Acessibilidade / Reportar erro

Aspectos que influenciam o autocuidado de pacientes vivendo com vírus da imunodeficiência humana* * Apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasil, processo nº 447511/2014-9.

RESUMO

Objetivo:

analisar aspectos relacionados ao aumento ou diminuição do autocuidado nos pacientes vivendo com vírus da imunodeficiência humana atendidos em serviço de ambulatório especializado.

Método:

estudo transversal de caráter analítico com 135 pacientes com idade maior ou igual a 18 anos, de ambos os sexos, que fazem acompanhamento no serviço. As variáveis independentes e os desfechos foram coletados do instrumento da consulta de enfermagem, que tem como referencial teórico a Teoria de Orem. Os dados foram analisados por abordagem paramétrica. Relações ou diferenças foram consideradas significativas se p < 0,05. A análise foi feita com o software SPSS v21.0.

Resultados:

maioria do sexo masculino (56,3%), com média de idade de 42,1 anos. Os pacientes que necessitaram ocultar o diagnóstico desempenharam menos autocuidado (β= -0,72 (-1,38; -0,06); p<0,031). A chance de realizar o autocuidado diminuiu em relação ao aumento da idade (OR=0,93 (0,89;0,97);p<0,003). Por outro lado, encontrou-se que o paciente que tem parceria fixa possui maior chance de desempenhar o autocuidado (OR=3,46 (1,27;9,46); p<0,015).

Conclusão:

foram evidenciados aspectos relacionados ao aumento ou à diminuição do autocuidado nos pacientes que vivem com vírus da imunodeficiência humana. No entanto, fazem-se necessários outros estudos que privilegiem o caráter analítico do desempenho do autocuidado desses pacientes.

Descritores:
Autocuidado; Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; HIV; Cuidados de Enfermagem; Saúde do Adulto; Assistência Ambulatorial

ABSTRACT

Objective:

to analyze aspects related to the increase or decrease of self-care in patients living with human immunodeficiency virus treated in a specialized outpatient service.

Method:

analytical cross-sectional study with 135 patients aged 18 and over, of both sexes, who are followed up on the service. The independent variables and outcomes were collected from the nursing consultation instrument, whose theoretical reference is the Orem’s Theory. The data were analyzed by parametric approach. Relationships or differences were considered significant if p <0.05. The analysis was done with SPSS v21.0 software.

Results:

most participants were male (56.3%), with a mean age of 42.1 years. Patients who needed to conceal the diagnosis had less self-care (β = -0.72 (-1.38, -0.06), p <0.031). The chance of performing self-care decreased with increasing age (OR = 0.93 (0.89, 0.97), p <0.003). On the other hand, patients with a permanent partner had a higher chance of performing self-care (OR = 3.46 (1.27, 9.46), p <0.015).

Conclusion:

aspects related to the increase or decrease of self-care in patients living with human immunodeficiency virus were evidenced. However, further studies are necessary to emphasize the analytical character of the self-care of these patients.

Descriptors:
Self Care; Acquired Immunodeficiency Syndrome; HIV; Nursing Care; Adult Health; Ambulatory Care

RESUMEN

Objetivo:

analizar los aspectos relacionados al aumento o disminución del autocuidado en los pacientes viviendo con el virus de la inmunodeficiencia humana que fueron atendidos en servicio de ambulatorio especializado.

Método:

estudio transversal de carácter analítico con 135 pacientes con edad mayor o igual a 18 años, de ambos sexos, que hacen seguimiento en el servicio. Las variables independientes y los resultados fueron recolectados del instrumento de la consulta de enfermería, que tiene como referencial teórico la Teoría de Orem. Los datos se analizaron mediante un enfoque paramétrico. Las relaciones o diferencias se consideraron como significativas si p <0,05. El análisis se realizó con el software SPSS v21.0.

Resultados:

la mayoría del sexo masculino (56,3%), con una media de edad de 42,1 años. Los pacientes que necesitaban ocultar el diagnóstico desempeñaron menos autocuidado (β= -0,72 (-1,38; -0,06), p<0,031). La probabilidad de realizar el autocuidado disminuyó en relación al aumento de la edad (OR=0,93 (0,89, 0,97), p<0,003). Por otro lado, se encontró que el paciente que tiene asociación fija tiene mayor probabilidad de desempeñar el autocuidado (OR=3,46 (1,27, 9,46), p<0,015).

Conclusión:

se evidenciaron aspectos relacionados al aumento o a la disminución del autocuidado en los pacientes que viven con virus de la inmunodeficiencia humana. Sin embargo, se hacen necesarios otros estudios que privilegien el carácter analítico del desempeño del autocuidado de esos pacientes.

Descriptores:
Autocuidado; Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida; VIH; Atención de Enfermería; Salud del Adulto; Atención Ambulatoria

Introdução

Desde o início da epidemia da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (aids) muitos pesquisadores de todas as partes do mundo realizam pesquisas buscando responder às questões referentes a essa doença11 Oskouie F, Kashefi F, Rafii F, Gouya MM, Vahid-Dastjerdi M. Facilitating factors of self-care among HIV-positive young women in Iran: a qualitative study. Int J Adolesc Med Health. 2018 Feb 5. doi: http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172.
http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-017...

2 Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013...

3 Basti BD, Mahesh V, Bant DD, Bathija GV. Factors affecting antiretroviral treatment adherence among people living with human immunodeficiency virus/acquired immunodeficiency syndrome: a prospective study. J Fam Med Prim Care. 2017 Jul-Set; 6 (3): 482-6. doi: http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014.
http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.2220...

