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Preparação de argilas organofílicas e desenvolvimento de nanocompósitos de polietileno. Parte 2: comportamento de inflamabilidade

Preparation of organophilic clays and development of polyethylene nanocomposites. Part 2: flammability behavior

Resumos

Nanocompósitos de polietileno de alta densidade/argila bentonita foram preparados por meio da técnica de intercalação por fusão. Para a modificação da argila foram utilizados quatro tipos diferentes de sais quaternários de amônio visando a sintetizar argilas organofílicas. A argila não modificada e modificada com os quatro sais foi incorporada em teores de 1 e 3% a uma matriz de polietileno. A estabilidade térmica e a inflamabilidade dos sistemas foram determinadas por termogravimetria e segundo a norma UL-94 HB, respectivamente. A avaliação da dispersão e a distância entre planos (d001) das partículas de argila foram realizadas por difração de raios X (DRX) e microscopia eletrônica de transmissão (MET). A presença da argila organofílica na matriz polimérica aumentou a temperatura de degradação dos sistemas em relação ao polímero puro. Os sistemas apresentaram atraso da velocidade de queima, indicando uma melhoria no comportamento de inflamabilidade dos nanocompósitos.

Nanocompósitos; argila organofílica; morfologia; polietileno


High density polyethylene/Bentonite clay nanocomposites were prepared by the melt intercalation technique. The clay was organically modified with different quaternary ammonium salts to obtain the organoclay. The unmodified and modified clays with the quaternary ammonium salts were introduced in a polyethylene matrix with 1 and 3 wt. % of clay. The thermal stability and the flammability of the systems were investigated by thermogravimetry and UL-94HB standard, respectively. The dispersion analysis and the interlayer distance (d001) of the clay particles were obtained by X ray Diffraction (XRD) and transmission electron microscopy (TEM). The organoclay presence in the polymer matrix increased the degradation temperature in relation to the pure polymer. The systems showed a reduction on the burning rate, indicating that the flammability resistance of the nanocomposites was improved.

Nanocomposites; organoclay; morphology; polyethylene


ARTIGO TÉCNICO CIENTÍFICO

Preparação de argilas organofílicas e desenvolvimento de nanocompósitos de polietileno. Parte 2: comportamento de inflamabilidade

Preparation of organophilic clays and development of polyethylene nanocomposites. Part 2: flammability behavior

Renata BarbosaI; Edcleide M. AraújoII; Tomás J. A. de MeloII; Edson N. ItoIII

IEngenharia de Processos, UFCG

IIDepartamento de Engenharia de Materiais, UFCG

IIICiência e Engenharia de Materiais, UFSCar

Autor para correspondência Autor para correspondência: Edcleide M. Araújo Departamento de Engenharia de Materiais, UFCG Rua Aprígio Veloso 882, Bodocongó CEP: 58109-970, Campina Grande, PB, Brasil E-mail: edcleide@dema.ufcg.edu.br

RESUMO

Nanocompósitos de polietileno de alta densidade/argila bentonita foram preparados por meio da técnica de intercalação por fusão. Para a modificação da argila foram utilizados quatro tipos diferentes de sais quaternários de amônio visando a sintetizar argilas organofílicas. A argila não modificada e modificada com os quatro sais foi incorporada em teores de 1 e 3% a uma matriz de polietileno. A estabilidade térmica e a inflamabilidade dos sistemas foram determinadas por termogravimetria e segundo a norma UL-94 HB, respectivamente. A avaliação da dispersão e a distância entre planos (d001) das partículas de argila foram realizadas por difração de raios X (DRX) e microscopia eletrônica de transmissão (MET). A presença da argila organofílica na matriz polimérica aumentou a temperatura de degradação dos sistemas em relação ao polímero puro. Os sistemas apresentaram atraso da velocidade de queima, indicando uma melhoria no comportamento de inflamabilidade dos nanocompósitos.

Palavras-chave: Nanocompósitos, argila organofílica, morfologia, polietileno.

