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O Jornal da Paulista: a configuração de um meio de divulgação universitária numa perspectiva histórica

Jornal da Paulista: the configuration of a university newspaper in a historical perspective

Resumos

Este artigo, decorrência da pesquisa de mestrado realizada no programa do Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde da Universidade Federal de São Paulo (2007), tem como objetivo apresentar a descrição e a análise da trajetória histórica do Jornal da Paulista, jornal universitário que surgiu na Escola Paulista de Medicina em 1987 e que circulou até 2003, quando esta já havia se transformado em universidade. Partindo do referencial teórico do semiólogo Eric Landowiski, a trajetória do Jornal da Paulista foi dividida em três fases. Na primeira, o jornal foi compreendido como uma publicação direcionada à necessidade de comunicação interna e de divulgação institucional; na segunda fase ocorreu uma intensificação na publicação de matérias de divulgação científica; e a terceira fase foi avaliada como um momento de envolvimento pleno do jornal com a comunicação pública das ciências da saúde. Apontamos que o JP constituiu-se preponderantemente como um veículo de divulgação científica das ciências da saúde.

Divulgação científica; Jornal universitário; Ciências da saúde


This article is the result of a master's research developed at Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde of Universidade Federal de São Paulo (2007). It aims to present the description and analysis of the historical trajectory of Jornal da Paulista, the newspaper issued by Escola Paulista de Medicina in 1987, which circulated until 2003, when this institution had already turned into a university. Based on the theoretical framework of the semiotician Eric Landowiski, the trajectory of Jornal da Paulista was divided into three phases. At first, the newspaper was used as a publication targeted at the dissemination of the institution and to respond to the need of internal communication; in the second phase, there was an intensification of the publication of scientific articles; and the third phase was evaluated as a time when the newspaper was fully engaged in the public communication of the health sciences. The conclusion is that Jornal da Paulista was mainly a media channel for the public communication of the health sciences.

Public Communication of Science; University Newspaper; Health Sciences


PARTE I - ARTIGOS

O Jornal da Paulista: a configuração de um meio de divulgação universitária numa perspectiva histórica

Jornal da Paulista: the configuration of a university newspaper in a historical perspective

Carlos Antonio TeixeiraI; Márcia Regina Barros da SilvaII; Dante Marcello Claramonte GallianIII

IDoutorando em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; Docente no Centro Universitário Adventista de São Paulo. Endereço: Estrada de Itapecerica, 2736, CEP 05835-004, Jardim Germânia, São Paulo, SP. E-mail: carlos.teixeira@unasp.edu.br

IIPesquisadora do Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde da Universidade Federal de São Paulo. Endereço: Rua Botucatu, 740, CEP 04023-900, Vila Clementino, São Paulo, SP. E-mail: mbarros.cehfi@epm.br

IIIDocente e Diretor do Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde da Universidade Federal de São Paulo. Endereço: Rua Botucatu, 740, CEP 04023-900, Vila Clementino, São Paulo, SP. E-mail: dante.cehfi@epm.br

RESUMO

Este artigo, decorrência da pesquisa de mestrado realizada no programa do Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde da Universidade Federal de São Paulo (2007), tem como objetivo apresentar a descrição e a análise da trajetória histórica do Jornal da Paulista, jornal universitário que surgiu na Escola Paulista de Medicina em 1987 e que circulou até 2003, quando esta já havia se transformado em universidade. Partindo do referencial teórico do semiólogo Eric Landowiski, a trajetória do Jornal da Paulista foi dividida em três fases. Na primeira, o jornal foi compreendido como uma publicação direcionada à necessidade de comunicação interna e de divulgação institucional; na segunda fase ocorreu uma intensificação na publicação de matérias de divulgação científica; e a terceira fase foi avaliada como um momento de envolvimento pleno do jornal com a comunicação pública das ciências da saúde. Apontamos que o JP constituiu-se preponderantemente como um veículo de divulgação científica das ciências da saúde.

Palavras-chave: Divulgação científica; Jornal universitário; Ciências da saúde.

ABSTRACT

This article is the result of a master's research developed at Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde of Universidade Federal de São Paulo (2007). It aims to present the description and analysis of the historical trajectory of Jornal da Paulista, the newspaper issued by Escola Paulista de Medicina in 1987, which circulated until 2003, when this institution had already turned into a university. Based on the theoretical framework of the semiotician Eric Landowiski, the trajectory of Jornal da Paulista was divided into three phases. At first, the newspaper was used as a publication targeted at the dissemination of the institution and to respond to the need of internal communication; in the second phase, there was an intensification of the publication of scientific articles; and the third phase was evaluated as a time when the newspaper was fully engaged in the public communication of the health sciences. The conclusion is that Jornal da Paulista was mainly a media channel for the public communication of the health sciences.

Keywords: Public Communication of Science; University Newspaper; Health Sciences.

Introdução

A Escola Paulista de Medicina (EPM) iniciou sua história no ano de 1933 como uma "sociedade civil sem fins lucrativos embora de caráter particular com cobrança de mensalidades" (Silva, 1998). Federalizada em 1956, foi elevada à condição de universidade em 1994. Em 1987, oito anos antes de se transformar na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), a EPM implantou seu Departamento de Comunicação, e este, como primeiro produto institucional, passou a publicar, a partir de novembro daquele mesmo ano, um jornal universitário - o Jornal da Paulista, que ficou conhecido como JP.

O JP circulou por 16 anos, sete dos quais como jornal da EPM, e por mais nove anos como jornal da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM). Em novembro de 1997, o jornal passou a ter também uma versão eletrônica, que se manteve até maio de 2004.

