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Os instrumentos normalizadores (NOB) no processo de descentralização da saúde

The basic operational norms (NOB) in the health decentralization process

Resumos

O presente artigo discute as quatro Normas Operacionais Básicas (NOB), editadas no período de 1991 a 1996, como os principais instrumentos normalizadores do processo de descentralização das ações e serviços de saúde no Brasil, um dos pilares de sustentação do Sistema Único de Saúde. Inicialmente os autores analisam alguns elementos constitutivos da descentralização e posteriormente abordam as NOB, discutindo-as à luz de contextos histórico políticos particulares e dos elementos e princípios da descentralização. Concluem o trabalho ressaltando que a descentralização tem avançado com as NOB, mas que elas têm transcendido seu papel regulador, transformando-se em instrumentos de conformação do modelo de atenção à saúde e até mesmo de direcionamento de políticas públicas para o setor saúde.

Descentralização; Municipalização; Saúde no Brasil; Legislação da Saúde; Sistema Único de Saúde


This article analyses the four Basic Operational Norms (NOB) edited by the Ministry of Health from 1991 to 1996. They are the main normative tools in the decentralization process of health services in Brazil, which is one of the main pillars of the National Health System. In this study, the authors analyse the main characteristics of decentralization, based on NOB approach, related to the political historical context and their principles. In conclusion, the study highlights that the decentralization process has been implemented by the NOB. However, they have transcended their regulatory role and are being applied as political tools, conforming a new health care model and also influencing health policy.

Decentralization; Health Legislation; Health in Brasil; National Health System


ARTIGOS

Os instrumentos normalizadores (NOB) no processo de descentralização da saúde

The basic operational norms (NOB) in the health decentralization process

João Henrique Gurtier ScatenaI; Oswaldo Yoshimi TanakaII

IProfessor Assistente de Instituto de Saúde Coletiva da UFMT e Doutorando do Departamento de Saúde Materno-Infantil da FSP/USP e-mail: jscatena@zaz.com.br

IIProfessor Associado do Departamento de Saúde Materno-Infantil da Faculdade de Saúde Pública da USP. e-mail: oytanaka@usp.br

RESUMO

O presente artigo discute as quatro Normas Operacionais Básicas (NOB), editadas no período de 1991 a 1996, como os principais instrumentos normalizadores do processo de descentralização das ações e serviços de saúde no Brasil, um dos pilares de sustentação do Sistema Único de Saúde. Inicialmente os autores analisam alguns elementos constitutivos da descentralização e posteriormente abordam as NOB, discutindo-as à luz de contextos histórico políticos particulares e dos elementos e princípios da descentralização. Concluem o trabalho ressaltando que a descentralização tem avançado com as NOB, mas que elas têm transcendido seu papel regulador, transformando-se em instrumentos de conformação do modelo de atenção à saúde e até mesmo de direcionamento de políticas públicas para o setor saúde.

Palavras-chave: Descentralização, Municipalização, Saúde no Brasil, Legislação da Saúde, Sistema Único de Saúde.

SUMMARY

This article analyses the four Basic Operational Norms (NOB) edited by the Ministry of Health from 1991 to 1996. They are the main normative tools in the decentralization process of health services in Brazil, which is one of the main pillars of the National Health System. In this study, the authors analyse the main characteristics of decentralization, based on NOB approach, related to the political historical context and their principles. In conclusion, the study highlights that the decentralization process has been implemented by the NOB. However, they have transcended their regulatory role and are being applied as political tools, conforming a new health care model and also influencing health policy.

Key-words: Decentralization, Health Legislation, Health in Brasil, National Health System.

INTRODUÇÃO

O movimento da Reforma Sanitária brasileira teve seu apogeu com a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986), a criação da Comissão Nacional de Reforma Sanitária e com a instituição do Sistema Único de Saúde, pela Constituição de 1988. Esta, a Constituição Cidadã, foi a que mais avançou no campo dos direitos sociais, consolidando ganhos pelos quais a sociedade ansiava há décadas e colocando o país, sob o ponto de vista de aparato legal, em um patamar mais elevado de justiça social.

No que tange à saúde, se por um lado a Constituição passou a conceber saúde como "direito de todos e dever do Estado", por outro, não conseguiu estabelecer com clareza, em seu texto – Art. 198, P. U. (BRASIL, 1988) – como dar-se-ia o financiamento desse Sistema de acesso universal e igualitário. Ao refletir as contradições da própria sociedade, a Constituição de 1988 promove avanços e mantém privilégios, mas são inquestionáveis os progressos assegurados no campo da saúde, salientando-se (BRASIL, 1988):

- a mudança de concepção de saúde;

- o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde;

- a mudança na forma de organização do Sistema - com destaque para a descentralização - tendo em cada esfera de governo a única responsável pela direção de seu sistema;

- a mudança da lógica curativa sobre a preventiva, ao propor o atendimento integral com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo das assistenciais;

- a participação da comunidade, enquanto a alimentadora, a orientadora e controladora do sistema ;

- a participação, apenas em caráter complementar, da iniciativa privada.

Passados dez anos, a impressão que se tem é que o Sistema Único de Saúde (SUS), que foi consagrado pela Constituição de 88 como modelo hegemônico, não parece ser o mesmo Sistema que se tem atualmente: por volta de 25,0% da população brasileira está vinculada ao sub-sistema privado de saúde, a concepção de saúde tendo a doença como referência e a lógica curativa parecem estar cada vez mais incorporadas pela sociedade e estão constantemente sendo questionados os princípios da universalidade e igualdade de acesso ao Sistema, bem como o da integralidade da atenção à saúde. Nesse cenário pessimista que se descortina, a descentralização e a participação popular parecem ser os únicos (e últimos) bastiões de resistência do SUS.

Constituído em 1988, o SUS somente vai ser regulamentado em 1990 e há que se ressaltar que quando foram sancionadas as Leis Orgânicas da Saúde – Lei nº 8080 (BRASIL, 1990) e nº 8142 (BRASIL, 1990) – já se vivia em outro contexto político, mais permeável à pressão de grupos de interesse corporativos e clientelísticos, não tão favorável à implantação do SUS como originalmente concebido, como expressam os vetos efetuados à Lei 8080 e analisados por SANTOS (1990) e MEHRY (1990). Regulamenta-se o SUS no final de 1990, mas o processo de descentralização da saúde se inicia, de forma mais concreta, a partir de 1991, com a edição da Resolução nº 273 do INAMPS – a Norma Operacional Básica 1/91 (BRASIL, 1991) – à qual se seguiram a NOB 1/92, da Secretaria Nacional de Assistência à Saúde/MS (BRASIL, 1992), a NOB 1/93 (BRASIL, 1993) e a NOB 1/96 (BRASIL, 1996), estas últimas emitidas pelo próprio Ministro da Saúde. A própria identificação dos atores e instâncias responsáveis pela elaboração e edição destas normas já dá indicações das distintas conjunturas, concepções e responsabilidades que vão se conformando no processo de construção deste sistema e mais particularmente da descentralização.

