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Políticas de Saúde, Pluralidade Terapêutica e Identidade na Amazônia

Health Policies, Therapeutic Plurality and Identity in Indigenous Amazonia

Resumos

O propósito deste trabalho é realizar uma comparação entre os campos terapêuticos vivenciados por dois grupos pano: os Yaminawa (Departamento do Ucayali, Peru) e os Yawanawa (Acre, Brasil). Essa comparação levanta questões relevantes, na medida em que ambos os grupos, apesar de sua proximidade cultural, se encontram inseridos em realidades nacionais, sociais e políticas diferentes. As diferenças existentes não se limitam a questões derivadas de duas políticas oficiais de saúde distintas, mas estão diretamente associadas às particularidades dos respectivos contextos sociais regionais. A comparação dessas situações mostra que o tipo de relação que as sociedades envolventes e os Estados estabelecem com as populações indígenas, assim como os aspectos identitários derivados dela, são fatores importantes na constituição do habitus terapêutico desses grupos. Esse aspecto é exemplificado no texto por meio de uma reflexão sobre diferenças existentes entre as práticas, de cada um dos grupos, relativas à alimentação dos recém-nascidos e ao uso dos recursos da biomedicina em relação ao parto e o controle da natalidade.

Etnologia indígena; Saúde indígena; Identidade; Saúde da mulher


The purpose of this paper is to make a comparison between the therapeutic fields that form part of the daily experience of two Panoan groups: Yaminawa people (Ucayali, Peruvian Amazon) and Yawanawa people (Acre, Brazilian Amazon). This comparison raises some interesting questions, as both groups, in spite of their cultural and linguistic relatedness, are inserted in different national, social and political contexts. The existing differences observed are not limited to questions stemming from two different state health policies; rather, they are directly associated with the particularities of their respective social and regional contexts. A comparison of these situations demonstrates that the relationship that the State establishes with indigenous societies, as well as the identity aspects deriving from it, are important factors in the constitution of indigenous therapeutic habitus. The present analysis examines how these issues are exemplified in newborns' feeding practices and in the use of biomedical resources in childbirth and birth control in both groups.

Amazonian Ethnology; Indigenous Health; Identity; Women's Health


ARTIGOS

Políticas de Saúde, Pluralidade Terapêutica e Identidade na Amazônia1 1 Trabalho apresentado no Foro sobre Saúde indígena, coordenado pelas Profas. Esther Jean Langdon e Marina Cardoso, na VI Reunión de Antropología del Mercosur, Montevideo, 2005.

Health Policies, Therapeutic Plurality and Identity in Indigenous Amazonia

Laura Pérez Gil

Doutora em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina, Pós-Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina. Endereço: Rua Gilson da Costa Xavier, 4125,Sambaqui, cep 88051-001, Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: lauranawa@yahoo.com.br

RESUMO

O propósito deste trabalho é realizar uma comparação entre os campos terapêuticos vivenciados por dois grupos pano: os Yaminawa (Departamento do Ucayali, Peru) e os Yawanawa (Acre, Brasil). Essa comparação levanta questões relevantes, na medida em que ambos os grupos, apesar de sua proximidade cultural, se encontram inseridos em realidades nacionais, sociais e políticas diferentes. As diferenças existentes não se limitam a questões derivadas de duas políticas oficiais de saúde distintas, mas estão diretamente associadas às particularidades dos respectivos contextos sociais regionais. A comparação dessas situações mostra que o tipo de relação que as sociedades envolventes e os Estados estabelecem com as populações indígenas, assim como os aspectos identitários derivados dela, são fatores importantes na constituição do habitus terapêutico desses grupos. Esse aspecto é exemplificado no texto por meio de uma reflexão sobre diferenças existentes entre as práticas, de cada um dos grupos, relativas à alimentação dos recém-nascidos e ao uso dos recursos da biomedicina em relação ao parto e o controle da natalidade.

Palavras-chave: Etnologia indígena; Saúde indígena; Identidade; Saúde da mulher.

ABSTRACT

The purpose of this paper is to make a comparison between the therapeutic fields that form part of the daily experience of two Panoan groups: Yaminawa people (Ucayali, Peruvian Amazon) and Yawanawa people (Acre, Brazilian Amazon). This comparison raises some interesting questions, as both groups, in spite of their cultural and linguistic relatedness, are inserted in different national, social and political contexts. The existing differences observed are not limited to questions stemming from two different state health policies; rather, they are directly associated with the particularities of their respective social and regional contexts. A comparison of these situations demonstrates that the relationship that the State establishes with indigenous societies, as well as the identity aspects deriving from it, are important factors in the constitution of indigenous therapeutic habitus. The present analysis examines how these issues are exemplified in newborns' feeding practices and in the use of biomedical resources in childbirth and birth control in both groups.

Keywords: Amazonian Ethnology; Indigenous Health; Identity; Women's Health.

Várias pesquisas têm demonstrado que o processo de adoção de elementos socioculturais do exterior por parte das sociedades indígenas é um fenômeno complexo e implica uma releitura e uma adaptação realizadas a partir dos próprios esquemas culturais. Esse fato se pode aplicar a qualquer aspecto da vida das sociedades indígenas, entre elas a saúde. A utilização que os grupos indígenas fazem dos recursos e das técnicas da biomedicina é diferente do uso para o qual a própria ciência ocidental os destina e depende, em grande medida, de critérios culturais próprios. Em relação aos medicamentos, por exemplo, as sociedades indígenas se apropriam deles e os utilizam seguindo suas próprias concepções sobre as substâncias com poder curativo (Pollock, 1994). Uma das pesquisas concludentes a esse respeito é a realizada por Shepard, comparando o uso que dois grupos indígenas de famílias lingüísticas diferentes, que ocupam a mesma área geográfica, os Matsiguenga (Arawak) e os Yora (Pano), dão aos medicamentos ocidentais. O autor explica, em primeiro lugar, quais são as características sensoriais das plantas medicinais, usadas nos sistemas médicos nativos, que cada uma das etnias considera como elemento-chave de sua eficácia, para depois mostrar como essas teorias nativas são aplicadas, em cada caso, na utilização que fazem dos remédios da farmácia e nos efeitos a eles atribuídos (Shepard, 1999).

Os xamanismos indígenas, igualmente, têm demonstrado uma grande capacidade para se apropriar de elementos de poder externos e inseri-los dentro do discurso e da prática próprias (Townsley, 1993; Greene, 1998). Estes aspectos evidenciam a atitude ativa que as culturas indígenas têm ao se relacionar com as sociedades envolventes (Langdon, 1991; Greene, 1998; Cardoso, 2004).

