Acessibilidade / Reportar erro

Cobertura, acesso e equidade universal em saúde: uma caracterização da produção científica de enfermagem

Resumos

Objetivos:

caracterizar a contribuição científica pela enfermagem em relação à cobertura, ao acesso e à equidade universal na saúde e conhecer essa produção, em termos de sujeitos e fenômenos de estudo.

Material e Métodos:

pesquisa documental e transversal, cuja unidade de análise foram 97 revistas e 410 documentos recuperados da categoria Nursing do Web of Science. Aplicaram-se descritores dos tesauros DeCS e Mesh, associados à cobertura, ao acesso e à equidade em saúde. Foram utilizados indicadores e regras bibliométricas e análise de artigos mais importantes em termos de citações e colaboração.

Resultados:

a recuperação de documentos permitiu observar 25 anos de produção, uma colaboração institucional e internacional de 31% e 7%, respectivamente. A coautoria média foi de 3,5, com uma taxa de transitoriedade de 93%. O índice de visibilidade foi de 67,7% e 4 revistas-núcleo concentram 24,6% da produção. Destacam-se uma revisão da categoria Nursing, com 286 citações, e uma autora brasileira como a mais produtiva.

Conclusões:

o coletivo de Enfermagem deve reforçar futuras investigações sobre o tema, definindo linhas e sublinhas de pesquisa, ampliar a internacionalização e construí-la com a participação conjunta da academia e da enfermagem comunitária.

Cobertura Universal; Acesso Universal a Serviços de Saúde; Equidade em Saúde; Enfermagem


Objectives:

to characterize the scientific contribution nursing has made regarding coverage, universal access and equity in health, and to understand this production in terms of subjects and objects of study.

Material and methods:

this was cross-sectional, documentary research; the units of analysis were 97 journals and 410 documents, retrieved from the Web of Science in the category, "nursing". Descriptors associated to coverage, access and equity in health, and the Mesh thesaurus, were applied. We used bibliometric laws and indicators, and analyzed the most important articles according to amount of citations and collaboration.

Results:

the document retrieval allowed for 25 years of observation of production, an institutional and an international collaboration of 31% and 7%, respectively. The mean number of coauthors per article was 3.5, with a transience rate of 93%. The visibility index was 67.7%, and 24.6% of production was concentrated in four core journals. A review from the nursing category with 286 citations, and a Brazilian author who was the most productive, are issues worth highlighting.

Conclusions:

the nursing collective should strengthen future research on the subject, defining lines and sub-lines of research, increasing internationalization and building it with the joint participation of the academy and nursing community.

Universal Coverage; Universal Access to Health Care Services; Equity in Health; Bibliometrics; Nursing


Objetivos:

caracterizar la contribución científica que ha realizado la enfermería respecto a cobertura, acceso y equidad universal en salud y conocer esta producción en términos de sujetos y fenómenos de estudio.

Material y métodos:

investigación documental y transversal, cuya unidad de análisis fueron 97 revistas y 410 documentos recuperados de la categoría "Nursing" de la Web of Science. De los tesauros DeCS y Mesh, se aplicaron descriptores asociados a cobertura, acceso y equidad en salud. Se utilizaron indicadores y leyes bibliométricas y análisis de artículos más destacados según citas y colaboración.

Resultados:

la recuperación documental permitió observar 25 años de producción, una colaboración institucional e internacional del 31% y 7% respectivamente. La co-autoría promedio fue de 3.5, con un índice de transitoriedad del 93%. El índice de visibilidad fue del 67.7% y 4 revistas núcleo que concentran el 24.6% de la producción. Destaca una revisión de la categoría Nursing con 286 citas y una autora brasilera como la más productiva.

Conclusiones:

el colectivo de enfermería debe fortalecer futuras investigaciones en el tema definiendo líneas y sub-líneas de investigación, aumentar la internacionalización y construirla con la participación conjunta de la academia y la enfermería comunitaria.