Até o final de sua veiculação, com raras exceções, o JP manteve uma regularidade mensal de publicação, com uma tiragem que variou de cinco mil a nove mil exemplares. Ao longo de sua trajetória, o jornal circulou com uma variação de um mínimo de oito a um máximo de 24 páginas. A maior parte do tempo circulou com edições de 16 páginas.

Até 1987, a EPM elaborava um relatório anual da sua produção científica e, naquele mesmo período, outros informativos elaborados em diferentes formatos eram distribuídos ou fixados em murais do campus universitário. A circulação do JP agilizou esse processo de comunicação.

No período abrangido pela trajetória do JP a UNIFESP/EPM dedicava-se, exclusivamente, ao ensino e à pesquisa na área das ciências da saúde, e o JP, por sua vez, foi o único jornal universitário totalmente dedicado às ciências da saúde, majoritariamente no campo da medicina.

A mais importante fonte de informação para as matérias veiculadas no JP era a produção científica desenvolvida na própria universidade, particularmente nos programas de pós-graduação, seguida pela produção de docentes-pesquisadores. Conquanto em menor expressividade, também foram transformadas em matérias algumas contribuições da produção de iniciação científica dos cursos de graduação.

Como o JP deixou de ser publicado sem aviso prévio no final de 2003, por uma decisão administrativa (e a versão eletrônica no início de 2004), este artigo busca resgatar a sua história e articulação com a divulgação científica das ciências da saúde, propondo, ao mesmo tempo, uma reflexão sobre o processo de comunicação nas universidades.

Referencial Teórico Metodológico

O estudo do JP foi subsidiado pelas proposições que o semiólogo Eric Landowiski (1992) fez acerca do veículo de comunicação "jornal" depois de ter estudado os jornais Le Monde e Libération.

A originalidade de sua proposta está em considerar o jornal como "pessoa" - "uma verdadeira pessoa, moral" -, que é diferente da personalidade jurídica que todo jornal tem. Todo jornal recebe um título, e por detrás dele toma corpo "uma entidade figurativamente reconhecível" que se afirma socialmente no que esse semiólogo chama de "sujeito semiótico".

O jornal, enquanto sujeito semiótico, é detentor de um estilo, um tom e um perfil próprios. Essas características o definem e fazem dele uma figura social que pode gerar atração ou repulsa. A eleição de um jornal e a fidelidade a ele proporciona ao público leitor a sensação de permanecer fiel a si mesmo.

O jornal, afirma Landowiski, tem duas faces complementares - a episodicidade e a periodicidade - associadas, respectivamente, à narrativa e ao discurso. Ao desenvolver uma relação com o seu público, este, enquanto leitor, também se constrói nessa relação. O jornal possui ainda duas dimensões: a de proclamar o que há de novo hoje no mundo e a de ocupar-se com o cotidiano, o aqui e agora.

Resultados e Discussão

Características do JP e suas fases

A trajetória do JP foi divida em três fases, graficamente sintetizadas na Tabela 1:

Tal periodização foi estabelecida a partir da observação de características editoriais que marcaram sensivelmente cada fase da trajetória histórica do jornal e que demarcam, também, mudanças do ponto de vista dos objetivos, assim como de público-alvo. Em sua primeira fase, o JP caracteriza-se basicamente como um veículo de press release, função que vai se transformar sensivelmente a partir de 1994, quando a dimensão de veículo de comunicação pública em ciências da saúde vai se firmar, inaugurando assim a sua segunda fase. A terceira fase, iniciada em 1999, configura-se por uma radical reestruturação editorial, caracterizada pelo desmembramento do veículo: o JP (agora também em versão eletrônica) e o JP Informa, estabelecendo linguagens distintas para os públicos interno e externo. Nesse momento, o JP se firma como veículo de divulgação científica para a sociedade extramuros da universidade.

O estudo do JP ateve-se às 185 versões impressas, e estas, totalizando 2.554 páginas de material informativo, constituíram-se nos principais documentos de análise.

Levando em consideração a história recente do JP e na medida em que os documentos não possibilitariam a total compreensão de sua história, foram realizadas também entrevistas com pessoas que estiveram mais diretamente envolvidas com a sua trajetória.

Dentre os dez entrevistados, cinco são jornalistas, um profissional de relações públicas, três médicos e um administrador de empresa.

Descrição e caracterização da primeira fase do JP (Novembro de 1987 a Agosto de 1994)

Concomitante à criação do JP estabeleceu-se na EPM um serviço de Assessoria de Imprensa, intencionalmente associado ao jornal. A análise dos depoimentos do administrador Sidnei Abdalla, do assessor de imprensa Renato Conte e da jornalista Eliane Oliveira1 1 Última jornalista responsável pelo JP. Desempenhou também as funções de editora-chefe do Setor de Publicações e Assessora de Imprensa. possibilitou compreender a estratégia da Assessoria de Imprensa de utilizar o JP como recurso para a divulgação da instituição.

Sidnei Abdalla relatou que a implantação do Departamento de Comunicação objetivava fazer marketing externo da instituição e, em segundo plano, responder às suas necessidades internas de comunicação, informou ainda que buscou a assessoria do professor Laurindo Leal Filho para a elaboração do jornal da EPM, tendo como inspiração o boletim Pré-Pauta, preparado pela Assessoria de Imprensa da USP.

Leal Filho, contudo, faz uma distinção entre um jornal universitário, que é "um elemento difusor das realizações da administração, [...] socializador dos trabalhos desenvolvidos na instituição, [...] integrador da comunidade através das informações ou ainda [...] uma combinação deles todos" (Leal Filho, 1990, p. 9), e o Pré-Pauta, que "tratou-se de um significativo avanço sobre os press-releases" (Leal Filho, 1990, p. 75). O Pré-Pauta era um boletim que continha textos curtos preparados pela assessoria de imprensa e encaminhados aos veículos de comunicação.