4 Thapa S, Hannes K, Buve A, Bhattarai S, Mathei C. Theorizing the complexity of HIV disclosure in vulnerable populations: a grounded theory study. BMC Public Health. 2018;18:162. doi: http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-5073-x.
http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-50...
-55 Harris LM, Emlet CA, Pierpaoli Parker C, Furlotte C. Timing of Diagnosis: understanding Resilience Narratives of HIV Positive Older Adults Diagnosed Pre- and Post-HAART. J Gerontol Soc Work. 2018 Jan;61(1):78-103. doi: http://dx.doi.org/10.1080/01634372.2017.1402841.
http://dx.doi.org/10.1080/01634372.2017....
.

Contudo, mesmo após quase quarenta anos da descoberta do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), ainda existem deficit na assistência às pessoas vivendo com HIV/aids (PVHA), principalmente no que se refere a viver e conviver com a infecção, na busca de incentivar a capacidade de autonomia do paciente para realizar o seu autocuidado e também no cuidado das suas necessidades psicossociais. Dessa maneira, oferecer cuidados para doenças crônicas como aids é um desafio crescente no mundo11 Oskouie F, Kashefi F, Rafii F, Gouya MM, Vahid-Dastjerdi M. Facilitating factors of self-care among HIV-positive young women in Iran: a qualitative study. Int J Adolesc Med Health. 2018 Feb 5. doi: http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172.
http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-017...
. Acredita-se que para enfrentar os desafios do cuidado de pessoas com doenças crônicas é necessário identificar fatores que possam influenciar as pessoas a se envolver mais no autocuidado.

Nessa perspectiva, enfatiza-se a importância do Processo de Enfermagem como uma ferramenta metodológica que orienta o cuidado profissional de enfermagem e deve ser desenvolvido de forma intencional66 Silva JP, Garanhani ML, Peres AM. Systematization of Nursing Care in undergraduate training: the perspective of Complex Thinking. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2015;23(1):59-66. doi: http://dx.doi.org 10.1590/0104-1169.0096.2525.
http://dx.doi.org 10.1590/0104-1169.0096...
. Dessa forma, essa ferramenta pode contribuir para diminuir a lacuna que ainda existe na assistência às PVHA22 Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013...
,77 Caetano JA, Pagliuca LMF. Self-care and HIV/aids patients: nursing care systematization. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):336-45. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006...

8 Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009...
-99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
.

Em instituições prestadoras de serviços ambulatoriais de saúde, o Processo de Enfermagem corresponde à Consulta de Enfermagem22 Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013...
, que possibilita identificar as necessidades específicas das PVHA, promover a qualidade de vida e incentivá-los à realização do autocuidado.

A Resolução Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) 358/2009 dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e torna a Consulta de Enfermagem obrigatória no desenvolvimento da assistência de enfermagem em todos os níveis de assistência à saúde, seja em instituição pública ou privada, tornando possível a operacionalização do Processo de Enfermagem. No entanto, o enfermeiro deve ter a compreensão e a decisão clara da utilização do Processo de Enfermagem, não devendo ser a resolução COFEN 358/2009 a principal motivação para o uso dessa ferramenta.

Considerando o comprometimento de assistir o indivíduo vivendo com HIV/aids, o enfermeiro, por meio da Consulta de Enfermagem, que obrigatoriamente deve estar baseada em um referencial teórico, consegue diagnosticar as necessidades do paciente, proceder à prescrição dos cuidados e posteriormente avaliar as intervenções junto com paciente, tendo a oportunidade de desenvolver um trabalho voltado para a melhoria da qualidade de vida desses sujeitos22 Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013...
.

Optou-se por utilizar o referencial da Teoria Geral de Dorothea Orem, também conhecida como a Teoria de Enfermagem do Deficit de Autocuidado, composta de três teorias inter-relacionadas: Teoria do Autocuidado, Teoria do Deficit de Autocuidado e Teoria dos Sistemas de Enfermagem1010 Orem DE. Nursing: concepts of practice. New York: McGraw-Hill; 1995.. No presente estudo, utilizou-se a Teoria do Autocuidado, que tem como finalidade identificar os deficit de autocuidado e observar até que ponto o paciente está capacitado a realizar o autocuidado, o que é fundamental para a manutenção da saúde do indivíduo vivendo com HIV/aids77 Caetano JA, Pagliuca LMF. Self-care and HIV/aids patients: nursing care systematization. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):336-45. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006...

8 Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009...
-99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
. Essa teoria possui três requisitos de autocuidado: o requisito de Autocuidado Universal, associado a processos da vida e à manutenção da integridade da estrutura e funcionamento humano; o de Desenvolvimento, relativo a alguma condição natural do ciclo vital ou associado a algum evento; e por Desvio de Saúde, relacionado às condições de doença1010 Orem DE. Nursing: concepts of practice. New York: McGraw-Hill; 1995..

Ressalta-se que a Teoria de Orem é um referencial válido na sistematização da assistência de enfermagem, sendo utilizada em estudos com PVHA77 Caetano JA, Pagliuca LMF. Self-care and HIV/aids patients: nursing care systematization. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):336-45. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006...

8 Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009...
-99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
.

