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Adesão ao tratamento em pacientes com insuficiência cardíaca acompanhados por enfermeiras em duas clínicas especializadas

Resumos

Objetivos:

analisar a adesão ao tratamento da insuficiência cardíaca (IC) em pacientes acompanhados pela equipe de enfermagem em clínicas especializadas e sua associação com características dos pacientes, tais como número de consultas anteriores, estrutura familiar e comorbidades.

Métodos:

estudo transversal realizado em duas clínicas de referência para o tratamento de pacientes com IC (centro 1 e centro 2). Os dados foram obtidos por meio de um questionário composto por 10 itens com escores variando de 0 a 26 pontos; a adesão foi considerada adequada se a pontuação fosse ≥18 pontos, ou 70% de adesão.

Resultados:

no total, 340 pacientes foram incluídos. A média do escore de adesão foi de 16 (±4) pontos. Além disso, 124 (36,5%) pacientes apresentaram uma taxa de adesão ≥70%. Demonstrou-se que os pacientes que viviam com suas famílias tiveram escores de adesão mais elevados, e que três ou mais consultas de enfermagem anteriores estavam significativamente associadas com uma adesão mais alta (p<0,001); a hipertensão estava associada com baixa adesão (p=0,023).

Conclusões:

a adesão ao tratamento foi considerada satisfatória em menos da metade dos pacientes acompanhados nas duas clínicas especializadas em IC. Viver com a família e comparecer a um grande número de consultas de enfermagem aumentaram a adesão, enquanto a presença de hipertensão levou a menor adesão.

Insuficiência Cardíaca; Enfermagem; Cooperação do Paciente


Objectives:

to analyze treatment adherence in heart failure (HF) patients followed up by the nursing staff at specialized clinics and its association with patients' characteristics such as number of previous appointments, family structure, and comorbidities.

Methods:

a cross-sectional study was conducted at two reference clinics for the treatment of HF patients (center 1 and center 2). Data were obtained using a 10-item questionnaire with scores ranging from 0 to 26 points; adherence was considered adequate if the score was ≥ 18 points, or 70% of adherence.

Results:

a total of 340 patients were included. Mean adherence score was 16 (±4) points. Additionally, 124 (36.5%) patients showed an adherence rate ≥ 70%. It was demonstrated that patients who lived with their family had higher adherence scores, that three or more previous nursing appointments was significantly associated with higher adherence (p<0.001), and that hypertension was associated with low adherence (p=0.023).

Conclusions:

treatment adherence was considered satisfactory in less than a half of the patients followed up at the two clinics specialized in HF. Living with the family and attending to a great number of nursing appointments improved adherence, while the presence of hypertension led to worse adherence.

Heart Failure; Nursing; Patient Compliance


Objetivos:

analizar la adherencia al tratamiento de la insuficiencia cardíaca (IC) en pacientes acompañados por el equipo de enfermería de clínicas especializadas y su asociación con las características de los pacientes, tales como número de consultas anteriores, la estructura familiar y las comorbilidades.

Método:

estudio transversal que se llevó a cabo en dos clínicas de referencia para el tratamiento de pacientes con IC (centro 1 y centro 2). Los datos fueron obtenidos a través de un cuestionario de 10 ítems con puntuaciones de 0 a 26 puntos; la adherencia al tratamiento se consideró adecuada si la puntuación era ≥18 puntos o 70% de adherencia.

Resultados:

un total de 340 pacientes fueron incluidos en el estudio. La puntuación media de adherencia fue de 16 (± 4) puntos. Además, 124 (36,5%) pacientes tuvieron una tasa de adherencia ≥70%. Se demostró que los pacientes que vivían con sus familias tuvieron puntajes más altos de adherencia al tratamiento, tres o más consultas anteriores de enfermería se asociaron significativamente con una adherencia mayor (p <0,001); la hipertensión se asoció con la baja adherencia (p = 0,023).