Leal Filho considerava o Pré-Pauta um avanço na dinâmica da prestação de serviços de uma assessoria de imprensa "na medida em que não mais se oferecia para a imprensa um texto final pronto, mas em seu lugar se sugeria, com todas as indicações necessárias, a possibilidade da elaboração de uma pauta sobre um assunto no qual a universidade tinha o seu especialista" (Leal Filho, 1990, p. 75). Abdalla conferiu ao jornal que estava se instituindo na EPM a função de um press-release.

Renato Conte, que iniciou sua atuação no JP como estagiário e passou a ter seu nome arrolado no Expediente a partir da edição número 44 (junho de 1991), e que ainda hoje exerce a função de Assessor de Imprensa da UNIFESP/EPM, relatou que por ocasião da implantação do serviço de Assessoria de Imprensa, este "não produzia releases, atuando mais no levantamento de notícias para compor o jornal", e que "quando a jornalista Luisa Acalde ficou sozinha no Jornal da Paulista, ele passou a ser 'vendido' como assessoria de imprensa".2 2 CONTE, R. Entrevista concedida no dia 09 de novembro de 2005 (arquivo de áudio disponível na Biblioteca Prof. Dr. Bernardes de Oliveira - Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde - CeHFi - Unifesp) Luisa Acalde foi jornalista responsável pelo JP durante o curto período de maio a agosto de 1991.

O emprego do JP com o objetivo único e explícito de ser um press-release foi superado ao longo do tempo. No entanto, a estratégia de ser um divulgador da instituição permaneceu ao longo de sua trajetória.

Um escritório representativo da EPM em Brasília

De acordo com o depoimento do diretor Nader Wafae, a criação de um escritório da EPM em Brasília facilitaria a articulação da instituição, seus respectivos Departamentos, Disciplinas e pesquisadores, com os órgãos de fomento à pesquisa e ao ensino superior - os Ministérios, CAPES, CNPq e FINEP.

Abdalla apontou em seu depoimento que para as Instituições Federais Isoladas de Ensino Superior, como era o caso da EPM, era destinado um aporte menor de verbas governamentais do que aquele destinado às universidades. Tal aporte não atendia plenamente as necessidades da EPM, nem permitia a consecução de planos de expansão. Sendo assim, o lançamento do JP, segundo Abdalla, tinha como um de seus objetivos influenciar através da mídia as pessoas que tinham poder de decisão para sensibilizar as ações da EPM. Para Abdalla, "divulgar internamente" a EPM "era um subproduto da veiculação do JP".

A divulgação interna da EPM para a EPM devia-se a uma característica, ainda hoje vigente, de a instituição ter um campus fragmentado em diversas unidades que necessitava de um veículo de intercomunicação.

Divulgação científica na Edição Número Um

Embora as características apresentadas apontem para um jornal que surgiu como estratégia de marketing e apoio para a comunicação interna, o JP, desde o seu primeiro exemplar, trazia informações direcionadas a uma comunidade extramuros.

O exemplar número um, por exemplo, veiculou três matérias com informações consideradas de divulgação científica: "Geneticista japonês ganha Prêmio Nobel", "Esper traz o Michel Prize para o Brasil" e "Radiação: seus efeitos e sua utilização". Duas dessas matérias receberam chamada de capa.

Essas primeiras matérias, a exemplo das demais que foram publicadas ao longo da trajetória do JP, seguiam critérios de estilo objetivando uma eficiente comunicação pública de ciência (Vieira, 1999, p. 21 e 22) e empregavam um código de linguagem que poderia ser compreendido pelo público leigo em geral - uma linguagem sensível à divulgação científica.

Outro componente de divulgação científica associado a essas primeiras matérias consiste no fato de que o Michel Prize, outorgado a Esper Cavalheiro por suas relevantes pesquisas acerca da epilepsia, serviria, segundo o próprio pesquisador, "para chamar a atenção de nossas autoridades". Essa postura viria a ser objeto de uma declaração proferida no I Congresso sobre Comunicação Social da Ciência, realizado em Granada: "Os cientistas não têm somente a possibilidade, mas também o dever de falar em voz alta e chamar a atenção para os males de que padecemos, apontando suas possíveis soluções" (JP, edição número 131, maio de 1999, páginas 4 e 5).

Descrição e caracterização da segunda fase do JP (setembro de 1994 a maio de 1999)

São referências para a segunda fase do JP a introdução das colunas "Pesquisa", "Debate" e "Entrevista" (edições 78, 114 e 188, respectivamente), e o início da versão on-line do jornal, a partir da edição 113.

A análise das matérias publicadas nessas colunas possibilitou identificar um processo de mudança gradual na linha editorial do JP, que passava a se dedicar cada vez mais à comunicação pública das ciências da saúde.

Coluna Pesquisa

A incrementação por meio da inserção de matérias divulgando as pesquisas desenvolvidas na UNIFESP/EPM, que já era feita desde a publicação do primeiro exemplar do JP, propiciou o estabelecimento da coluna Pesquisa. A partir de sua primeira inserção, na edição número 78, a coluna Pesquisa circulou regularmente por mais 109 edições, até o último exemplar do jornal.

A Tabela 2 é baseada nas 1.015 matérias de divulgação científica veiculadas ao longo da trajetória do JP. Desse montante, 435 entradas, 43% do total, referem-se especificamente a matérias de divulgação das pesquisas desenvolvidas na universidade, cuja evolução de inserção no jornal pode ser percebida pelos dados numéricos e percentuais:

Nota-se, por meio desses dados, um progressivo aumento na quantidade de matérias de divulgação científica na trajetória histórica do Jornal, com especial incremento da segunda para a terceira fase, quando a temática assume, sem dúvida, o papel central na estratégia editorial. Tal mudança marca, efetivamente, a caracterização do JP como um veículo de divulgação científica (Abramczyk, 2001).