ABSTRACT

High density polyethylene/Bentonite clay nanocomposites were prepared by the melt intercalation technique. The clay was organically modified with different quaternary ammonium salts to obtain the organoclay. The unmodified and modified clays with the quaternary ammonium salts were introduced in a polyethylene matrix with 1 and 3 wt. % of clay. The thermal stability and the flammability of the systems were investigated by thermogravimetry and UL-94HB standard, respectively. The dispersion analysis and the interlayer distance (d001) of the clay particles were obtained by X ray Diffraction (XRD) and transmission electron microscopy (TEM). The organoclay presence in the polymer matrix increased the degradation temperature in relation to the pure polymer. The systems showed a reduction on the burning rate, indicating that the flammability resistance of the nanocomposites was improved.

Keywords: Nanocomposites, organoclay, morphology, polyethylene.

Introdução

Os nanocompósitos poliméricos compreendem uma classe de materiais formados por substâncias inorgânicas com dimensões nanométricas, tais como argila e outros minerais, que são finamente dispersos dentro de uma matriz polimérica[1]. Devido à grande necessidade de materiais com propriedades superiores e ao fato dos polímeros puros não apresentarem o comportamento ou as propriedades necessárias para determinadas funções, novos materiais começaram a ser estudados[2]. Recentemente, grande atenção vem sendo dada aos nanocompósitos poliméricos; especialmente aos nanocompósitos desenvolvidos com silicatos em camada, que representam uma alternativa aos compósitos desenvolvidos com cargas convencionais. A adição de níveis mínimos (<10%) de argilas organofílicas melhora as propriedades mecânicas, térmicas, de barreira e estabilidade dimensional dos nanocompósitos[3-5].

Para obter argilas compatíveis com as matrizes poliméricas, as mesmas devem ser modificadas para se tornarem organofílicas. Geralmente, isto pode ser feito através de reação de troca-iônica dos cátions trocáveis, presentes na superfície e no espaço interlamelar dos argilominerais, por cátions surfactantes do tipo alquilamônio primário, secundário, terciário ou quaternário[6,7]. Quando as argilas organofílicas são incorporadas ao polímero, o caráter de reforço que as partículas da argila exercem deve-se às restrições da mobilidade das cadeias poliméricas em contato com as partículas da argila. Dessa forma, a melhoria nas propriedades nos nanocompósitos tais como: resistência à tração, compressão, fratura e os aumentos do módulo de Young têm sido relacionados com a dispersão; o grau de delaminação; o fator de forma da argila; e as interações interfaciais polímero-argila[8]. As propriedades térmicas, óticas, de inflamabilidade e de resistência a solventes também são melhoradas pela incorporação da argila ao polímero. A maior estabilidade térmica está relacionada com a diminuição da difusão das moléculas de oxigênio para o interior do nanocompósito devido à barreira formada pelas partículas da argila. Assim, sem o oxigênio, principal fator na deterioração do polímero, o nanocompósito é mais resistente à degradação oxidativa[9].

Devido à falta de estudos envolvendo a produção de nanocompósitos de matrizes poliméricas com argilas bentoníticas, provenientes das jazidas brasileiras, surge a idéia de se estudar e produzir nanocompósitos com essas argilas. Bentonita é o nome genérico da argila composta predominantemente pelo argilomineral montmorilonita (55-70%), do grupo das esmectitas, independentemente de sua origem ou ocorrência. As esmectitas possuem como características principais o alto poder de inchamento, até 20 vezes seu volume inicial, atingindo espaços interplanares de até 100 Å, alta área de superfície (até 800 m2/g), capacidade de troca catiônica (CTC) na faixa de 60 a 170 meq.100 g-1 e tixotropia. Essas características conferem à bentonita propriedades bastante específicas, que têm justificado uma vasta gama de aplicações nos mais diversos segmentos[10].

O estado da Paraíba concentra a maior parte dessas argilas, com aproximadamente 62% das reservas nacionais, em segundo lugar o estado de São Paulo com 28% e os 10% restantes nos estados da Bahia, Minas Gerais e Paraná. Além da vantagem dessa abundância de argilas no Brasil, a transformação dessas em argilas organofílicas, por meio de tratamentos de superfície com sais quaternários de amônio, é um procedimento simples. Os diferentes tipos de sais quaternários escolhidos para a realização do tratamento das argilas nesse trabalho estão disponíveis comercialmente e não foram ainda objetos de estudo para esse fim[10].

Neste trabalho a bentonita organofílica foi preparada utilizando quatro tipos diferentes de sais quaternários de amônio, e em seguida foi utilizada como carga em uma matriz de polietileno de alta densidade. Os nanocompósitos obtidos foram caracterizados por TG, inflamabilidade, difração de raios X e microscopia eletrônica de transmissão.