Se o Sistema Único de Saúde tem sido tão criticado e tão desacreditado, principalmente pelos segmentos que não têm interesse na sua real implantação, há por outro lado, que se considerar que ele é o modelo (público) de saúde ao qual recorre a maioria da população do país. Além disso, foi somente nos últimos 8 anos – após a instituição das Normas Operacionais Básicas – que grande parcela dos municípios brasileiros vêm assumindo, de fato, a responsabilidade pela estruturação e gestão de seus Sistemas Municipais de Saúde.

Face ao exposto, busca-se neste trabalho, em sua primeira parte abordar o termo descentralização, tentando discutir alguns dos elementos que o constituem. Num segundo tópico são apresentadas as quatro Normas Operacionais Básicas mencionadas, à luz dos elementos constitutivos da descentralização.

DESCENTRALIZAÇÃO

A descentralização permeia vários capítulos da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, mas não deve ser entendida apenas como um produto da Assembléia Nacional Constituinte e da abertura política que permitiu sua instalação. De fato, como afirma TOBAR (1991), a descentralização está ligada ao processo de construção do Estado Moderno, aparecendo na consolidação dos regimes democráticos e desaparecendo durante as ditaduras, e mais que isto, é um dos resultados (ou uma das conseqüências) das mudanças que vêm se operando neste último quartil de século, principalmente nos países centrais, as quais vêm repercutindo, às vezes até de forma traumática, nos demais países dependentes, entre os quais o Brasil. A emergência de uma economia pós-industrial, a crise do emprego, o aumento do desemprego e da demanda por serviços públicos, a redução do crescimento do PIB, as mudanças do perfil demográfico, a globalização, entre outros fatores (que são alguns dos elementos constitutivos da crise do Welfare State), fizeram com que fosse revisto o papel de um Estado Nacional forte, protetor e centralizado (ABRUCIO & COSTA, 1998; BARROS, 1997; MEDICI, 1991; VIANA, 1997; MENDES, 1998).

ABRUCIO & COSTA (1998), num balanço das reformas realizadas nos países desenvolvidos, frente a este cenário, identificaram duas "reações" de peso: a modificação do modelo de intervenção econômica, através de privatizações, concessões de desregulamentação, tendo o Estado, neste processo, um importante papel regulador, e a adoção de novas formas de gestão, entre as quais se sobressai a descentralização. Neste sentido, a descentralização emerge como uma estratégia – de ordem gerencial – de reestruturação do Estado.

Embora nessa perspectiva a descentralização possa aparecer apenas como possibilidade de conferir maior eficácia e eficiência ao aparato estatal (na lógica do Estado mínimo), a descentralização, segundo vários autores também está associada à democratização, à centralização, à desconcentração, à autonomia, ao modelo de organização, ao princípio federativo e até mesmo à privatização. Assim, o conceito de descentralização não deve ser único ou fechado, uma vez que ele vai estar sendo construído a partir de determinadas concepções, do contexto em que está sendo utilizado e também das posições político-ideológicas de quem o está definindo e utilizando. Nesse aspecto, considera-se mais interessante apresentar e explorar sucintamente algumas das várias dimensões do termo, na busca de sua construção, que limitá-lo a uma definição fechada.

Descentralização e Centralização

BOBBIO et al. (1993) concebem descentralização a partir de centralização, num universo onde ambas não podem existir em forma pura (por contrariarem - nesta forma - a própria noção de Estado), mas sempre entrelaçadas e em relação dinâmica. Para o autor, tem-se

"...centralização quando a quantidade de poderes das entidades locais e dos órgãos periféricos é reduzida ao mínimo indispensável, a fim de que possam ser considerados como entidades subjetivas de administração. (Tem-se) ...ao contrário, descentralização quando os órgãos centrais do estado possuem o mínimo de poder indispensável para desenvolver as próprias atividades" .

Tendo em vista o que refere esse autor, o poder emerge como elemento chave para a caracterização da descentralização (e da centralização), entendendo-se "poder" num sentido amplo, que engloba minimamente as dimensões política, administrativa, financeira e fiscal. Claro está que tanto a descentralização como a centralização absolutas são apenas possibilidades teóricas. Mesmo em regimes autoritários, quando o poder é centralizado, não é possível que ele o seja de modo total, de tal forma que toda uma nação seja completamente controlada por um poder central. Não seria possível afirmar, por exemplo, que a ditadura no Brasil conseguiu ter, durante 20 anos, um poder absoluto sobre todos os municípios brasileiros. Por outro lado, a descentralização absoluta provavelmente representaria o caos, principalmente para uma nação com tantas desigualdades como o Brasil. Cada esfera de governo tem seu papel definido, dentro do princípio do federalismo que vigora neste país e a cada uma delas devem ser conferidos poderes para o desempenho desses papéis. A descentralização, neste sentido, implica em transferência (ou alocação) de poder para o exercício dos respectivos papéis.

No caso da Saúde, a descentralização visa a constituição de Sistemas Locais de Saúde que respondam adequadamente às demandas e necessidades da população adscrita, mas que ao invés de se caracterizarem como sistemas isolados e autônomos, sejam elementos e elos dinâmicos de Sistemas Estaduais, que conformam um Sistema Nacional. Neste sentido, a descentralização – e a centralização – têm que coexistir, de forma pactuada, para garantir o fortalecimento do Sistema Nacional de Saúde e não a atomização dos Sistemas Locais.

Quando se fala em transferência de poder a cada esfera de governo (União ® estados ® municípios), já se está definindo qual forma de descentralização – entre níveis de governo – está em discussão, uma vez que outras existem (UGA, 1991), tanto no sentido da administração direta para a indireta (autarquias, fundações e empresas públicas) como no sentido do Estado para a sociedade civil (através de articulação com as organizações da sociedade civil ou através da venda de empresas públicas ao setor privado).

