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Tradução e adaptação brasileira do Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ)

Translation and brazilian adaptation of the Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ)

Resumos

O objetivo deste estudo foi traduzir o instrumento Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ) para a língua portuguesa do Brasil e realizar a adaptação cultural para aplicação na população de pais brasileiros. A tradução obedeceu às etapas de tradução, tradução reversa e revisão por um comitê de especialistas. No pré-teste, uma amostra de 20 pais respondeu ao questionário para avaliar os erros e desvios das traduções. Além disso, foi acrescentada a cada questão a alternativa "não entendi" para identificar questões que não fossem compreendidas pelos pais, isto é, consideradas culturalmente inadequadas. Os achados sugerem adequação do processo de adaptação cultural do instrumento para a língua portuguesa. No pré-teste, 20 indivíduos responderam ao questionário e apresentaram uma boa compreensão do instrumento, uma vez que nenhuma questão foi considerada incompreensível por 15% ou mais dos pais. A versão em português do P-CPQ mostrou ser de fácil compreensão pela população de pais brasileiros.

Questionários; Pais; Qualidade de vida; Tradução (Processo); Criança; Saúde bucal


The aim of this study was to translate the Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ) into Brazilian Portuguese and to make the necessary cultural adaptations for use in the Brazilian parent population. The whole translation process consisted of translation, back-translation and committee review. In the pre-testing stage, a sample of 20 parents answered the questionnaire in order to check for errors and deviations in the translations. Furthermore, in each question the alternative "I didn't understand" was added to identify the questions that were not understood by the parents, i.e. questions considered culturally inappropriate. The findings suggested that the instrument is adequate to the Portuguese language and to the Brazilian cultural identity. In the pre-testing stage, 20 subjects answered the questionnaire and showed good understanding of the instrument, since no question was considered incomprehensible by 15% or more of the parents. The Portuguese version of the P-CPQ proved to be easily understandable by the Brazilian parental population.

Questionnaires; Parents; Quality of life; Translation; Children; Oral health


PARTE I - ARTIGOS

Tradução e adaptação brasileira do Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ)1 1 Apoio Financeiro: CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Brasília, DF, Brasil)

Translation and brazilian adaptation of the Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ)

Taís de Souza BarbosaI; Carolina Steiner-OliveiraII; Maria Beatriz Duarte GaviãoIII

IMestre e Doutoranda em Odontopediatria pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba, FOP/Unicamp. Endereço: Av. Limeira, 901, Areião, CEP 13414-903, Piracicaba, SP, Brasil. E-mail: tais_sb@yahoo.com

IIDoutora em Odontopediatria. Endereço: Av. Limeira, 901, Areião, CEP 13414-903, Piracicaba, SP, Brasil. E-mail: casteiner@terra.com.br

IIIProfessor Titular em Odontopediatria do Departamento de Odontologia Infantil, Área de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Unicamp. Endereço: Av. Limeira, 901, Areião, CEP 13414-903, Piracicaba, SP, Brasil. E-mail: mbgaviao@fop.unicamp.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi traduzir o instrumento Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ) para a língua portuguesa do Brasil e realizar a adaptação cultural para aplicação na população de pais brasileiros. A tradução obedeceu às etapas de tradução, tradução reversa e revisão por um comitê de especialistas. No pré-teste, uma amostra de 20 pais respondeu ao questionário para avaliar os erros e desvios das traduções. Além disso, foi acrescentada a cada questão a alternativa "não entendi" para identificar questões que não fossem compreendidas pelos pais, isto é, consideradas culturalmente inadequadas. Os achados sugerem adequação do processo de adaptação cultural do instrumento para a língua portuguesa. No pré-teste, 20 indivíduos responderam ao questionário e apresentaram uma boa compreensão do instrumento, uma vez que nenhuma questão foi considerada incompreensível por 15% ou mais dos pais. A versão em português do P-CPQ mostrou ser de fácil compreensão pela população de pais brasileiros.

Palavras-chave: Questionários; Pais; Qualidade de vida; Tradução (Processo); Criança; Saúde bucal.

