde, não foram identificadas nos discursos das usuárias do serviço.

A partir dos vínculos estabelecidos entre profissionais e usuárias, determinados pelo atendimento contínuo e pela proximidade que a ESF possibilita, despontam possibilidades de captação da violência, das necessidades. Além disso, no diálogo e na escuta estabelecida nessa relação, há potência para a superação de traumas e o fortalecimento das mulheres. Fala-se em potência por não constituir uma lógica concreta operacionalizada em sua totalidade, constituindo ainda uma possibilidade na realidade objetiva dos serviços de saúde(44. Guedes RN, Fonseca RMGSo, Egry EY. Limites e possibilidades avaliativas da estratégia saúde da família para a violência de gênero. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(2):304-11.).

É importante que a escuta estabelecida no contato entre profissionais e usuárias não se traduza, na prática, em um simples diálogo que permeia a assistência. A escuta qualificada pressupõe a atenção integral, o olhar atento que na atenção às mulheres que vivenciam violência, deve ser mediado por um saber instrumental generificado, que apreenda as necessidades das usuárias, reconhecidas como sujeitos de sua existência e inseridas em uma sociedade que determina a subalternidade e a violência.

Considerações finais

Os discursos trazidos pelas mulheres vitimizadas e pelos profissionais de saúde desvelam divergências e convergências, revelando as necessidades propriamente humanas como interface dos significados que as necessidades em saúde assumem para esses sujeitos. As necessidades que remetem à autonomia feminina e ao vínculo na relação entre profissionais e mulheres usuárias do serviço, revelaram-se como aspectos comuns nos discursos. Entretanto, as entrelinhas dos depoimentos revelam uma lacuna na utilização das potencialidades dessa interface pelos profissionais de saúde.

As mulheres remetem a necessidades propriamente humanas não referenciadas pelos profissionais. Além disso, o reconhecimento de necessidades de boas condições de vida e necessidades medicalizadas traduzidas em agravos físicos pelos profissionais não foram aspectos significativos nos discursos das mulheres usuárias. No que concerne às condições de vida, em especial em um território permeado pela exclusão social e violência, o não reconhecimento das mulheres da relação entre condição de vida e necessidades em saúde pode estar relacionado à ausência de crítica sobre a relação entre saúde e sociedade, refletindo uma visão idealizada que resulta da construção histórica do feminino na sociedade.

A medicalização das necessidades em saúde, assim como a predominância das necessidades existenciais à frente das propriamente humanas revelam um desencontro entre as necessidades das mulheres vitimizadas e sua compreensão pelos profissionais.

Assim, este estudo revela divergências, apontando para limites que devem ser considerados no planejamento de uma atenção à saúde efetiva para este grupo social específico e possibilidades que devem ser aprofundadas e fortalecidas enquanto potência para a prevenção e o enfrentamento da violência de gênero no âmbito da saúde a partir da releitura das necessidades das mulheres vitimizadas.

É premente a necessidade de reconhecimento da violência enquanto problema e demanda cuja atenção é inerente aos serviços de saúde. A tradução das demandas trazidas pelas mulheres nas necessidades que a produziram representa um desafio a ser alcançado. O reconhecimento dessas necessidades pressupõe ainda considerar a violência e a subalternidade de gênero como generativos desse processo. Assim, o trabalho que qualifica a atenção à saúde das mulheres em situação de violência deve superar o modelo biomédico de atenção, limitado ao processo de reprodução biológica, que ainda caracteriza a maioria dos processos de trabalho das práticas em saúde da mulher, mantendo-se fiel à concepção positivista de ciência. A superação desse modelo implica rever a prática profissional, posto que, na perspectiva da emancipação da opressão das mulheres, o saber crítico sobre as necessidades em saúde como consequência da situação de opressão que a abordagem de gênero encerra um dos instrumentos que deve orientar todo o trabalho das práticas profissionais nessa área.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Abr 2015
  • Data do Fascículo
    Feb-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2013
  • Aceito
    03 Dez 2014
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