Descentralização e Democracia

Há uma tendência praticamente universal de se associar descentralização à democracia. Progressistas vêem na descentralização uma estratégia para a criação de instituições onde a participação dos cidadãos – enquanto sujeitos sociais, atuantes em decisões políticas – pode ser viabilizada (BORJA apud ARRETCHE, 1996). Já para os liberais, segundo ARRETCHE (1996), a descentralização representa a possibilidade de rompimento com estruturas centralizadas, liberando a capacidade de iniciativa da sociedade.

No entanto, a descentralização, por si só, não é condição suficiente para promover a democracia, pois, como afirma essa autora: "É a concretização de princípios democráticos nas instituições políticas de cada nível de governo que define seu caráter..." . Assim, caso os princípios democráticos não estejam incorporados nas instituições que compõem um determinado município, a transferência de poder do centro para a periferia, pode significar apenas uma "mudança de endereço" da centralização e não a descentralização propriamente dita. Deste modo, associa-se à transferência de poder, a necessidade de um certo desenvolvimento democrático, para que se dê, de fato, a descentralização.

É inegável, no entanto, a possibilidade de a transferência de poder do centro para a periferia (contando esta com uma estrutura ainda precária de participação popular), funcionar como um estímulo para a constituição de instituições e incorporação de princípios democráticos, viabilizando, com o tempo, a plena descentralização. Nesse sentido, assume-se a não associação obrigatória de descentralização com democracia, mas alinha-se com o pensamento de Borja (apud ARRETCHE, 1996), ao se admitir a possibilidade de a descentralização ser também elemento viabilizador de democracia.

Os princípios democráticos, e as qualidades da descentralização face a tais princípios (ambos sintetizados no Quadro 1) foram trabalhados por UGA (1991), que analisou as possibilidades, bem como as dificuldades e limitações, de a descentralização conduzir aos princípios democráticos, concluindo que embora a descentralização tenha grande importância no processo de implementação da democracia, ela, por si só, não garante sua viabilização. À transferência de poder há que se somar minimamente a constituição de instituições representativas, a incorporação de princípios democráticos, o exercício da (e a educação pela) prática democrática, através da participação, tudo isto em um ambiente amplo – nacional – de democracia. Nada que não possa ser, no entanto, gradual, progressiva e continuamente alcançado, ou construído.


Descentralização e/versus Desconcentração

Descentralização tem significado distinto de desconcentração. A primeira, segundo TOBAR (1991) incorpora a noção de redistribuição de poder, de alteração de interesses de grupos de poder, enquanto a desconcentração envolve delegação de competências sem deslocar o poder decisório. Posição semelhante é adotada por JUNQUEIRA (1996, 1997), ao referir que:

"A desconcentração difere da descentralização pois enquanto na primeira há apenas um deslocamento da decisão, na segunda o poder é transferido. São estratégias diversas para atingir um mesmo objetivo: levar para mais próximo da população o poder de decisão sobre as ações do poder público, com o intuito de dar maior eficácia às ações estatais, viabilizando a participação" .

UGA (1991) também diferencia desconcentração de descentralização, embora admita que a primeira possa estar inclusa na segunda, uma vez que descentralização implica na redistribuição de encargos (coincidindo com desconcentração) e também dos meios (poder e recursos) para executá-los.

Não é pequeno, no entanto, o número de autores que como MEDICI (1994, 1995) e TEIXEIRA (1990), não vêem a dicotomia entre ambas, identificando na desconcentração uma etapa do processo de descentralização. Segundo MEDICI (1995) "...pode-se afirmar que: a) a desconcentração é condição necessária, mas não suficiente para um processo pleno de descentralização; b) a desconcentração faz parte do processo de descentralização e pode ser considerada como uma forma de descentralização".

É também Medici que ao analisar o Financiamento do Setor Saúde, elabora o diagrama apresentado abaixo, que se baseia na taxonomia de Affonso (apud MEDICI, 1994), o qual também conceitua os vários "tipos" de descentralização ilustrados no diagrama.

Desconcentração financeira: a responsabilidade sobre o gasto mantém-se sob o poder das esferas centrais de governo, embora a operação seja feita por uma agência do governo central, no nível local.

Descentralização autônoma: passagem de responsabilidade da esfera de maior para a de menor hierarquia, financiada mediante recursos próprios desta última esfera.

Descentralização dependente: passagem de responsabilidade da esfera de maior para a de menor hierarquia, financiada através de transferências de recursos da esfera mais central.

Descentralização dependente tutelada: baseada em transferências negociadas de recursos financeiros.

Descentralização dependente vinculada: baseada em transferências automáticas de recursos financeiros, legalmente definidos.

Nos vários sistemas estaduais e municipais de saúde, essas diferentes modalidades estarão ocorrendo simultaneamente e essa tipologia de descentralização, mesmo que restrita ao componente financiamento do setor saúde, traz elementos importantes e que vão auxiliar no processo de caracterização das várias "descentralizações" concebidas nas distintas Normas Operacionais Básicas.

Descentralização, Federalismo e Autonomia.

O federalismo aparece no Brasil com a proclamação da república, em 1889 e é homologado pela Constituição de 1891, que em seu Art. 1º institui a república como "...a união perpétua e indissolúvel das antigas províncias, em Estados Unidos do Brazil" (BRASIL, 1891). Embora de inspiração nitidamente americana, o federalismo brasileiro pouco tem a ver com aquele modelo, em seus princípios básicos, ou seja, enquanto o federalismo dos EUA surge como um pacto entre os estados autônomos, suscitando o aparecimento e a organização de uma instância central federal, no Brasil a União é antecessora e criadora dos estados, que de províncias do império passam a unidades federadas, às quais são distribuídas parcelas de poder. Enquanto o modelo americano é agregador, uma vez que é sustentado por um acordo pactuado entre partes autônomas, o modelo brasileiro, embora proponha a descentralização, é desagregador, fomentando a distribuição desigual de poder aos estados, conforme o poder político e econômico dos mesmos (ABRUCIO & COSTA, 1998).

A definição de um Estado Federal implica numa descentralização política, a qual segundo BOBBIO (1993) expressa uma idéia de direito autônomo. Para esse autor, "somente quando a descentralização assume os caracteres de uma descentralização política podemos começar a falar de federalismo ou, a nível menor, de uma real autonomia política das entidades territoriais".