ABSTRACT

The aim of this study was to translate the Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire (P-CPQ) into Brazilian Portuguese and to make the necessary cultural adaptations for use in the Brazilian parent population. The whole translation process consisted of translation, back-translation and committee review. In the pre-testing stage, a sample of 20 parents answered the questionnaire in order to check for errors and deviations in the translations. Furthermore, in each question the alternative "I didn't understand" was added to identify the questions that were not understood by the parents, i.e. questions considered culturally inappropriate. The findings suggested that the instrument is adequate to the Portuguese language and to the Brazilian cultural identity. In the pre-testing stage, 20 subjects answered the questionnaire and showed good understanding of the instrument, since no question was considered incomprehensible by 15% or more of the parents. The Portuguese version of the P-CPQ proved to be easily understandable by the Brazilian parental population.

Keywords: Questionnaires; Parents; Quality of life; Translation; Children; Oral health.

Introdução

A saúde bucal vinha historicamente sendo avaliada por meio de critérios exclusivamente clínicos, os quais não permitem a determinação do real impacto dos problemas bucais na vida dos indivíduos. A necessidade de determinar a repercussão integral de alterações presentes na cavidade bucal levou ao desenvolvimento dos instrumentos de avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde bucal, que são utilizados com frequência cada vez maior em pesquisas odontológicas (Jokovic e col., 2002).

Muitos instrumentos que avaliam a qualidade de vida foram desenvolvidos na língua inglesa (Guillemin, 1995). Há, contudo, a necessidade de se criar instrumentos para serem utilizados em outros idiomas. Para isso, duas opções podem ser empregadas: construir um novo instrumento de medida ou adaptar um já existente em outra língua (Guillemin e col., 1993).

Casas-Anguita e colaboradores (2001) defendem que a adaptação cultural é preferível à construção de um novo instrumento. As razões para essa preferência são: a complexidade do processo de criação de um questionário, o fato de a adaptação permitir confiabilidade e validade similar ao instrumento original e a necessidade de elementos de referência para serem utilizados em investigações das quais participam vários países. Como a tarefa de desenvolver um novo instrumento para mensurar qualidade de vida relacionada à saúde consome muito tempo, com grande frequência instrumentos são "exportados" para realidades culturais distintas de onde foram desenvolvidos (Herdman e col., 1998).

O Child Oral Health Quality of Life Questionnaires (COHQoL) é uma série de questionários desenvolvida por pesquisadores canadenses com o objetivo de avaliar as percepções dos pais e das crianças em relação à qualidade de vida relacionada à saúde bucal das crianças. Consiste de questionários para grupos etários de 8 a 10 anos (Child Perceptions Questionnaire - CPQ8-10) (Jokovic e col., 2004) e de 11 a 14 anos (CPQ11-14) (Jokovic e col., 2002), que visam avaliar a percepção da criança sobre o impacto das doenças orais no funcionamento físico e psicossocial. Estudos preliminares confirmaram a validade e a confiabilidade do CPQ8-10 e CPQ11-14 em outros países como Inglaterra (Marshman e col., 2005), Arabia Saudita (Brown e Al-Khayal, 2006), China (McGrath e col., 2008) e Brasil (Goursand e col., 2008; Barbosa e col., 2009).

Além disso, o COHQoL inclui também um questionário de percepção dos pais sobre a qualidade de vida relacionada à saúde bucal da criança (Parental-Caregiver Perceptions Questionnaire - P-CPQ) (Jokovic e col., 2003), bem como uma escala de avaliação dos efeitos das doenças bucais no funcionamento familiar (Family Impact Scale - FIS) (Locker e col., 2002). As propriedades psicométricas do P-CPQ já foram avaliadas em outros países como Inglaterra e China (McGrath e col., 2008; Marshman e col., 2007). No entanto, no Brasil, ainda não há uma proposta de tradução e validação desse questionário.

A avaliação da percepção dos pais em relação à saúde bucal relacionada ao bem-estar da criança é importante, pois são os principais responsáveis por sua saúde. Sendo assim, este estudo objetivou realizar a tradução para a língua portuguesa e a adaptação cultural do questionário P-CPQ para a população de pais brasileiros.