Cobertura Universal; Acceso Universal a Servicios de Salud; Equidad en Salud; Bibliometría; Enfermería


Introdução

Considerando-se que a cobertura universal de saúde não pode ser alcançada sem os dados científicos que a pesquisa fornece e, portanto, esta última torna-se um instrumento inegável para resolver a diversidade de perguntas sobre como conseguir aquela universalidade na atenção à saúde(11. Organización Mundial de la Salud (OMS). Informe sobre la salud en el mundo 2013: Investigaciones para una cobertura universal de salud. [Acesso 1 maio 2015]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/85763/1/9789240691223_spa.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
), a presente investigação propôs a seguinte questão: Quais são as características da contribuição da enfermagem na produção científica, sujeitos e fenômenos de interesse com relação à cobertura, acesso e equidade universal da saúde? Os referenciais conceituais que permitiram responder esta pergunta foram dois: cobertura de saúde universal e bibliometria.

Por cobertura universal ou cobertura universal de saúde, entende-se o desenvolvimento de sistemas de financiamento da saúde que permitam o acesso a serviços de saúde a todas as pessoas, incluindo ações de promoção e incentivo, prevenção, tratamento e reabilitação, e que esse acesso não signifique encontrar dificuldades financeiras ao pagar por esses serviços. Em outras palavras, envolve a decisão de como o sistema de saúde é financiado, como se protegem as pessoas das consequências financeiras do enfrentamento de uma doença e seu cuidado e como se utilizam os recursos disponíveis nesse sistema, de forma otimizada(22. Organización Mundial de la Salud (OMS). Resumen Informe sobre la salud en el mundo 2010: La financiación de los sistemas de salud el camino hacia la cobertura universal. [Acesso1 maio 2015]. Disponível em: http://www.who.int/whr/2010/10_summary_es.pdf?ua=1
http://www.who.int/whr/2010/10_summary_e...
-33. World Health Organization (WHO). Fiftyeighth World Health Assembly: Sustainable health financing, universal coverage and social health insurance. Geneva, 16-25 May 2005. Resolution WHA58.33. [Acesso 10 maio 2015]. Disponível em: http://apps._who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA58/WHA58_33-en.pdf
http://apps._who.int/gb/ebwha/pdf_files/...
). Emergem, assim, outros dois conceitos fundamentais: acesso e equidade. O acesso universal à saúde é a ausência de barreiras do tipo geográfica, econômica, sociocultural, organizacional e é obtido por meio da eliminação progressiva dos obstáculos que impedem que todas as pessoas utilizem os serviços integrais de saúde determinados em nível nacional e de maneira equitativa(77. Sanz-Valero J, Tomás Casterá V, Wanden-Berghe C. Estudio bibliométrico de la producción científica en el período de 1997 a 2012. Rev Panam Salud Publica. 2014;35(2):81-8.). Por sua vez, a equidade universal na saúde é um conceito amplo, inclusivo e multidimensional, constituído por aspectos relacionados a alcançar boa saúde por meio de processos que não só têm a ver com a distribuição de atenção à saúde, mas também com a justiça social e a total não-discriminação na prestação dessa assistência(55. Sen A. ¿Porqué la equidad en salud? Rev Panam Salud Publica. 2002;11(5/6):302-9.). A saúde não é apenas uma função do setor de saúde, porque para alcançá-la, intervêm fatores como as condições de vida e de trabalho, o estado psicossocial e fatores socioeconômicos(66. Bachellet M. Hacia una cobertura universal de salud: aplicación de una perspectiva de género. MEDICC Rev. 2015;17(1):19-20.). Em outras palavras, a equidade universal em saúde é alcançar a saúde sem que qualquer circunstância social a impeça(55. Sen A. ¿Porqué la equidad en salud? Rev Panam Salud Publica. 2002;11(5/6):302-9.).