Dessa forma, justifica-se o uso da Teoria de Orem considerando que o autocuidado é indispensável à PVHA no seu dia a dia, com a intenção de garantir o desenvolvimento em benefício da vida, da saúde e do bem-estar.

Foi durante a Consulta de Enfermagem realizada com as PVHA em um serviço de ambulatório especializado de infectologia que se percebeu a existência de aspectos da vida dos pacientes que influenciavam no seu autocuidado. No entanto, não era possível quantificar e verificar estatisticamente quais eram esses aspectos e se os mesmos aumentavam ou diminuíam o autocuidado das PVHA.

Diante desse contexto, este estudo buscou analisar aspectos que influenciam no aumento ou diminuição do autocuidado das PVHA atendidas em serviço de ambulatório especializado.

Método

Estudo transversal de caráter analítico, com abordagem quantitativa, desenvolvido em um serviço de ambulatórios especializados de infectologia de um município do interior de São Paulo, Brasil. O serviço é uma referência para acompanhamento e tratamento de casos de HIV e hepatites crônicas diagnosticados na região. Atualmente, o serviço atende aproximadamente 800 PVHA, que são divididas em quatro ambulatórios que acontecem semanalmente, recebendo atendimento multiprofissional e demandas de forma espontânea ou referenciada.

O critério que definiu os pacientes para a amostra do estudo foi a presença nos dias que acontece a consulta de enfermagem às PVHA. Amostragem não probabilística totalizou 135 PVHA. Contudo, para estimar as diferenças mínimas que poderão ser detectadas com n = 135 entrevistados, consideraram-se a amostragem aleatória simples, com erro tipo I igual a 0,05 e erro tipo II igual a 0,20, ausência de confundimento, desvio-padrão do desfecho igual a 2, razão de “alocação” igual a 1:1 para as variáveis independentes binárias e normalidade para a distribuição do desfecho. Com essas suposições, observou-se que a amostra de 135 entrevistados permitiu detectar diferenças significativas entre duas categorias de uma variável binária acima de um ponto.

A consulta de enfermagem acontece no serviço de ambulatórios especializados de infectologia desde outubro de 2013. É desenvolvida por uma das autoras e por alunos do curso de graduação em Enfermagem que realizam estágio nesse serviço, com a supervisão da pesquisadora. Para realizar a consulta de enfermagem foi construído um instrumento que teve como referencial teórico a Teoria do Autocuidado de Orem. A construção desse instrumento foi baseada em autores que também realizam a consulta de enfermagem com PVHA, utilizando instrumentos com o mesmo referencial teórico, em outros serviços77 Caetano JA, Pagliuca LMF. Self-care and HIV/aids patients: nursing care systematization. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):336-45. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006...

8 Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009...
-99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
.

A coleta de dados foi realizada no período compreendido entre os meses de outubro de 2014 e junho de 2017, em um dos ambulatórios que acontecem às quartas-feiras e tem aproximadamente 200 PVHA cadastradas. Os dados foram coletados no mesmo dia da consulta de enfermagem. A recusa na participação aconteceu com quatro pessoas. Para alcançar o objetivo do presente estudo foi necessário elaborar um instrumento com questões que foram retiradas de um instrumento maior, a consulta de enfermagem, conforme citado acima. As consultas foram realizadas em ambiente reservado, permitindo o sigilo e a confidencialidade das informações obtidas. Ressalta-se que visando não haver repetição dos participantes foi realizado cadastro em planilha de Excel de todos as PVHA que realizam a consulta de enfermagem. Desse modo, antes de incluir um novo participante era verificado se o mesmo já fazia parte do estudo.

No estudo foi incluído pacientes com idade a partir de 18 anos, de ambos os sexos, com condições clínicas e cognitivas às questões do estudo.

Os dados coletados estiveram relacionados às variáveis independentes e ao desfecho do estudo. As variáveis independentes (sociodemográficas e de comportamento) obtidas foram sexo, idade, cor autorreferida, escolaridade, religião, parceria, número de filhos, renda familiar, total de dependentes da renda, residência com água encanada, esgoto, coleta de lixo e proximidade de serviço de saúde, orientação sexual, atividade sexual, tempo de conhecimento do diagnóstico da infecção pelo HIV/aids, tempo de tratamento e doença oportunista após o diagnóstico, bom relacionamento com a família, sentimento de solidão, tristeza e/ou angústia, necessidade de ocultar o diagnóstico, aceitação da condição de estar com HIV/aids, necessidade de ocultar o diagnóstico, aprendeu a viver com HIV/aids. Ressalta-se que a seleção das variáveis independentes aconteceu a partir de pesquisas já desenvolvidas com as PVHA11 Oskouie F, Kashefi F, Rafii F, Gouya MM, Vahid-Dastjerdi M. Facilitating factors of self-care among HIV-positive young women in Iran: a qualitative study. Int J Adolesc Med Health. 2018 Feb 5. doi: http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172.
http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-017...
,33 Basti BD, Mahesh V, Bant DD, Bathija GV. Factors affecting antiretroviral treatment adherence among people living with human immunodeficiency virus/acquired immunodeficiency syndrome: a prospective study. J Fam Med Prim Care. 2017 Jul-Set; 6 (3): 482-6. doi: http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014.
http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.2220...
,88 Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009...
-99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
,1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
-1212 Semvua SK, Orrell C , Mmbaga BT, Semvua HH, Bartlett JÁ, Boulle AA. Predictors of non-adherence to antiretroviral therapy among HIV infected patients in northern Tanzania. PLoS One. 2017 Dec 18;12(12):e0189460. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0189460.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.018...
.

