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Efeito do óleo de linhaça e do óleo de amendoim sobre a vulcanização da borracha natural (NR). parte II: modelo detalhado

Effect of linseed oil and peanut oil upon natural rubber (NR) vulcanization. part II: detailed model

Resumos

O efeito da substituição total ou parcial do ácido esteárico por óleos vegetais de linhaça e amendoim foi investigado em composições de borracha natural (NR). Um sistema de vulcanização convencional foi escolhido e os estudos cinéticos foram conduzidos nas temperaturas de 160 ºC, 170 ºC e 180 ºC. O modelo cinético detalhado permitiu estudar os diferentes estágios da vulcanização e verificar que na etapa de formação do precursor de ligações cruzadas (A → B) houve diferenças significativas entre o ácido esteárico e os óleos vegetais. Tal resultado foi devido à presença expressiva de ácidos graxos insaturados na composição química dos óleos de linhaça e de amendoim (principalmente, os ácidos oléico e linolênico), o que facilitou a ocorrência de reações laterais inesperadas e, consequentemente, diminuiu o rendimento final de ligações cruzadas nos vulcanizados.

Borracha natural; óleos vegetais; vulcanização


The effect of the total or partial replacement of stearic acid with vegetable oils of linseed and peanut has been investigated in natural rubber (NR) compositions. A conventional vulcanization system has been chosen and kinetic studies have been done in the temperatures of 160 ºC, 170 ºC and 180 ºC. The detailed kinetic model has allowed studying the different stages of vulcanization and verifying that in the formation of the crosslink precursor (A → B) there were significant differences between stearic acid and the vegetable oils. This result has been attributed to the high concentration of unsaturated fat acids in the chemical composition of the vegetable oils (mainly, oleic and linolenic acids), which allowed unexpected side reactions and, consequently, diminished the final yield of crosslinking in the vulcanizates.

Natural rubber; vegetable oils; vulcanization


Efeito do óleo de linhaça e do óleo de amendoim sobre a vulcanização da borracha natural (NR). parte II: modelo detalhado

Effect of linseed oil and peanut oil upon natural rubber (NR) vulcanization. part II: detailed model

Alexandre BezerraI; Alex. C. S. SantosI; Helson M. da CostaI; Valéria D. RamosII; Helson M. da CostaII

IDepartamento de Materiais (DEMAT), Instituto Politécnico (IPRJ), Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

IIUniversidade Estácio de Sá (UNESA)

Autor para correspondência Autor para correspondência: Helson M. da Costa Departamento de Materiais - DEMAT, Instituto Politécnico do Rio de Janeiro - IPRJ, Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ Rua Bonfim, 25, Vila Amélia CEP 28625-570, Nova Friburgo, RJ, Brasil e-mail: hmcosta@iprj.uerj.br

RESUMO

O efeito da substituição total ou parcial do ácido esteárico por óleos vegetais de linhaça e amendoim foi investigado em composições de borracha natural (NR). Um sistema de vulcanização convencional foi escolhido e os estudos cinéticos foram conduzidos nas temperaturas de 160 ºC, 170 ºC e 180 ºC. O modelo cinético detalhado permitiu estudar os diferentes estágios da vulcanização e verificar que na etapa de formação do precursor de ligações cruzadas (A → B) houve diferenças significativas entre o ácido esteárico e os óleos vegetais. Tal resultado foi devido à presença expressiva de ácidos graxos insaturados na composição química dos óleos de linhaça e de amendoim (principalmente, os ácidos oléico e linolênico), o que facilitou a ocorrência de reações laterais inesperadas e, consequentemente, diminuiu o rendimento final de ligações cruzadas nos vulcanizados.

Palavras-chave: Borracha natural, óleos vegetais, vulcanização.

ABSTRACT

The effect of the total or partial replacement of stearic acid with vegetable oils of linseed and peanut has been investigated in natural rubber (NR) compositions. A conventional vulcanization system has been chosen and kinetic studies have been done in the temperatures of 160 ºC, 170 ºC and 180 ºC. The detailed kinetic model has allowed studying the different stages of vulcanization and verifying that in the formation of the crosslink precursor (A → B) there were significant differences between stearic acid and the vegetable oils. This result has been attributed to the high concentration of unsaturated fat acids in the chemical composition of the vegetable oils (mainly, oleic and linolenic acids), which allowed unexpected side reactions and, consequently, diminished the final yield of crosslinking in the vulcanizates.