Em relação ao Brasil, há que se determinar quais são os níveis de descentralização e de autonomia políticas que têm as esferas regionais (estados) e municipais e se eles expressam, realmente, a idéia de direito autônomo. Os níveis sub nacionais tiveram sua autonomia ampliada após 1988, mas ainda se trata de uma autonomia limitada, uma vez que, principalmente em termos financeiros, grande parte dos estados e a maioria dos municípios brasileiros são bastante (e às vezes totalmente) dependentes dos repasses financeiros centrais. É óbvio que por trás dessa relativa centralização financeira (que já foi muito mais acentuada e impermeável a questionamentos) está a necessidade da existência, num Estado Federal democrático, de um governo central com papel redistributivo e redutor de desigualdades, mas também é inegável que tal situação limita a autonomia dessas esferas de governo.

Como parte de um todo, a descentralização, enquanto princípio do federalismo, se complementa na sua relação de cooperação/competição com a centralização, definidora da alocação e/ou transferência de poder para o exercício das atribuições de competência de cada esfera de governo.

Princípios da Descentralização

Concebe-se a descentralização como uma estratégia ou como instrumento que possa, associado a outros, promover alterações político-institucionais. Assim, à semelhança do posicionamento assumido por TOBAR (1991), MEDICI (1995) e LOBO (1988), entre outros autores, a descentralização representa um meio para viabilizar mudanças e não um fim em si própria. Em termos amplos, a descentralização pode auxiliar na viabilização da democratização do Estado e de maior justiça social, enquanto no setor saúde pode ser um dos elementos viabilizadores da universalidade e eqüidade de acesso aos serviços de saúde, da mudança do modelo de atenção à saúde, da oferta adequada às necessidades e da participação e controle social, entre outros princípios de sustentação do SUS.

Também é importante salientar alguns princípios norteadores, que orientam a descentralização na consecução dos objetivos a que ela se propõe. LOBO (1988, 1990) enumera quatro desses princípios, que se sobressaem entre outros:

- flexibilidade: entendida como "tratamento diferenciado aos governos sub-nacionais", ou seja, as desigualdades políticas, econômicas, técnico-administrativas e sociais – intra e extra – regionais, estaduais e municipais devem ser consideradas e tratadas de forma diferenciada. Não deve existir um "modelo" único e fixo de descentralização;

- gradualismo e progressividade: incorpora a flexibilidade e trata da adequação da descentralização às distintas realidades definidas no tempo e no espaço, permitindo que ela se consolide de forma gradual e contínua, não somente a partir de deliberações centrais, mas como resultado de processos pactuados de mudanças;

- transparência no processo decisório: como a descentralização trata fundamentalmente de transferência de poder, o exercício desse poder descentralizado implica em transparência, para que ele se legitime, se implemente e se perpetue;

- controle social: associado à transparência no processo decisório, o controle social é elemento de democratização do Estado, sendo ambos, princípios orientadores do futuro do processo de descentralização. A descentralização da saúde pode, por exemplo, significar uma centralização municipal, caso neste nível o exercício de poder do secretário municipal de saúde não seja transparente e/ou as instituições de controle social – Conferência Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Saúde (legitimamente constituído), Conselhos Gestores, Ouvidoria de Saúde – não existam, ou estejam à margem do processo decisório municipal.

Descentralização e os Instrumentos Normalizadores

Uma vez expostos alguns dos elementos que conformam a descentralização, bem como alguns de seus princípios norteadores, suscita interesse analisar como tais elementos e princípios estão incorporados aos instrumentos que vêm orientando o processo de descentralização da saúde, após a Constituição de 1998 e a sanção das Leis Orgânicas da Saúde.

Norma Operacional Básica 01/91

Editada pelo INAMPS/MS em janeiro/91 e reeditada em julho do mesmo ano, a NOB 01/91 (BRASIL, 1991) reproduz em seu texto muitos dos elementos que compõem as Leis Orgânicas da Saúde, uma vez que elas constituem as bases de implantação e operacionalização do Sistema Único de Saúde, mas o enfoque desta Norma está basicamente direcionado à normalização de mecanismos de financiamento do SUS – repasse, acompanhamento, controle e avaliação dos recursos financeiros do INAMPS para os municípios e/ou estados –, mecanismos estes considerados fator de incentivo ao processo de descentralização.

Chama primeiramente a atenção – e é uma evidência de que se evoluiu no processo de construção do SUS, quando se o analisa atualmente – o fato que esta NOB tenha sido editada sob a chancela do INAMPS, revelando como são complicados, cheios de avanços e retrocessos, os caminhos de uma mudança. Desde 1990 vinculado ao Ministério da Saúde (que também contemplava um "Departamento do SUS"), o INAMPS, instituto que com esta ou outras denominações foi o mantenedor de um modelo de saúde médico-assistencial-hospitalar, continuava a manter o poder (e principalmente os recursos financeiros) para editar uma norma orientadora para o Sistema Nacional de Saúde. Não é casual, portanto, que tal Norma privilegiasse o financiamento, e mais especificamente da Assistência Hospitalar e Ambulatorial.

A não ser quando essa NOB se reporta às Leis 8080 e 8142, não se evidenciam em seu texto, maiores referências a alguns dos elementos constitutivos da descentralização, como democracia, federalismo e autonomia. Já a centralização e a desconcentração financeiras são elementos que a permeiam, implícita ou explicitamente. A centralização está presente na forma extremamente fechada com que são definidos os repasses financeiros para as atividades hospitalares e ambulatoriais.

Para as atividades hospitalares, o pagamento é feito diretamente do INAMPS ao estabelecimento provedor do serviço. Também é o nível central que define os critérios – demográficos, epidemiológicos e de estrutura física – que orientarão o repasse de AIH aos municípios e aos Estado. Aos municípios que preenchem os critérios prescritos na lei Nº 8142, cabe o encargo da distribuição das AIH aos prestadores públicos, filantrópicos e contratados. Neste sentido, apenas uma atribuição administrativa foi transferida aos municípios, caracterizando uma desconcentração. Além disso, a parcela de AIH dos municípios "não habilitados" – provavelmente os de menor porte e mais deficitários em termos de estrutura e provisão de serviços –, somada a 20,0% do total de AIH calculadas com base na população de cada município, são alocadas nas Secretarias Estaduais, as primeiras para serem gerenciadas por esta instância e as segundas compondo o "fundo de compensação de demanda". Desnecessário dizer que tal estratégia transforma as AIH em instrumento de poder (o "cheque em branco"), que acaba favorecendo os municípios política e estrategicamente mais importantes, ou socialmente organizados, o que quase sempre exclui os municípios mais carentes.