Para o desfecho, consideraram-se os três requisitos de autocuidado: Autocuidado Universal, Autocuidado por Desvio de Saúde e Autocuidado de Desenvolvimento. As questões foram construídas com resposta binária (sim ou não). A cada resposta positiva ao desenvolvimento do autocuidado foi recebido um ponto. Quanto maior a pontuação, maior o desempenho do autocuidado da PVHA.

O Requisito do Autocuidado Universal foi contemplado com 12 questões, sendo elas: recebe orientação sobre nutrição; consegue cumprir as orientações sobre nutrição; toma no mínimo oito copos de água por dia; dorme no mínimo oito horas por noite; realiza exercícios físicos; tem alguma atividade de lazer e a pratica semanalmente; usa algum método nas relações sexuais para prevenir a reinfecção do vírus; participa de atividades sociais; realiza frequentemente exames ginecológicos/urológicos; é usuário de drogas; é tabagista; consome bebida alcoólica.

As questões do Requisito do Autocuidado por Desvio de Saúde foram compostas por quatro questões: comparece nas datas agendadas pelo médico? Realiza acompanhamento com mais algum profissional, quando necessário? Se precisa usar medicamento (antirretroviral), faz uso diariamente? Comparece ao médico somente quando está doente?

Já o Requisito do Autocuidado de Desenvolvimento teve como questão: consegue realizar mudanças no seu estilo de vida relacionadas com a doença?

Ressalta-se que nas três últimas questões do Autocuidado Universal e na última questão do Autocuidado por Desvio de Saúde, entendeu-se que a resposta negativa (não) é que levaria ao acréscimo de um ponto e a resposta positiva (sim) não acarretaria pontuação.

Diante da ausência de parâmetro adotado para estabelecer os aspectos relacionados ao aumento ou diminuição do autocuidado nas PVHA, elaborou-se o Escore de Autocuidado Universal que consistiu na soma simples obtida em função da resposta dada a 12 itens que expressam o autocuidado universal. Portanto, o escore variou de 0 a 12 pontos, sendo que quanto maior a pontuação, maior o autocuidado. Também foi elaborado o Escore de Autocuidado por Desvio de Saúde, que variou de 0 a 4 pontos. Quanto maior a pontuação, maior o autocuidado. Já o Autocuidado por Desenvolvimento foi considerado positivo se o participante do estudo respondeu sim à questão: consegue realizar mudanças no seu estilo de vida relacionadas com a doença?

Para as análises estatísticas, utilizou-se o software SPSS v21.0. O desfecho Escore de Autocuidado Universal foi realizado por modelo de regressão linear com resposta normal. Já a análise das chances de Autocuidado de Desenvolvimento e Desvio de Saúde, por modelos de regressão logística. Associações foram consideradas estatisticamente significativas se p < 0,05.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob protocolo n° 563.918, atendendo às recomendações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, garantindo, assim, o anonimato.

Resultados

A Tabela 1 apresenta as variáveis independentes (sociodemográficas) das PVHA. Considerando-se as 135 pessoas investigadas, 56,3% eram do sexo masculino, brancos, com filhos e religião. A idade variou de 19 a 74 anos, com média de 42,1 anos (DP = 12). Apresentavam baixos níveis de escolaridade (56,3%), 23% viviam com até um salário mínimo e tinham em média 3,6 dependentes da renda familiar (DP = 1,8), mínimo de 1 e máximo 11.

Poucas pessoas não tinham na residência a coleta de lixo (3%), água encanada (4,5%), presença de rede de esgoto (4,5%). No entanto, 34,9% não tinham um serviço de saúde próximo à residência.

Tabela 1
Distribuição das variáveis independentes (sociodemográficas) dos pacientes que vivem com HIV/aids*. Município de Botucatu, SP, Brasil, 2014-2017

Na Tabela 2, observa-se que a maioria era heterossexual (75,6%), tinha parceria fixa (50,3%), vida sexual ativa (54,8%), relatava ter um bom relacionamento com a família após o diagnóstico da infecção pelo HIV (86,6%), aceitava estar com HIV/aids (77,1%) e 87,4% aprenderam a viver com a infecção (87,4%).

Contudo, 57,7% referiram que após o diagnóstico tiveram alteração da vida sexual, sentiram solidão, tristeza e/ou angústia (51,1%), necessitaram ocultar o diagnóstico (71,8%) e tiveram a presença de doença oportunista após o diagnóstico (37,8%).

Destaca-se que o tempo médio de diagnóstico foi de 8,3 anos (Desvio padrão (DP) = 7,1) e o tempo médio de tratamento, 7,3 anos (DP = 6,7).

Tabela 2
Distribuição das variáveis independentes (comportamento) dos pacientes que vivem com HIV/aids*. Município de Botucatu, SP, Brasil, 2014-2017

O Escore de Autocuidado foi elaborado considerando 12 itens e cada item recebeu o valor de um ponto. A média do escore de autocuidado foi de 6,3 pontos (DP = 1,8), mínimo de 1 e máximo 10.

A Tabela 3 mostra o resultado da análise desse escore com a intenção de verificar associação com aumento ou diminuição do autocuidado. Em um primeiro momento da análise não houve associação estatisticamente significante. Dessa maneira, optou-se por selecionar as variáveis independentes que tiveram valor de p menores e os mesmos foram levados para um modelo mais parcimonioso.