Estabelecida a contribuição conceitual do estudo, foi utilizada a análise bibliométrica para caracterizá-lo, pois, enquanto permite examinar retrospectivamente como foram alcançados e divulgados os avanços científicos, permite, também, conhecer a geração de resultados úteis e mensurar o desenvolvimento de disciplinas científica em determinadas linhas de investigação(77. Sanz-Valero J, Tomás Casterá V, Wanden-Berghe C. Estudio bibliométrico de la producción científica en el período de 1997 a 2012. Rev Panam Salud Publica. 2014;35(2):81-8.). Os indicadores bibliométricos de produção quantificam tanto o número de documentos publicados por país, instituição ou autores, bem como quantificam as citações recebidas por esses documentos como medida do sua repercussão ou importância(88. De Arenas J, Santillan-Rivero E. Bibliometría ¿para qué? Nueva Epoca. 2002;5(1):3-10.). São medidas obtidas a partir da análise estatística dos elementos básicos de revistas ou artigos com os quais os indicadores são construídos para medir a qualidade, impacto, relacionamentos ou colaboração da atividade científica, ou seja, a quantificação e evolução temporal da produção(99. Mendoza-Parra S, Paravic-Klijn T, Muñoz-Muñoz AM, Barriga O, Jimenez-Contreras E. Visibility of Latin American Nursing Research (1959-2005). J Nurs Scholarsh. 2009;41(1):54-63.). Assim, a informação armazenada em bancos de dados representa uma matéria-prima que, uma vez analisada, permite extrair conhecimentos que podem contribuir para a compreensão dos esforços científicos e para a tomada de decisões estratégicas em uma determinada área do conhecimento(1010. Castiel L, Sanz-Valero J. Política científica: manejar la precariedad de los excesos y desnaturalizar la ideología "publicacionista" todopoderosa. [Editorial]. Salud Colect. 2009;5(1):5-11.).

Conforme o exposto, este estudo teve dois objetivos: primeiro, caracterizar, por meio de indicadores bibliométricos, a contribuição científica da enfermagem sobre cobertura, acesso e equidade universal na saúde e segundo, conhecer as tendências dessa produção em termos de sujeitos e fenômenos de estudo.

Material e métodos

Tipo de estudo e unidade de análise: pesquisa bibliométrica descritiva e exploratória, cuja unidade de análise foram as publicações seriadas e documentos recuperados da categoria Nursing do Web of Science, doravante denominada "WoS".

Estratégias de busca (Figura 1): foi realizada a consulta aos thesaurus DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) e MeSH (Medical Subject Heading) a fim recuperar os termos controlados ou descritores que coincidissem com os termos naturais do problema de pesquisa, ou seja, "cobertura", "acesso" e "equidade" e cada um separadamente associado aos termos "saúde", "atenção à saúde", "serviços de saúde" e "universal".

Figura 1
- Descritores e estratégias de busca, Categoria Nursing, Web of Science, 2015

Universo: composto de 97 revistas e 410 documentos (artigos, revisões, cartas, notas, editoriais, etc.). Análise dos dados: para análise exploratória univariada de indicadores bibliométricos unidimensionais ou descritivos, utilizou-se distribuição de frequência, medidas de tendência central e de dispersão. Para o comportamento dos autores e revistas, foram calculadas as leis de Lotka e Bradford.

Resultados

Caracterização de documentos

Magnitude, evolução e tipos de documentos (Figura 2): o registo de documentos na WOS teve início a partir anos 90, com um artigo, atingindo uma média de 47,5 a partir de 2011. Em 2015, já existe um total de 410 registros. De acordo com o tipo de documentos, nos 25 anos estudados, 91,5% (375) são artigos, 3,7% (15) são revisões e 2,2% (9) editoriais. O restante são relatos breves, notícias e cartas ao editor.

Figura 2
- Produção científica de enfermagem nos temas Cobertura, Acesso e Equidade universal em Saúde, Web of Science, 1990-2015 (N=410)