Procedimentos Metodológicos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Piracicaba - Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp), protocolo número 021/2006. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O P-CPQ é um questionário autopreenchível, composto de 35 questões que avaliam as percepções dos pais e/ou responsáveis sobre os impactos das doenças bucais (por exemplo, cárie, maloclusão) na qualidade de vida das crianças com idade entre 6 e 14 anos (Jokovic e col., 2003), bem como uma escala de avaliação, composta de 14 questões que avaliam os efeitos das desordens orais no funcionamento familiar (Locker e col., 2002). As questões 1 e 2 referem-se à percepção global dos responsáveis sobre a saúde bucal e o bem-estar geral da criança. Apresentam opções de resposta que variam de zero (0) a quatro (4). As demais questões dividem-se em quatro amplas categorias: sintomas orais (questões 3 a 8), limitações funcionais (questões 9 a 16), bem-estar emocional (questões 17 a 24), bem-estar social (questões 25 a 35). As questões 36 a 49 referem-se aos impactos das desordens orais no bem-estar da família. As opções de resposta variam de zero a cinco pontos (0 = nunca; 1 = uma ou duas vezes; 2 = algumas vezes; 3 = frequentemente; 4 = todos os dias ou quase todos os dias; 5 = não sei). A pontuação total é obtida pela soma dos escores de todas as questões. Quanto maior a pontuação, maior o impacto das doenças bucais na qualidade de vida.

A tradução e adaptação cultural do P-CPQ seguiu as etapas indicadas por Guillemin e colaboradores (1993): tradução inicial, retradução, revisão por comitê de especialistas e adaptação cultural (Quadro 1).


Tradução inicial

As questões da versão em inglês do P-CPQ foram inicialmente traduzidas para a língua portuguesa por dois professores de inglês independentes, brasileiros, cientes do objetivo da pesquisa. Foi enfatizada, principalmente, a tradução conceitual e não a estritamente literária. Os primeiro autor (TSB) e os dois tradutores analisaram as duas traduções e por consenso reduziram as diferenças encontradas nas traduções. Essa etapa constou da escolha da melhor tradução para as questões e da modificação por aproximação de termos mais adequados, escolhidos para permitir a compreensão pela população brasileira. Dessa forma, foi obtida a versão nº 1 em português.

Retradução

A versão nº 1 em português foi encaminhada para dois tradutores estadunidenses, bilíngues, desconhecedores do texto original, os quais realizaram nova versão para o idioma Inglês. Não foi permitido que esses novos tradutores tivessem contato com o texto original, escrito em Inglês, para evitar qualquer influência à tradução das palavras. A finalidade das retraduções (RT1 e RT2) foi detectar erros ou desvios do instrumento original, conforme sugere a metodologia back-translation3.

Revisão por comitê de especialistas

Um comitê formado pelo primeiro autor (TSB) e por especialistas na área (Odontopediatria) realizou a comparação das duas versões do instrumento traduzido com os originais em inglês. Foram realizados os ajustes necessários para se obter uma única versão apropriada do instrumento em português. A partir das discussões e das explicitações das divergências entre o primeiro autor (TSB) e os membros do comitê, foram efetivadas as modificações, as adaptações e reescritas algumas expressões no instrumento traduzido até a obtenção de um consenso, gerando a versão n° 2 em português, garantindo, assim, a equivalência de sentido, sem comprometer a compreensão pela população a que se destinava. Durante esse processo foram observados os seguintes aspectos:

• Equivalência semântica: avaliação da equivalência gramatical e de vocabulário. As palavras que não possuíam uma tradução literal com significado semelhante foram traduzidas para os termos em português que apresentavam equivalência de significado.

• Equivalência idiomática: tradução de certas expressões idiomáticas que não pode ser feita de forma literal, devendo equivaler no seu sentido.