Conclusiones:

la adherencia al tratamiento se consideró satisfactoria en menos de la mitad de los pacientes tratados en las dos clínicas especializadas en IC. Vivir con la familia y asistir a un gran número de consultas de enfermería aumentó la adherencia al tratamiento, mientras que la presencia de hipertensión llevó a disminuir la adherencia.

Insuficiencia Cardíaca; Enfermería; Cooperación del Paciente


Introdução

A insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome complexa que resulta em um número considerável de hospitalizações, o que pode estar relacionado com a adesão inadequada ao tratamento e também com a dificuldade em reconhecer os sinais e sintomas da descompensação da doença( 1. Mangini S, Silveira FS, Silva CP, Grativvol PS, Seguro LFBC, Ferreira SMA, et al. Insuficiência cardíaca descompensada na unidade de emergência de hospital especializado em cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2008 Jun;90(6):433-40. ). Analisar a adesão dos pacientes ao tratamento é essencial para identificar os fatores que podem interferir com suas escolhas e implementar estratégias iniciais para reduzir crises de descompensação da IC e consequentes hospitalizações não planejadas( 2. Gusmão JL, Ginani GF, Silva GV, Ortega KC, Junior DM. Adesão ao tratamento em hipertensão arterial sistólica isolada. Rev Bras Hipertens. 2009;16(1):38-43. ).

Compreender a adesão dos pacientes e dos profissionais é um processo complexo que vai do cumprimento e acompanhamento do tratamento prescrito, incluindo o envolvimento dos pacientes na definição de seu plano de cuidados, à busca do bem-estar e saúde, representada por mudanças no estilo de vida que incluem o comparecimento às consultas e um maior controle da medicação( 3. Gusmão JL, Junior DM. Adesão ao tratamento-conceitos. Rev Bras Hipertens. 2006;13(1):23-5. ).

Uma revisão sistemática que teve por objetivo identificar e resumir a eficácia de estratégias de intervenção para melhorar a adesão à medicação em uma população de pacientes com IC concluiu que há pouca evidência sobre estratégias que isoladamente melhorem a adesão ao tratamento( 4. Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo MET. Interventions to Enhance Adherence to Medications in Patients with Heart Failure: a systematic review. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5:126-33. ). Este resultado indica que a adesão deve ser considerada uma questão multifatorial pela equipe de enfermagem, uma vez que vários fatores podem estar envolvidos nesse comportamento, tais como regime terapêutico, aspectos socioeconômicos, problemas cognitivos e comorbidades associadas( 5. Sabaté E. Adherence to long-term therapies: evidence for action. Geneve: World Health Organization; 2003. ).

Em relação ao regime terapêutico, o uso de estratégias educativas implementadas pelos enfermeiros para melhorar o conhecimento dos pacientes com IC sobre a doença, tratamento e adesão ao tratamento pode ter um efeito positivo, como observado em um estudo prospectivo de uma coorte ambulatorial de 308 pacientes com IC em três hospitais universitários localizados na região metropolitana de Atlanta, que constatou que várias recomendações de autocuidado estavam associadas com melhores taxas de adesão e um número menor de hospitalizações por todas as causas( 6. Marti CN, Georgiopoulou VV, Giamouzis G, Cole RT, Deka A, Tang WHW, Dunbar SB et al. Patient-Reported elective Adherence to Heart Failure Self-Care. Congest Heart Fail. 2013 Jan-Feb;19(1):16-24. ).

Ao longo das últimas décadas, clínicas de IC têm feito muitos esforços para educar os pacientes sobre a doença, tratamento e adesão. Basicamente, este conceito de educação do paciente tem sido implementado em vários centros em todo o mundo nos últimos 20 anos para melhorar esses aspectos e reduzir as altas taxas de hospitalização( 4. Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo MET. Interventions to Enhance Adherence to Medications in Patients with Heart Failure: a systematic review. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5:126-33. ).