Colaboração: apenas 31% da produção (127) tiveram colaboração institucional e o vínculo mais comum (27) foi com universidade/hospital. A taxa de colaboração ou coautoria, ou seja, o número médio de autores por artigo durante todo o período foi de 3,5. A maior quantidade de coautores foi obtida por um artigo de 2007 (11), com 12 autores canadenses que descrevem como o acesso em tempo real que as enfermeiras hospitalares ou comunitárias têm a recursos eletrônicos não só fornece informação simultânea sobre os resultados do paciente, ou sobre a melhor evidência para apoiar a prática, mas também revela a estreita relação entre as intervenções de enfermagem e os resultados dos pacientes. Esta é a questão chave para um planejamento oportuno das melhores intervenções e, assim, facilitar o acesso aos melhores cuidados de saúde a curto prazo(1111. Doran DM, Mylopoulos J, Kushniruk A, Nagle L, Laurie-Shaw B, Sidani S, et al. Evidence in the palm of your hand: development of an outcomes-focused knowledge translation intervention. Worldviews Evid Based Nurs. 2007;4(2):69-77.). A colaboração em nível nacional ultrapassou este indicador em 93,4% dos manuscritos (383); dentre eles, o documento que tinha o maior número de instituições participantes dos seus autores é do ano de 2009, no qual foram identificadas 9 instituições australianas acadêmicas, filantrópicas, de pesquisa e assistência cujo objetivo foi realizar um mapeamento rural e regional dos serviços de câncer no país. Entre outros aspectos, identificaram-se deficiências significativas na prestação de serviços oncológicos, disponibilidade limitada de enfermeiras e com importantes diferenças em sua formação para prestar cuidados semelhantes. Concluíram que essas deficiências poderiam contribuir para desfavorecer os progresso de pacientes com câncer que viviam em áreas regionais, rurais ou remotas e que era imperativo tomar medidas a curto prazo para melhorar o acesso aos serviços oncológicos e, assim, eliminar as desigualdades no cuidado desses pacientes na Austrália(1212. Underhill C, Bartel R, Goldstein D, Snodgrass H, Begbie S, Yates P, et al. Mapping Oncology Services in Regional and Rural Australia. Aust J Rural Health. 2009;17(6):321-9.). A colaboração internacional só atingiu 7%, liderada pelos Estados Unidos, com 10 publicações junto a países europeus, asiáticos, africanos e latino-americanos. Destaca-se nesse grupo o manuscrito com maior número de países participantes, com autores da Inglaterra, Noruega, Austrália, Suíça, Alemanha e Grécia. Trata-se de uma revisão publicada em 2013, a partir de 16 estudos, descreveram as percepções, necessidades e experiências das mulheres migrantes grávidas. Concluíram que, embora todos os Estados membros da União Europeia tenham ratificado resoluções com base nos direitos humanos, ainda há uma relação entre a desigualdade social e as barreiras ao acesso aos cuidados pré, intra e pós-parto. Os resultados mostraram que as mulheres migrantes são um grupo muito vulnerável durante a gravidez e o parto e é necessário melhorar o acesso aos serviços de saúde para melhor atender às suas reais necessidades(1313. Balaam MC, Akerjordet K, Lyberg A, Kaiser B, Schoening E, Fredriksen AM, et al. A Qualitative Review of Migrant Women's Perceptions of Their Needs and Experiences Related to Pregnancy and Childbirth. J Adv Nurs. 2013;69(9):1919-1930.).

Autores, produção ocasional e Lei de Lotka: Foram identificados 1197 autores em todos os artigos. Destes, 1109 tinham apenas um único artigo, de modo que a taxa de produção ocasional ou índice de transitoriedade foi de 93%. Devido a esta proporção, não se pôde obter uma distribuição padrão previsível de autores e obras. Como descrito acima, calculando-se o coeficiente de Lotka (-3,4), verificou-se que a comunidade de autores em relação à cobertura, ao acesso e à igualdade universal em saúde na categoria Nursing do WOS ainda é uma comunidade de pesquisadores com pouca produção científica e que é representada por uma elite de 34 pesquisadores (√1197) que escreveram três ou mais artigos. Destaca-se aqui, a autora Teresa Cristina Scatena Villa, que lidera a elite como coautora de 9 artigos publicados de 2011 a 2014, os quais referem-se a vários tópicos sobre acessibilidade aos serviços de atenção à Tuberculose.

Citações: o índice de visibilidade, ou seja, o peso relativo que teve o número de documentos citáveis (artigos, revisões, cartas e notas), neste caso 394, que foram citados no período, foi de 67,7% (267). Pareceu importante investigar o comportamento das citações por categoria científica, pois 118 dos documentos citáveis (29,9%) estavam vinculados a uma ou mais das 18 categorias encontradas, diferentes de Nursing. A Tabela 1 mostra a média de citações por categoria. Observa-se que seis documentos alcançam a maior média de citações (7,7) vinculados às categorias Obstetrics & Gynecology, seguido por dois relacionados a Public, Environmental & Occupational Health e em terceiro lugar, ligado a Cardiovascular System & Cardiology. A categoria Nursing, nos 25 anos estudados, classifica-se em quarto lugar, com uma média de 6 a 394 documentos citados.