Keywords: Natural rubber, vegetable oils, vulcanization.

Introdução

A vulcanização é a tecnologia chave de uma vasta indústria que produz artefatos variados em borracha. O processo pode ser descrito como um conjunto de reações químicas complexas onde os reagentes da composição escolhida reagem entre si e, posteriormente, com as cadeias elastoméricas, para formar uma rede de ligações cruzadas tridimensional. Durante o processo, reações laterais como a dessulfurização e a degradação das ligações cruzadas, além de modificações na cadeia principal da borracha, também podem ocorrer simultaneamente. O resultado líquido de tais reações define a qualidade e o desempenho final dos artefatos de borracha[1].

Uma típica mistura para vulcanização inclui em partes por cem partes de borracha (phr): 100 phr de um elastômero (natural ou sintético); cargas (quantidade variável); enxofre (0,5-4 phr); óxido de zinco (2-4 phr); ácido esteárico (1-4 phr); aceleradores orgânicos (0,5-2 phr); e, pequenas quantidades de antioxidantes, inibidores de vulcanização e outros produtos químicos. A função de cada um desses reagentes é razoavelmente bem conhecida[2,3].

Na Parte I deste estudo[4], foi investigado o efeito da substituição do ácido esteárico por dois óleos vegetais, comestíveis e facilmente encontrados nos mercados locais, sobre a vulcanização da borracha natural (NR). Através dos dados reométricos e de um modelo cinético simplificado, foi possível verificar que os óleos foram capazes de vulcanizar as composições de NR, ainda que não o tenham feito na mesma extensão que o ácido esteárico - conforme verificado através da comparação dos valores de torque máximo (Mh).

Agora na Parte II, o efeito dos óleos vegetais é novamente investigado, porém utilizando-se um modelo mais detalhado para o estudo da vulcanização. O objetivo é verificar em que ponto particular do processo a ação dos óleos difere da ação do ácido esteárico - ácido graxo comumente encontrado nas composições vulcanizadas com enxofre.

Modelo cinético detalhado

A cinética de vulcanização de composições elastoméricas que apresentam tempos de pré-cura significativos como, por exemplo, aquelas que usam aceleradores do tipo sulfenamida, não pode ser tratada em termos de reações elementares do tipo A → B → C → D, etc[5-7].

Observações resultantes da análise química de vulcanizados de borracha natural curados com enxofre e dissulfeto de 2,2'-dibenzotiazol (MBTS), N-oxi-dietil-benzotiazol sulfenamida (NOBS), N-ciclohexil-2-benzotiazol sulfenamida (CBS) ou N,N'-diisopropil-2-benzotiazol sulfenamida (DPBS), mostram que a formação de ligações cruzadas parece ocorrer através de uma reação de primeira ordem, mas somente após o completo desaparecimento do acelerador e dos seus aparentes produtos imediatos de reação com o enxofre, os quais inibem a formação de ligações cruzadas. O período de indução (tempo de pré-cura) poderia, então, ser resultado do tempo requerido para o desaparecimento dessas espécies[5-7].

Assim sendo, a Equação 1 poderia ser montada para descrever o processo de vulcanização[5-7]:

onde A é o acelerador e/ou seus produtos de reação (com enxofre, Zn2+, etc.); B é o precursor de ligações cruzadas, provavelmente de natureza polimérica na forma de polissulfeto; B* é a forma ativa de B, provavelmente um radical livre na forma de radical tiil; Vu é a ligação cruzada formada; α e β são ajustes estequiométricos. A borracha não é usada no esquema pois é considerada como estando em excesso, com uma concentração que permanece essencialmente constante durante o processo[5-7].

O modelo explica os longos períodos de pré-cura associados ao uso de aceleradores como as sulfenamidas; se a reação através de k4 é muito mais rápida do que através de k3, muito pouca formação de ligações cruzadas pode ocorrer até que A seja essencialmente consumido. Tanto a reação através de k4 quanto a reação através de k3 são consideradas muito mais rápidas do que a reação através de k2. Portanto, a etapa limitante da taxa de vulcanização é a reação que ocorre através de k2, ou seja, que ocorre após A ser completamente consumido[5-7].