Embora vários estudos tenham sido publicados sobre as baixas taxas de adesão em pacientes internados com IC descompensada, pouco se sabe sobre a adesão ao tratamento em pacientes com IC acompanhados em clínicas especializadas que têm aplicado esta abordagem durante as últimas duas décadas. Este estudo preenche esta lacuna no conhecimento da área de saúde, especialmente na área de enfermagem, uma vez que os enfermeiros têm um papel essencial nas intervenções educacionais e no monitoramento de sinais de descompensação( 4. Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo MET. Interventions to Enhance Adherence to Medications in Patients with Heart Failure: a systematic review. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5:126-33. ). Em vista disso, o objetivo da presente investigação foi analisar a adesão ao tratamento em pacientes com IC acompanhados pela equipe de enfermagem em clínicas especializadas e sua associação com características dos pacientes, tais como número de consultas anteriores, estrutura familiar e comorbidades.

Métodos

Delineamento do estudo

Estudo transversal realizado em duas clínicas especializadas no atendimento ambulatorial para pacientes com IC crônica acompanhados por enfermeiros.

Locais

O presente estudo foi realizado em instituições universitárias públicas localizadas nas cidades de Porto Alegre, região Sul do Brasil, e Niterói, região Sudeste do Brasil. A decisão de avaliar estes dois locais foi motivada pelas semelhanças entre as duas instituições, que combinam o ensino, a pesquisa e a assistência multidisciplinar especializada em pacientes com IC. A coleta de dados ocorreu de agosto de 2011 a dezembro de 2012 em Porto Alegre (centro 1) e de janeiro de 2012 a outubro de 2013 em Niterói (centro 2).

A pesquisa foi realizada em ambos os centros para determinar o número total de pacientes atendidos por semana durante o período de estudo. Os pesquisadores visitaram as clínicas nos dias agendados para consultas ambulatoriais para selecionar pacientes que preenchessem os critérios de inclusão. Antes da consulta, os pacientes foram convidados a participar do estudo e, posteriormente, leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A estratégia de amostragem de conveniência foi usada para selecionar pacientes que preenchessem os critérios de inclusão e concordassem em participar do estudo.

Participantes

A amostra incluiu pacientes adultos com diagnóstico de IC crônica que haviam comparecido a pelo menos uma consulta de enfermagem nos centros 1 e 2 nos últimos seis meses antes de serem incluídos no estudo e que apresentavam a capacidade de comunicação preservada. Nessas consultas, os enfermeiros orientam os pacientes sobre o conhecimento da IC, o autocuidado e a adesão ao tratamento. Os pacientes com comprometimento cognitivo registrado em seu prontuário médico e confirmado durante a aplicação do TCLE foram excluídos do estudo.

Variáveis e coleta de dados

Nós investigamos variáveis sociodemográficas, clínicas e de adesão ao tratamento. As variáveis sociodemográficas foram: idade, gênero, estrutura familiar (vivendo com a família, sozinho ou em clínicas geriátricas), escolaridade (anos de estudo), situação conjugal e renda mensal do paciente (renda familiar, se for o caso). As variáveis clínicas foram: peso corporal, tabagismo, tempo de progressão da doença, tempo de acompanhamento no ambulatório, classe funcional da New York Heart Association e comorbidades, como diabetes mellitus, insuficiência renal crônica, doença arterial coronariana, depressão, câncer e hipertensão. Também coletamos o número de consultas anteriores com a equipe de enfermagem nas clínicas especializadas, quando os pacientes recebiam intervenções educativas sobre conhecimento da doença, autocuidado e adesão ao tratamento.