Para as atividades ambulatoriais, mais uma vez é o INAMPS que estabelece os valores das Unidades de Cobertura Ambulatorial (UCA) para cada estado, que segundo aquele órgão, baseiam-se nos critérios: população, capacidade instalada, qualidade e desempenho técnico, econômico e financeiro da rede em períodos anteriores. Uma parcela de 10,0% dos recursos para atividades ambulatoriais é mantido no nível estadual, enquanto os 90,0% restantes são destinados (proporcionalmente a sua população) aos municípios, recebendo-os em seus Fundos Municipais de Saúde, os municípios habilitados e indiretamente (via Secretarias Estaduais) os demais municípios. Os critérios definidores da UCA acabam também perpetuadores de desigualdades, uma vez que tendem sempre a favorecer as regiões mais desenvolvidas do país. Já o repasse direto de recursos financeiros para os municípios habilitados representa uma descentralização dependente vinculada, um avanço em termos de municipalização, ainda que limitado pela insuficiência destes recursos e principalmente pela carência de outros (materiais e humanos).

A NOB 01/91 também propõe recursos para investimento na rede, através das Unidades de Capacitação da Rede (URC) numa tentativa de diminuir as desigualdades regionais (principalmente na estrutura de provisão de serviços), que as rubricas anteriores (assistência hospitalar e ambulatorial) reproduzem. Assim, os estados cuja UCA tem o maior valor, receberiam um incentivo correspondente a 1,0% deste valor para "reposição, e modernização tecnológica dos equipamentos da rede pública estadual e municipal", enquanto aqueles cuja UCA tem o menor valor, receberiam, a título de URC, incentivos correspondentes a 5,0% daquele valor. Estes recursos, transferidos e administrados pelas Secretarias de Estado, deveriam ser utilizados contemplando os projetos previstos no consolidado estadual dos Planos Municipais de Saúde. Salienta-se que a diferença de 4,0% entre a menor e maior UCR representa valores insuficientes para corrigir distorções regionais muito grandes, o que associado à não inclusão, no consolidado estadual, dos planos municipais de saúde daqueles municípios que não têm condições de elaborá-los, somente acentua a desigualdade na provisão de serviços de saúde e na estruturação dos Sistemas Municipais de Saúde.

Finalmente são propostos estímulos à municipalização do SUS e às ações de saúde coletiva, através do Fator de Estímulo à Municipalização (FEM), que corresponde a 5,0% do valor da UCA, transferidos mensalmente àqueles municípios que atenderam os 7 requisitos básicos previstos na lei Nº 8142. De todos os recursos financeiros definidos nesta NOB, estes são os únicos, que embora insuficientes, dão aos municípios certa autonomia, pois não estão vinculados a uma contraprestação de serviços, apenas ao cumprimento de preceitos definidos nas LOS, ficando a critério dos municípios o emprego destes recursos. Neste sentido, pode-se falar de uma descentralização (financeira) dependente vinculada. Não sem razão, dá-se após esta NOB – e provavelmente incentivado pelo FEM – , o crescimento do interesse dos municípios em "municipalizar-se", criando os Conselhos e Fundos Municipais de Saúde, elaborando Planos Municipais de Saúde, Programação e Orçamentação de Saúde e Relatórios de Gestão, constituindo Comissão de Elaboração do Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS) e aumentando sua contrapartida financeira para a saúde.

Quanto aos princípios norteadores da descentralização, são pouco freqüentes na NOB 01/91 as cláusulas que incorporam flexibilidade e gradualismo/progressividade. O financiamento das atividades hospitalares, através das AIHs, permitem apenas às Secretarias Estaduais de Saúde, com muita limitação, efetuar algumas correções, através de um fundo de compensação de AIH. O financiamento de atividades ambulatoriais são baseados nas UCAs, com critérios que, se adequados do ponto de vista técnico administrativo, não contemplam, com justiça, as desigualdades regionais e estaduais. Apenas observa-se uma "tentativa" de flexibilidade quando da proposição do financiamento para investimento na rede e para incentivo à municipalização e às ações de saúde pública, embora as percentagens propostas e as diferenças que elas representam sejam ainda pequenas e insuficientes para desfazer desequilíbrios estaduais e municipais.

A transparência e o controle social estão contemplados no item II da NOB – Acompanhamento, Controle e Avaliação – mas de forma a dar muito mais ênfase aos processos burocráticos de prestação de contas (são 17 sub-itens que tratam desse assunto) que às orientações com vistas ao fortalecimento de instituições políticas viabilizadoras da transparência e controle social.

A NOB 01/91 teve seu papel histórico no processo de construção do SUS e destacou-se como o primeiro instrumento a regulamentar os inúmeros "espaços abertos" deixados pelas Leis Orgânicas da Saúde. Sua grande limitação é derivada de sua orientação pelos princípios do INAMPS e de seu enfoque dirigido fundamentalmente ao financiamento, com valorização das atividades hospitalares e ambulatoriais, perpetuando a lógica de privilegiamento da assistência médica (e da concepção de saúde tendo a doença como referência), que sempre orientou o INAMPS. Além disso, a forma convenial que permitia a municipalização – termo aditivo entre INAMPS e prefeituras, excluindo as Secretarias Estaduais – e o controle exercido pela Coordenadorias Regionais do INAMPS, representaram uma barreira à habilitação para a grande maioria dos municípios brasileiros.

Norma Operacional Básica 01/92

A NOB 01/92 (BRASIL, 1992) foi editada pela Secretaria Nacional de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde (SNAS/MS), instância à qual se encontrava subordinado o "Departamento do SUS". Ela inova em relação à sua predecessora por alguns aspectos:

- É produto de um consenso entre SNAS/MS, INAMPS, CONASS e CONASEMS, cenários onde atuam distintos atores, representando interesses e expectativas diversos e não raro antagônicos;

- Inclui em seu texto uma introdução que destaca os elementos fundamentais da Constituição de 88 (Capítulo da Saúde) e das leis Nº 8080 e 8142, ressaltando o caráter processual da construção do SUS;

- Recupera, principalmente em sua Introdução e nos itens 1 (Planejamento), 6 (Processo de Municipalização) e 8 (Disposições Gerais), elementos constitutivos da descentralização (não entendida como desconcentração) tais como autonomia e democracia, e sua concorrência com a centralização, além de princípios norteadores como flexibilidade, gradualismo/ progressividade, transparência e controle social.

