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Sistema de informações para a gestão local de saúde

APRESENTAÇÕES EM PAINÉIS E MESAS REDONDAS

Sistema de informações para a gestão local de saúde

Valdemar Pereira de Pinho

Médico Sanitarista, Docente do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP

A principal tarefa do movimento sanitário é a viabilização do SUS tal como idealizado na Lei Orgânica da Saúde.

O descrédito do SUS junto à maioria da opinião pública é fruto da sua incapacidade de oferecer soluções adequadas aos problemas de saúde das comunidades.

Os poucos recursos destinados ao setor são responsáveis por uma parte fundamental dessa incapacidade, mas não explicam tudo.

Parte da ineficácia do sistema deve-se ao boicote, mais ou menos dissimulado, colocado em prática pelos defensores de um modelo privatista de prestação de serviços de saúde. Freqüentemente essas forças são as responsáveis pela gestão do SUS, adotando posturas de sucateamento deliberado do serviço público. É a lógica de desacreditar para privatizar, onde os meios de comunicação desempenham um papel fundamental.

No entanto, essa tarefa tem sido facilitada pela baixa qualidade das ações de saúde e pela ineficiência e ineficácia da maioria dos sistemas municipais de saúde, até mesmo em muitos locais onde os responsáveis desejam a implantação dos SUS.

Com o aprofundamento da municipalização da gestão dos serviços de saúde, é nos Sistemas Locais de Saúde (SILOS) que a viabilização do SUS está sendo decidida. A gestão nesse nível precisa ser competente para avaliar a qualidade das ações e intervir para a melhoria da eficácia, efetividade e resolutividade dos SILOS. Nessa tarefa um instrumento fundamental é um Sistema de Informações em Saúde (SIS) que permite a avaliação qualitativa e o estabelecimento de prioridades.

Embora o SIS trabalhe com vários tipos de informação, é o método epidemiológico que permite avaliar as condições de saúde de uma população e os resultados das ações sobre elas. Para uma avaliação qualitativa as informações epidemiológicas são imprescindíveis e devem estar integradas a outras, como características geográficas, sócio-econômicas, demográficas, financeiras, dimensionamento das unidades de saúde, rendimento, etc. Todas devem estar subordinadas à lógica da epidemiologia, embora muitas sejam importantes para a gestão sem serem epidemiológicas.

Uma questão que precisa ser definida é como estruturar o SIS para a realidade que queremos. A medida em que se descentraliza a gestão do SUS torna-se necessário descentralizar o SIS que dará suporte a essa gestão. Há duas possibilidades para isso. A primeira é descentralizar as informações, desagregando-as no nível de SILOS, mantendo o SIS centralizado. Todos os SILOS teriam o mesmo tipo de informações e os mesmos indicadores, garantindo a comparabilidade e a avaliação. Outra possibilidade é a organização de Sistemas Locais de Informação em Saúde (SLIS), referentes a um município ou a um Distrito Sanitário (para as grandes metrópoles). São os SLIS que, organizados adequadamente, podem responder às especificidades de cada SILOS.

Ao se optar pelo SLIS sem os devidos cuidados corre-se o risco de fragmentar ainda mais o SIS, criando múltiplos sistemas independentes, com informações e indicadores não comparáveis, inviabilizando uma avaliação global do SUS.

Viabilizar os SLIS (necessários à gestão local) e compatibilizá-los com os SIS regionais e estaduais e estes com a nacional (necessários à integração do SUS) é o desafio dos profissionais envolvidos na questão. A implantação dos sistemas locais deve ser acompanhada pelos gestores regionais, para garantir a compatibilidade das informações básicas entre os vários SILOS.

Sistemas locais de informação em saúde

Cada SILOS deve organizar um SLIS adequado às suas necessidades de avaliação e intervenção, visando garantir a melhoria das condições de saúde da sua comunidade.