A adesão ao tratamento foi avaliada por meio de um questionário composto por 10 itens desenvolvido e validado no Brasil para uso em pacientes com IC( 7. Bocchi EA, Cruz F, Guimarães G, Pinho Moreira LF, Issa VS, Ayub Ferreira SM, et al. A Long-term Prospective Randomized Controlled Study Using Repetitive Education at Six-Month Intervals and Monitoring for Adherence in Heart Failure Outpatients: The REMADHE Study Trial. Circ Heart Fail. 2008 Jul;1:10-18. ). As dez perguntas incluem uma sobre o uso de medicação, uma sobre o controle de peso, três sobre os hábitos alimentares, três sobre ingestão de líquidos, uma sobre o consumo de bebidas alcoólicas e uma sobre o comparecimento às consultas agendadas. A pontuação neste questionário variava de 0 a 26 pontos; quanto maior a pontuação, mais alta a adesão. A adesão foi considerada adequada se o paciente apresentou um escore igual ou maior a 18 pontos, correspondente a 70% de adesão( 8. Mussi CM, Ruschel K, Souza EN, Lopes ANM, Trojahn MM, Paraboni CC, et al. Home visit improves knowledge, self-care and adhesion in heart failure: randomized Clinical Trial HELEN-I. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2013; 21(spe number):20-8. ). A aplicação do questionário durou aproximadamente 15 minutos. A entrevista foi realizada pelo pesquisador antes da consulta, dependendo da disponibilidade do paciente. As consultas de enfermagem e a coleta de dados foram por meio de entrevistas com os pacientes conduzidas por pesquisadores adequadamente treinados. Todas as variáveis foram coletadas pelo testemunho verbal do paciente e verificadas no prontuário do mesmo dia da consulta.

Tamanho da amostra

O tamanho da amostra foi estimado em 340 pacientes, com base em um percentual de 52% de adesão encontrado em um estudo anterior com pacientes acompanhados em uma clínica de IC( 7. Bocchi EA, Cruz F, Guimarães G, Pinho Moreira LF, Issa VS, Ayub Ferreira SM, et al. A Long-term Prospective Randomized Controlled Study Using Repetitive Education at Six-Month Intervals and Monitoring for Adherence in Heart Failure Outpatients: The REMADHE Study Trial. Circ Heart Fail. 2008 Jul;1:10-18. ), considerando um nível de confiança de 95% e uma margem de erro de 5% e usando o software estatístico Winpepi (versão 11.1).

Aspectos éticos

Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de ambas as instituições sob os números de protocolo 11-0268 e 335-744.

Análise estatística

Os dados foram inseridos em um banco de dados no Microsoft Excel e analisados por meio do programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 19. As variáveis contínuas foram expressas como média e desvio padrão para aquelas com distribuição simétrica e mediana e amplitude interquartil para aquelas com distribuição assimétrica. As variáveis categóricas foram expressas como números absolutos e percentuais. A associação entre os escores de adesão e variáveis clínicas ou sociodemográficas foi analisada usando o teste Qui-Quadrado dePearson. A comparação estatística entre os grupos divididos de acordo com o ponto de corte para adesão foi feita utilizando o teste de Mann-Whitney para as variáveis clínicas quantitativas e o teste Qui-Quadrado dePearson para as variáveis categóricas. Valor de p bicaudal <0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

Características sociodemográficas e clínicas

Durante o período do estudo, 367 pacientes eram potencialmente elegíveis. Sete deles foram excluídos por ser a primeira consulta de enfermagem, uma não consentiu em participar do estudo e 20 pacientes apresentavam pelo menos um critério de exclusão. No total, 340 pacientes foram incluídos: 223 do centro 1 e 117 do centro 2. A Tabela 1 mostra as características sociodemográficas e clínicas da amostra.

Tabela 1
- Características sociodemográficas e clínicas da amostra (n=340). Porto Alegre, região Sul do Brasil, e Niterói, região Sudeste do Brasil, 2014

Adesão ao tratamento

A pontuação geral da adesão média foi de 16±4 pontos para todos os pacientes. Um total de 124 (36,5%) pacientes apresentou taxa de adesão igual ou superior a do ponto de corte (70% ou 18 pontos). Destes, 50% haviam comparecido a pelo menos quatro consultas de enfermagem antes da inclusão no estudo. Pelo menos 50% dos pacientes que apresentaram escores de adesão abaixo do ponto de corte, haviam comparecido a apenas uma consulta de enfermagem.