Tabela 1
- Categorias científicas de acordo com o número médio de citações e número de documentos, Categoria Nursing, Web of Science, 2015

Caracterização de revistas

País de Origem: a Tabela 2 identifica 97 revistas provenientes de 15 países. Destacam-se quatro países com o maior número de revistas-núcleo sobre o tema: Estados Unidos, Inglaterra, Brasil e Austrália.

Tabela 2
- Distribuição de países por revistas de origem segundo o número de revistas e documentos, Categoria Nursing, Web of Science, 2015

Revistas-núcleo (Lei de Bradford): a partir do número de documentos por revistas, identificaram-se 4 zonas de Bradford (Tabela 3), cada uma com uma porcentagem de produção que variou entre 23% e 26%. As revistas-núcleo, ou seja, aquelas em que concentra-se a maior produção científica em relação à cobertura, acesso e equidade universal em saúde, são 5: Public Health Nursing, do Estados Unidos, com 32 documentos, Journal of Advanced Nursing, da Inglaterra, com 23 documentos, Australian Journal of Rural Health, com 17 documentos, e duas revistas brasileiras Revista da Escola de Enfermagem da USP e Acta Paulista de Enfermagem, com 15 e 14 artigos, respectivamente.

Tabela 3
- Áreas de Bradford, relativas à cobertura, ao acesso e à equidade universal em saúde, Categoria Nursing, Web of Science, 2015

Sujeitos e fenômenos de estudo

Para observar as tendências sobre temas de interesse, pareceu importante recuperar e analisar por anos os documentos mais citados por categorias científicas e resgatar deles os fenômenos e sujeitos de estudo (Figura 3). Foram identificadas 15 categorias nos 394 documentos citáveis e 14 documentos com a maior quantidade de citações por categoria. No grupo dos mais citados, destaca-se uma revisão de 2005, com 286 citações na categoria Nursing.

Figura 3
- Resumo de documentos relativos à cobertura, ao acesso e à equidade universal em saúde, por ano, citações, sujeitos e revistas, Categoria Nursing, Web of Science, 2015

No Reino Unido, com base em uma evidência crescente norte-americana, que aponta que os homens recorrem menos que as mulheres a buscar ajuda para resolver problemas de saúde tão diversos como depressão, abuso de substâncias, deficiências físicas ou eventos estressantes da vida e que homens eram mais relutantes em procurar ajuda e acesso aos serviços de saúde, houve a necessidade de recuperar a literatura científica que descrevesse esse comportamento. Encontrou-se um número crescente de estudos de gênero que visualizava uma tendência dos homens em retardar a procura por ajuda quando adoeciam. Sob esse enfoque, os homens brancos de classe média, por exemplo, tinham um comportamento masculino tradicional que impedia que acessassem de maneira oportuna a atenção à saúde. Concluiu-se que, principalmente, o papel das crenças masculinas e as semelhanças e diferenças entre os diferentes perfis de homens necessitavam mais atenção e investigação; especialmente levando-se em consideração as desigualdades em saúde entre os homens de diferente nível socioeconômico e etnia. As autoras sugerem que novas pesquisas sejam realizadas com amostras heterogêneas visando a obter uma melhor compreensão dos fatores desencadeantes e barreiras associados ao processo de tomada de decisão sobre a busca de cuidados de saúde pelos homens. Enfatizaram que, com mais evidência, não só pode-se melhorar o acesso dos homens aos cuidados de saúde, mas também melhorar a qualidade de vida das mulheres que informalmente devem assumir esse cuidado e, portanto, também reduzir custos nacionais de saúde associados ao atraso dos cuidados de saúde(1818. Galdas P, Cheater F, Marshall P. Men and Health Help-Seeking Behaviour: Literature Review. J Adv Nurs. 2005;49(6):616-23.).

Discussão e conclusões

Destaca-se que a entrada das coleções Scielo e KCI-Korean no Web of Science torna possível a realização de estudos bibliométricos com alcance global visando a observar o comportamento científico de determinados campos e fenômenos de estudo. Embora seja discutível o fato de que este estudo não contemple tudo o que a comunidade de enfermagem tem produzido em relação à cobertura, acesso e equidade universal em saúde, podemos recuperar junto à WOS a coleção de documentos de melhor qualidade científica sobre o tema e ter uma visão geral de sua contribuição.