A constante de taxa k2 pode ser determinada a partir de dados do reômetro de disco oscilatório, assumindo que a formação de Vu é de primeira ordem em B. Também é considerado que o progresso de cura Mt (medido pelo reômetro), correspondente a certo período de vulcanização t, é proporcional à concentração de Vu. Na verdade, foi verificado que o aumento nas leituras de torque, registrado pelo reômetro (Mt), é proporcional à densidade de ligações cruzadas, determinada por medidas de inchamento. Contudo, a constante de proporcionalidade entre Mt e Vu muda com o tipo de composição estudada[7].

A Equação 2, proposta por Cotten[8], pode ser usada para o cálculo da constante de taxa k2:

onde ΔM representa o incremento máximo de torque observado no reômetro de torque após a cura completa (ΔMmáx = Mh - Ml) ou um tempo tMt = Mt - Ml). A constante de taxa k2pode ser estimada a partir da inclinação negativa da porção linear obtida pela Equação 2[6, 7].

Também é possível através do gráfico ln [1 - (ΔMt / ΔMmáx)] versus tempo estimar: (i) o tempo de indução( tind), o qual corresponde à interseção das duas regiões desse gráfico, conforme ilustra Sirqueira et al.[9]; e, (ii) o "tempo de exposição" (tdisplay), o qual é o tempo requerido para a reação de vulcanização tornar-se uma reação de primeira ordem verdadeira. O tdisplay é considerado como o tempo necessário para que exista o completo desaparecimento da espécie A[6, 7].

A constante de taxa k1pode ser calculada pela Equação 3[6, 7]:

Não é possível calcular as constantes k3e k4 separadamente; todavia, a razão k4 / αk3 pode ser determinada. Essa razão, a qual pode ser denominada de razão de extinção, é um indicativo da tendência do acelerador ou de um produto a partir deste, formado nos primeiros estágios da reação, de inibir a reticulação. Após hipóteses simplificadoras, a Equação 4 pode ser obtida[5-7]:

onde k4 / k'3é a razão de extinção expressa como uma razão adimensional de constantes de taxa; Ma é a massa molecular do acelerador; Caé a concentração do acelerador expresso em partes por 100 gramas de borracha; e, U é o número de mols de duplas ligações por 100 gramas de borracha. Em função das hipóteses adotadas para a geração da Equação 4, ΔMt deve ser tomado para valores de t inferiores ao tdisplay. A razão de extinção indica quão abrupto é o início da reação de primeira ordem após o tdisplay .

Uma vez que a elaboração desse modelo detalhado foi baseada em diversas reações, o tratamento acima pode ser usado no estudo específico dos estágios da vulcanização. Com base no modelo, os efeitos das condições de processamento e/ou variações na formulação podem ser observados com relação a cada constante de taxa.

Experimental

Todos os materiais foram usados como recebidos. Borracha natural foi fornecida pela Michelin Brasil. O antioxidante usado, Irganox 1010, e o óxido de zinco foram doados pela Uniroyal Química S.A. O acelerador N-t-butil-2-benzotiazol-sulfenamida (TBBS) foi doado pela Bann Química Ltda. Os outros reagentes da composição, ácido esteárico e enxofre, foram adquiridos junto à Vetec Química Fina Ltda.

Os óleos comestíveis de amendoim e de linhaça foram obtidos no comércio local e são manufaturados pela Indústria de Óleos Vegetais Pazze Ltda. As características físico-químicas dos óleos encontram-se na Tabela 1. A formulação utilizada no preparo das sete composições de borracha natural contendo diferentes razões de ácido esteárico / óleo de amendoim / óleo de linhaça está na Tabela 2.

As misturas foram conduzidas em linhas gerais de acordo com a norma ASTM D3182. Um misturador de rolos Berstoff, modelo 90-3Wo/1335/69, foi utilizado com uma razão de fricção de 1:1,25. Após a plastificação da borracha, óxido de zinco foi adicionado e, após a incorporação, os demais reagentes foram adicionados em conjunto. Para a obtenção das curvas de torque elástico (S') versus o tempo, as diferentes composições foram vulcanizadas no curômetro Rheoline Oscillating Disc Rheometer (Prescott Instruments Ltd.) com amplitude de oscilação de ±1º. Três temperaturas (160, 170 e 180 ºC) foram selecionadas para o cálculo dos parâmetros cinéticos. Em cada temperatura, duas amostras de cada mistura foram analisadas.