A Tabela 2 apresenta os pacientes divididos em dois grupos: um incluindo aqueles com adesão satisfatória (escore ≥18 pontos) e outro incluindo aqueles com baixa adesão (escore <18 pontos). Observou-se que pacientes com IC que viviam com suas famílias apresentaram escores de adesão mais elevados do que aqueles que viviam sozinhos ou em clínicas geriátricas. Três ou mais consultas de enfermagem anteriores foi significativamente associado com maior adesão (p<0,001). A presença de hipertensão como uma comorbidade foi associada com baixa adesão (p=0,023).

Tabela 2
- Comparação entre os escores de adesão e características sociodemográficas e clínicas. Porto Alegre, região Sul do Brasil, e Niterói, região Sudeste do Brasil, 2014

Respostas dos pacientes ao questionário de 10 itens

A Tabela 3 mostra as respostas dos pacientes às dez perguntas do questionário e a melhor resposta em termos de adesão.

Tabela 3
- Respostas de pacientes com insuficiência cardíaca às perguntas de um questionário sobre adesão ao tratamento. Porto Alegre, região Sul do Brasil, e Niterói, região Sudeste do Brasil, 2014

Discussão

Este estudo apresenta os resultados de uma análise sobre a adesão ao tratamento de pacientes acompanhados em duas clínicas especializadas em IC. Os resultados indicam que, apesar do local em que o estudo foi conduzido, a taxa de adesão não foi inteiramente satisfatória. Por outro lado, um achado muito positivo foi o fato de que a maior adesão ao tratamento foi associada com um maior número de consultas de enfermagem prévias e com viver com a família. A presença de hipertensão como uma comorbidade levou a menor adesão ao tratamento.

Diversos estudos têm discutido diferentes abordagens educacionais para melhorar a adesão ao tratamento dos pacientes com IC( 4. Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo MET. Interventions to Enhance Adherence to Medications in Patients with Heart Failure: a systematic review. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5:126-33. , 7. Bocchi EA, Cruz F, Guimarães G, Pinho Moreira LF, Issa VS, Ayub Ferreira SM, et al. A Long-term Prospective Randomized Controlled Study Using Repetitive Education at Six-Month Intervals and Monitoring for Adherence in Heart Failure Outpatients: The REMADHE Study Trial. Circ Heart Fail. 2008 Jul;1:10-18. , 9. Castro RA, Aliti GB, Linhares JC, Rabelo ER. Adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca em um hospital universitário. Rev Gaúcha Enferm. 2010 jun;31(2):225-31. - 1010 . Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo ME. Interventions to enhance adherence to medications in patients with heart failure. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5(1):126-33. ). Em um estudo realizado com 252 pacientes internados por IC, no Sul do Brasil, que tinham média de idade de 63±13 anos e eram predominantemente homens brancos, verificou-se que 112 (47%) pacientes relataram alta adesão ao tratamento farmacológico, enquanto apenas 45 (18%) aderiram ao tratamento não farmacológico. A adesão foi maior nos pacientes que tinham conhecimento sobre o manejo não farmacológico da doença, reforçando a importância de intervenções educacionais neste grupo( 9. Castro RA, Aliti GB, Linhares JC, Rabelo ER. Adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca em um hospital universitário. Rev Gaúcha Enferm. 2010 jun;31(2):225-31. ). Recentemente, um ensaio clínico em que os enfermeiros realizavam uma intervenção educativa composta por visitas domiciliares e telefonemas durante um período de acompanhamento de seis meses apresentou resultados positivos em termos de adesão, conhecimento e autocuidado( 8. Mussi CM, Ruschel K, Souza EN, Lopes ANM, Trojahn MM, Paraboni CC, et al. Home visit improves knowledge, self-care and adhesion in heart failure: randomized Clinical Trial HELEN-I. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2013; 21(spe number):20-8. ). Estes resultados corroboram nossa conclusão de que um maior número de consultas de enfermagem em clínicas especializadas leva a um escore de adesão ao tratamento mais elevado.