Com relação aos documentos, especificamente em relação à evolução da sua magnitude, observa-se claramente que o tema não entrou na fase de crescimento linear. Esta é uma característica própria que confere a maturidade científica de uma área de conhecimento a seu trabalho investigativo, mesmo que o período de 25 anos estudados tenha sido o suficiente para reforçar essa linha de pesquisa. As evidências que reforçam o exposto acima são: a pouca quantidade de revisões recuperadas (3,7%) e uma colaboração majoritariamente nacional (93,4%) originada do ambiente universitário, com um elevado índice de transitoriedade. Isto coincide com a afirmação feita pelo Trzesniak(28) ao estabelecer que a enfermagem, como outras ciências emergentes, ainda está em processo de transição da tecnologia/profissão para ciência/investigação e o comportamento do grupo que tem investigado em relação à cobertura, acesso e equidade em saúde o comprova.

É importante ressaltar que, apesar de a maior produtividade ser originária de países como EUA e Inglaterra, é uma autora brasileira quem lidera os índices de produtividade por autor. Na verdade, Scatena Villa tem uma participação contínua no tempo, com nove artigos que podem representar uma sublinha de pesquisa em relação à cobertura, acesso e equidade em pacientes com tuberculose.

Também é importante a visibilidade alcançada pelos documentos citáveis (67%) e que quase 30% deles estejam categorizados em outros campos científicos, pois indica que o que a enfermagem produz sobre o tema não só causa impacto em seu próprio grupo, mas também contribui para o conhecimento de outras áreas científicas(99. Mendoza-Parra S, Paravic-Klijn T, Muñoz-Muñoz AM, Barriga O, Jimenez-Contreras E. Visibility of Latin American Nursing Research (1959-2005). J Nurs Scholarsh. 2009;41(1):54-63.).

Em relação às revistas, espera-se que países com muitos dados na WOS ocupem a maior quantidade de revistas indexadas, questão que torna mais relevante que o Brasil integre o grupo de revistas-núcleo e ocupe a terceira posição, com sete revistas que acumulam 72 documentos com texto integral e livre acesso. Sem dúvida, poderíamos denominar este livre acesso, incorporado a uma base de dados global como a WOS, acessibilidade científica global. Isto é uma característica-chave e relevante para se cumprir eticamente com a cobertura universal de saúde. Sem acesso à ciência relevante produzida em todo o mundo, não se pode falar de universalidade nem de cobertura, de acesso e muito menos de equidade em saúde.

No que diz respeito aos artigos em destaque, seja pela colaboração ou citações, o conjunto de documentos indica que a enfermagem tem entendido muito bem os conceitos de cobertura, acesso e equidade universal em saúde. O fato de que seus sujeitos de estudos são idosos de áreas rurais, pacientes com câncer, pacientes com doenças psiquiátricas, mulheres migrantes grávidas, adultos sem-teto, crianças de bairros marginalizados, adultos hospitalizados ou homens resistentes ao acesso à atenção em saúde e muitos outros tipos de grupos, reflete que compreende-se a necessidade de se eliminar progressivamente todos os obstáculos que impedem as pessoas de utilizar os serviços de saúde integrais organizados pelos países a que pertencem(2929. De Bortoli SH. Strategy for universal access to health and universal health coverage and the contribution of the International Nursing Networks. Editorial. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2014;22(6):891-2.).

Da mesma forma, o fato de os fenômenos de pesquisa mais citados relacionarem-se à tomada de decisão na área da saúde, ao uso de serviços de saúde, a fatores que afetam o uso de meios diagnósticos, satisfação do usuário, atitudes de estudantes de enfermagem frente a grupos vulneráveis, uso de rede de computadores ou ferramentas de informática, para educar ou conectar a família com doentes hospitalizados, indica que a enfermagem busca, por meio de sua pesquisa, os nichos de desigualdade e falta de equidade nos cuidados como um mecanismo para observar claramente a realidade e reduzir essas lacunas que impedem a universalidade dos cuidados de saúde

Embora nem o marco metodológico nem o teórico nas investigações do estudo tenha feito parte deste estudo, pôde-se observar uma variedade de abordagens qualitativas e quantitativas para resolver os problemas de investigação e o enfoque de gênero como uma perspectiva fundamental para a construção do conhecimento nesta área. Não é em vão que tanto a perspectiva de gênero quanto a universalidade na cobertura, acesso e equidade na atenção à saúde tenham seus princípios fundamentais nos direitos humanos e na ética.