Nesse segundo modelo, ao serem avaliadas as variáveis independentes, correlacionadas com o Escore de Autocuidado Universal, observa-se que não houve nenhuma correlação positiva que evidencie o aumento do autocuidado. Em contrapartida, obteve-se uma correlação negativa, estatisticamente significativa (β= -0,72 (-1,38; -0,06);p<0,031), quando nota-se que as PVHA que necessitaram ocultar o diagnóstico desempenham menos o autocuidado.

Tabela 3
Modelo de regressão linear com resposta normal para o Escore de Autocuidado Universal. Município de Botucatu, SP, Brasil, 2014-2017

O Escore de Autocuidado por Desvio de Saúde foi estabelecido utilizando quatro itens e cada item recebeu o valor de um ponto. A média do Escore por Desvio de Saúde foi 2,2 pontos (DP = 0,6), mínimo de zero e máximo de quatro. Na Tabela 4, observa-se que houve a necessidade de levar as variáveis independentes que tiveram valor de p menores para um modelo mais parcimonioso.

Ao se avaliarem nesse segundo modelo as variáveis independentes e a correlação com o Escore por Desvio de Saúde, observou-se que a medida que aumenta a idade da PVHA diminui a chance da mesma de desempenhar o autocuidado (OR=0,93 (0,89;0,97); p<0,003). No entanto, a PVHA que tem parceria fixa tem mais chance de desempenhar o autocuidado por desvio de saúde (OR=3,46 (1,27;9,46); p<0,015).

Tabela 4
Modelos de regressão logística para o Escore de Autocuidado por Desvio de Saúde. Município de Botucatu, SP, Brasil, 2014-2017

A associação das variáveis independentes como o Escore de Autocuidado por Desenvolvimento está evidenciada na Tabela 5, e o mesmo foi considerado positivo se a PVHA respondeu sim à questão: consegue realizar mudanças no seu estilo de vida relacionadas com a doença? Houve a necessidade de levar as variáveis independentes que tiveram valor de p menores para um segundo modelo mais parcimonioso.

Nesse segundo modelo, observou-se que a PVHA que apresenta alteração na vida sexual após o diagnóstico do HIV tem maior chance de realizar mudanças no seu estilo de vida (OR=1,94 (0,88;4,28); p<0,100). Contudo, encontrou-se um resultado espúrio, quando se evidencia que a PVHA que tem um bom relacionamento familiar após diagnóstico possui menos chance de realizar mudanças no seu estilo de vida (OR=0,24 (0,06;0,93); p<0,038).

Tabela 5
Modelo de regressão logística para o Escore Autocuidado por Desenvolvimento. Município de Botucatu, SP, Brasil, 2014-2017

Discussão

Desde o início da epidemia, 76,1 milhões de pessoas foram infectadas pelo HIV e 35 milhões de pessoas morreram por causas relacionadas à aids. Em 2016, havia 36,7 milhões de PVHA em todo o mundo. A relevância da epidemia da aids também pode ser observada no contexto brasileiro. De 1980 a junho de 2017, foram identificados no país 882.810 casos de aids. Anualmente, observa-se uma média de 40 mil novos casos dessa doença nos últimos cinco anos1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
.

Considerando o cotejamento com outros estudos, o perfil das PVHA do presente estudo vem ao encontro aos últimos dados brasileiros e mundiais, visto que a epidemia apresenta-se concentrada em grupos mais vulneráveis1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
,1313 Cunha GH, Fiuza MLT, Gir E, Aquino PS, Pinheiro AKB, Galvão MTG. Quality of life of men with AIDS and the model of social determinants of health. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2015;23(2):183-91. doi: http://dx.doi. org/10.1590/0104-1169.0120.2541.
http://dx.doi. org/10.1590/0104-1169.012...
.

Os últimos dados do Brasil mostram que a epidemia está longe de ser controlada. De 1980 até junho de 2017, foram registrados 576.245 (65,3%) casos de aids em homens e 306.444 (34,7%) em mulheres. A maior concentração dos casos de aids no Brasil está nos indivíduos com idade entre 25 e 39 anos, em ambos os sexos. A principal via de transmissão entre homens e mulheres com 13 anos de idade ou mais foi a via sexual. Entre os homens, no ano de 2016, a região Sudeste apresentou um predomínio da categoria de exposição de homossexual (46,1% dos casos), enquanto nas demais regiões o predomínio foi heterossexual. Quando analisados os casos de aids nos últimos 10 anos e a distribuição dos indivíduos pelo quesito raça/cor, observou-se queda de 21,9% na proporção de casos entre pessoas brancas. Entre as pessoas autodeclaradas pardas, a proporção aumentou 35,7%1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
.

Semelhante ao dado encontrado no presente estudo, a maior concentração de casos de aids ocorreu entre indivíduos com a 5ª a 8ª série incompleta (25,5%), embora essa faixa apresente uma tendência de redução dos casos ao longo dos anos. Contudo, nota-se que os homens com aids apresentaram grau de instrução mais elevado do que as mulheres. Em 2016, a proporção de casos entre homens analfabetos foi de 2,3%, enquanto entre as mulheres foi de 3,9%. Fato também observado no nível superior completo, que entre os homens a proporção foi de 13,1% em comparação a 4,7% entre as mulheres1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
.