As informações necessárias para a avaliação dos níveis centrais devem ser contempladas no SLIS. Os bancos de dados do nível federal e estadual devem ser usados e o fornecimento, por esses níveis, de dados e informações agregados por município deve ser priorizado. Mas o SLIS deve organizar essas informações segundo a lógica local e coletar e processar outras informações além dessas. Isso permite a elaboração de indicadores que permitam uma vigilância a saúde adequada ao perfil epidemiológico das sub-regiões do SILOS e uma avaliação qualitativa das ações e atendimentos.

O SLIS deve subsidiar decisões administrativas, como priorização de recursos, localização e dimensionamento de unidades de saúde, estabelecimento de perfis profissionais dos recursos humanos e dos treinamentos e atualizações necessários.

Evidentemente um sistema local com todas essas características não será viável a curto prazo. Para a maioria dos SILOS a implantação da utilização rotineira dos dados epidemiológicos clássicos, como mortalidade e vigilância epidemiológica, fornecidos pelos sistemas de informação regionais, estaduais e nacionais, já é um avanço em relação à realidade atual. Mesmo os SILOS que tiverem mais condições de construir um SLIS completo, começarão com algo mais modesto e irão ampliando o sistema de acordo com os novos desafios e a existência de recursos.

Em resumo, a tarefa imediata é viabilizar, a curto prazo, a utilização das informações epidemiológicas clássicas para todos os SILOS, como instrumento de planejamento e avaliação. Os níveis centrais do SIS têm um papel fundamental nessa viabilização. A partir daí, cabe ao nível local, com assessoria do nível regional, desenvolver progressivamente seu SLIS. Os locais que tenham condições de desenvolver sistemas mais avançados devem servir como "laboratórios de teste" de modelos que possam ser incorporados por outros SILOS.

Características do SLIS

No nível local é mais viável a integração de informações de várias instituições, que contribuam para o processo de planejamento e intervenção. O SLIS deve trabalhar, tanto quanto possível, com áreas homogêneas e desagregar as informações para esse nível. Os setores censitários do IBGE podem ser usados como áreas homogêneas, com a vantagem de que é nessa base geográfica que são coletados os dados dos censos e PNADs. Trabalhando com Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) pode-se ter indicadores para essa territoriali-zação, o que permite que cada unidade básica possa identificar e diferenciar os riscos na sua área de cobertura.

Informações sobre condições de saneamento e qualidade dos alimentos, obtidos junto à companhia de água e esgoto e prefeitura, podem indicar o perfil sanitário. Dados da poluição ambiental teriam a CETESB, DPRN e Prefeitura como potencial fonte de informações. O ideal é que as informações sobre mortalidade e morbidade hospitalar, existentes em sistemas nacionais e estaduais, possam ser incorporadas ao SLIS por setor censitário. Idem para a morbidade ambulatorial. Sabemos da dificuldade em conseguir que os profissionais de saúde registrem adequadamente os atendimentos. Para se facilitar essa tarefa podemos utilizar uma ficha resumo de atendimento onde os profissionais registrem apenas o extrato codificado das informações, que serão cruzadas com a área homogênea de onde o cliente provem. Para isso é preciso que os códigos sejam simplificados e não numerosos, para simplificar a procura do código adequado e facilitar a digitação dos dados.

As informações administrativas sobre os atendimentos, encaminhamentos, internações, exames complementares e outros, relacionadas às áreas homogêneas, podem indicar a cobertura, grau de adesão à unidade básica e aos programas, etc. Podem também ser extraídos padrões de atendimento dos profissionais, comparando dados de vários profissionais e de várias unidades da mesma complexidade. Só um sistema de informações por área homogênea garante ações diferenciadas para as populações de alto risco, baseadas em avaliação objetiva do perfil epidemiológico. A construção desse sistema enfrenta inúmeras dificuldades, mas deve ser buscada passo a passo por todos os envolvidos na viabilização do SUS.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jun 2008
  • Data do Fascículo
    1995
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