No entanto, quando essa NOB trata do financiamento, praticamente mantém o que a NOB anterior regulamentava. É priorizado o financiamento da assistência médica curativa (atividades hospitalares e ambulatoriais) com repasses baseados em dados populacionais (para as AIHs) e além desses, em estrutura física e desempenho financeiro prévio (para as UCA).

Os municípios que cumprem os requisitos enumerados pela Lei 8142 passam a ter uma "autonomia limitada", frente à assistência hospitalar e ambulatorial. Eles podem administrar a distribuição das AIH (80,0% delas, pois 20,0% compõem o Fundo de Compensação), mas o pagamento continua sendo feito pelo nível central. Têm-se, deste modo, apenas uma desconcentração, no caso da assistência hospitalar, uma vez que somente os encargos são redistribuídos aos municípios. A NOB ainda estabelece alguns critérios para a distribuição das AIH alocadas nas Secretarias de Estado de Saúde (AIH dos municípios não habilitados + Fundo de Compensação), sugerindo que o planejamento integrado tenha precedência sobre o critério populacional, mas como a maioria dos municípios, entre os quais os mais carentes, continuam sem condições de se habilitar, e portanto inserir-se ativamente no planejamento integrado, continuam a valer os critérios populacionais e políticos, reprodutores de desigualdades.

Os municípios habilitados também podem administrar os serviços ambulatoriais públicos e conveniados, desde que respeitados os tetos de recursos financeiros definidos centralmente (SNAS/MS e SES), para repasse aos municípios. Neste sentido, esta NOB é mais centralizadora que a anterior, pois reduziu a parcela a ser transferida para o nível local, enquanto aumentou a parcela sob controle das Secretaria de Estado. Mesmo considerando a limitação financeira, tem-se uma "parcial" descentralização dependente vinculada, no caso da gerência das atividades ambulatoriais, pois aos municípios habilitados são repassados os encargos e os meios, estes últimos parcialmente, haja vista a insuficiência dos recursos financeiros e a não inclusão dos recursos materias e humanos.

Encontra-se aberta a possibilidade de descentralização financeira dependente tutelada para outros investimentos e a descentralização autônoma é contemplada à medida que essa NOB reitera a necessidade de que os recursos financeiros estaduais e municipais também componham o financiamento da saúde. Novamente nessa NOB, tanto o investimento na rede como o estímulo à municipalização e às ações de saúde coletiva são contemplados com parcelas que no máximo podem atingir a 5,0% do valor da UCA, mantendo assim, a priorização das ações curativas e não permitindo interferências substantivas no quadro de desigualdades regionais e municipais.

Mesmo mantendo a mesma orientação que a NOB anterior, no que tange ao financiamento e regulamentação de repasses financeiros – através de convênios –, a NOB 01/92, em relação à descentralização, pode ser considerada um instrumento normativo transicional, pois avança na explicitação de elementos e princípios da descentralização que, conforme a própria NOB,

"... não deve ser entendida apenas pelo cumprimento aos critérios estabelecidos na Lei 8142/90, para repasse, de forma regular e automática, dos recursos financeiros federais para cobertura das ações e serviços de saúde a serem implementados pelos municípios. Ela deve ser entendida principalmente pela nova responsabilidade do município de administrar as ações e serviços de saúde em sua área de abrangência, planejando, decidindo e gerindo os recursos humanos, materiais e financeiros. É o estabelecimento do comando único do SUS na esfera municipal" (BRASIL, 1992).

Em que pesem as limitações destas duas NOB, observou-se, desde 1991, um gradual aumento no número de municípios brasileiros que se organizaram para o cumprimento dos critérios definidos lei Nº 8142 (Tabela 1). Estes municípios habilitados passam – ainda que de forma bastante limitada – a ter algum poder (ou pelo menos algum controle) sobre os seus sistemas locais de saúde.

Em 1993, a descentralização da saúde implementava-se em mais de 1/5 dos municípios brasileiros, o que em termos populacionais tinha expressão muito maior, haja vista que dentro deste milhar de municípios incluíam-se a maioria das capitais e grandes municípios.

Norma Operacional Básica 01/93

Algumas características diferenciam essa NOB de suas antecessoras:

1. É originária do trabalho do Grupo Especial de Descentralização (GED), o qual elaborou uma proposta de operacionalização dos preceitos legais que fundamentam o SUS, proposta esta aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) em janeiro de 1993, seguida de "...um longo processo de discussão e negociação com o conjunto dos atores da área (da saúde). ...Gestores estaduais e municipais, setor privado, entidades de representação popular e sindical, instituições públicas federais, entidades científicas se dedicaram a analisar, questionar e oferecer sugestões para o aperfeiçoamento da proposta" (Ministério da Saúde, 1993), sugestões estas que foram, em sua maioria incorporadas e redundaram na versão final do documento "Descentralização das ações e serviços de saúde: A ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei", aprovado pelo CNS em 15 de abril de 1993.

2. É editada pelo próprio Ministro da Saúde;

3. Busca regulamentar não apenas o financiamento, mas o processo de descentralização da gestão dos serviços e ações no âmbito do SUS

O fato desta Norma ter sido editada como portaria ministerial (e não pela Secretaria Nacional de Assistência à Saúde, ou INAMPS, como suas antecessoras) é evidência e resultado de um outro contexto político, no qual atores do movimento sanitário favoráveis à descentralização constituem grupo técnico no Ministério da Saúde e ocupam espaços políticos estratégicos – CONASS, CONASEMS – (ALMEIDA, 1995), enquanto aumentam as pressões de prefeitos e secretários municipais, por condições (entenda-se poder – principalmente na forma de recursos financeiros) para assumirem a saúde em nível local. Dá-se uma grande valorização política da Saúde, embora sem uma concomitante valorização e implementação de Políticas de Saúde.

Encontram-se presentes na Introdução da NOB 01/93 os elementos que caracterizam a descentralização: redistribuição de poder (e não desconcentração); reorganização institucional envolvendo dimensões políticas, sociais e culturais, diálogos, negociação e pactuação (democracia); redefinição de papéis e estabelecimento de novas relações entre as três esferas de governo (descentralização concorrente com centralização e compatível com os princípios do federalismo); autonomia proporcional à capacidade de gestão. Também estão presentes tanto ao longo do texto da NOB, quanto no documento que a orienta ("A ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei") pelo menos os princípios norteadores da descentralização pontuados por LOBO (1988, 1990): flexibilidade, gradualismo/progressividade, transparência no processo decisório e controle social.