Resultados e Discussão

Formação do precursor de ligações cruzadas

A Figura 1 apresenta os resultados experimentais obtidos nas temperaturas de 160 ºC a 180 ºC para a etapa da vulcanização caracterizada pela constante de taxa k1. Pode-se observar que:


a. Os valores de k1 tornaram-se, aproximadamente, duas ou três vezes maiores para cada aumento de 10 ºC na temperatura de vulcanização. Isto ocorreu para todas as composições, embora o aumento tenha sido diferente de uma composição para outra. Tal fato é apresentado por Brady et al.[11] como uma regra genérica ("rule of thumb");

b. As composições de NR contendo óleo de linhaça sozinho (NR2) ou combinado em partes iguais com o óleo de amendoim (NR6) foram as que exibiram os maiores valores para a constante k1. Com o aumento da temperatura, as diferenças tornaram-se ainda mais acentuadas entre as composições de NR;

c. A composição NR1 contendo apenas o ácido esteárico sempre exibiu o menor valor da constante de taxa k1. Estes valores foram de 1,5 a 2 vezes menores do que os encontrados para a composição NR2.

De acordo com os trabalhos de Coran[5-7,12], a etapa de formação do precursor de ligações cruzadas pode ser representada pelo esquema reacional indicado na Figura 2. Um aumento no valor da constante k1 é obtido quando há um aumento na concentração de zinco solúvel em função da reação reversível ilustrada na Figura 3. A forma de complexo quelato entre zinco, fragmentos do acelerador combinados com enxofre e ácido esteárico é considerada mais reativa e, portanto, torna a etapa de formação do precursor B mais rápida.



Conforme discutido na Parte I[4] desta investigação, foi observado que durante a mistura física dos reagentes com a borracha natural (NR), o acelerador e o enxofre eram solubilizados facilmente nos óleos vegetais. Consequentemente, ao terem sido incorporados na matriz elastomérica, não apenas a dispersão foi facilitada, mas também a possível interação com o óxido de zinco tornou-se mais rápida. Como o ácido esteárico foi adicionado à NR no estado sólido e funde-se em torno de 70 ºC, pode-se supor que exista um natural atraso do processo representado pela constante de taxa k1.

Desta forma, os dados da Figura 1 permitem concluir que na presença dos óleos vegetais a transformação do zinco, inicialmente na forma de ZnO, em Zn2+ e a posterior formação do complexo da Figura 3 foi beneficiada. A hipótese é corroborada quando se analisa a Figura 4, na qual os valores de energia de ativação (Ea), para a etapa representada por k1, das diferentes composições são apresentados.


Para a composição NR1 (ácido esteárico), o valor médio de Ea situou-se em torno de 112,1 kJ/mol. Em contrapartida, nas composições NR2 (óleo de linhaça) e NR3 (óleo de amendoim) registraram-se valores médios de 104,6 kJ/mol e 99,5 kJ/mol, respectivamente. As demais composições (NR4 a NR7), nas quais pelo menos um tipo de óleo está presente, mostraram sempre valores médios inferiores ao da NR1.

A superfície de resposta, também ilustrada na Figura 4, foi gerada por regressão numérica dos valores experimentais conforme descrito por da Costa et al.[13]. Próximo ao vértice do ácido esteárico, uma estreita região escura foi obtida e nela os valores de Ea apresentaram-se acima de 110 kJ/mol. Por outro lado, em uma extensa região pontilhada na parte central do triângulo, a qual representa composições nas quais os óleos substituem o ácido esteárico em 50% ou mais, os valores de Ea exibidos foram de 7% a 9% menores (entre 100-102 kJ/mol).

Porém, na Parte I[4], através da análise dos valores de torque máximo (Mh), verificou-se que as composições NR2, NR3 e NR6 não apresentavam uma reticulação tão efetiva quanto à composição padrão NR1. Em contrapartida, nas composições NR4 (óleo de linhaça / ácido esteárico, 50%-50%), NR5 (óleo de amendoim / ácido esteárico, 50%-50%) e NR7 (óleo de linhaça / óleo de amendoim / ácido esteárico, 33,3%-33,3%-33,3%) era possível encontrar um desempenho próximo ao da composição NR1.