Durante a segunda e a terceira fases, o JP chegou a destinar até 25% do seu espaço para a veiculação das matérias publicadas na coluna Pesquisa. Durante essas fases o jornal circulou com edições de 16 páginas, sendo comum que matérias de divulgação de pesquisa ocupassem até quatro páginas em determinadas edições.

A veiculação de matérias de divulgação das pesquisas realizadas na instituição pode ser constada, também, pela média de matérias publicadas por edição em cada uma das fases do JP, o que possibilitou a caracterização da sua segunda fase como de transição e reconfiguração editorial do jornal, conforme pode ser constatado na Tabela 3:

Considerando que apenas recentemente o mercado editorial de revistas científicas está em ascensão no Brasil, não representando, contudo, um número ainda significativo quando comparado com o mercado internacional (Targino e Garcia, 2000), a divulgação de pesquisas pelo JP representava também uma pequena, mas significativa, contribuição mesmo para especialistas.

Coluna Debate

Outra importante coluna da segunda fase do JP que também veiculava matérias de divulgação científica foi a coluna Debate, introduzida a partir da edição 114 (novembro de 1997), circulou por 32 edições não sequenciais. Doze edições da coluna Debate pertenceram à segunda fase do jornal (37,5%) e 20, à terceira fase (62,5%). Esse fato demonstra crescimento e ênfase na discussão de temas científicos e não apenas institucionais, pois temas polêmicos das ciências da saúde tiveram espaço no JP particularmente com as matérias publicadas nesta coluna, que apresentavam opiniões de diferentes especialistas sobre determinados tópicos da área da saúde que não eram ainda objeto de consenso.

É possível constatar o uso do gênero debate em publicações científicas do campo da saúde de modo geral numa consulta simples na base de dados PubMed.

As matérias da coluna Debate foram assinadas por 14 jornalistas diferentes. Desses, apenas três tiveram seus nomes arrolados diretamente no Expediente do JP, significando que apenas esses pertenciam ao quadro efetivo de redação do jornal e os demais atuavam como jornalistas eventuais (freelancers).

Coluna Entrevista

A coluna Entrevista passou a ser veiculada com a edição número 118 (abril de 1998). Embora com uma constância mais acentuada que a coluna Debate, também como aquela circulou de forma intermitente por 55 edições do jornal. Pertenceram à segunda fase do JP dez dessas matérias.

Com exceção de Cláudio Csillag, médico, todos os demais 22 autores que assinaram como responsáveis pelas matérias dessa coluna eram jornalistas. Csillag, que por vários anos foi Editor de Texto do JP, passou a integrar a equipe de Redação do jornal em junho de 1997.

Consideramos que a atuação direta de um especialista médico na equipe de redação do jornal minimizava os possíveis questionamentos, comuns ainda hoje entre cientistas, de que a tradução da linguagem científica para a de divulgação incorre em erros. Cabe ressaltar que tanto nos jornais analisados quanto nos depoimentos colhidos não foi identificado esse tipo de dúvida quanto ao JP, o que não descarta a preocupação do jornal.

Diferentemente das matérias publicadas na coluna Debate, para as matérias da coluna Entrevista colhia-se o depoimento de um único entrevistado, escolhido pelo reconhecimento em sua especialidade, e este respondia a perguntas sobre um tema específico.

Onze dos 22 jornalistas que escreveram matérias da coluna Entrevista assinaram também textos da coluna Debate.

O fato de que muitos jornalistas colaboraram com o JP foi considerado como uma indicação de que o jornal era conhecido no meio jornalístico e despertava o interesse de profissionais em escrever sobre ciências da saúde. Ao mesmo tempo, cogita-se aqui que o escritório de Redação do JP pode ter representado uma espécie de "escola" para muitos jornalistas preocupados com o aprimoramento da técnica do jornalismo científico no campo das ciências da saúde, lembrando que ainda hoje existem poucas iniciativas de aprimoramento profissional nessa área.

Ciência a golpes de vontade

Na edição 119 (maio de 1998), na segunda matéria veiculada na coluna Entrevista, a jornalista Maria Góes Carvalho entrevistou Esper Abrão Cavalheiro que, na época, era o Pró-reitor de Graduação e Pesquisa da UNFESP/EPM. Na matéria "Ciência a golpes de vontade", com subtítulo: "Pró-reitor de pós-graduação e pesquisa critica falta de planejamento científico no país", infere-se a inserção no JP da discussão de temas relacionados ao estabelecimento de políticas públicas, sendo um jornal universitário um importante canal para a discussão da política científica nacional.

Divisão de poder no consultório

Nesta mesma coluna, Cláudio Csillag entrevistou David Sobel, diretor do Departamento de Educação em Saúde da Kaiser Permanente, a maior empresa de planos de saúde dos Estados Unidos, para publicar a matéria "Divisão de poder no consultório" (JP, edição 129, março de 1999). Essa matéria, na qual Sobel discorreu sobre o tema da relação médico-paciente, é apontada aqui como uma inferência da possibilidade de utilização do JP enquanto divulgador de informações científicas na área da saúde, como um elemento contribuidor para o processo educação em saúde. Sobel falou sobre como a apropriação pelo paciente de informações sobre a sua própria saúde pode torná-lo um elemento ativo no processo de educação em saúde na sociedade à qual está integrado.