• Equivalência experimental ou cultural: coerência entre os termos utilizados e as experiências vividas pela população à qual se destina, dentro do seu contexto cultural. A equivalência experimental ou cultural foi verificada por meio de aplicação do questionário na população de pais e/ou responsáveis, analisando qualitativamente as respostas. Essa fase da tradução foi realizada na segunda etapa da pesquisa, por meio da análise da compreensão e adequação das questões para o contexto da população analisada.

Adaptação cultural

A versão n° 2 em português foi utilizada para o pré-teste, autoaplicada por um grupo de 20 indivíduos, responsáveis pelas crianças que frequentam o Departamento de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, Unicamp. Esses indivíduos foram convidados a participar do teste-piloto para verificar a compreensão das questões do questionário. Nessa fase, o único critério de exclusão foi analfabetismo.

A equivalência cultural foi estabelecida de acordo com os critérios de Guillemin e col.3, em que pelo menos 85% dos indivíduos não devem mostrar algum tipo de dificuldade para responder a cada questão formulada. As questões que apresentassem índice maior do que 15% de resposta "não entendi" foram avaliadas novamente pelo comitê de especialistas e foram substituídas por outras de mesmo conceito, para que não fossem alteradas de modo significativo a estrutura e propriedades de sua avaliação. Depois de modificada, essa versão (versão nº 3 em português) foi novamente aplicada a outro grupo de 20 sujeitos, sendo sua equivalência cultural testada novamente, até que nenhuma questão fosse incompreensível para mais de 15% dos indivíduos.

Resultados

O Quadro 2 sintetiza as etapas da tradução inicial, retradução e revisão por comitê de especialistas. Alguns pontos referentes ao processo de revisão são destacados a seguir.


Os resultados das avaliações de tradução com o comitê de especialistas apontaram que houve equivalência nas questões traduzidas, equivalência semântica entre as duas versões em português e ausência de dificuldades de tradução. Em alguns itens do instrumento, foi priorizada uma versão sobre a outra, com o objetivo de conseguir maior clareza do item.

Na etapa de avaliação de equivalência da tradução inicial e retraduções com a versão original, foram feitas alterações em estruturas gramaticais de algumas questões, quando a versão em português foi traduzida para o inglês. Essas mudanças se fundamentaram na necessidade de se obter a equivalência semântica, idiomática e cultural. Os itens que apresentaram necessidade de adaptação cultural estavam de acordo com o tipo de equivalência, como nos exemplos abaixo:

• Semântica: em algumas situações foram utilizadas palavras e expressões sinônimas, proporcionando equivalência de significado (questões 1-3, 8, 9, 11, 12, 16, 17, 19, 21, 23, 24, 27-32, 34, 36, 37, 39, 46, 48, 49).

• Idiomática: algumas expressões não puderam ser traduzidas de forma literal, equivalendo-se no seu sentido (questões 29 e 39). A expressão "taken time off work", por exemplo, foi traduzida para "precisou de dispensa do trabalho".

• Cultural: o termo "clubs" foi traduzido tendo em vista o contexto social da criança brasileira, como "grupos de atividades" (questão 32).

Para especificação da versão final em português do P-CPQ, foram sugeridas algumas modificações e adaptações pelo comitê de especialistas que explicitamente alteraram a estrutura do instrumento original. Foram realizadas algumas substituições de termos por palavras sinônimas tendo em vista o melhor entendimento pela população estudada (questões 8, 14, 15, 16, 24, 29, 31, 32, 35, 40). Alguns termos ainda que corretos do ponto de vista da tradução literal foram considerados inadequados por não representarem o significado conceitual da questão avaliada, sendo substituídos por outros que melhor compreendem o significado da afirmativa (questões 11, 17, 36).

Os resultados referentes ao pré-teste demonstraram que a versão brasileira do P-CPQ foi bem compreendida pelos indivíduos da pesquisa (Quadro 3). O nível de incompreensão não ultrapassou 15% em 22 questões, não sendo necessária, portanto, a revisão de nenhuma questão do instrumento. Das 22 questões, uma refere-se à percepção global, três referem-se às limitações funcionais, seis ao bem-estar emocional, sete ao bem-estar social e cinco à escala familiar. As questões 2, 11, 15, 16, 18, 21, 24, 28-31, 34, 35, 37, 41, 43 e 47 apresentaram-se duvidosas em 5% dos indivíduos, as questões 17, 20, 22 e 38 em 10% dos sujeitos, e apenas a questão 25 foi incompreendida por 15% da população selecionada. Dos 20 indivíduos que participaram do pré-teste, quatro não compreenderam até quatro questões das 41 presentes no questionário, e somente um indivíduo não compreendeu mais de quatro questões (20 questões).