Analogamente, a biomedicina interpreta os elementos que conformam os outros sistemas em função de suas próprias teorias sobre o mundo. Isso fica claro na leitura que faz do uso das plantas medicinais do ponto de vista farmacêutico, completamente divergente das concepções nativas ao respeito (Greene, 1998, p. 638): se para a biomedicina, a eficácia das plantas radica nos efeitos que seus componentes bioquímicos têm no corpo, as teorias indígenas e aqui encontramos variações de uma cultura para outra atribuem sua eficácia a agências subjetivas. Entretanto, mesmo que em ambos os casos ocorra uma ressignificação dos elementos alheios, existe uma diferença expressiva a respeito da atitude perante os outros sistemas. Enquanto as etnomedicinas indígenas têm uma predisposição a incorporar elementos de fora, gerando assim processos de hibridação (Follér, 2004), a biomedicina se recusa a permitir que as fronteiras entre ela e os outros sistemas se façam fluidas.

Contudo, os comportamentos, concepções e hábitos que as sociedades indígenas elaboram nos contextos de interação com a sociedade envolvente não são resultado, exclusiva ou principalmente, de reinterpretações do sistema forâneo baseadas em suas tradições culturais específicas. A história de contato do grupo, o contexto regional no qual se encontra inserido, sua atitude e suas estratégias perante a sociedade envolvente e perante as políticas públicas que definem os recursos e as alternativas às que têm acesso, são elementos a serem levados em conta para se compreender esse processo, isto é, há uma multiplicidade de fatores, muitos deles externos, que contribuem à conformação dos hábitos, determinando-os em muitas ocasiões, que essas sociedades desenvolvem em relação às práticas associadas à saúde, e este deve ser um aspecto a ser considerado na hora de elaborar as políticas públicas de saúde. Se, por um lado, é necessário fornecer recursos médicos análogos aos que usufruem outros segmentos da população – "os brancos" –, como os Kalapálo do Alto-Xingú demandam (Cardoso, 2004), de outro, a forma como os recursos destinados ao atendimento da saúde são investidos pode gerar resultados que nem sempre têm uma incidência positiva na saúde da população.

Este trabalho pretende fazer uma breve descrição sobre a situação em relação à saúde encontrada em dois grupos pano, situados em lados diferentes da fronteira, mas na mesma região histórico-geográfica: a região de confluência das cabeceiras do Juruá, do Purus e do Ucayali, marcada desde o final do o século XIX até a metade do século XX pela extração de caucho e seringa. O levantamento dos principais aspectos que caracterizam cada uma dessas situações mostra que os contextos nacionais e locais influem significativamente na forma como são definidas as estratégias de interação e os hábitos relativos à saúde.

Os grupos aqui focados, os Yaminawa (Departamento do Ucayali, Peru) e os Yawanawa (Acre, Brasil)2 2 As reflexões aqui realizadas se baseiam no trabalho de campo que executei em ambos os grupos. Entre os Yawanawa, realizei pesquisa de campo durante 6 meses em 1998, cujo resultado foi minha dissertação de mestrado, e 01 mês em 2003. Entre os Yaminawa, realizei um total de 12 meses de pesquisa em várias etapas entre 2000 e 2003, no marco do curso de doutorado e de minha participação no projeto TSEMIM (financiado pela União Européia e coordenado pela Université Libre de Bruxelles). Quero expressar aqui meu agradecimento à CAPES e ao CNPq, que me forneceram bolsas se estudo durante a realização dos cursos de mestrado e doutorado no PPGAS/UFSC, e ao SHS do CNRS, que por duas vezes me concedeu bolsas, por meio do Legs. Lelong, para realização de trabalho de campo e conclusão de tese. , são cultural e lingüisticamente muito próximos, embora circunstâncias históricas e contextuais, assim como projetos de futuro, estejam marcando cada vez mais certas diferenças que se refletem, sobretudo, na organização sociopolítica. Entre os Yawanawa existe uma tendência a se reforçar a autoridade e o controle dos líderes sobre o grupo e a defini-lo com mais veemência enquanto comunidade solidária e homogênea, já os Yaminawa mantêm uma organização frouxa, de limites lábeis, e falta de uma liderança forte capaz de unificar sob uma autoridade todas as famílias que conformam o grupo.

O Atendimento à Saúde Indígena no Contexto do Acre

Os Yawanawa foram contatados definitivamente por volta do segundo quarto do século XX (Carid, 1999). Durante a maior parte do século XX, trabalharam como mão-de-obra semi-escrava em seringais situados na cabeceira do rio Gregório, onde atualmente se encontra demarcada sua Terra Indígena. Na década de 1980, obtiveram a delimitação oficial da TI onde moram atualmente, e foi então que expulsaram os patrões e os missionários que se encontravam na área. Desse momento em diante, começou uma nova etapa na história dos Yawanawa. Alguns líderes que se tinham formado em Rio Branco junto a organizações indigenistas voltaram para seu povo, cientes de seus direitos como população indígena e cheios de idéias para o futuro. Desde então, a relação dos Yawanawa com a sociedade nacional e a internacional mudou radicalmente. Eles constituem um bom exemplo da moderna articulação entre o local e o global. Moradores da floresta, com uma economia baseada na agricultura, na caça e na pesca e uma organização social fundada nas relações de parentesco tradicionais, participam, ao mesmo tempo, de projetos de desenvolvimento sustentável com grandes empresas norte-americanas e européias, vendem roupas com seus desenhos tradicionais em butiques de Rio de Janeiro, organizam festas na aldeia, assistidas por importantes personalidades, viajam às principais cidades brasileiras para fazer apresentações dos seus rituais e cantos, dos quais gravaram CDs, e contam com internet via satélite em sua aldeia.