Embora se considere aqui que a atividade da divulgação científica desempenha um papel educativo, compreende-se, contudo, que existem limites, como o exposto pelo especialista em Ciência da Informação Baudoin Jurdant3 3 "Seminário Estratégias para a divulgação científica na sociedade do conhecimento" realizado nos dias 19 e 20 de outubro de 2006, na Faculdade de Medicina Veterinária da USP. , para quem é impossível tornar-se um especialista apenas com o conhecimento de palavras científicas.

Contudo, um argumento favorável, pelo menos no Brasil, ao papel educativo da divulgação científica em saúde vem de publicações como Dados do IBGE - Censo Demográfico de 2000, Anuário Estatístico de Saúde do Brasil de 2001 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNDA) de 2003. Dados dessas publicações revelaram que dos 183 milhões de habitantes, na época, cerca de mil habitantes, em média, contavam com a assistência de 1,9 médicos. No entanto, em alguns estados das regiões Norte e Nordeste, esse índice caía para até um médico por mil habitantes. Esses indicadores revelam também que 62,8% da população brasileira passou por uma consulta médica entre os 12 meses que antecederam a coleta dos dados, o que na média significaria que, em um ano, cada brasileiro consultou um médico 2,4 vezes. Isso implica em considerar que cerca de 38% da população (quase 70 milhões de habitantes) na verdade não passou sequer por uma única consulta médica, o que, estatisticamente, é um número bastante significativo.

Apesar de todos os esforços governamentais e institucionais para melhorar a qualidade dos atendimentos, ainda assim a assistência à saúde encontra muitas dificuldades para estender a todos os brasileiros um atendimento adequado. Daí a educação ao paciente que, entende-se, está implícita no princípio do SUS, desempenhar uma importante ferramenta nessa conjuntura, subtendendo-se a contribuição de materiais informativos como aquele configurado pelo JP.

Alguns dados podem ser acrescentados para mostrar a influência dos meios de comunicação no público em geral. Bubela e Caulfield, por exemplo, entendendo que "a maioria das pessoas toma conhecimento de assuntos relacionados à pesquisa genética por intermédio da mídia", ao analisarem jornais do Canadá, Estados Unidos, Grã-Bretanha e Austrália constataram que "a maioria dos artigos de jornal apresenta os resultados convenientemente e refletem os argumentos postulados nos artigos publicados nos periódicos científicos" (Bubela e Cualfield, 2004, p. 1.399 e 1.403).

A pesquisadora Condit amplia o escopo da influência da mídia ao declarar: "As pessoas leigas obtém da mídia uma quantidade substancial de informação acerca da saúde e de tópicos relacionados" (Condit, 2004, p. 1.415).

Harrabin e colaboradores (2003), que pesquisaram na Inglaterra a cobertura jornalística de temas de saúde e de riscos à saúde em três programas da rede BBC - TV (BBC News at Ten O'Clock, News-night e BBC Radio 5 Live), entre os anos 2000 e 2002, e em três jornais de grande circulação (Daily Mirror, Daily Mail e The Guardian), entendem que: "reportagens sobre temas de saúde podem exercer grande influência nas prioridades e decisões dos gestores de políticas públicas por aquilo que veem na televisão, ouvem no rádio e leem na mídia geral e especializada. Membros da sociedade podem também alterar seu comportamento de maneira a afetar sua saúde, como resultado, ao menos parcial, da informação e conselho que obtém da mídia" (Harrabin e col., 2003, p. 7).

Figueredo, por sua vez, opõe-se à ideia de uma "teoria conspiratória" com relação à influência da mídia, reportando-se a estudos que demonstram uma limitação dessa influência e que reconhecem a capacidade do público em filtrar as informações da mídia. As mensagens da mídia "são seletivamente processadas e confrontadas com outras fontes" (Figueredo, 2000).

Descrição e caracterização da terceira fase do JP (junho de 1999 a dezembro de 2003)

A terceira e última fase do JP iniciou-se com a publicação da edição 131, de junho de 1999, quando o jornal estava em seu 12º ano de veiculação. Essa fase encerrou-se com o fim da publicação impressa do jornal (edição 185, de novembro/dezembro de 2003). São episódios referenciais dessa fase a veiculação de textos nas novas colunas Comunicação e Reportagens, que passaram a ser publicadas nas edições 131 e 166, respectivamente, o lançamento do Jornal da Paulista Informa (JPInforma), anunciado na edição 134 do JP, de agosto de 1999, e o texto "Declaração de Missão do JP", veiculado pela primeira vez na edição 152, de fevereiro de 2001.

Com o crescimento da UNIFESP/EPM houve um aumento da demanda pela veiculação de informações de interesse exclusivamente interno no JP, e o jornal não dispunha de espaço suficiente para tal. Como decorrência, foi então criado, em junho de 1999, o JPInforma, que funcionou como o jornal interno (house organ) da instituição.

A partir daquele momento, o JP passou por uma reestruturação editorial. Em matéria publicada na coluna Comunicação, Eliane Oliveira informava acerca das implementações na política do Departamento de Comunicação da universidade. Tais políticas incluíam, além da publicação do novo veículo de comunicação interna, o JPInforma, "a elaboração de novas publicações, cursos de comunicação para profissionais de saúde e cursos sobre saúde para jornalistas" (JP, edição número 134, agosto de 1999, p. 5).

Esta fase estava ainda associada ao período no qual efetivas ações do Departamento de Comunicação trouxeram para a universidade ideias do movimento da divulgação científica, que se consolidava internacionalmente e que no Brasil também ia se constituindo.