A escolaridade reflete a situação econômica das pessoas, que por sua vez desempenha papel importante na adesão medicamentosa das PVHA. Ressalta-se que, após a contagem de CD4, a adesão à terapia antirretroviral é o segundo maior preditor de progressão para a aids e a morte33 Basti BD, Mahesh V, Bant DD, Bathija GV. Factors affecting antiretroviral treatment adherence among people living with human immunodeficiency virus/acquired immunodeficiency syndrome: a prospective study. J Fam Med Prim Care. 2017 Jul-Set; 6 (3): 482-6. doi: http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014.
http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.2220...
. Sabe-se que a adesão à terapia antirretroviral está relacionada à supressão do HIV, diminuição das taxas de resistência e aumento da sobrevida e melhoria da qualidade de vida33 Basti BD, Mahesh V, Bant DD, Bathija GV. Factors affecting antiretroviral treatment adherence among people living with human immunodeficiency virus/acquired immunodeficiency syndrome: a prospective study. J Fam Med Prim Care. 2017 Jul-Set; 6 (3): 482-6. doi: http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014.
http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.2220...
.

Desde o início da epidemia de aids até o final de 2016, foram notificados no Brasil 316.088 óbitos, tendo o HIV/aids como causa básica. No entanto, no período de 2014 para 2015, com o início da política de tratamento para todos, constatou-se uma redução de 7,2% na taxa de mortalidade padronizada, que passou de 5,7 para 5,3/100.000 habitantes. Já no período de 2006 para 2016, verificou-se uma queda no coeficiente de mortalidade padronizado para o Brasil, que passou de 5,9 para 5,2 óbitos por 100 mil habitantes, o que corresponde a uma queda de 11,9%1111 Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017.
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
.

O viver com HIV/aids apresenta, na maioria das vezes, um comprometimento do funcionamento do organismo, causando um desvio de saúde que necessita que o próprio paciente seja agente ativo do autocuidado, uma vez que o HIV leva a uma doença crônica que até o momento não há cura.

Estudos evidenciam a importância de incentivar as PVHA à prática do autocuidado, com a intenção de contribuir com a manutenção de sua saúde22 Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013...
,99 Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010...
, levando o indivíduo a entender que realizar o autocuidado é algo que deve ser aprendido para o seu próprio benefício1414 Mendonça SCB, Zanetti ML, Sawada NO, Barreto IDC, Andrade JS, Otero LM. Construction and validation of the Self-care Assessment Instrument for patients with type 2 diabetes mellitus. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2017;25:e2890 doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.1533.2890.
http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.1533...
.

Estudo realizado no Irã demonstrou que o fornecimento de suporte e serviços adequados, bem como uma atitude positiva da sociedade em relação a mulheres HIV positivas, podem contribuir para a adesão ao autocuidado em mulheres jovens com HIV11 Oskouie F, Kashefi F, Rafii F, Gouya MM, Vahid-Dastjerdi M. Facilitating factors of self-care among HIV-positive young women in Iran: a qualitative study. Int J Adolesc Med Health. 2018 Feb 5. doi: http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172.
http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-017...
).

Em contrapartida, o estigma do HIV pode ter inúmeras repercussões, como perda de amizade e laços familiares, demissão da escola e ocupação e negação de cuidados de saúde1515 Simoni JM, Pantalone DW. Secrets and safety in the age of AIDS: does HIV disclosure lead to safer sex? Top HIV Med.[Internet] 2004 [cited 2017 dez 15]; 12(4):109-18. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15516708
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1551...
-1616 Qiao S, Li X, Stanton B. Theoretical models of parental HIV disclosure: a critical review. AIDS Care. 2013;25(3):326-36. doi: http://dx.doi.org/10.1080/09540121.2012.712658.
http://dx.doi.org/10.1080/09540121.2012....
. O estigma do HIV é um processo de desvalorização de pessoas que vivem com ou estão associadas à infecção por HIV e pode estar relacionado a não divulgação do seu status sorológico44 Thapa S, Hannes K, Buve A, Bhattarai S, Mathei C. Theorizing the complexity of HIV disclosure in vulnerable populations: a grounded theory study. BMC Public Health. 2018;18:162. doi: http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-5073-x.
http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-50...
.

Conforme encontrado no presente estudo, o fato de a PVHA ocultar o diagnóstico leva esse indivíduo a desempenhar menos autocuidado. Fato que pode ser justificado pelo estigma do HIV que leva muitas PVHA a não procurarem um serviço de saúde para realizar o tratamento1717 Hatzenbuehler ML, Phelan JC, Link BG. Stigma as a fundamental cause of population health inequalities. Am J Public Health. 2013;103(5):813-21. doi: http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2012.301069.
http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2012.3010...
. No mundo, por conta do estigma, um terço das PVHA não revela a sua sorologia positiva para o HIV1515 Simoni JM, Pantalone DW. Secrets and safety in the age of AIDS: does HIV disclosure lead to safer sex? Top HIV Med.[Internet] 2004 [cited 2017 dez 15]; 12(4):109-18. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15516708
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1551...
.

Também foi demonstrado neste estudo que a idade foi uma variável que influenciou negativamente no desempenho do autocuidado. Estudo mostra que idosos que vivem com HIV/aids por quase 30 anos e fazem parte do grupo pré-terapia antirretroviral desenvolveram as suas próprias estratégias para aumentar a resiliência, incluindo condutas de autocuidado, como dedicação à saúde e envolvimento com os cuidados médicos. Em contrapartida, o grupo de idosos que vivem a era pós-terapia antirretroviral entendeu o autocuidado como se mantendo aderente e se absteve de bons comportamentos de saúde1515 Simoni JM, Pantalone DW. Secrets and safety in the age of AIDS: does HIV disclosure lead to safer sex? Top HIV Med.[Internet] 2004 [cited 2017 dez 15]; 12(4):109-18. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15516708
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1551...
.

