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Editorial

EDITORIAL

O presente número temático oferece ao leitor de SAÚDE E SOCIEDADE uma incursão no campo da metodologia da investigação científica em saúde apresentando artigos de autores brasileiros preocupados com questões de diferentes naturezas nesse âmbito.

A amplitude dos temas tratados pelos diferentes autores permite não somente recobrir aspectos de grande interesse para investigadores da área, mas igualmente ressaltar o aspecto de que abordar questões metodológicas no campo da ciência demanda que se vá além do âmbito dos métodos e das técnicas de investigação científica propriamente dito.

Em função disso o leitor encontrará, no presente número, artigos que recobrem boa parte desse campo por versarem sobre a construção do objeto de estudo e delimitação ou definição de áreas e sub-áreas da Saúde, assim como os diferentes níveis de análise que se apresentam ao tratamento do objeto ou problemas neles presentes.

Em termos da ampla caracterização dessa área é que se coloca, por exemplo, o trabalho de Alvarenga quando define dois eixos básicos do tratamento metodológico: o de uma metodologia teórica e o de uma metodologia da técnica em termos dos quais apresentam-se questões de natureza ontológica, lógica e sobretudo epistemológica. A autora procura, a partir de uma caracterização da Saúde Pública como campo de investigação interdisciplinar, destacar as questões de natureza metodológica que se apresentam ao investigador científico que com elas se defronta, sobretudo quando busca avançar no estudo de problemas emergentes que se colocam à margem da chamada "ciência normal".

Por outro lado, Carvalheiro retoma a discussão da questão epistemológica, colocada em nível do reconhecimento da importância do saber produzido no cotidiano dos serviços de saúde, centrando a análise nas questões relativas à Investigação em Serviços de Saúde (ISS). Para tanto, resgata as tentativas de mapeamento deste campo de investigação e definição de problemas em reuniões específicas realizadas na América Latina nas últimas décadas; discute os principais problemas levantados, notadamente o da delimitação do objeto e campo da ISS; e questiona as propostas recentemente preconizadas por organismos internacionais de formação de redes de investigação.

O trabalho de Minayo constitui-se numa discussão de fundo sobre a questão da interdisciplinaridade. Confronta pelo menos três posições teóricas e busca desmistificar o conceito enquanto solução para os males da ciência moderna. Reflete, porém, sobre as potencialidades do tema enquanto mobilizador de mudanças no âmbito da comunicação entre pares, enquanto superação de simplificações de áreas conexas e de viabilização de projetos estratégicos.

Apontando para as questões tanto do delineamento de campos, construção de objeto, como níveis de análise encontram-se os trabalhos de Nunes, Westphal e Laurenti.

O texto de Nunes busca retraçar a trajetória histórica e conceitual da "Saúde Coletiva", enquanto área de conhecimento e de prática, e suas relações com os projetos preventivista e da medicina, social. Nesse contexto, a questão das modalidades de apreensão do social e do coletivo são temas de destaque. O de Westphal busca colocar os movimentos sociais como sujeitos da saúde e da educação e analisa a questão da delimitação do campo e da área destacando as novas necessidades teóricas que se colocam em nível da abordagem do objeto.

A contribuição do trabalho de Laurenti reside em apresentar a Classificação Internacional de Doenças (CID) simultaneamente como instrumental e como objeto de investigação em saúde. Aponta para a complexidade dos tratamentos da morbidade e da mortalidade que encontra nas próprias revisões sucessivas da classificação os desafios que se colocam a essa modalidade de conhecimento.

O artigo de Spink & Gimenes trabalha questões de natureza metodológica acerca de níveis de análise tendo como objeto de preocupação a pesquisa qualitativa. As autoras tratam as práticas discursivas como práticas sociais pautadas pela intersubjetividade e buscam delinear uma metodologia de análise de tais práticas como produção de sentido articulando, para tanto, diferentes níveis de análise. Interpretam tais práticas discursivas no contexto da experiência de câncer de mama tomada como exemplo empírico de análise da produção de sentido.

Finalmente, dois outros artigos dedicam-se a questões relativas a uma metodologia da técnica. O de Adorno & Castro, versando sobre o emprego da pesquisa qualitativa no campo da Saúde Pública, indica ao leitor que os desafios que se apresentam ao investigador, nessa modalidade de pesquisa, antes de serem técnicos são, sobretudo, de natureza teórico-metodológica. O texto de Lefèvre permite indicar como a questão da formulação do instrumento de coleta de dados num processo de investigação, como questionários, formulários e roteiros temáticos, requer especial cuidado teórico-metodológico no emprego dos conceitos dada a ambiguidade presente em muitos deles que interferem na apreensão do objeto sob estudo. Sugere que o cuidado com o delineamento de um projeto de pesquisa não se centra de maneira exclusiva no instrumental técnico. Este responde por questões que se colocam, previamente, em nível do problema a ser investigado e no quadro de referência conceitual que o circunscreve.

Esperamos, assim, com este número temático sobre questões metodológicas, atender à atualidade e à relevância de um tema para a Saúde que nas últimas décadas assiste a um aumento da sua produção e vem encontrar nos congressos, simpósios e reuniões científicas espaço propício à reflexão sobre as questões que permeiam os processos de investigação no campo e instigam seus pesquisadores a aceitarem desafios e a avançarem no processo de conhecimento.

A Comissão Editorial

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jun 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 1994
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