Experimental

A matriz polimérica empregada neste estudo foi o polietileno de alta densidade (JV-060U), fornecido pela BRASKEM/BA que apresenta boa processabilidade, alta rigidez, estabilidade dimensional, resistência mecânica e boa resistência ao impacto a baixas temperaturas. Suas características estão apresentadas na Tabela 1.

A argila bentonita utilizada foi a BRASGEL PA (sódica ativada), de cor creme, passada em peneira ABNT nº 200 (d = 0,074 mm), fornecida pela Indústria Bentonit União Nordeste (BUN), localizada na cidade de Campina Grande – PB. A capacidade de troca de cátion (CTC) é de 90 meq.100 g-1 (método de adsorção de azul de metileno)[10-13]. Para tornar a argila compatível com o polímero, os íons sódio presentes entre as lamelas da argila foram trocados por íons de amônio para produzir a argila organofílica. Essa troca foi realizada na presença de quatro sais quaternários de amônio[13,14]: o Dodigen® (cloreto de alquila dimetil benzil amônio), o Praepagen® (cloreto de estearil dimetil amônio) e o Genamin® (cloreto de cetil trimetil amônio), fornecidos pela Clariant/PE e o Cetremide® (brometo de cetil trimetil amônio), produzido pela VETEC/SP. Para a obtenção das argilas organofílicas foram realizados tratamentos distintos de acordo com cada tipo de sal quaternário e com base na capacidade de troca de cátions (CTC) da argila, conforme já descrito em trabalhos anteriores[11-14].

Para a produção dos nanocompósitos de PEAD foram utilizadas composições de 1 e 3 % em peso de argila modificada com os sais quaternários de amônio, a fim de avaliar a eficiência da organofilização desses sais. A argila foi incorporada nas matrizes poliméricas em uma extrusora de rosca dupla contra–rotativa, acoplada a um Reômetro de Torque da Haake Blucher 90. As condições de processamento utilizadas na extrusora foram: 170-200 °C e 60 rpm. O material extrudado foi granulado e em seguida moldado por injeção a 200 °C com um tempo de resfriamento de 30 segundos, em Injetora, modelo Fluidmec, conforme já descrito[13,14]. Foram confeccionados corpos de prova de tração (ASTM D638), impacto ASTM D256) e inflamabilidade (UL94 HB).

Inicialmente, fixou-se o percentual em 3% em peso da argila modificada variando-se os tipos de sais de amônio. Foram analisados os resultados de termogravimetria, inflamabilidade, difração de raios X e microscopia eletrônica de transmissão. Em seguida, utilizou-se o percentual de 1% em peso de argila modificada com exceção do sal cetremide®, devido a alguns fatores de eliminação tais como: custo mais elevado em relação aos demais sais, toxicidade, pois a sua composição é à base de bromo e no geral as propriedades analisadas foram inferiores àquelas obtidas com os demais sistemas. A argila bentonita foi nomeada de MMT e a argila organofílica com os sais dodigen de D-OMMT, cetremide C-OMMT, genamin G-OMMT e praepagen P-OMMT. Os nanocompósitos foram nomeados como PE/C-OMMT, PE/D-OMMT, PE/G-OMMT e PE/P-OMMT.

Termogravimetria (TG)

As análises foram conduzidas em aparelho TGA 50 da Shimadzu empregando-se cerca de 5 mg de amostra e taxa de aquecimento 12,5 °C/min, de 20 a 900 °C, utilizando-se atmosferas de ar e de nitrogênio.

Teste de Inflamabilidade horizontal, UL 94 HB[15]

O ensaio é aplicado para materiais que continuam a queimar e propagam a chama, após a retirada da chama inicial. O material polimérico é classificado como 94 HB com uma velocidade de queima abaixo de um valor mínimo especificado. Um esquema simplificado do teste é mostrado na Figura 1.


Difração de raios X (DRX)

As análises de DRX foram conduzidas em aparelho XRD-6000 Shimadzu, utilizando-se radiação Ka do cobre, tensão de 40 kV, corrente de 30 mA, varredura em 2q de 2 a 30° e velocidade de varredura de 2°/min. A difração de raios X foi utilizada para determinar a ocorrência da intercalação/esfoliação das camadas da argila após incorporação ao polímero, visando-se identificar o tipo de nanocompósito formado.

Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET)

O microscópio eletrônico de transmissão utilizado foi o da marca PHILIPS CM 120 operando a uma voltagem de aceleração de 120 kV. As amostras foram retiradas do centro do corpo de prova de impacto e preparadas através da redução de área pelo procedimento do "trimming" (corte na forma trapezoidal) com uma área de aproximadamente 0,5mm2[14]. Os cortes das amostras foram realizados em um ultramicrótomo da marca RMC modelo MT-7000 usando-se uma faca de diamante da marca Diatome tipo Cryohisto 45°, em condições criogênicas.

Resultados e Discussão

Neste trabalho foram desenvolvidos nanocompósitos de polietileno de alta densidade/argila bentonita por meio da técnica de intercalação por fusão. Foram investigados os efeitos de diferentes tipos de sais quaternários de amônio para a organofilização da argila. Foram avaliados também os efeitos da incorporação da argila na matriz polimérica através das propriedades térmicas, morfológicas e de inflamabilidade, nas composições de 1 e 3% em peso de argila. Primeiramente, serão apresentados os sistemas de PE com 3% em peso de argila e, em seguida, os sistemas de PE com 1% em peso de argila. Pode ser observado que foram utilizados quatro sais quaternários para a organofilização da argila para os sistemas com 3% de argila. Para os sistemas com 1% de argila um dos sais, o Cetremide foi excluído devido a alguns fatores de eliminação tais como: custo mais elevado em relação aos demais sais, toxicidade, pois a sua composição é à base de bromo e, no geral, as propriedades analisadas foram inferiores e próximas àquelas obtidas com os outros sistemas.

Sistema PE com 3% de argila

Termogravimetria (TG)

As Figuras 2a e 2b apresentam as curvas de TG do PE puro e dos sistemas PE/MMT, PE/C-OMMT, PE/D-OMMT, PE/G-OMMT e PE/P-OMMT com 3% em peso de argila, em atmosferas de ar e nitrogênio.



Quando a TG foi conduzida em ambiente oxidativo, os sistemas contendo a argila modificada com os sais apresentam estabilidade térmica inferior ao sistema PE/MMT. As temperaturas de início de decomposição foram de aproximadamente 334, 286, 277, 257, e 254 °C para PE/MMT, PE/C-OMMT, PE/D-OMMT, PE/G-OMMT e PE/P-OMMT, respectivamente. Vale salientar que as temperaturas mencionadas estão bem acima da temperatura de processamento da matriz utilizada.

Em atmosfera inerte, o polietileno puro apresentou estabilidade térmica inferior aos demais sistemas. Observa-se que a estabilidade térmica é melhorada com a presença da argila organofílica e que aparentemente, os nanocompósitos com argilas modificadas com os sais dodigen (D-OMMT) e genamin (G-OMMT) são mais estáveis do que os outros sistemas. Os picos das curvas das derivadas (dTG) com relação à temperatura máxima de decomposição são de aproximadamente 520, 554, 527, 527 e 526 °C para PE/MMT, PE/G-OMMT, PE/C-OMMT, PE/D-OMMT e PE/P-OMMT respectivamente, quando comparado ao valor apresentado para a matriz de PE de 515 °C. Esse resultado pode ser atribuído ao efeito de barreira de proteção da argila no polímero, fazendo com que sua estabilidade térmica seja melhorada.

Zhao et al.[16], em estudos com nanocompósitos PE/argila, concluíram que a argila organofílica tem duas funções antagônicas na estabilidade térmica dos nanocompósitos polímero/argila: uma, é o efeito de barreira exercido pela argila, que pode melhorar a estabilidade térmica e a outra, é o efeito catalítico da argila que pode provocar a degradação da matriz polimérica, diminuindo a estabilidade térmica. No nosso estudo, aparentemente o primeiro efeito foi observado provavelmente devido à pequena fração de argila adicionada na matriz polimérica, pois para níveis elevados de argila o efeito catalítico é predominante e a estabilidade térmica do nanocompósito é diminuída.

Outros trabalhos existentes na literatura[17-19] não encontraram nenhuma diferença na estabilidade térmica dos nanocompósitos polímero/argila organofílica.