É fato que a comunidade de enfermagem em nível mundial já tem revistas-núcleo no tema, apenas precisando reforçar suas pesquisas futuras, organizando-a melhor em termos de linhas e sublinhas de pesquisa, internacionalização e originando-a a partir de um vínculo estreito entre a academia e agora ligada à enfermagem, que se desenvolve em nível comunitário.

References

  • 1
    Organización Mundial de la Salud (OMS). Informe sobre la salud en el mundo 2013: Investigaciones para una cobertura universal de salud. [Acesso 1 maio 2015]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/85763/1/9789240691223_spa.pdf
    » http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/85763/1/9789240691223_spa.pdf
  • 2
    Organización Mundial de la Salud (OMS). Resumen Informe sobre la salud en el mundo 2010: La financiación de los sistemas de salud el camino hacia la cobertura universal. [Acesso1 maio 2015]. Disponível em: http://www.who.int/whr/2010/10_summary_es.pdf?ua=1
    » http://www.who.int/whr/2010/10_summary_es.pdf?ua=1
  • 3
    World Health Organization (WHO). Fiftyeighth World Health Assembly: Sustainable health financing, universal coverage and social health insurance. Geneva, 16-25 May 2005. Resolution WHA58.33. [Acesso 10 maio 2015]. Disponível em: http://apps._who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA58/WHA58_33-en.pdf
    » http://apps._who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA58/WHA58_33-en.pdf
  • 4
    Organización Mundial de la Salud (OMS). 66ª Sesión del Comité Regional de la OMS para Las Américas Washington. CD53/5, Rev. 2: Estrategia para el acceso universal a la salud y la cobertura universal de salud. [Acesso 17 maio 2015]. Disponível em: http://www.paho.org/HQ/index.php?option=com_content&view=article&id=9774:53rd-directing-council&Itemid=41062&lang=es#InformeFinal
    » http://www.paho.org/HQ/index.php?option=com_content&view=article&id=9774:53rd-directing-council&Itemid=41062&lang=es#InformeFinal
  • 5
    Sen A. ¿Porqué la equidad en salud? Rev Panam Salud Publica. 2002;11(5/6):302-9.
  • 6
    Bachellet M. Hacia una cobertura universal de salud: aplicación de una perspectiva de género. MEDICC Rev. 2015;17(1):19-20.
  • 7
    Sanz-Valero J, Tomás Casterá V, Wanden-Berghe C. Estudio bibliométrico de la producción científica en el período de 1997 a 2012. Rev Panam Salud Publica. 2014;35(2):81-8.
  • 8
    De Arenas J, Santillan-Rivero E. Bibliometría ¿para qué? Nueva Epoca. 2002;5(1):3-10.
  • 9
    Mendoza-Parra S, Paravic-Klijn T, Muñoz-Muñoz AM, Barriga O, Jimenez-Contreras E. Visibility of Latin American Nursing Research (1959-2005). J Nurs Scholarsh. 2009;41(1):54-63.
  • 10
    Castiel L, Sanz-Valero J. Política científica: manejar la precariedad de los excesos y desnaturalizar la ideología "publicacionista" todopoderosa. [Editorial]. Salud Colect. 2009;5(1):5-11.
  • 11
    Doran DM, Mylopoulos J, Kushniruk A, Nagle L, Laurie-Shaw B, Sidani S, et al. Evidence in the palm of your hand: development of an outcomes-focused knowledge translation intervention. Worldviews Evid Based Nurs. 2007;4(2):69-77.
  • 12
    Underhill C, Bartel R, Goldstein D, Snodgrass H, Begbie S, Yates P, et al. Mapping Oncology Services in Regional and Rural Australia. Aust J Rural Health. 2009;17(6):321-9.
  • 13
    Balaam MC, Akerjordet K, Lyberg A, Kaiser B, Schoening E, Fredriksen AM, et al. A Qualitative Review of Migrant Women's Perceptions of Their Needs and Experiences Related to Pregnancy and Childbirth. J Adv Nurs. 2013;69(9):1919-1930.
  • 14