Em relação à área da saúde, essa etapa esteve marcada pelo treinamento na ciência biomédica de alguns, cada vez mais, dos seus membros. Sabemos que na época do trabalho nos seringais, tanto o chefe do grupo, quanto vários outros homens, eram pessoas iniciadas no xamanismo e possuíam conhecimento de um grande número de plantas medicinais, sendo as sessões xamânicas e o uso de plantas medicinais técnicas às quais recorriam habitualmente em caso de doença. De fato, a aquisição de certo grau de destreza nesse tipo de práticas formava parte do processo de se tornar um homem adulto, e estava associada à função masculina de proteção da própria família. Durante essa etapa, os Yawanawa começaram a usar alguns medicamentos da farmácia que os patrões possuíam. Entretanto, seu uso devia ser certamente limitado, em parte pela falta de disponibilidade. De fato, se os Yawanawa pediam remédios ao patrão, seus conhecimentos constituíam também um recurso terapêutico importante para os trabalhadores dos seringais. Os Yawanawa lembram que os "cearenses" que trabalhavam também no seringal eram enviados pelo patrão a se tratar com eles quando sofriam certos tipos de doença. O poder atribuído a suas técnicas curativas tradicionais se reflete em algumas narrativas que explicam como os "cariú" termo usado na região para designar aos não-indígenas – eram tratados com sucesso pelos homens yawanawa (Pérez Gil, 1999).

A afluência de medicamentos na área parece ter se incrementado durante os anos de 1970, ao se instalarem entre os Yawanawa um grupo de missionários das Novas Tribos que se esforçaram para reprimir, entre outros aspectos da cultura indígena, o uso das técnicas de cura tradicionais, especialmente às associadas ao xamanismo. Paralelamente a essa repressão, fomentavam o uso e a dependência dos fármacos por parte dos Yawanawa. Com isso, não tratavam apenas de extirpar as que consideravam "coisas do diabo", mas também de incutir nos Yawanawa valores de caráter capitalista (Gallois e Grupioni, 1999).

Na metade da década de 1980, com a delimitação oficial da área, expulsaram dela os missionários e a empresa que tinha comprado, anos antes, aquelas terras "com eles dentro" (Delarole, 1981). A partir de então, os Yawanawa tomaram as rédeas, assumindo as decisões que dizem respeito a seu dever enquanto grupo. Sem a assistência médica que forneciam anteriormente os missionários, procuraram a ajuda das instituições governamentais e das ONGs atuantes no Acre para poder contar com recursos biomédicos na própria aldeia. Aos poucos, várias pessoas foram sendo formadas. Atualmente, a área, cuja população alcançava em 2003 pouco mais de 500 habitantes, conta com uma enfermeira indígena, um microscopista, cinco agentes de saúde oficiais3 3 Várias outras pessoas receberam treinamento e exerceram esta função durante um tempo, mas a abandonaram por falta de remuneração. , e algumas pessoas que receberam recentemente formação em técnicas de higiene comunitária. A tendência atual é treinar pessoas de núcleos de habitação diferentes, de forma que não dependam completamente do posto de saúde que existe na aldeia principal, já que o deslocamento, no caso de alguns núcleos, é demorado e, dependendo da época do ano, custoso. Essa tendência tem também um aspecto político. A população Yawanawa se encontra dispersa ao longo do rio Gregório, dentro dos limites de sua área, em vários casarios ocupados por famílias extensas, ou, em alguns casos, agrupações de famílias. Existe, além desses casarios, uma aldeia principal que reúne várias famílias. Embora os líderes principais tenham uma disposição centralizadora, as relações políticas no interior desse conjunto não estão isentas de conflitos, e nos últimos anos se intensificaram as reivindicações das agrupações periféricas. Isto se refletiu, por exemplo, no fato de que, atualmente não era assim em 1998 quando realizei minha primeira pesquisa entre os Yawanawa , os diferentes núcleos habitacionais são considerados como "aldeias" e não "colocações"4 4 "Colocação" era o termo usado na época dos seringais para se referir aos casarios ocupados no território. O termo continuou sendo usado entre os Yawanawa durante um bom tempo depois do fechamento dos seringais, e apenas recentemente está sendo evitado. , como anteriormente, e os homens que atuam como cabeça de família neles recebem o título de "líder". Em relação à saúde, as pessoas reclamavam que alguns dos agentes mostravam uma tendência a cuidar apenas de seus familiares mais próximos, negligenciando o resto dos moradores. Assim, a descentralização da capacitação dos agentes indígenas tem também, como objetivo, proporcionar a cada núcleo pessoas que possam realizar os atendimentos médicos básicos.

A formação das pessoas que se dedicam à saúde esteve durante um tempo a cargo, fundamentalmente, da ONG CPI/Acre, radicada em Rio Branco. Apenas a enfermeira a primeira pessoa a ser instruída na ciência biomédica e a única contratada pela Funai - e o microscopista foram treinados pela Funai. Até 1999, a Funai era o organismo encarregado de fornecer e organizar a assistência de saúde, formando e contratando agentes de saúde e fornecendo remédios. A partir desse ano, a Funasa assumiu esse papel, que exerceu por meio de um convênio com a UNI (União Indígena do Acre). Assim, com exceção da enfermeira, os outros agentes de saúde são contratados por meio desse convênio. Outras funções do Convênio consistem em fornecer meios para a remoção dos pacientes graves ao Pólo-base de Tarauacá e atendê-los, assim como abastecer o posto de saúde dos medicamentos necessários. Porém, diversos problemas com a gerência dos recursos tiveram como conseqüência a revogação do convênio e o desmantelamento da UNI, que foi acusada de desvio de recursos e má administração. Desde então, a Funasa assumiu completamente a atenção à saúde indígena, realizada por meio dos pólos-base localizados em cada um dos municípios e ligados aos DSEIs5 5 Na região do Acre existem dos DSEIs (Distrito Sanitário Especial Indígena): um deles atende a região conformada pela bacia do Alto Juruá e seus afluentes (DSEI/Alto Juruá); e o outro a região do Alto Purus (DSEI/Alto Purus). O pólo-base de Taraucá, que atende à população Yawanawa, depende do DSEI/Alto Juruá. regionais. Os pólos-base são atendidos pelas Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena (EMSI), que, além de receber os pacientes indígenas encaminhados pelos AIS, visitam periodicamente as TI para realizar a vacinação, o atendimento básico, e fornecer orientações referentes a diversos aspectos da saúde (higiene, prevenção de DST/AIDS, etc.) dentro das comunidades.