A versão brasileira do P-CPQ, obtida após a tradução do idioma inglês para o português e a adaptação cultural, encontra-se apresentada no Anexo.

Discussão

Um instrumento só pode ser considerado válido se for capaz de captar adequadamente determinado conceito subjacente. Assim, um instrumento traduzido deve ser capaz de obter na cultura para a qual está sendo adaptado o mesmo efeito que o instrumento original tem no contexto em que foi criado. A falta de equivalência transcultural compromete a validade das informações coletadas, impossibilitando a utilização do instrumento para estudar um conceito corretamente (Reichenheim e col., 2000). Tesh e colaboradores (2008) enfatizam que o processo de avaliação da equivalência semântica na adaptação cultural de instrumentos de qualidade de vida associada à saúde bucal deve ter uma base conceitual e se apoiar em metodologias criteriosamente definidas.

Nesse sentido, existe grande discussão na literatura sobre os métodos apropriados para se realizar adaptações transculturais de instrumentos de avaliação da qualidade de vida. Alguns autores (Guillemin e col., 1993; Herman e col., 1997) iniciaram essa discussão e questionaram a confusão terminológica e uma real carência de sistemática na avaliação de equivalência transcultural entre instrumentos desenvolvidos em determinado idioma e sua(s) versão(ões) (Herman e col., 1997; Hebling e Pereira, 2007). O grande questionamento seria quanto ao comprometimento da validade da informação, fato que levaria à perda das características originais do instrumento. Por isso existem instruções padronizadas que tentam minimizar essas perdas decorrentes da mudança do idioma (Guillemin e col., 1993; Herman e col., 1997; Reichenheim e col., 2000; Falcão e col., 2003).

Assim, este trabalho considerou esses aspectos e se orientou pelo modelo sugerido por Guillemim e colaboradores (1993) no desenvolvimento da versão em português do P-CPQ. Nesse processo, para que as traduções alcançassem um alto nível de qualidade, foram utilizados dois tradutores e dois retradutores independentes, para possibilitar a comparação entre as versões, a identificação de erros em algumas questões e a escolha dos termos mais adequados. No mais, a utilização e o confronto de mais de uma tradução permitiu a junção de itens oriundos de diferentes versões e, ainda, possibilitou a escolha de por uma terceira alternativa uma vez que nenhuma das duas traduções mostrou-se adequada. Como também vem sendo proposto atualmente na literatura (Guillemin e col., 1993; Beaton e col., 2000; Reichenheim e col., 2000; Moraes e col., 2002), durante essa etapa, foi valorizada a equivalência semântica, e não a literal entre os termos, uma vez que nem sempre a literal se mostra mais vantajosa em expressar conceitos ou situações da nova população que se deseja estudar.

Além do processo de tradução e retradução do instrumento original, foi realizada uma avaliação da equivalência semântica, idiomática e cultural com uma interlocução com profissionais da área estudada. Sem isso, a adaptação de instrumentos perde em termos de significado conceitual, limitando o instrumento ao significado literal. Além disto, o número de sujeitos envolvidos e a caracterização da amostra no pré-teste foram adequadamente descritos, estando de acordo com os critérios metodológicos preconizados para adaptação cultural de questionários (Castro e col., 2007).

Quanto ao modo de aplicação, estudos posteriores poderão demonstrar se há equivalência. Originalmente o instrumento propõe que seja autoaplicado, sendo necessário que o respondente leia atentamente as instruções antes de responder às questões. Dessa forma, no presente estudo, achou-se viável que as instruções iniciais fossem lidas pelo pesquisador conjuntamente aos sujeitos da pesquisa visando certificar a compreensão das normas de preenchimento do questionário pela população analisada.