Desta forma, a presença individual dos óleos ou a simples combinação destes, permitiu a espécie B fosse formada mais rapidamente e com menor energia de ativação, porém não implicou em uma rede de ligações cruzadas final de igual magnitude àquela da composição onde apenas o ácido esteárico estava presente. A hipótese para este comportamento singular residiu na estabilidade do complexo formado, conforme discutido na Parte I[4].

A presença de ácidos graxos insaturados em maior proporção nos óleos, em particular no óleo de linhaça, comprometeu a estabilidade do complexo de zinco ilustrado na Figura 3. Logo, a espécie A foi gerada nas composições NR2, NR3 e NR6, contudo, dada a instabilidade da mesma, não gerou em concentração expressiva o precursor de ligação cruzada B.

Nas demais composições (NR4, NR5 e NR7), a presença de ácido esteárico minimizou o efeito adverso e permitiu a geração da espécie B em quantidades mais significativas.

Formação da espécie ativa B*

A Figura 5 apresenta os resultados experimentais obtidos nas temperaturas de 160ºC a 180ºC para a etapa da vulcanização caracterizada pela constante de taxa k2. Pode-se observar que:


a. Os valores de k2 em todas as composições tornaram-se, aproximadamente, duas ou três vezes maiores para cada aumento de 10 ºC na temperatura de vulcanização. Tal comportamento já era esperado, conforme o exposto por Brady et al.[11];

b. A exemplo do que ocorreu na etapa caracterizada pela constante k1, as composições de NR contendo óleo de linhaça sozinho (NR2) ou combinado em partes iguais com o óleo de amendoim (NR6) foram as que exibiram os maiores valores para a constante k2. Com o aumento da temperatura, as diferenças nos valores de k2 tornaram-se mais acentuadas entre as composições; e

c. A composição NR1 contendo apenas o ácido esteárico apresentou o menor valor da constante de taxa k2 em todos os casos. Estes valores foram, aproximadamente, de 1,5 a 2 vezes menores do que os encontrados para a composição NR2.

A formação da espécie ativa B*, cuja geração é governada pela taxa de reação k2, é apresentada na Figura 6, conforme descrito nos trabalhos de Coran[5-7,12]. A espécie B* depende fundamentalmente da formação da espécie B e, pelo comentado na Parte I[4] desta investigação, vulcanizados de NR foram obtidos em todas as composições. Assim, é possível admitir que a vulcanização na presença dos óleos vegetais (linhaça e amendoim), sozinhos ou não, promoveu a formação da espécie B* através de mecanismo similar ao seguido por vulcanizados com ácido esteárico (NR1).


A Figura 7 auxilia na validação da hipótese acima. Com exceção da composição NR4, a formação da espécie B* a partir de B necessitou de um conteúdo energético similar. Os valores de energia de ativação (Ea) das diferentes composições de NR ficaram em torno de 100 a 110 kJ/mol. De acordo com o gráfico da superfície de resposta, foi também observado que Ea só atingiu valores inferiores a 100 kJ/mol quando, dentro do triângulo, as composições do tipo NR4 (óleo de linhaça/ácido esteárico combinados, porém ricas em óleo de linhaça 50% ou mais) foram alcançadas.


A razão de extinção k 4 /k' 3

A Figura 8 apresenta o gráfico relativo aos valores da razão k4/k'3 para as diferentes composições de NR obtidos nas temperaturas de 160 ºC a 180 ºC. Pode ser observado que:


Seguindo a tendência já comentada para as outras constantes de taxa, houve um aumento nos valores de k4/k'3 conforme a temperatura de vulcanização foi aumentada;

As diferenças nas razões k4/k'3 tornaram-se mais significativas em 180ºC. Vulcanizados NR2 (óleo de linhaça) e NR4 (óleo de linhaça / ácido esteárico) exibiram os maiores valores de razão de extinção.

Vulcanizados que exibem grandes valores de k4/k'3 apresentam períodos de pré-cura mais longos em função da habilidade do acelerador e/ou das espécies iniciais da reação com enxofre (A' e/ou A" na Figura 2) de eliminarem a forma ativa B*, o que impede que a reticulação tenha início[6], Figura 9.