Em geral, os agentes de saúde indígenas (AIS) tratam os problemas de saúde leves dentro das aldeias, mas quando uma pessoa sofre de alguma doença que eles não são capazes de solucionar, encaminham o paciente ao pólo-base em Tarauacá, onde a EMSI se encarregará de encaminhar o paciente ao estabelecimento do SUS adequado. Entretanto, os Yawanawa consideram insuficiente o atendimento e os recursos que recebem de parte dos organismos governamentais. Além da assistência fornecida pelos organismos do governo, os Yawanawa tiveram certo sucesso na obtenção de recursos destinados à saúde por meio de projetos que eles mesmos procuraram, sem intermediação governamental, com empresas estrangeiras. Parte do equipamento os microscópios, por exemplo e dos medicamentos com que contam na aldeia são resultado destes empreendimentos. Certamente, a saúde é um dos temas que mais preocupa a comunidade. Com o intuito de melhorar a situação que hoje se vive, os novos líderes têm idealizado vários projetos, alguns dos quais já estão em andamento. Um deles, que está sendo negociado diretamente com o Governo do Estado do Acre, é a implementação de um sistema de saneamento básico que inclui a construção de poços artesianos e visa diminuir a incidência de problemas de saúde derivados da contaminação da água. Durante a visita que realizei em 2003, um dos líderes com grande experiência no exterior do país tinha o projeto de realizar um convênio com um consultório médico privado de Tarauacá. Os Yawanawa tinham em perspectiva receber das empresas estrangeiras parceiras nos projetos de desenvolvimento de equipamentos médicos muito caros (se falava de máquina de raios-X, de equipamento odontológico, etc.) e, considerando que não há nenhum Yawanawa com a formação adequada para manipulá-los nem condições na aldeia para mantê-los lá, estavam negociando com o consultório para ceder a eles os equipamentos em troca do atendimento médico ao povo Yawanawa6 6 Em contatos posteriores soube que esse convênio não foi, finalmente, efetivado. . Por último, outro projeto recente foi a construção de um "hospital" na aldeia, isto é, um lugar para onde as pessoas doentes possam ser removidas e atendidas pelos AIS. Não se trata, entretanto, de um hospital à ocidental, mas de uma construção que mantenha os parâmetros "étnicos", isto é, com uma estrutura de madeira e o teto de palha. Porém, este projeto se mostrou muito oneroso em termos econômicos e laborais, e várias pessoas da aldeia se mostram contrárias a ele.

Este último projeto, especialmente, evidencia um dos paradoxos que enfrentam atualmente os Yawanawa e que decorre, especificamente, dessa inserção no mundo globalizado e da crescente consciência que eles adquiriram sobre o conceito de "cultura" e sua importância estratégica nesse mundo. O rendimento econômico dos projetos de desenvolvimento sustentável realizados em parceria com empresas estrangeiras e o sucesso das reivindicações políticas junto aos organismos governamentais decorrem, em grande medida, da eficácia com que os Yawanawa têm "exposto" sua identidade étnica. Durante a década de 1990, iniciou-se um processo de revitalização cultural que foi crucial nos logros anteriormente mencionados e que se intensificou a partir do ano 2000. Esse fenômeno envolve, especialmente, a manufatura de bens materiais - que agora passam a ser "artesanatos" - e a realização de festas e rituais que, durante uma etapa da história yawanawa, foram reprimidos por diversos agentes da sociedade envolvente. O propósito dos Yawanawa é recuperar e revitalizar costumes que foram abandonados ao longo dos anos por várias circunstâncias, e, por meio disso, ter acesso a certos benefícios da sociedade envolvente sem ter de renunciar a sua forma de vida particular.

Em relação à saúde, acontece que, à medida que se intensificou o recurso à biomedicina, os conhecimentos e técnicas tradicionais - xamanismo, o uso de plantas medicinais, etc. - foram sendo relegados a um segundo plano ou a outros planos diferentes da saúde. Atualmente, nesse contexto de revitalização cultural, existe uma preocupação explícita de recuperar e preservar esses conhecimentos, e algumas ações têm se desenvolvido a esse respeito, como a criação de hortas com as plantas medicinais (Calavia e col., 2003). Igualmente, desde o ano 2000, várias pessoas foram iniciadas no xamanismo, o que não acontecia há 50 anos. O xamanismo e o conhecimento das plantas medicinais são aspectos das culturas indígenas cada vez mais valorizados por parte da sociedade ocidental, tornando-se, nesse sentido, elementos-chave nas estratégias de construção de uma identidade eficaz nos processos de negociação com a sociedade envolvente (Conklin, 2002). Entretanto, enquanto o xamanismo e os conhecimentos sobre plantas estão recebendo uma atenção cada vez maior por parte dos Yawanawa, isso não tem diminuído a utilização dos recursos da biomedicina, como evidenciam os projetos anteriormente comentados.

O papel que essa revitalização das técnicas e conhecimentos "tradicionais" terá no futuro nos hábitos associados à saúde entre os Yawanawa não é, por enquanto, previsível. Sua recepção dentro do grupo varia muito entre as pessoas. Enquanto alguns têm aproveitado a oportunidade com entusiasmo, outros parecem céticos. De qualquer forma, na medida em que a saúde se constitui como elemento central na construção de identidade, este se torna um fator a mais na determinação do campo terapêutico vivenciado pelos Yawanawa.

O Atendimento Médico às Populações Indígenas no Departamento do Ucayali (Peru): o caso dos Yaminawa

A situação dos Yaminawa é muito diferente da dos Yawanawa. Apesar de terem acontecido contatos esporádicos com os não-indígenas desde finais do século XIX provavelmente, os Yaminawa não estabeleceram relações estáveis com a sociedade nacional até os primeiros anos da década de 1960 (Soria e Álvarez Lobo, 1965). Os agentes de contato nesse processo foram os madeireiros que trabalham na região e os missionários católicos da missão de Sepahua, situada no rio Urubamba. Desde o início dessa nova etapa, os Yaminawa trabalharam para os madeireiros com a finalidade de obter mercadorias, especialmente ferramentas para cultivar seus roçados. Foi, de fato, a procura dessas ferramentas o que os levou a "se civilizar", processo que, segundo a versão indígena, foi iniciativa deles e não dos "brancos".

A política peruana a respeito das populações indígenas é bastante diferente da brasileira. No Peru, por exemplo, não existe nenhum organismo governamental encarregado de definir e gerir as políticas relativas às populações indígenas que seja análogo à Funai. Nos últimos 15 anos, a delimitação das terras indígenas na região amazônica do Ucayali, onde se localizam os Yaminawa, tem sido realizada principalmente pelo esforço laboral e econômico de organizações indígenas e ONGs internacionais (Gray, 1998). No que diz respeito à saúde, o governo não tem desenvolvido políticas diferenciais destinadas a este setor da população. O contato que os Yaminawa têm com a biomedicina é relativamente limitado e provém, principalmente, de fontes não-especializadas, isto é, existe um uso freqüente de remédios farmacêuticos, mas trata-se de um uso leigo, sem consulta a um especialista ou a uma pessoa com uma mínima formação.