No presente estudo, o apoio da família foi apontado como um fator importante para uma melhor adesão ao tratamento, revelando que 88,5% dos pacientes do estudo viviam com a família. Houve evidência de que o apoio familiar é um preditor de adesão adequada e que o relacionamento familiar precário compromete o regime terapêutico complexo da IC( 1111 . Chung ML, Moser DK, Lennie TA, Riegel B. Spouses enhance medication adherence in patients with heart failure. Circulation. 2006;114(18):518.

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14 . Luttik ML, Jaarsma T, Veeger N, van Veldhuisen DJ. Marital status, quality of life, and clinical outcome in patients with heart failure. Heart Lung. 2006 Jan-Feb;35(1):3-8.
- 1515 . Dunbar SB, Clark PC, Quinn C, Gary RA, Kaslow NJ. Family influences on heart failure self-care and outcomes. J Cardiovasc Nurs. 2008 May-Jun;23(3):258-65. ). Acredita-se que o apoio social da família preserva a saúde mental e aumenta o bem-estar dos pacientes com IC, motivando assim a adesão ao tratamento.

Dentre as comorbidades avaliadas, a hipertensão foi associada com a pior adesão e representou o principal motivo para a procura de cuidados de saúde primários. Segundo a literatura, verificou-se que a baixa adesão é a razão principal para o fracasso do tratamento; em pacientes com hipertensão não controlada, a taxa de adesão ao tratamento é quase 50%( 1616 . Pucci N, Pereira MR, Vinholes DB, Pucci P, Campos ND. Conhecimento sobre hipertensão arterial sistêmica e adesão ao tratamento anti-hipertensivo em idosos. Rev Bras Cardiol. 2012 jul-ago;25(4):322-9. ). Além disso, cerca de 40 a 60% dos hipertensos não usavam os medicamentos prescritos adequadamente, percentual que foi ainda maior em relação a medidas de mudança de estilo de vida, como iniciar uma dieta, realização de atividade física, parar de fumar e evitar ingestão de álcool( 1616 . Pucci N, Pereira MR, Vinholes DB, Pucci P, Campos ND. Conhecimento sobre hipertensão arterial sistêmica e adesão ao tratamento anti-hipertensivo em idosos. Rev Bras Cardiol. 2012 jul-ago;25(4):322-9. ). Há várias razões para a dificuldade em aderir ao tratamento da hipertensão, como, por exemplo, ausência de sintomas associados à doença, complexidade do regime posológico, custo elevado do tratamento e falta de conhecimento sobre a doença( 1717 . Santos MVR, Oliveira DC, Arraes LB, Oliveira DAGC, Medeiros L, Novaes MA. Adesão ao tratamento anti-hipertensivo: conceitos, aferição e estratégias inovadoras de abordagem. Rev Soc Bras Clín Méd. 2013 jan-mar;11(1):55-61. ).

Em um estudo transversal com 385 pacientes hipertensos diagnosticados há pelo menos seis meses e atendidos em uma unidade de atenção primária à saúde, a atividade física foi relatada por 29,6% dos pacientes, porém apenas 17,7% relataram atividade física regular. Um total de 69,1% dos indivíduos fizeram ajustes em sua dieta, que consistiu, principalmente, em restrição à ingestão de sal, gordura e açúcar( 1818 . Girotto E, Andrade SM, Cabrera MA, Matsuo T. Adherence to pharmacological and non pharmacological treatment for arterial hypertension and associated factors in primary care. Cienc Saúde Coletiva. 2013 Jun;18(6):1763-72. ).