Contudo, considerando que a adesão à terapia antirretroviral faz parte de ações que demonstram o autocuidado, estudo realizado na Tanzânia encontrou que a não adesão à terapia antirretroviral foi associada à idade mais jovem e ao desemprego1212 Semvua SK, Orrell C , Mmbaga BT, Semvua HH, Bartlett JÁ, Boulle AA. Predictors of non-adherence to antiretroviral therapy among HIV infected patients in northern Tanzania. PLoS One. 2017 Dec 18;12(12):e0189460. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0189460.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.018...
.

Encontrou-se no presente estudo que a parceria fixa aumenta a chance de a PVHA desempenhar o seu autocuidado. Nesse sentido, percebe-se a escassez de literatura que discutisse especificamente o papel da parceria fixa no desempenho do autocuidado. Outro achado foi evidenciar que a PVHA que tem um bom relacionamento familiar após diagnóstico possui menos chance de realizar mudanças no seu estilo de vida. Esse dado foi considerado como uma regressão espúria, uma vez que não há relação de causa e feito.

No entanto, estudo de revisão bibliográfica sobre redes sociais de apoio às PVHA aponta que há pouca produção científica sobre famílias no contexto do HIV/aids. Os autores ressaltam que, embora se reconheça algumas dificuldades de acesso aos familiares como o preconceito e medo do estigma, é fundamental que haja estudos que privilegiem os familiares e cuidadores das PVHA1818 Silva LMS, Tavares JSC. The family’s role as a support network for people living with HIV/AIDS: a review of Brazilian research into the theme. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(4):1109-1118. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015204.17932013.
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320152...
.

Após a regressão logística foi possível encontrar no presente estudo que a PVHA que apresenta alteração na vida sexual após o diagnóstico do HIV tem maior chance de realizar mudanças no seu estilo de vida. Entretanto, estudo mostra que o diagnóstico do HIV leva as PVHA a terem uma insatisfação sexual1919 Schönnesson LN, Zeluf G, Garcia-Huidobro D, Ross MW, Eriksson LE, Ekström AM. Sexual (Dis)satisfaction and Its Contributors Among People Living with HIV Infection in Sweden. Arch Sex Behav. 2018 Feb 13. http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1106-2.
http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-110...
. A persistência do estigma e da discriminação relacionada ao HIV pode ser uma barreira ao exercício sexual das PVHA, ocasionando mais um efeito sobre o desejo e frequência da atividade sexual do que sobre sua interrupção, fato influenciado pelo estigma do HIV/aids, pela idade, pelos valores morais e religiosos2020 Pinho AA, Barbosa RM, Brignol S, Villela W, Monteiro SS. Drivers of Sexual Inactivity Among Women Living with HIV and AIDS: Findings of the GENIH Study in São Paulo, Brazil. Arch Sex Behav. 2018; Feb 2. http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1110-6.
http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-111...
.

Contudo, acredita-se que conhecer aspectos que podem influenciar o desempenho do autocuidado contribui com a atuação dos profissionais que assistem as PVHA. Enfatiza-se a importância de instrumentos de mensuração de ações de autocuidado, podendo ser utilizados como uma ferramenta metodológica que auxilia na avaliação das respostas dos pacientes ao desempenho do seu autocuidado.

O estudo traz como limitações o fato de os participantes terem sido recrutados em serviço ambulatorial especializado, que tende a apresentar amostras com PVHA que já desempenham melhor o seu autocuidado, uma vez que o recrutamento aconteceu durante a ida dos pacientes às consultas de enfermagem, o que demonstra que esses pacientes se preocupam com a sua saúde. Sendo assim, ressalta-se que presença do paciente na consulta de acompanhamento mostra maior desempenho de autocuidado desses sujeitos pesquisados. Os resultados não devem ser generalizados para outras populações e regiões do país.

Conclusão

Aspectos relacionados ao aumento ou à diminuição do autocuidado nas PVHA, que são atendidas em serviço ambulatorial especializado, foram evidenciados neste estudo. Dentre eles, destaca-se que as PVHA que necessitaram ocultar o diagnóstico do HIV/aids desempenharam menos autocuidado. A chance de realizar o autocuidado diminuiu em relação ao aumento da idade. Por outro lado, encontrou-se que a PVHA que tem parceria fixa possui maior chance de desempenhar o autocuidado.

Enfatiza-se que o uso da Teoria de Orem possibilitou identificar o aumento ou diminuição do autocuidado das PVHA. No entanto, fazem-se necessários outros estudos que privilegiem o caráter analítico do desempenho do autocuidado desses pacientes.