Os Yaminawa apreciam, como a maioria das populações indígenas, os remédios da farmácia, atribuindo grande eficácia a alguns deles, especialmente àqueles injetáveis e aos antibióticos. Quando alguém adoece, a procura por estes remédios é paralela ao uso de várias outras técnicas nativas, dependendo do tipo de doença e da gravidade. Embora limitada, há certa disponibilidade de remédios na aldeia, já que as pessoas com mais meios financeiros - mulheres casadas com madeireiros, homens que ganham algum recurso trabalhando a madeira - costumam comprá-los na cidade. Entretanto, diferentemente do que aconteceu em outros casos (Shepard, 1999: 167), a presença de remédios da farmácia não parece ter substituído outros recursos terapêuticos próprios já que, por exemplo, o uso de plantas medicinais continua sendo cotidiano entre os Yaminawa. Eles possuem conhecimento sobre um grande número de plantas da floresta que usam para fins medicinais; além disso, tratam continuamente de obter plantas usadas por outros grupos indígenas ou pela população mestiça7 7 Na região da Amazônia peruana se utiliza o termo "mestiço" para se referir à população regional não-indígena. , prática à qual se mostram muito afeiçoados. Outro recurso terapêutico são as sessões de curas xamânicas, que alguns homens realizam quando seus familiares estão doentes. Entretanto, por razões que não tratarei aqui, os Yaminawa asseguram que o poder xamânico que detêm hoje em dia é um pálido reflexo do que seus antepassados possuíam outrora (Pérez Gil, 2006). Assim, quando uma doença é especialmente grave e as terapias próprias resultam ineficazes, procuram alternativas no exterior.

Contudo, dificilmente um Yaminawa empreende uma viagem à cidade para recorrer à biomedicina. Apenas em ocasiões em que o paciente está à beira da morte, ele é levado a um posto de saúde existente numa comunidade mestiça a dia e meio de viagem. Problemas de saúde são causa freqüente de visitas à cidade ou a outras aldeias, mas normalmente não se procura ajuda no hospital ou em postos de saúde, senão que se recorre a curandeiros e xamãs mestiços ou indígenas, cujos sistemas nosológicos e terapêuticos têm similitudes significativas com o yaminawa. O recurso ao hospital pode ser paralelo, mas sempre secundário. É interessante notar que, como no resto da região amazônica peruana, no Ucayali desenvolveu-se entre a população mestiça uma forma de xamanismo que se nutre das tradições indígenas (Luna, 1986; Regan, 1993; Gow, 1994). Este processo, por outro lado, reforçou os xamanismos indígenas e contribuiu para seu florescimento. Desta forma, na sociedade ucayalina, o xamanismo constitui um importante recurso terapêutico, do qual se vale a maior parte da população. Se o xamanismo, como prática generalizada entre a população masculina, retraiu-se entre os Yaminawa, não por isso está menos presente na vida cotidiana da aldeia. O que antes era um recurso fundamentalmente interno, agora foi projetado para o exterior (Pérez Gil, 2006).

A respeito do atendimento que os Yaminawa recebem do Governo, ele é certamente escasso. Duas ou três vezes ao ano, uma equipe médica volante, dependente do hospital de Atalaya, percorre os rios da região visitando as aldeias indígenas e mestiças. Normalmente, passam dia e meio em cada lugar, fazendo vacinação, dando remédios contra os vermes às crianças, extraindo dentes e proporcionando um atendimento rápido às pessoas com problemas de saúde. Uma das principais missões dessas equipes é distribuir anticoncepcionais entre as mulheres. Em geral, aplicam medicamentos injetáveis que evitam a gravidez durante um período de três meses. O objetivo dessa política, segundo me informou um dos integrantes da equipe, é evitar que famílias sem recursos econômicos suficientes tenham mais filhos dos que possam criar. De qualquer forma, não observei nenhum tipo de trabalho informativo com as mulheres, as quais não eram perguntadas sobre se desejavam receber as injeções e o faziam sem saber muito bem de que se tratava.

Além dessas visitas, existe um homem yaminawa que, oficialmente, é o "agente de saúde" ("promotor de salud") da aldeia. Entretanto, não recebeu nenhum tipo de formação nem apoio por parte dos organismos governamentais. Ele explica que se tornou "promotor de salud" quando ocorreu a epidemia de cólera em 1998. Várias pessoas foram afetadas e eles não tinham ninguém que pudesse ajudar. Então, Napo começou aplicar soro intravenoso aos doentes, conseguindo que alguns se recuperassem8 8 Duas pessoas morreram e, a interpretação nativa foi que tinham comido coisas indevidas antes de estar completamente recuperados. Esse tipo de explicação condiz com as concepções yaminawa sobre os processos de cura. Em muitos casos, as mortes são atribuídas não tanto ao fracasso da técnica usada, mas ao descumprimento das regras alimentares adequadas por parte do paciente. . Quando a equipe de médicos visitou a aldeia logo após ter passado a epidemia, Napo foi nomeado "promotor de salud". Eventualmente, ele recebe do hospital alguns medicamentos para malária e soro intravenoso. Entretanto, os remédios de que dispõe normalmente na aldeia são comprados por ele mesmo quando viaja a Atalaya. Para poder contar regularmente com uma pequena reserva, solicita das pessoas que lhe pedem os remédios que os paguem, o que atenta contra um dos princípios éticos mais significativo do sistema moral yaminawa, já que pedir a um parente que solicita alguma coisa que pague é considerado um ato de mesquinharia.

Na maior parte das situações, as informações relativas ao uso dos medicamentos farmacêuticos não derivam de cursos de formação nem de uma fonte especializada. Da mesma forma que acontece com outro tipo de remédios de caráter popular, extraídos normalmente de plantas, os medicamentos se utilizam seguindo indicações de outras pessoas que não são especialistas em biomedicina, ou baseando-se em experiências anteriores. Trata-se de formas de uso que vão circulando de boca em boca entre a população, por meio de conselhos, opiniões, etc.

Por outro lado, os Yaminawa não parecem ter grande confiança na medicina praticada nos hospitais. De fato, se considera que ela é absolutamente inútil para tratar uma grande quantidade de doenças. Apenas em certos casos, como doenças com sintomas similares à cólera, cujos efeitos sofreram de forma traumática na aldeia, reconhecem que o uso de terapias aprendidas com os não-indígenas são as únicas eficazes.