    Neese J, Abraham I, Buckwalter K. Utilization of Mental Health Services Among Rural Elderly. Arch Psychiatr Nurs. 1999;13(1):30-40.
  • 15
    Magilvy J, Congdon J. The Crisis Nature of Health Care Transitions for Rural Older Adults. Public Health Nurs. 2000;17(5):336-45.
  • 16
    Verhoef M, White M. Factors in Making the Decision to Forgo Conventional Cancer Treatment. Cancer Pract. 2002;10(4):201-7.
  • 17
    Yu M, Wu T. Factors Influencing Mammography Screening of Chinese American Women. JOGNN. 2005;34(3):386-94.
  • 18
    Galdas P, Cheater F, Marshall P. Men and Health Help-Seeking Behaviour: Literature Review. J Adv Nurs. 2005;49(6):616-23.
  • 19
    Artinian N. Telehealth as a Tool for Enhancing Care for Patients With Cardiovascular Disease. J Cardiovasc Nurs. 2007;22(1):25-31.
  • 20
    Martins D. Experiences of Homeless People in the Health Care Delivery System: a Descriptive Phenomenological Study. Public Health Nurs. 2008;25(5):420-30.
  • 21
    Ndugwa R, Zulu E. Child Morbidity and Care-Seeking in Nairobi Slum Settlements: the Role of Environmental and Socio-Economic Factors. J Child Health Care. 2008;12(4):314-28.
  • 22
    Atack L, Luke R, Chien E. Evaluation of Patient Satisfaction With Tailored Online Patient Education Information. Cin-Comput Inform Nurs. 2008;26(5):258-64.
  • 23
    Hamlyn S. Reducing the Incidence of Colorectal Cancer in African Americans. Gastroenterol Nurs. 2008;31(1):39-42.
  • 24
    Wray J, Walker L, Benedict. Student Nurses' Attitudes to Vulnerable Groups: a Study Examining the Impact of a Social Inclusion Module. Nurse Educ Today. 2008;28(4):513-20.
  • 25
    Savage C, Gillespie G, Lindsell C. Health Status and Access to Care for Homeless Adults With Problem Alcohol and Drug Use. J Addict Nurs. 2008;19(1):27-33.
  • 26
    Logan L, Mcilfatrick S. Exploring Women's Knowledge, Experiences and Perceptions of Cervical Cancer Screening in an Area of Social Deprivation. Eur J Cancer Care. 2011;20(6):720-7.
  • 27
    Dykes P, Carroll D, Hurley A, Benoit A, Chang F, Pozzar R et al. Building and Testing a Patient-Centric Electronic Bedside Communication Center. J Gerontol Nurs. 2013;39(1):15-9.
  • 28
    Trzesniak P. Conferências com o espírito Solvay em áreas cientificamente emergentes: um impulso notável para a construção de conhecimento. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(2):184-6.
  • 29
    De Bortoli SH. Strategy for universal access to health and universal health coverage and the contribution of the International Nursing Networks. Editorial. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2014;22(6):891-2.
  • Errata

    No artigo "Cobertura, acesso e equidade universal em saúde: uma caracterização da produção científica de enfermagem", com número de DOI: 10.1590/1518-8345.1082.2669, publicado no periódico Rev. Latino-Am. Enfermagem, 2016;24:e2669, na página 9:
    Onde se lia:
    "Universidad de Concepción. Facultad de Enfermería
    Departamento Fundamentos de Enfermería
    Casilla 160 C
    Barrio Universitario
    Concepción, Región del Bío-Bío, Chile
    E-mail: smendoza@udec.cl"
    Leia-se:
    "Sara Mendoza-Parra
    Universidad de Concepción. Facultad de Enfermería
    Departamento Fundamentos de Enfermería
    Casilla 160 C
    Barrio Universitario
    Concepción, Región del Bío-Bío, Chile
    E-mail: smendoza@udec.cl"

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    07 Jun 2015
  • Aceito
    28 Jul 2015
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
E-mail: rlae@eerp.usp.br