A publicação das matérias de divulgação científica das ciências da saúde que perpassou o JP desde a sua primeira fase, intensificada durante a segunda fase, ganhou mais espaço na terceira fase. É no período correspondente a essa fase que o jornal assume como compromisso voltar-se para a sociedade, tendo como principal característica a divulgação das atividades científicas desenvolvidas pela universidade.

Antecipando-se a uma exigência para órgãos e departamentos, que seria estabelecida apenas em 2005 com a implantação do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), o JP passou a publicar, a partir da edição 152, de fevereiro de 2001, aquela que foi considerada como sua declaração de missão. Apesar de não fazer uma referência direta a si mesmo como jornal de divulgação científica, essa declaração contrasta com aquela que marcou a primeira fase do JP, de que ele era um "Jornal da EPM para a EPM":

O Jornal da Paulista tem como característica principal a publicação das atividades científicas desenvolvidas pela universidade. Além das seções Pesquisa, Assistência e Ensino, o JP, como é conhecido, procura levar à sociedade entrevistas e debates sobre assuntos atuais e polêmicos. Ele traz ainda a opinião de autoridades e especialistas sobre o funcionamento do sistema de saúde e discute os diversos aspectos que envolvem o mercado de trabalho na área médica (JP, número 152, fevereiro de 2001 - grifo acrescentado).

Colunas Comunicação e Curtas

Quando o JP estava em seu 12º ano de circulação, passou a veicular matérias numa nova coluna, intitulada Comunicação. Os textos dessa coluna traziam informações específicas sobre a comunicação pública das ciências da saúde, sobre a divulgação científica, sobre o jornalismo científico e sobre promoções de eventos na UNIFESP/EPM - workshops, encontros e cursos - que visavam à aproximação da universidade com a sociedade por meio de uma comunicação científica pública.

A introdução das discussões acerca da divulgação científica na UNIFESP/EPM deu-se quando a jornalista Heliana Nogueira escreveu a primeira matéria da coluna Comunicação, que trazia informações do Congresso Internacional de Divulgação Científica, ocorrido em Granada, Espanha, do qual a jornalista havia participado no mês de março de 1999, sob o tema "Comunicar a ciência no século XXI".

Para fazer frente aos desafios da divulgação científica quanto à fidelidade das informações transmitidas, apontando formas de tornar a ciência acessível à sociedade, Nogueira fechava o último bloco de sua matéria com o texto do documento elaborado pelos participantes do Congresso Internacional de Divulgação Científica, sob o subtítulo de "Plano de divulgação":

Está começando a figurar-se um novo compromisso social com a ciência e que afeta todos: cientistas, cidadãos, governo, educadores, instituições públicas, empresas, meios de comunicação [...] O apoio à ciência por parte da sociedade deverá ir se manifestando nos próximos anos, não só em maior provisão de fundos para a investigação, mas na criação de novos instrumentos de participação social: comitês de ética, organizações de encontros e debates, canais específicos de informação. Parece oportuno recomendar a elaboração, por parte do melhor grupo de especialistas possível, de um plano de divulgação científica que seja assumido e financiado pelos governos e pelas instituições públicas e privadas. É urgente, portanto, incrementar a cultura científica da população. A informação científica é uma semente fecundíssima para o desenvolvimento social, econômico e político dos povos (JP, edição número 131, p. 5 e 6, 1999).

As matérias publicadas na coluna Comunicação nas edições seguintes do JP relataram as efetivas ações que tomavam vulto na UNIFESP/EPM em prol da intensificação da divulgação científica das ciências da saúde, envolvendo médicos, pesquisadores, jornalistas e divulgadores científicos. Algumas das ações identificadas foram: projeto de um curso de formação contínua em comunicação e saúde (edição 134, agosto de 1999) - a primeira e única versão desse curso de 180 horas de duração foi credenciada pela Pró-reitoria de Extensão da universidade e ofereceu certificado reconhecido pelo MEC (edição 141, março de 2000); promoção de cursos para 'quebrar o gelo' entre médicos e jornalistas (edição 134, agosto de 1999 e edição 137, novembro de 1999); promoção do workshop Comunicação em Saúde (edições 147 e 148, setembro e outubro de 2000).

A última notícia que explicitava informações sobre o tema Divulgação Científica foi publicada na coluna Curtas, edição 181, de junho de 2003: "Workshop Ciência e comunicação da América Latina em foco", que havia acontecido no mês de maio de 2003. Esse foi, ao mesmo tempo, o último evento relacionado à divulgação científica realizado na universidade no período estudado.

Coluna Reportagens

A descrição e caracterização da terceira e última fase do JP foi concluída com informações acerca da coluna Reportagens. Inserida a partir da edição número 166 (abril de 2002), a coluna marcou o auge da terceira fase e da identificação do JP como veículo de divulgação científica em ciências da saúde. Essa coluna foi veiculada em 14 edições do jornal, num total de 36 matérias. Cada coluna publicava de uma a quatro reportagens, representando uma média de 2,6 reportagens por edição.

As reportagens reservavam um diferencial com relação às matérias de divulgação das pesquisas. Essas últimas tinham como referência e fonte de informação a produção científica elaborada exclusivamente na UNIFESP/EPM. As reportagens ampliavam o espectro informacional e buscavam na elaboração do texto uma maior articulação da informação com fontes de diferentes instituições da saúde, aproximando-se, nesse aspecto, das matérias publicadas nas colunas Debate e Entrevista, que também utilizavam o recurso de trazer para o texto de divulgação científica opiniões e contribuições de especialistas que não pertenciam exclusivamente à comunidade UNIFESP/EPM.

O fim do JP: descontinuidade das ações

A ausência de uma versão oficial para o encerramento da publicação do JP possibilitou algumas conjecturas feitas a partir do depoimento de Regina Stella, Diretora do Departamento de Comunicação da universidade no período estudado4 4 Depoimento colhido em 10 de novembro de 2005. .