No caso Yaminawa, portanto, o atendimento público à saúde é sumamente limitado, o qual contrasta com o uso que fazem de outras formas terapêuticas também externas. O sistema xamânico yaminawa9 9 Estou apresentando aqui sistema xamânico numa concepção ampla, não apenas como o conjunto de práticas próprias do "xamã", mas como um marco conceitual cosmológico ligado a uma série ampla de práticas (Chaumeil, 1983; Brunelli, 1996; Langdon, 1996; Pérez Gil, 1999; 2006). O xamanismo não se limita unicamente à cura, mas permeia a vida cotidiana dos yaminawa. Nesse sentido, o uso de plantas medicinais é uma das práticas que conformam o sistema xamânico, e não um sistema diferente dele. e os sistemas terapêuticos baseados no xamanismo, presentes tanto entre a população mestiça quanto entre outros grupos indígenas, apresentam similaridades significativas a respeito de suas concepções nosológicas, das terapias, do tipo de relação social que se estabelece entre paciente e curador, das noções relativas ao corpo, etc. Essa proximidade conceitual permite aos Yaminawa estabelecer um diálogo muito mais igualitário com xamãs e curandeiros da região do que com os médicos do hospital, que, em geral, mantêm uma atitude depreciativa em relação aos costumes e sistema de pensamento indígena, como tem sido descrito, por exemplo, a respeito dos Siona da Colômbia (Langdon, 1991). Nesse sentido, não se deve entender a atitude dos Yaminawa perante a biomedicina como uma rejeição; como mencionei, eles têm incorporado o uso de remédios da farmácia a suas práticas curativas. Entretanto, a atitude dos atendentes de saúde em relação a eles, por um lado, e a dificuldade de compreender e controlar os diagnósticos e tratamentos da biomedicina, de outro, contribuem para que a procura de atendimento nos hospitais seja muito limitada. A principal alternativa terapêutica, fora os recursos internos do próprio grupo, são os curandeiros e xamãs de outras aldeias ou da cidade, e visitar estes especialistas constitui um motivo freqüentemente alegado para explicar as viagens fora da aldeia.

Incidência da Política Pública de Saúde entre os Yaminawa e os Yawanawa: o caso da saúde reprodutiva da mulher

Com a finalidade de exemplificar em que medida as políticas públicas e o contexto regional incidem no comportamento dos povos mencionados em relação ao cuidado da saúde, gostaria de comentar alguns dados relativos à saúde da mulher e da criança.

Observei durante minhas estadias entre os Yawanawa - a primeira de seis meses em 1998 e a segunda de um mês em 2003 - que várias mulheres se deslocam até a cidade para dar a luz no hospital, apesar de o acesso à cidade desde a área yawanawa é complicado e oneroso, e em certas épocas do ano possível apenas por meio de avião. Esse tipo de comportamento aparece mais marcado entre certas famílias e menos entre outras, porque a possibilidade de realizar essas viagens à cidade e, sobretudo, de passar lá uma estadia, depende em grande medida das redes de parentesco. Algumas famílias, especialmente aquelas ligadas à liderança, conseguiram comprar casas na cidade mais próxima, Tarauacá, e estabelecer permanentemente lá alguns de seus membros. Seus integrantes passam, anualmente, períodos de várias semanas na cidade, sustentando-se basicamente com os salários e aposentadorias que alguns deles recebem. A capacidade de se estabelecer na cidade tem a ver com o fato de que, em geral, os cargos remunerados, tais como professor indígena ou agente de saúde, que representam importantes fontes de recursos econômicos, foram ocupados em sua maioria, por essas famílias associadas à liderança.

Portanto, a capacidade de ocupar esses cargos e ter acesso a recursos monetários está diretamente relacionada com a possibilidade de passar períodos mais ou menos longos na cidade. Contudo, nos últimos anos, as reivindicações de outras famílias para poder participar também dos cursos de formação de professores e agentes de saúde e ter acesso a esses empregos, assim como a afluência de recursos derivados dos projetos de desenvolvimento sustentável, permitiu que outras famílias começassem a ir com mais freqüência à cidade de Tarauacá.

Apesar de existirem parteiras na aldeia, muitas mulheres acodem, portanto, à Tarauacá para dar à luz, de forma que é possível perceber uma afluência crescente das mulheres yawanawa ao hospital. Em ocasiões, viajam pouco antes do parto, mas, em outras, passam vários meses na cidade, apesar de sofrem pela escassez dos recursos. A razão que algumas dão é que querem dar à luz no hospital para, depois do parto, realizar uma operação de ligadura de trompa.

De outro lado, e em relação a isso, é possível perceber que muitas mulheres não amamentam os bebês, lhes dão leite em pó ou preparados à base de banana e mandioca, e usam, ademais, mamadeiras, o que ocasiona vários problemas de saúde. Podemos distinguir um conjunto de fatores internos e outros externos que estão por trás desse fenômeno. Um fator que contribui para a redução da amamentação é o costume yawanawa das avós assumirem a criação dos netos quando as filhas são jovens e não têm ainda um matrimônio estável. Esse costume se relaciona a duas questões: de um lado, filhos pequenos de relações anteriores podem ser um empecilho para as jovens mães solteiras estabilizarem um novo casamento, e muitas vezes, sem marido que as sustente, não têm capacidade de criar os filhos; de outro, as mulheres que já não estão em idade fértil procuram, com certa avidez, inclusive, assumir a educação dessas crianças. Parece que o fato de ter a seu cargo uma criança é um aspecto essencial na definição do papel da mulher dentro da sociedade. O problema é que, atualmente, quando uma mulher que já não está mais em idade fértil assume a criação de um bebê, encontra grandes dificuldades para fazer com que a criança seja amamentada e precisa recorrer a outro tipo de alimento.

Entre os Yaminawa existe também, de forma marcada, esse costume, mas nunca o leite materno é substituído por outro alimento: ou bem a mãe entrega o filho depois de ele ter sido amamentado durante alguns meses, ou haverá outras mulheres em volta, irmãs da mãe, na maior parte dos casos, que assumirão essa tarefa.