A NOB 01/93 é a primeira a definir o gerenciamento do processo de descentralização nos três níveis de governo, através da Comissão Intergestores Tripartite, das Comissões Intergestores Bipartites e dos Conselhos Municipais, bem como as condições de gestão para municípios (Incipiente, Parcial e Semi-Plena) e estados (Parcial e Semi-Plena), que buscam exatamente contemplar os diferentes estágios em que se encontram estados e municípios, em relação à descentralização.

Quanto ao financiamento, como não havia sido regulamentada a aplicação dos critérios previstos no art. 35 da lei Nº 8080, mantém-se nessa NOB muito do que vigorava nas NOB anteriores. O financiamento das atividades ambulatoriais é baseado nas UCA e o financiamento das atividades hospitalares nas AIH, desaparecendo a figura do convênio como reguladora das transferências de recursos financeiros. Criam-se o Fator de Apoio ao Estado (5,0% da UCA) e o Fator de Apoio ao Município (também 5,0% da UCA), para estados e municípios que se encontram em algumas formas de gestão previstas pela NOB 01/93. Mantém-se, dessa forma, a maior preocupação com o financiamento da assistência médica curativa, hospitalar (mediante desconcentração financeira ou descentralização dependente vinculada, quando da gestão semi plena) ou ambulatorial (mediante descentralização dependente vinculada).

A grande diferença da NOB 01/93 para as anteriores, em relação ao financiamento, está no fato de a forma mais avançada de gestão – semi-plena – permitir maior autonomia sobre o pagamento dos prestadores ambulatoriais e hospitalares, públicos e privados, o que torna possível aos municípios sob tal forma de gestão, ainda que com limitações, a utilização desses recursos de forma mais adequada às realidades e necessidade de distintos estados e municípios.

Além disso, o processo de adesão a essa Norma, embora tenha se iniciado somente em junho de 1994 e tenha sofrido interferências diversas (ALMEIDA, 1995), pode ser considerado positivo, uma vez que, em novembro de 1995, 2750 municípios estavam habilitados nas formas de gestão da NOB-93, sendo 52 municípios na condição de gestão semi-plena (BARROS, 1997). No início de 1996 os municípios em gestão semi-plena já somavam 92, representando 13,0% da população brasileira (BARROS, 1996). Levcovitz (1998) mostra a evolução do número de municípios habilitados, no período de 1994 a 1996, dados estes que relacionados ao número de municípios brasileiros revela uma percentagem de adesão superior a 60,0% em 1996 (Tabela 2). Este percentual, no entanto, não é homogêneo para todo o país e respeita a heterogeneidade de porte, organização e complexidade de municípios e sistemas e serviços de saúde, ou seja, enquanto nas regiões Sudeste e Sul por volta de 70,0% dos municípios são habilitados, nas regiões Centro-Oeste e Nordeste este percentual está próximo a 50,0% e na região Norte não atinge 10,0% (ALMEIDA, 1995)

Para este autor, a NOB 01/93 "...não é e não representa uma simples regulamentação administrativa e financeira. Significa, na realidade, a expressão de uma decisão política de procurar realizar os princípios e diretrizes do SUS, particularmente quanto à descentralização de gestão". Representa assim um marco definidor no processo de consolidação do SUS, tanto por romper, ainda que de modo parcial, com a lógica do INAMPS, como por assentar os elementos e princípios da descentralização, na proposição das Condições de Gestão e do Gerenciamento do Processo de Descentralização.

Norma Operacional Básica 01/96

A NOB 01/96, editada pelo Ministro da Saúde, em 06/11/96, pretende dar continuidade ao processo de consolidação do SUS, colocando como finalidade primordial "promover e consolidar o pleno exercício, por parte do poder público municipal e do Distrito Federal, da função de gestor da atenção à saúde dos seus munícipes, com conseqüente redefinição das responsabilidades dos Estados, do DF e da união" (BRASIL, 1996). Para tal, propõe, modifica e implementa importantes aspectos, tais como:

a) O reordenamento do modelo de atenção à saúde, de modo que cada nível de governo possa melhor desenvolver as ações no campo da assistência (no âmbito ambulatorial, hospitalar e domiciliar), das intervenções ambientais (vigilâncias e saneamento) e das políticas externas ao setor saúde (emprego, habitação, educação, lazer, etc.). Este reordenamento pressupõe a incorporação do modelo epidemiológico ao modelo clínico vigente;

b) Enfoca os Sistemas Municipais como a base e os elementos fortalecedores do Sistema Nacional de Saúde, desde que "integrados, harmonizados e modernizados, com eqüidade", cabendo este papel ao poder público estadual e federal. Reestruturação nos três níveis são propostas para viabilizar o exercício dos respectivos papéis;

c) Institui a Programação Pactuada e Integrada (PPI) como "o instrumento essencial de reorganização do modelo de atenção e da gestão do SUS, de alocação dos recursos e da explicitação do pacto estabelecido entre as três esferas de governo" (Brasil, 1996). As PPI elaboradas por cada município, ou pactuada entre um conjunto de municípios, são harmonizadas e compatibilizadas pelas CIB, que a elas incorporam as ações de responsabilidade do estado, submentendo-as à apreciação dos Conselhos Estaduais de Saúde. A União procede a integração de todas as PPI estaduais, incorporando as ações sob sua responsabilidade e alocando os recursos disponíveis e negociados na CIT;

d) Define as transferências de recursos fundo a fundo para a assistência ambulatorial e hospitalar (PAB, Incentivo ao PSF e PACS, FAE, TFAM, TFAE e IVRI ), ações de Vigilância Sanitária (PBVS, IVISAI I) e ações de epidemiologia e controle de doenças. Também define a remuneração por serviços prestados (internações hospitalares, ambulatório de alto custo, vigilância sanitária e epidemiológica) e transferências por convênios (vig. epidemiológica);

e) Define, finalmente, as condições de gestão para os municípios (Plena da Atenção Básica e Plena do Sistema) e estados (Avançada do Sistema e Plena do Sistema), relacionando responsabilidades, requisitos e prerrogativas

À semelhança da NOB 01/93, esta Norma incorpora os elementos constitutivos da descentralização, bem como a maioria de seus princípios. Diferentemente daquela que a antecedeu e que embora abrangente era de fácil compreensão, a NOB 01/96 é extensa, complexa, de difícil compreensão e cumprimento, haja vista as responsabilidades e os requisitos que preconiza. Também, de certa forma, ela representa uma descontiunidade (ou minimamente uma mudança de enfoque) do processo que vinha sendo construído até então, tanto ao propor apenas duas formas de gestão aos municípios (Plena da Atenção Básica e Plena do Sistema) como ao definir os mecanismos de transferência de recursos financeiros e a remuneração por serviços produzidos. Para tal, essa NOB divide a assistência à saúde em três grandes "compartimentos": a) Assistência Hospitalar e Ambulatorial, b)Vigilância Sanitária e c) Epidemiologia e Controle de Doenças, dentro dos quais foram definidos pisos, tetos, fatores de incentivo e índices de valorização, que definem os valores a serem repassados, diretamente ou via fundo estadual, conforme a condição de gestão do município.