Teste de Inflamabilidade horizontal, UL 94 HB

As Figuras 3a e 3b mostram as fotos dos corpos de prova durante o ensaio para a matriz de polietileno e para o nanocompósito, respectivamente. As figuras representam o comportamento para todos os materiais estudados. Observa-se que para a matriz (Figura 3a) ocorre um gotejamento contínuo de material, maior emissão de fumaça e altura elevada da chama em comparação às dos nanocompósitos (Figura 3b). Esse comportamento pode ser confirmado por meio dos resultados de velocidade de queima (mm/min) para o PE, PE/MMT, PE/C-OMMT, PE/D-OMMT, PE/G-OMMT e PE/P-OMMT na Figura 4. Pode ser observado que para os nanocompósitos ocorreu atraso no processo de queima dos corpos de prova devido à diminuição dos valores da velocidade. Reduções de 17, 9, 7 e 4% dos nanocompósitos PE/P-OMMT, PE/G-OMMT, PE/C-OMMT e PE/D-OMMT, respectivamente, em relação à matriz de PE. Provavelmente, os diferentes sais promovem estruturas diferentes polímero-argila que afetam o comportamento de inflamabilidade. Esse efeito será estudado na análise da morfologia obtida por DR-X e MET.




A maior estabilidade térmica está relacionada com a diminuição da difusão das moléculas de oxigênio para o interior do nanocompósito devido à propriedade de barreira da argila. Assim, com a mais baixa concentração de oxigênio, principal fator na deterioração do polímero, o nanocompósito é mais resistente à decomposição, conforme também verificado por Ray e Okamoto[9]. A inflamabilidade também é melhorada devido à formação de uma camada termicamente isolante, gerada pelas nanopartículas da argila organofílica que protege a matriz polimérica. Além disso, o efeito de barreira aos produtos voláteis gerados durante a combustão do nanocompósito impede que estes produtos escapem e alimentem a chama, pois estes voláteis servem de combustíveis que mantêm a chama durante a combustão[9]. Dessa forma, a adição da argila organofílica ao PE provocou um atraso no processo de queima dos corpos de prova, como verificado.

Difração de raios X (DRX)

Para verificar se houve a formação de nanocompósitos PE/MMT, os sistemas com 3% em peso de argila foram analisados por DRX e por MET. A Figura 5 apresenta os difratogramas de PE/MMT e PE com argila modificada com os quatro sais. Observa-se que o sistema PE/MMT apresenta um pico correspondente à distância basal (d001= 13,3 Å) que é próximo da posição do pico obtido para a argila não modificada, d001= 12,5 Å[19], evidenciando um pequeno aumento da distância basal entre planos (d001), ou seja, pode ter ocorrido uma pequena intercalação das cadeias do PE entre as camadas da argila. Por outro lado, o sistema PE/C-OMMT apresentou um aumento da distância para 30 Å, correspondente à intercalação de um número maior das moléculas do polietileno nas camadas da argila modificada. Um segundo ombro correspondente à distância 15,6 Å pode indicar que uma pequena parte das camadas da argila organofílica não foi intercalada pelas moléculas do PE. Difratogramas semelhantes, com a presença de um ombro e de um pico correspondente à argila organofílica, foram obtidos por Zanetti e Costa[20] em seu estudo com o nanocompósito PE/EVA/argila organofílica. A presença do ombro foi atribuída, pelos autores, ao aumento da distância basal devido à intercalação do polímero; e o pico foi atribuído à manutenção da regularidade do espaçamento interlamelar de algumas camadas da argila organofílica. Assim, pode-se dizer que os resultados de DRX indicam que o sistema PE/C-OMMT apresenta uma morfologia de nanocompósito intercalado. O sistema PE/D-OMMT mostra que a distância basal permanece na mesma posição (2q) da argila organofílica (20,7 Å). Em princípio, não houve intercalação do polímero, mas a ocorrência de alargamento do pico indica que provavelmente tenha havido intercalação parcial. O sistema PE/G-OMMT apresenta um aumento da distância para 34,6 Å, correspondente à intercalação das moléculas do polietileno nas camadas da argila modificada. Um segundo ombro correspondente à distância 19,5 Å aparece. Isso pode indicar que uma pequena parte das camadas da argila organofílica não foi intercalada pelas moléculas do PE, conforme discutido para o sistema PE/C-OMMT. O sistema PE/P-OMMT apresenta um comportamento diferente dos demais: um aumento da distância para 36,1 Å, correspondente à intercalação das moléculas do polietileno entre as camadas da argila modificada. Aparece um segundo ombro correspondente à distância 19,4 Å, conforme mencionado e discutido para os sistemas PE/C-OMMT e PE/G-OMMT e, um terceiro ombro em 12,5 Å.