A adesão ao tratamento apresentada por hipertensos, que já é considerada baixa por si só( 1919 . Riegel B, Carlson B. Facilitators and barriers to heart failure self-care. Patient Educ Couns. 2002 Apr;46(4):287-95. ), diminui ainda mais quando a hipertensão está associada com IC. Nesta situação, seguir o tratamento prescrito é mais difícil, porque o número de medicamentos aumenta, assim como aumentam os custos de tratamento e as restrições de estilo de vida.

Como mostrado na Tabela 3, o escore de adesão mais alto foi observado para perguntas relacionadas com questões frequentemente discutidas durante o atendimento de pacientes com IC, ou seja, de conformidade adequada com o tratamento prescrito, ingestão adequada de líquidos, restrição de álcool e comparecimento às consultas, o que corrobora a constatação de que pacientes com um número maior de consultas de enfermagem apresentaram maior adesão.

No presente estudo, os indivíduos apresentaram menor adesão às medidas relacionadas com a monitoração diária do peso, adoção de uma dieta baixa em sódio e inclusão de suco de frutas na quantidade de ingestão diária de líquidos. Diversos estudos têm discutido a dieta baixa em sódio, bem como sua relação com o acúmulo de líquido e adesão terapêutica, e identificaram o sabor dos alimentos, a dificuldade na preparação de refeições saudáveis, bem como a necessidade de comer fora como barreiras à adesão( 4. Molloy GJ, O'Carroll RE, Witham MD, McMurdo MET. Interventions to Enhance Adherence to Medications in Patients with Heart Failure: a systematic review. Circ Heart Fail. 2012 Jan;5:126-33. , 1818 . Girotto E, Andrade SM, Cabrera MA, Matsuo T. Adherence to pharmacological and non pharmacological treatment for arterial hypertension and associated factors in primary care. Cienc Saúde Coletiva. 2013 Jun;18(6):1763-72. , 2020 . Van der Wal MH, Jaarsma T, Moser DK, van Gilst WH, van Veldhuisen DJ. Qualitative examination of compliance in heart failure patients in The Netherlands. Heart Lung. 2010 Mar-Apr;39(2):121-30. ).

Essas evidências apontam para a necessidade de atenção especial aos cuidados médicos e de enfermagem especializados para o paciente com IC e sua família pela implementação de estratégias que possam melhorar a adesão e o autocuidado dos pacientes e, portanto, sua qualidade de vida.

Limitações do Estudo

Poucos instrumentos abrangentes para avaliar a adesão ao tratamento em pacientes com IC estão disponíveis na literatura. No presente estudo, foi aplicado um questionário desenvolvido no Brasil para ser utilizado em pacientes com IC atendidos em clínicas que trabalham com o conceito de cuidado multidisciplinar. Questões sobre mudanças no estilo de vida, que seriam válidas também para outras doenças crônicas, não foram abordadas pelos autores que desenvolveram o questionário. Neste sentido, a presente pesquisa demonstrou as limitações deste instrumento para a comunidade científica e estudos adicionais podem contribuir para a avaliação de outros hábitos de vida essenciais para o controle da saúde dos pacientes com IC. Além disso, mais estudos são necessários para corroborar as conclusões quanto ao comportamento de adesão em pacientes com IC observado nas clínicas especializadas.

Conclusão

Os resultados deste estudo nos permitiram concluir que menos da metade dos pacientes acompanhados nas duas clínicas especializadas em IC foram considerados como tendo adesão satisfatória. Além disso, a convivência com a família e o comparecimento a um grande número de consultas de acompanhamento de enfermagem melhorou a adesão ao tratamento, enquanto a presença de hipertensão levou a menor adesão.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2015

Histórico

  • Recebido
    03 Jul 2014
  • Aceito
    22 Mar 2015
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