Todavia, quando os dados de tempo de pré-cura (ts1) da Parte I desta investigação[4] foram novamente analisados, foi observado que a citação de Coran[6] não foi validada para os vulcanizados NR2. Mais uma vez, os dados experimentais induziram a considerar a etapa de formação do precursor B como a etapa crítica do processo de substituição do ácido esteárico pelos óleos vegetais.

O óleo de amendoim e, sobretudo, o de linhaça são ricos em ácidos graxos insaturados. A dupla ligação presente na cadeia desses ácidos graxos pode ser oxidada, o que resulta em produtos cuja natureza depende do agente oxidante e das condições de reação.

Na Figura 10 as estruturas químicas das moléculas do ácido esteárico (ácido octadecanóico), do ácido oléico (ácido cis-9-octadecenóico), principal ácido graxo do óleo de amendoim; e, do ácido linolênico (ácido cis,cis,cis-9,12,15-octadecatrienóico), principal ácido graxo do óleo de linhaça, são apresentadas. Há também ao lado de cada estrutura espacial, na forma de uma superfície, a densidade de carga eletrônica da molécula. Regiões de carga negativa relativamente maior estão em vermelho; regiões mais positivas estão em azul; e, regiões de relativamente baixa densidade eletrônica estão em cinza.


Uma reação característica dos compostos com uma ligação dupla carbono-carbono é a adição. Os elétrons da ligação π estão expostos e, assim, a ligação π é particularmente suscetível aos reagentes que procuram elétrons (reagentes eletrofílicos)[14]. Observa-se na Figura 10 que, diferentemente do ácido esteárico, a presença de ligações duplas nos ácidos graxos oléico e linolênico cria novas regiões de concentração de carga negativa (regiões em vermelho indicadas pelas setas), as quais tornam-se propícias para reações laterais.

Consequentemente, caso o complexo de zinco, citado no modelo cinético (Figura 3) tenha sido formado, este pode ter assumido estruturas diversas e, desta forma, não apenas a geração da espécie B foi comprometida, mas também o número de reações laterais, não necessariamente previstas pela razão k4/k'3, foi aumentado.

Conclusões

Através do modelo proposto por Coran[5-7], a cinética de vulcanização de composições de borracha natural (NR) contendo óleos vegetais de linhaça e de amendoim foi investigada.

A análise dos diferentes estágios da cura permitiu concluir que a utilização dos óleos vegetais como ativadores do sistema de cura conduziu a vulcanização nos mesmos moldes da vulcanização convencional com ácido esteárico. No entanto, a etapa crítica do processo de substituição do ácido esteárico pelos óleos vegetais foi a formação da espécie A do modelo cinético desenvolvido por Coran[5-7].

Os óleos apresentam conteúdos expressivos em sua composição química de ácidos graxos insaturados - ácidos oléico e linolênico, principalmente - o que propiciou centros ativos para reações laterais não previstas e instabilidade no complexo de zinco (Figura 3).

Consequentemente, a redução da energia de ativação (Ea) e o aumento da constante de taxa k1, verificado nos vulcanizados com óleos vegetais, não refletiram em um rendimento final expressivo na densidade de ligações cruzadas. Em média, os valores de torque máximo (Mh) para as composições NR2 e NR3 foram de 5 a 8 dN.m inferiores ao da composição NR1, conforme discutido na Parte I deste estudo[4].

Agradecimentos

Os autores agradecem aos órgãos de fomento (CAPES, CNPq e FAPERJ) pelo suporte finaceiro e ao Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano (IMA/UFRJ) pelo apoio no desenvolvimento experimental desta investigação.

Enviado: 11/11/2011

Reenviado: 19/01/2012

Aceito: 08/05/2012

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  • Autor para correspondência:

    Helson M. da Costa
    Departamento de Materiais - DEMAT, Instituto Politécnico do Rio de Janeiro - IPRJ, Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ
    Rua Bonfim, 25, Vila Amélia
    CEP 28625-570, Nova Friburgo, RJ, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      11 Nov 2011
    • Aceito
      08 Maio 2012
    • Revisado
      19 Jan 2012
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