O fato de a NOB-96 ter sido publicada em 11/96 e o processo de habilitação pela mesma somente ter se iniciado no início de 1998 é uma evidência tanto de um certo "destoamento" do processo de descentralização até então em curso, como da dificuldade de estados e principalmente municípios cumprirem o que este instrumento prescreve. Apesar disto, em menos de 24 meses, 97,0% dos municípios brasileiros encontram-se habilitados a esta norma, a grande maioria na Gestão Plena da Atenção Básica (Tabela 3).

Se a situação da habilitação à NOB anterior respeitava a heterogeneidade regional, o processo de habilitação à NOB-96, além de amplo, dá-se de forma homogênea em todo o país, com percentuais de municípios habilitados acima de 90,0% na maioria dos estados. Esta generalizada adesão à NOB-96 em todas as regiões do país, em princípio informa que a grande maioria dos municípios preenchem os requisitos para a habilitação, minimamente à Gestão Plena da Atenção Básica, mesmo face aos 10 requisitos necessários, que não podem ser considerados simples para grande parte desses municípios. Acredita-se, que muitos deles (entre os quais, os menores e mais carentes) criaram as condições necessárias à habilitação motivados principalmente pela possibilidade de repasse financeiro fundo a fundo e pela exigência normativa. Se assim for, haverá grandes dificuldades, por parte destes municípios, tanto de entenderem os complexos mecanismos de transferência de recursos propostos na NOB/96, quanto de assumirem as responsabilidades que ela preceitua.

A implantação da NOB 01/96 é muito recente e ainda não existem estudos avaliando seu impacto. O fato de quase 100,0% dos municípios terem-na incorporado, apesar de sua complexidade, sua rigidez normativa e pouca flexibilidade suscitam a necessidade de monitoramento contínuo, no sentido de observar se, de fato, esta NOB é viabilizadora da descentralização.

CONCLUSÃO

Se a Constituição de 1988 define os princípios básicos do Sistema Único de Saúde e as Leis Orgânicas da Saúde estruturam o seu arcabouço, definindo objetivos, atribuições, competências, financiamento, controle social e participação do setor privado, são as Normas Operacionais Básicas os instrumentos que concretizam a real implantação deste Sistema, a partir de 1991.

A descentralização dos serviços e ações de saúde ganha impulso com a edição das NOB 01/91 e 01/92, mas seu enfoque ainda se concentra no financiamento, principalmente da assistência médica, individual e curativa, reproduzindo o modelo que o MPAS tornou hegemônico nos últimos 40 anos. Não por acaso nesse período, o INAMPS foi a instância ordenadora destas NOB e controladora dos repasses financeiros a estados e municípios.

A NOB 01/93 foi o instrumento - ou a estratégia, no entender de Almeida (1995) - que permitiu o verdadeiro impulso rumo à descentralização, tanto por constituir-se resultado de discussões, reivindicações e anseios de atores sociais envolvidos na construção do SUS, como por orientar a organização progessiva, gradual, flexível e democrática dos Sistema Municipais e Estaduais de Saúde, através da várias formas de gestão que preconizava.

A NOB 01/96 surge com o intuito de dar continuidade ao processo de construção do SUS e neste sentido também incorpora os elementos constitutivos e princípios norteadores da descentralização, já discutidos. O fato de 97,0% dos municípios brasileiros terem se habilitado às duas formas de gestão por ela previstas, se por um lado pode representar um avanço da descentralização, por outro suscita grande preocupação, uma vez que estão sendo colocados num mesmo patamar, em termos de condições de gestão, 4849 municípios com grande heterogeneidade política, geográfica, social, cultural e sanitária. Os requisitos à habilitação e as responsabilidades que a NOB-96 impõe, associados à sua menor flexibilidade (somente permitindo duas formas de gestão) e maior complexidade (principalmente relacionada ao custeio), podem representar obstáculos ao no processo de descentralização. Assim, mesmo que a grande maioria dos municípios tenha se habilitado às formas de gestão previstas nesta NOB, ainda não é possível saber se este fato representou um avanço na descentralização ou vai gerar, no futuro, uma re-centralização no estado (uma "estadualização"), uma vez que o não cumprimento das obrigações a que ela implica, redundam na transferência de gestão dos sistemas municipais para as Secretarias de Estado da Saúde.

Como estratégias viabilizadoras da descentralização dos serviços e ações de saúde, por mais críticas que se façam às NOB, não há como negar sua importância. O que aqui se levanta como pauta para o debate é se elas não estariam ultrapassando o seu papel normativo.

As NOB, mesmo quando discutidas em outros níveis, são instrumentos normalizadores elaborados pelo poder executivo federal e editados na forma de portaria ou resolução ministerial, adquirindo status de lei e orientando a implementação do SUS em todo o território nacional. Neste sentido, deveriam ser instrumentos que definissem as bases e princípios fundamentais sobre os quais União, estados e municípios construiriam seus Sistemas de Saúde. O que tem se observado - e a NOB-96 representa apenas o estágio atual de um processo iniciado com as LOS - é que ao buscar cobrir todo o complexo universo do SUS, das condições de gestão ao financiamento, do modelo de atenção à programação e avaliação, das relações entre os sistemas locais de saúde ao custeio das várias ações previstas, as normas estão cada vez mais extensas, complexas e abrangentes. Essa situação permite supor que as NOB estão se configurando como instrumentos definidores do modelo de atenção à saúde e direcionadores de políticas públicas para o setor saúde, transcendendo o seu papel regulador.

Data do recebimento: 21/07/1999

Reapresentado: 03/00

Data da aprovação: 26/08/2000

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jun 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 2001

Histórico

  • Aceito
    26 Ago 2000
  • Revisado
    Mar 2000
  • Recebido
    21 Jul 1999
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