Considerações Finais

O processo de avaliação da adaptação cultural de instrumentos de qualidade de vida associada à saúde bucal deve ter uma base conceitual e se apoiar em metodologias criteriosamente definidas, uma vez que diferenças sutis nos hábitos de vida nas diferentes culturas podem levar incompreensões, podendo alterar as propriedades psicométricas do instrumento. Portanto, para que a adaptação cultural seja plenamente alcançada, é também necessário um estudo de avaliação da confiabilidade e validade da nova versão.

Recebido em: 30/06/2009

Aprovado em: 03/03/2010

Anexo - Questionário de Saúde Bucal Infantil - Percepção dos pais (6-14 anos)

Instruções aos pais:

1. Esse questionário é sobre os efeitos das condições bucais no bem-estar e vida diária das crianças e desses efeitos sobre suas famílias. Nós estamos interessados em qualquer condição que envolva dentes, lábios, boca e maxilares. Por favor, responda cada questão.

2. Para responder a questão, favor colocar um X na caixa próxima à resposta.

3. Por favor, dê a resposta que melhor descrever a experiência de seu filho(a). Se a questão não estiver de acordo com seu filho(a), favor responder "Nunca".

4. Por favor, não discuta as questões com seu filho(a), pois estamos apenas interessados na opinião dos pais nesse questionário.

SEÇÃO 1 - Saúde Bucal e bem-estar da criança

1. Como você classificaria a saúde dos dentes, lábios, maxilares e boca de seu filho(a)?

[ ] Excelente

[ ] Muito boa

[ ] Boa

[ ] Regular

[ ] Ruim

2. Quanto o bem-estar geral de seu filho(a) é afetado pela condição de seus dentes, lábios, maxilares ou boca?

[ ] Nem um pouco

[ ] Só um pouquinho

[ ] Mais ou menos

[ ] Muito

[ ] Muitíssimo

SEÇÃO 2 - As questões a seguir são sobre sintomas e desconfortos que as crianças podem sentir devido às condições de seus dentes, lábios, boca e maxilares

3. Seu filho(a) teve dor nos dentes, lábios, maxilares ou boca?

4. Seu filho(a) teve sangramentos na gengiva?

5. Seu filho(a) teve machucados na boca?

6. Seu filho(a) teve mau hálito?

7. Comida presa no céu da boca?

8. Seu filho(a) teve alimento preso dentro ou entre os dentes?

9. Seu filho(a) teve dificuldade de morder ou mastigar comidas como maçã, espiga de milho ou carne dura?

Durante os últimos 3 meses, devido aos dentes, lábios, boca ou maxilares, com que frequência:

10. Seu filho(a) respirou pela boca?

11. Seu filho(a) teve problemas durante o sono?

12. Seu filho(a) teve dificuldade para dizer alguma palavra?

13. Seu filho(a) demorou mais que os outros para comer uma refeição?

14. Seu filho(a) teve dificuldade para beber ou comer alimentos quentes ou frios?

15. Seu filho(a) teve dificuldade para comer alimentos de que ele/ela gostaria?

16. Seu filho(a) teve uma dieta restrita a certos tipos de alimentos (ex. alimentos moles)?

SEÇÃO 3 - As questões a seguir perguntam sobre os efeitos que a condição dos dentes, lábios, boca e maxilares de seu filho(a) podem ter no sentimento e nas atividades diárias deles

Durante os últimos 3 meses, devido aos dentes, lábios, boca ou maxilares, com que frequência:

17. Seu filho(a) se sente perturbado(a)?

18. Seu filho(a) se sente irritado(a) ou frustrado(a)?

19. Seu filho(a) se sente ansioso ou com medo?

Durante os últimos 3 meses, devido aos dentes, lábios, boca ou maxilares, com que frequência:

20. Seu filho(a) faltou à escola (ex. dor, consultas, cirurgias)?

21. Seu filho(a) teve dificuldade para prestar atenção na escola?

22. Seu filho(a) não quis falar ou ler em voz alta na classe?

23. Seu filho(a) não quis falar com outras crianças?

24. Seu filho(a) evitou sorrir ou rir quando estava perto de outras crianças?

Durante os últimos 3 meses, devido aos dentes, lábios, boca ou maxilares, com que frequência:

25. Seu filho(a) se preocupou que ele/ela não é tão saudável quanto outras pessoas?

26. Seu filho(a) se preocupou que ele/ela é diferente das outras pessoas?

27. Seu filho(a) se preocupou que ele/ela não é tão bonito(a) quanto outras pessoas?

28. Seu filho (a) agiu timidamente ou com vergonha?

29. Seu filho(a) foi provocado(a) ou apelidado(a) por outras crianças?

30. Seu filho(a) foi excluído(a) por outras crianças?

31. Seu filho(a) não quis ou não conseguiu passar um tempo com outras crianças?

32. Seu filho(a) não quis ou não conseguiu participar de atividades como esporte, grupos de atividades, teatro, música, viagens de escola?

33. Seu filho(a) se preocupou que ele/ela tem menos amigos?

Durante os últimos 3 meses, com que frequência:

34. Seu filho(a) se sentiu preocupado(a) com o que outras pessoas pensam sobre os dentes, lábios, boca ou maxilares?

35. Seu filho(a) foi questionado por outras crianças sobre os dentes, lábios, boca ou maxilares?

SEÇÃO 4 - As questões seguintes perguntam sobre efeitos que a condição bucal de seu filho(a) pode ter nos pais ou outros membros familiares

36. Você ou outro membro da família se sentiu perturbado?

37. Você ou outro membro da família teve o sono interrompido?

38. Você ou outro membro da família se sentiu culpado?

39. Você ou outro membro da família precisou de dispensa do trabalho (ex. dor, consultas, cirurgia)?

40. Você ou outro membro da família teve menos tempo para si mesmo ou para família?

41. Você ou outro membro da família se preocupou que seu filho(a) terá menos oportunidades na vida (ex. para namorar, casar, ter filhos, arrumar emprego)?

42. Você ou outro membro da família se sentiu desconfortável em lugares públicos (ex. lojas, restaurantes) com seu filho(a)?

Durante os últimos 3 meses, devido aos dentes, lábio, boca ou maxilares, com que frequência:

43. Seu filho(a) ficou com ciúmes de você ou de outros membros da família?

44. Seu filho(a) culpou você ou outra pessoa da família?

45. Seu filho(a) discutiu com você ou outros da família?

46. Seu filho(a) pediu mais sua atenção ou de outros da família?

Durante os últimos 3 meses, com que frequência a condição dos dentes, lábios, boca ou maxilares de seu filho(a):

47. Interferiu nas atividades da família em casa ou em outro lugar?

48. Causou discordância ou conflito na sua família?

49. Causou dificuldades financeiras para sua família?

SEÇÃO 5 - Gênero e idade da criança

Seu filho(a) é:

[ ] Menino

[ ] Menina

Seu filho(a) tem: Idade:

Questionário preenchido por:

[ ] Mãe

[ ] Pai

[ ] Outro

Data do preenchimento:

Para as questões de 3 a 49 as alternativas são:

[ ] Nunca

[ ] Uma ou duas vezes

[ ] Algumas vezes

[ ] Várias vezes

[ ] Todos os dias ou quase todos os dias

[ ] Não sei

Legenda: sintomas orais - questões 3 a 8; limitações funcionais - questões 9 a 16; bem-estar emocional - questões 17 a 24; bem-estar social - questões 25 a 35. As questões 36 a 49 pertencem à Escala de Impacto Familiar. A cada resposta nunca - 00 ponto; uma ou duas vezes - 01 ponto; algumas vezes - 02 pontos; várias vezes - 03 pontos; todos os dias ou quase todos os dias - 04 pontos; não sei - 05 pontos. O escore final é o somatório dos pontos obtidos em todos os domínios.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      30 Jun 2009
    • Aceito
      03 Mar 2010
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