Microscopia eletrônica de transmissão (MET)

A Figura 6 apresenta as fotomicrografias dos sistemas apresentados anteriormente: a) PE/MMT; b) PE/C-OMMT; c) PE/D-OMMT; d) PE/G-OMMT; e e) PE/P-OMMT com 3% em peso de argila. As análises morfológicas de todos os sistemas confirmam o comportamento obtido por difração de raios X. Esses sistemas são constituídos de partículas com lamelas intercaladas distribuídas na matriz polimérica, com grandes aglomerados e bem espaçadas. Entretanto, o sistema PE/P-OMMT (Figura 6e) exibe uma morfologia intercalada, diferente daquela dos demais sistemas, com predominância de partículas de argila aparentemente menores e dispersas na matriz polimérica. Isso pode estar relacionado à estrutura do sal utilizado, o Praepagen, que apresenta comprimento de cadeia maior que os outros três sais e dois grupos alquila ligados ao nitrogênio. Provavelmente essa disposição das cadeias orgânicas no sal proporcionou uma maior interação do polímero com as lamelas de argila. A estrutura molecular desses sais pode ser mais bem visualizada em um trabalho recentemente divulgado[14].



Sistema PE com 1% de argila

Termogravimetria (TG)

As Figuras 7a e 7b apresentam as curvas de termogravimetria do PE puro e dos sistemas PE/MMT, PE/D-OMMT, PE/G-OMMT e PE/P-OMMT com 1% em peso de argila. Através deste estudo, foi possível investigar o comportamento térmico do material quando dois diferentes gases de purga são utilizados na realização das análises (atmosfera de ar e de nitrogênio). No caso da utilização de atmosfera de ar (ambiente oxidativo), os sistemas contendo a argila após modificação orgânica apresentaram estabilidade térmica um pouco mais baixa do que o PE puro e o sistema PE/MMT, em aproximadamente 430 °C. Neste caso, provavelmente, as camadas de argila organofílica não agiram como um isolante e barreira aos produtos voláteis. Avaliando-se o estudo em atmosfera inerte de N2, não se verificou diferença na estabilidade térmica dos sistemas contendo argila organofílica. O sistema PE/G-OMMT tem um pequeno aumento de estabilidade em relação aos demais. Esse mesmo comportamento também foi observado em trabalhos da literatura[16-18].


Teste de Inflamabilidade horizontal, UL 94 HB

A velocidade de queima do PE puro e dos sistemas com 1% em peso da argila montmorilonita e da argila modificada está representada na Figura 8. Todos os sistemas apresentaram resultados de velocidade de queima superiores aos da matriz polimérica. Isso pode ser atribuído ao baixo teor de argila organofílica, que não provocou nenhum atraso no processo de queima dos corpos de prova. Esses resultados estão de acordo com os apresentados por termogravimetria, onde os sistemas analisados em atmosfera dinâmica de ar, contendo argila modificada, mostraram estabilidade térmica um pouco mais baixa que a do PE puro.


Difração de raios X (DRX)

A Figura 9 apresenta os difratogramas dos sistemas PE/1% em peso de argila não modificada e modificada com os sais dodigen®, genamin® e praepagen®. Observa-se para o sistema PE/D-OMMT um ombro em torno de 4,7° (d001 = 18,8 Å), correspondente, à parte da argila que não foi intercalada pelas cadeias do polímero, ficando em uma posição entre o ângulo da argila não modificada MMT 7,0° (d001 = 12,5 Å) e da argila modificada D – OMMT 4,19° (d001 = 20,7 Å), conforme trabalho já publicado[19]. Isso indica que houve uma redução do espaçamento basal da argila organofílica, provavelmente, devido ao cisalhamento insuficiente, durante a preparação e processamento dos materiais, para promover a dispersão da argila[21]. A tensão de cisalhamento contribui efetivamente para a difusão das cadeias poliméricas para dentro das galerias da argila, uma vez que a tensão de cisalhamento pode quebrar os aglomerados das partículas ou tactóides, aumentando o grau de intercalação/esfoliação sob condições de mistura. Esses resultados serão posteriormente investigados por microscopia eletrônica de transmissão. Se os nanocompósitos fossem denominados de intercalados, seria possível verificar o pico de 2q referente às camadas da argila, mas ele seria deslocado para ângulos 2q menores, devido à intercalação do polímero entre as camadas da argila. Aumentos consideráveis foram encontrados nos trabalhos de Shi et al.[22] e Vaia et al.[23].