Mas esse costume, embora se aplique a alguns casos, não se explica como fenômeno geral. Quando perguntava às mulheres yawanawa porque não amamentavam seus filhos e preferiam dar leite em pó, elas insistiam que os meninos não queriam mamar ou que elas tinham problemas no peito. Minha impressão era que alimentar as crianças com as mamadeiras tem uma forte carga simbólica como prática própria dos não-indígenas. Devemos levar em conta que, embora nos últimos anos os Yawanawa estejam imersos em um processo de revitalização cultural que revaloriza a identidade indígena, durante muito tempo essa identidade foi a causa de atitudes depreciativas por parte da sociedade circundante e, respondendo a pressões de fora, muitas pessoas fizeram esforços para ocultar sua identidade indígena com a finalidade de se integrar na sociedade e não sofrer os preconceitos. Considero que, pelo menos em certa medida, a recusa das mulheres yawanawa a amamentarem os bebês e, em vez disso, usar preferencialmente produtos comprados na cidade, está ligado a essa política identitária. De fato, como vários pesquisadores têm sugerido em relação aos grupos amazônicos em geral e os pano em particular, a alimentação está estreitamente ligada aos processos de construção social da pessoa e, portanto, à identidade (Gow, 1991; Conklin e Morgan, 1996; McCallum, 1998; Vilaça, 2002; Pérez Gil, 2003). A transformação da pessoa passa pela transformação ou alteração do corpo, de forma que não é de se estranhar que o alimento dado aos lactantes adquira certa centralidade nesses processos de redefinição identitária.

Além dessas circunstâncias internas ao grupo, existe um programa governamental por meio do qual as mulheres com crianças recém-nascidas recebem uma ajuda consistente em certa quantidade de leite em pó. Para as mulheres yawanawa receberem essa ajuda, precisam viajar a Tarauacá. Esse recurso, entretanto, é limitado, e quando não dispõem mais de leite em pó e seus seios já não produzem mais leite, recorrem ao mingau de banana (banana cozida e machucada em água) ou de mandioca (a mandioca é ralada e secada ao sol para depois preparar o mingau cozinhando-a em água). Durante minha estadia em 1998, não foi nunca mencionado que as mulheres recebessem uma ajuda governamental para a alimentação das crianças. Embora naquela época observasse já que várias mulheres não amamentavam os filhos, em 2003, essa circunstância tinha se acentuado, e suspeito que a ajuda governamental fosse um fator importante. As mulheres com bebês estavam continuamente procurando informações para saber se o funcionário encarregado de distribuir essa ajuda estava na cidade para viajar até lá com as crianças. Trata-se de uma política que contribui a fomentar a dependência das mulheres de alimentos diferentes do leite materno, já que constitui uma ajuda apenas temporal e contribui para interromper a amamentação.

Assim, a redução da amamentação implica vários problemas. De um lado, as mulheres acabam encontrando dificuldades para obter alimentos adequados para seus filhos lactantes, porque os recursos com que contam para obter leite em pó são muito reduzidos. Em ocasiões, quando se trata de mulheres solteiras, exigem ao pai da criança que contribua na alimentação da criança. De outro lado, implica também no uso de mamadeiras, e essa é provavelmente a causa de várias doenças das quais as crianças pequenas sofrem, já que não são usadas as medidas de higiene adequadas.

Mencionei anteriormente que um dos fatores que contribui para a afluência das mulheres ao hospital é o desejo de realizar uma operação de esterilização. Além dessa prática, que várias mulheres afirmaram ter realizado, algumas outras, as que têm mais familiaridade com a cidade, usam anticoncepcionais. Isso, entretanto, também implica alguns problemas, já que não são sempre usados da forma adequada. Encontrei o caso, por exemplo, de uma mulher jovem, com formação como AIS, que depois de ter o primeiro filho começou a usar anticoncepcionais sem ter consultado um especialista. Usou principalmente contraceptivos injetáveis que forneciam cobertura por um mês, mas como nem sempre tinha possibilidade de obtê-los cada vez que precisava deles, usava também outros que tinham três meses de durabilidade. Além disso, usou em ocasiões pílulas. Como resultado, deixou de ovular. Posteriormente, tendo estabilizado sua relação matrimonial, desejou ter mais filhos, mas tinha se tornado infértil pelo uso inadequado destes remédios, segundo explicou um médico com o qual se consultou. Iniciou então um tratamento para recuperar sua fertilidade, mas apenas conseguiu perder uma quantidade importante de dinheiro. Essa situação, a impossibilidade de ter mais filhos, é para ela fonte de sofrimento.

Os Yawanawa afirmam que tradicionalmente as mulheres usavam plantas medicinais para controlar seu ciclo reprodutivo. Alguns tratamentos visavam à infertilidade permanente e outros apenas o controle temporal. Esses tratamentos requeriam o cumprimento rigoroso de certos resguardos alimentares. É por isso que muitas mulheres dizem preferir os métodos da biomedicina. Entretanto, como demonstra o caso acima mencionado, a falta de informação e de controle médico no uso de anticonceptivos provoca efeitos indesejados e problemas de saúde para a população.

Estes dados demonstram que o uso indiscriminado dos recursos oferecidos pela biomedicina é, em certos casos, contraproducente e pode agudizar ou gerar certas tendências com conseqüências indesejadas.

De outro lado, como contraste, temos o caso dos Yaminawa, no Peru. Diferentemente do que acontece entre os Yawanawa, nenhuma mulher dá outro tipo de alimento a suas crianças pequenas distinto do leite materno. Todas as crianças são amamentadas até que tenham aproximadamente dois anos, ou até mais. Nunca vi o uso de leite em pó ou de mamadeiras para alimentar as crianças. Igualmente, as mulheres dão à luz na aldeia, ajudadas por alguma parenta próxima. Não existem pessoas especializadas na assistência de partos, mas normalmente as mulheres mais velhas, geralmente a mãe ou a sogra, têm o papel fundamental de aconselhar as mais novas durante a gravidez e o período pós-parto sobre os cuidados que elas e as crianças devem receber: resguardos alimentares, ações que devem ser evitadas, plantas que devem ser usadas para preservar a saúde da mãe e do filho. Em geral, não se recorre à biomedicina no que se refere à gravidez e o parto em situações normais.

A interferência mais destacada da biomedicina na vida reprodutiva das mulheres yaminawa acontece, como mencionei acima, durante as visitas das equipes médicas duas ou três vezes ao ano, quando elas recebem injeções anticoncepcionais sem serem consultadas, aconselhadas ou informadas sobre as possibilidades de realizar programas de controle de natalidade. Da mesma forma que os Yawanawa, os Yaminawa conhecem plantas medicinais que as mulheres usam para controlar sua fertilidade. O controle não é, em absoluto, uma noção alheia à visão yaminawa sobre a conformação da família, como pareciam pensar os médicos que integravam a equipe.