Em seu depoimento, Regina Stella abordou, entre outras coisas, os altos custos para a manutenção da comunicação na universidade, sendo este um forte indício de que tal particularidade é que pode ter orientado o fim do JP.

O Departamento de Comunicação da UNIFESP/EPM é um departamento administrativo que está ligado à Pró-reitoria de Administração. Neste particular, segundo apontado nos estudos de Leal Filho (1990) e Carneiro (2004), o primeiro ao estudar o Jornal da USP (JUSP), e a segunda ao estudar a política de comunicação e divulgação científica na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), reside a fragilidade de um departamento de comunicação e de um setor de imprensa de universidades.

Os estudos de Carneiro apontam para a importância do estabelecimento de uma política de comunicação universitária sistematizada:

Com base na nossa experiência de quase uma década de atuação na área de Comunicação da UFU (1994 até o momento), constato a existência de uma produção científica significativa e, ao mesmo tempo, a inexistência de uma política sistematizada e articulada de divulgação científica. A nosso ver, a responsabilidade da Universidade não termina com a apresentação dos resultados das pesquisas em espaços acadêmicos, como congressos, simpósios, seminários, e nem com a publicação dos trabalhos em espaços específicos, como revistas especializadas, o que normalmente ocorre. Esse novo conhecimento deve ser estendido até o público em geral, por meio da mídia, para que haja uma contribuição efetiva na solução de problemas sociais (Carneiro, 2004, p. 13).

Subsidiada em sua experiência e na de outros pesquisadores que pensam a política de comunicação universitária, Carneiro também concluiu que:

O sucesso de uma política global de Comunicação tem relação direta com o entendimento e a importância principalmente que o reitor dá à área (Carneiro, 2004, p. 149).

Carneiro reportou-se a Wilson da Costa Bueno e José Roberto Ferreira, que, durante a 3ª Conferência Mundial de Jornalistas Científicos, realizada pela Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC), em novembro de 2002, em São José dos Campos-SP, declararam, respectivamente:

Falta autonomia do pessoal de comunicação que atua em Institutos de Pesquisa e Universidades, muitas vezes direcionam seus trabalhos para o atendimento aos dirigentes em vez de divulgar a produção gerada em seus laboratórios.

É comum na troca de gestores haver uma troca da equipe... com isso, há interrupções de projetos que vinham sendo desenvolvidos (Carneiro, 2004, p. 53 ).

Carneiro valeu-se ainda das considerações de Margarida M. Krohling Kunsch que, ao discorrer sobre as reestruturações em organizações públicas ocorridas em decorrência de troca da cúpula diretiva, insere, nesse contexto, a política universitária de comunicação:

...a cada mudança da cúpula, se trocam também as chefias de primeiro e segundo escalões, que desfazem tudo e introduzem seus próprios conceitos, num incessante começar-e-recomeçar... Ora, os projetos de comunicação de uma universidade têm de ser vistos como opções institucionais conscientes e não como iniciativas individuais, que facilmente caem por terra. O que deve prevalecer é o interesse público (Kunsch, 1992, p. 110).

Apesar do acima exposto, não foram encontradas evidências de quaisquer indisponibilidades entre o Departamento de Comunicação da UNIFESP/EPM, ou, mais precisamente, entre o seu Setor de Imprensa e a Reitoria durante todo o período da trajetória do JP. Salvo o episódio que marcou o fim do jornal e o fim das ações de divulgação científica na universidade, os indícios recuperados apontam que a decisão de reestruturação do Departamento de Comunicação envolvia um aspecto orçamentário e de opção por aquilo que se considerava prioritário para a universidade. O estudo sobre o JP e o entendimento quanto à fragilidade dos departamentos de comunicação das universidades em geral, e da UNIFESP/EPM em particular, embasam esta perspectiva.

Por ocasião da troca da direção da UNIFESP/EPM em julho de 2003, decidiu-se pela re-estruturação do Departamento de Comunicação, terceirizando parte dele, que culminou com o fim da história do JP e das demais ações de divulgação científica que estavam sendo promovidas pelo Departamento de Comunicação da universidade.

O JP desapareceu sem que uma nota tivesse sido publicada anunciando o seu fim. Ao mesmo tempo em que o projeto editorial do JP foi encerrado, também o foi a publicação do JPInforma e o projeto editorial da revista Saúde Paulista, que havia sido iniciado em 2001. A proposta do Departamento de Comunicação de produzir manuais que seguiriam o Corra que a imprensa vem aí, e a elaboração de seminários, workshops e cursos de divulgação científica e formação para não especialistas em ciências da saúde também se encerraram com o fim do JP.

A exemplo de Regina Stela, a jornalista Eliane Oliveira, em seu depoimento, também relacionou o fim do JP a uma questão de ordem financeira.

Considerações Finais

Estudar a trajetória histórica do Jornal da Paulista (JP) significou ao mesmo tempo vislumbrar um pouco da própria trajetória científica da Universidade Federal de São Paulo, no limite do tempo no qual o JP circulou, entre novembro de 1987 e dezembro de 2003.

Na delimitação temporal do estudo, pari passu à constituição do jornal como um veículo de divulgação científica na área das ciências da saúde, ocorreu o processo de elevação da Escola Paulista de Medicina à condição de Universidade Federal, no final de 1994. Tal transformação consolidou e confirmou, assim, a vocação dessa instituição como um importante centro produtor e difusor do conhecimento científico, exclusivo na época da pesquisa à área das ciências da saúde. Muito desse conhecimento transformado em comunicação científica expressou-se publicamente em primeira mão como artigo de divulgação científica no JP, antes mesmo de ser elaborado no formato de um artigo para disseminação em periódicos científicos.