References

  • 1
    Oskouie F, Kashefi F, Rafii F, Gouya MM, Vahid-Dastjerdi M. Facilitating factors of self-care among HIV-positive young women in Iran: a qualitative study. Int J Adolesc Med Health. 2018 Feb 5. doi: http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172
    » http://dx.doi.org/10.1515/ijamh-2017-0172
  • 2
    Macêdo SM, Sena MCS, Miranda KCL. Nursing consultation for patient with HIV: perspectives and challenges from nurses’view. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):196-201. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672013000200007
  • 3
    Basti BD, Mahesh V, Bant DD, Bathija GV. Factors affecting antiretroviral treatment adherence among people living with human immunodeficiency virus/acquired immunodeficiency syndrome: a prospective study. J Fam Med Prim Care. 2017 Jul-Set; 6 (3): 482-6. doi: http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014
    » http://dx.doi.org 10.4103/2249-4863.222014
  • 4
    Thapa S, Hannes K, Buve A, Bhattarai S, Mathei C. Theorizing the complexity of HIV disclosure in vulnerable populations: a grounded theory study. BMC Public Health. 2018;18:162. doi: http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-5073-x.
    » http://dx.doi.org /10.1186/s12889-018-5073-x.
  • 5
    Harris LM, Emlet CA, Pierpaoli Parker C, Furlotte C. Timing of Diagnosis: understanding Resilience Narratives of HIV Positive Older Adults Diagnosed Pre- and Post-HAART. J Gerontol Soc Work. 2018 Jan;61(1):78-103. doi: http://dx.doi.org/10.1080/01634372.2017.1402841
    » http://dx.doi.org/10.1080/01634372.2017.1402841
  • 6
    Silva JP, Garanhani ML, Peres AM. Systematization of Nursing Care in undergraduate training: the perspective of Complex Thinking. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2015;23(1):59-66. doi: http://dx.doi.org 10.1590/0104-1169.0096.2525
    » http://dx.doi.org 10.1590/0104-1169.0096.2525
  • 7
    Caetano JA, Pagliuca LMF. Self-care and HIV/aids patients: nursing care systematization. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):336-45. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692006000300006
  • 8
    Silva MR, Bettencourt ARC, Diccini S, Belasco A, Barbosa DA. Nursing diagnoses for patients with Acquired Immunodeficiency Syndrome. Rev Bras Enferm. 2009;62(1):92-9. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672009000100014
  • 9
    Cunha GH, Galvão MTG. Nursing diagnoses in patients with Human Immunodeficiency Virus/Acquired Immunodeficiency Syndrome in outpatient care. Acta Paul Enferm. 2010;23(4):526-32. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000400013
  • 10
    Orem DE. Nursing: concepts of practice. New York: McGraw-Hill; 1995.
  • 11
    Ministério da Saúde (BR). Boletim epidemiológico AIDS - DST; 2017. [Acesso 30 jan 2018]. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017
    » http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017
  • 12
    Semvua SK, Orrell C , Mmbaga BT, Semvua HH, Bartlett JÁ, Boulle AA. Predictors of non-adherence to antiretroviral therapy among HIV infected patients in northern Tanzania. PLoS One. 2017 Dec 18;12(12):e0189460. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0189460
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0189460
  • 13
    Cunha GH, Fiuza MLT, Gir E, Aquino PS, Pinheiro AKB, Galvão MTG. Quality of life of men with AIDS and the model of social determinants of health. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2015;23(2):183-91. doi: http://dx.doi. org/10.1590/0104-1169.0120.2541
    » http://dx.doi. org/10.1590/0104-1169.0120.2541
  • 14
    Mendonça SCB, Zanetti ML, Sawada NO, Barreto IDC, Andrade JS, Otero LM. Construction and validation of the Self-care Assessment Instrument for patients with type 2 diabetes mellitus. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2017;25:e2890 doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.1533.2890
    » http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.1533.2890
  • 15
    Simoni JM, Pantalone DW. Secrets and safety in the age of AIDS: does HIV disclosure lead to safer sex? Top HIV Med.[Internet] 2004 [cited 2017 dez 15]; 12(4):109-18. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15516708
    » https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15516708
  • 16
    Qiao S, Li X, Stanton B. Theoretical models of parental HIV disclosure: a critical review. AIDS Care. 2013;25(3):326-36. doi: http://dx.doi.org/10.1080/09540121.2012.712658
    » http://dx.doi.org/10.1080/09540121.2012.712658
  • 17
    Hatzenbuehler ML, Phelan JC, Link BG. Stigma as a fundamental cause of population health inequalities. Am J Public Health. 2013;103(5):813-21. doi: http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2012.301069
    » http://dx.doi.org/10.2105/AJPH.2012.301069
  • 18
    Silva LMS, Tavares JSC. The family’s role as a support network for people living with HIV/AIDS: a review of Brazilian research into the theme. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(4):1109-1118. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015204.17932013
    » http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015204.17932013
  • 19
    Schönnesson LN, Zeluf G, Garcia-Huidobro D, Ross MW, Eriksson LE, Ekström AM. Sexual (Dis)satisfaction and Its Contributors Among People Living with HIV Infection in Sweden. Arch Sex Behav. 2018 Feb 13. http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1106-2
    » http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1106-2
  • 20
    Pinho AA, Barbosa RM, Brignol S, Villela W, Monteiro SS. Drivers of Sexual Inactivity Among Women Living with HIV and AIDS: Findings of the GENIH Study in São Paulo, Brazil. Arch Sex Behav. 2018; Feb 2. http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1110-6
    » http://dx.doi.org/10.1007/s10508-017-1110-6
  • *
    Apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasil, processo nº 447511/2014-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2019

Histórico

  • Recebido
    19 Abr 2018
  • Aceito
    12 Out 2018
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
E-mail: rlae@eerp.usp.br