Não é meu propósito, com essa comparação, concluir que os serviços médicos são perniciosos para as populações indígenas; nada mais longe da minha intenção. A capacitação de agentes indígenas yawanawa, por exemplo, teve resultados muito positivos. O treinamento de um microscopista para realizar o diagnóstico da malária e fornecer o tratamento para essa doença reduziu consideravelmente, conforme a percepção dos próprios Yawanawa, sua incidência na área, tendo sido durante muito tempo uma das afecções que mais causou mortes na região. Durante minhas estadias na área, os problemas de saúde mais graves, pela virulência com que aconteceram, foram surtos epidêmicos de infecções intestinais, provocados pela contaminação da água, que se manifestavam com sintomas de diarréia aguda e vômitos violentos, levando a uma desidratação intensa e rápida do paciente. Em 1998, a doença abalou a região do Acre cobrando-se, segundo as notícias que chegavam à aldeia, várias vítimas, tanto nas áreas urbanas quanto nas rurais. Na aldeia yawanawa morreu a primeira pessoa que adoeceu, pegando todo o mundo de surpresa; porém, graças aos AIS e às lideranças, que mobilizaram todos seus recursos para obter ajuda do exterior, as outras pessoas que foram atingidas pela epidemia sobreviveram. Esses exemplos evidenciam que um uso adequado das técnicas da biomedicina contribui muito positivamente para a melhora da saúde da população. No caso dos Yaminawa, de fato, um maior e mais adequado acesso aos recursos da biomedicina é necessário para, entre outras coisas, diminuir a alta taxa de mortalidade infantil que se pode verificar no grupo.

Entretanto, o acesso a recursos não é em si uma solução se esses não estão pensados em função das especificidades culturais e contextuais dos grupos aos que são dirigidos. De um lado, é preciso pensar em formas de articulação entre o sistema médico indígena e a biomedicina. De outro, é preciso levar também em conta que os grupos aos que os Governos devem fornecer atendimento por meio de seus organismos levam muitos anos em contato com a sociedade envolvente e, mais concretamente, com sociedades regionais concretas, as quais possuem também especificidades no que se refere à constituição e o funcionamento do campo terapêutico. Uma distinção entre medicina tradicional e biomedicina como dois sistemas contrapostos e diferentes, estranhos e excludentes entre si, não dá conta da forma como esses grupos experienciam e usam os recursos terapêuticos a seu alcance. A biomedicina passou a formar parte do "mundo vivido" (Gow, 2001) nativo. Não se trata apenas de uma apropriação por parte da cultura indígena de um elemento forâneo que é reinterpretado em função dos seus próprios parâmetros, já que esse processo não se dá sem uma incidência da biomedicina no próprio sistema nativo.

Por último, cabe ainda destacar que, quando se reflete sobre a da assistência médica às populações indígenas, a saúde deve ser pensada como um fenômeno híbrido, segundo o conceito usado por Latour (1994) na sua reflexão sobre a natureza do fazer científico. A saúde não é um elemento isolado de outros vários aspectos, como a dinâmica interna do poder e seu reflexo nas reivindicações diante das instituições governamentais (Cardoso, 2004), as políticas identitárias circunstanciais, como acontece entre os Yawanawa, ou os processos de interação e integração com a sociedade circundante, como ocorre no caso Yaminawa. Todos eles são fatores que contribuem à construção dos hábitos relativos à saúde.

Recebido em: 02/05/2007

Aprovado em: 28/05/2007

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  • 1
    Trabalho apresentado no Foro sobre Saúde indígena, coordenado pelas Profas. Esther Jean Langdon e Marina Cardoso, na VI Reunión de Antropología del Mercosur, Montevideo, 2005.
  • 2
    As reflexões aqui realizadas se baseiam no trabalho de campo que executei em ambos os grupos. Entre os Yawanawa, realizei pesquisa de campo durante 6 meses em 1998, cujo resultado foi minha dissertação de mestrado, e 01 mês em 2003. Entre os Yaminawa, realizei um total de 12 meses de pesquisa em várias etapas entre 2000 e 2003, no marco do curso de doutorado e de minha participação no projeto TSEMIM (financiado pela União Européia e coordenado pela Université Libre de Bruxelles). Quero expressar aqui meu agradecimento à CAPES e ao CNPq, que me forneceram bolsas se estudo durante a realização dos cursos de mestrado e doutorado no PPGAS/UFSC, e ao SHS do CNRS, que por duas vezes me concedeu bolsas, por meio do Legs. Lelong, para realização de trabalho de campo e conclusão de tese.
  • 3
    Várias outras pessoas receberam treinamento e exerceram esta função durante um tempo, mas a abandonaram por falta de remuneração.
  • 4
    "Colocação" era o termo usado na época dos seringais para se referir aos casarios ocupados no território. O termo continuou sendo usado entre os Yawanawa durante um bom tempo depois do fechamento dos seringais, e apenas recentemente está sendo evitado.
  • 5
    Na região do Acre existem dos DSEIs (Distrito Sanitário Especial Indígena): um deles atende a região conformada pela bacia do Alto Juruá e seus afluentes (DSEI/Alto Juruá); e o outro a região do Alto Purus (DSEI/Alto Purus). O pólo-base de Taraucá, que atende à população Yawanawa, depende do DSEI/Alto Juruá.
  • 6
    Em contatos posteriores soube que esse convênio não foi, finalmente, efetivado.
  • 7
    Na região da Amazônia peruana se utiliza o termo "mestiço" para se referir à população regional não-indígena.
  • 8
    Duas pessoas morreram e, a interpretação nativa foi que tinham comido coisas indevidas antes de estar completamente recuperados. Esse tipo de explicação condiz com as concepções yaminawa sobre os processos de cura. Em muitos casos, as mortes são atribuídas não tanto ao fracasso da técnica usada, mas ao descumprimento das regras alimentares adequadas por parte do paciente.
  • 9
    Estou apresentando aqui sistema xamânico numa concepção ampla, não apenas como o conjunto de práticas próprias do "xamã", mas como um marco conceitual cosmológico ligado a uma série ampla de práticas (Chaumeil, 1983; Brunelli, 1996; Langdon, 1996; Pérez Gil, 1999; 2006). O xamanismo não se limita unicamente à cura, mas permeia a vida cotidiana dos yaminawa. Nesse sentido, o uso de plantas medicinais é uma das práticas que conformam o sistema xamânico, e não um sistema diferente dele.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Fev 2008
    • Data do Fascículo
      Ago 2007

    Histórico

    • Aceito
      28 Maio 2007
    • Recebido
      02 Maio 2007
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