Uma possível conclusão do estudo é a de que o JP, ao longo de sua trajetória, constituiu-se como um instrumento de divulgação científica, conforme se pode constatar na análise minuciosa de suas edições, apoiada também nos depoimentos colhidos. Acrescenta-se ao estudo do jornal o dado de que o mesmo pode ser também compreendido como uma contribuição para o empoderamento em saúde, contudo, o detalhamento sobre essa conclusão demanda uma publicação específica posterior.

As entrevistas realizadas como elementos complementares à análise das edições do jornal possibilitaram o acesso a informações que os documentos não forneciam. Nomes como o de Nader Wafae, Sidnei Abdalla e Laurindo Leal Filho revelaram dados sobre a origem do jornal. Conquanto a maior parte das informações advindas dessas entrevistas estivesse relacionada a aspectos formais como o nome do jornal, bem como associada às suas características primárias de órgão de comunicação interna e instrumento de marketing institucional, ainda assim pudemos perceber indícios de que os depoentes entendiam o jornal também como um veículo que deveria se voltar para fora dos muros da instituição.

Os demais entrevistados, Izilda Alves, Renato Conte, Heliana Nogueira, Eliane Oliveira, falaram como jornalistas e de suas falas foi possível depreender que embora ainda houvesse uma preocupação com a divulgação do nome da instituição, a preocupação maior, com a profissionalização do jornal, era de fato a comunicação pública da informação científica.

O entrevistado Cláudio Csillag, por ser um médico que atuou no JP como editor de texto, revelou um importante dado quanto à confiabilidade das informações de divulgação científica que eram veiculadas nas páginas do JP.

Por fim, Miriam Baceto, Relações Públicas que ocupou temporariamente a posição de Diretora do Departamento de Comunicação até que o cargo fosse assumido por Regina Celes e Rosa Stella, e esta última, trouxeram dados complementares ao entendimento do JP como veículo de comunicação da UNIFESP/EPM, bem como sobre o seu papel como instrumento de divulgação científica.

O depoimento colhido junto à jornalista Izilda Alves (12/01/2006), que implantou o serviço de Assessoria de Imprensa na instituição e foi a primeira jornalista responsável pelo JP, revelou a facilidade de diálogo com os especialistas da universidade e a prontidão deles em responder às solicitações da imprensa - não foi perceptível, no estudo sobre o JP, a ocorrência de situações conflituosas.

O estudo acerca do JP revelou ainda como a equipe de comunicação da UNIFESP/EPM, durante a terceira fase do jornal, mobilizava-se para eliminar as distâncias entre pesquisadores das ciências da saúde e jornalistas e divulgadores científicos promovendo cursos, workshops e produzindo material de apoio.

No que diz respeito às características principais do JP, foi possível identificar:

1. O discurso da linguagem utilizada na veiculação das matérias de divulgação científica seguia critérios não apenas jornalísticos, mas aqueles específicos do jornalismo científico.

2. Em sua categoria de jornal universitário, o JP era o único que se dedicava a veicular informações exclusivamente na área das ciências da saúde.

3. A distribuição do JP não se restringia apenas à comunidade interna, mas era disponibilizado em lugares estratégicos do campus universitário, o que possibilitava que o pessoal circulante que buscava atendimento de saúde, nos diferentes locais de atendimento especializado, e seus acompanhantes também acessassem o jornal. A assessoria de imprensa da universidade, por meio de um amplo serviço de mailing, distribuía ainda o JP para as principais agências de comunicação do país.

4. O contingente de leitores do JP incluía não apenas o público leigo, mas também o de especialistas. Pelas páginas do jornal circulavam informações recém-apresentadas nos programas de pós-graduação da universidade, advindas da defesa de teses de mestrado e doutorado e que em primeira mão eram disponibilizadas no JP. Tais resultados poderiam levar um considerável tempo para serem publicados em revistas especializadas, mas com o JP obtinha maior agilidade na sua propagação. Dessa forma, o JP servia também como um instrumento de atualização para especialistas de diferentes áreas.

5. Dentre as características do JP, entende-se que a principal delas foi a de que o jornal representou um veículo de democratização e socialização do conhecimento científico.

Concluindo, podemos dizer que as fases pelas quais o JP passou, conforme descritas e discutidas neste artigo, indicam a sua passagem por um processo de amadurecimento editorial que culminou com a prevalência da divulgação científica das ciências da saúde como episódio de narração configurada com a periodicidade de sua publicação.

Entende-se que a necessidade premente marcada no início da publicação do JP, de tornar o nome da instituição reconhecida nos meios provedores de financiamento público, foi superada pelo papel do jornal como veículo de divulgação da produção científica da universidade.

Recebido em: 16/12/2008

Reapresentado em: 04/06/2009

Aprovado em: 18/07/2009

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  • 1
    Última jornalista responsável pelo JP. Desempenhou também as funções de editora-chefe do Setor de Publicações e Assessora de Imprensa.
  • 2
    CONTE, R. Entrevista concedida no dia 09 de novembro de 2005 (arquivo de áudio disponível na Biblioteca Prof. Dr. Bernardes de Oliveira - Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde - CeHFi - Unifesp)
  • 3
    "Seminário Estratégias para a divulgação científica na sociedade do conhecimento" realizado nos dias 19 e 20 de outubro de 2006, na Faculdade de Medicina Veterinária da USP.
  • 4
    Depoimento colhido em 10 de novembro de 2005.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Dez 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Aceito
      18 Jul 2009
    • Revisado
      04 Jun 2009
    • Recebido
      16 Dez 2008
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