Resultados semelhantes foram encontrados para o sistema PE/G-OMMT. Foi observado um ombro em torno de 4,40° (d001 = 20,1 Å), correspondente à parte da argila que não foi intercalada pelas cadeias do polímero, ficando em uma posição entre o ângulo da argila não modificada MMT 7,0° (d001 = 12,5 Å) e da argila modificada G – OMMT 4,1° (d001 = 21,4 Å)[19]. Em resumo, para os sistemas modificados com o sal dodigen® e genamin® as observações foram semelhantes.

Por outro lado, o sistema PE/P-OMMT apresentou um aumento da distância para 40,1Å, correspondente à intercalação de um número bem maior de moléculas de polietileno nas camadas da argila modificada. Um segundo e pequeno ombro, correspondente à distância 20,1 Å, pode indicar que uma pequena parte das camadas da argila organofílica não foi intercalada pelas moléculas do PE. Como já comentado anteriormente, difratogramas semelhantes foram obtidos por Zanetti e Costa[20].

Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET)

A Figura 10 apresenta as fotomicrografias dos sistemas: a) PE/MMT; b) PE/D-OMMT; c) PE/G-OMMT; e d) PE/P-OMMT com 1% em peso de argila. As análises morfológicas para todos esses sistemas confirmam o comportamento apresentado por difração de raios X. Os sistemas PE/MMT, PE/D-OMMT e PE/G-OMMT (Figuras 10a, 10b e 10c) apresentaram comportamento semelhante. São constituídos de partículas com lamelas não intercaladas distribuídas na matriz polimérica, com grandes aglomerados, bem espaçados. Essa visualização é mais evidente para o sistema constituído de argila não modificada. Já o sistema PE/P-OMMT (Figura 10d), mostra uma morfologia intercalada, com predominância de partículas de argila dispersas na matriz polimérica.





Conclusões

Nanocompósitos de polietileno de alta densidade (PEAD)/argila bentonita foram preparados por meio da técnica de intercalação por fusão. Em geral, a estabilidade térmica dos sistemas foi melhorada com a presença da argila organofílica. Provavelmente, esta funcionou como barreira de proteção para a matriz polimérica. Os resultados de difração de raios X e microscopia eletrônica de transmissão indicaram que os sistemas PE/argila organofílica apresentaram estruturas de nanocompósitos intercalados. Talvez, a solução para a esfoliação dos nanocompósitos possa estar na utilização de equipamentos de mistura mais eficientes para que seja alcançada a dispersão/delaminação das camadas de silicatos. A velocidade de queima dos sistemas PE/3% em peso de argila, apresentou um atraso em relação ao PE puro, sendo que para o PE/P-OMMT esse atraso foi mais significativo. Os sistemas com 1% em peso de argila não apresentaram nenhum resultado significativo provavelmente devido ao teor de argila que não foi suficiente para torná-la como barreira aos produtos voláteis.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Braskem pelo fornecimento do PE, à Bentonit União Nordeste pelo fornecimento da argila, à Clariant pela doação dos sais, à RENAMI (Rede de Nanotecnologia Molecular e de Interfaces), ao CNPq e à Fapesq/MCT/CNPq pelo apoio financeiro.

Enviado: 29/05/06

Reenviado: 15/01/07

Aceito: 02/02/07

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  • Autor para correspondência:
    Edcleide M. Araújo
    Departamento de Engenharia de Materiais, UFCG
    Rua Aprígio Veloso 882, Bodocongó
    CEP: 58109-970, Campina Grande, PB, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Jun 2007

    Histórico

    • Aceito
      02 Fev 2007
    • Recebido
      29 Maio 2006
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