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O “Programa Mulheres Mil” no Espírito Santo: uma política pública educacional de equidade de gênero?* * Esse artigo faz parte dos resultados de um projeto de pesquisa financiado pela chamada MCT-CNPq/MDS-SAGI nº 24/2013 e também contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

The “Thousand Strong Women Program” in Espírito Santo, Brazil: an educational public policy for gender equality?

El “Programa Mujeres Mil” en el Espírito Santo: una política pública educativa de la equidad de género?

Resumo

Evidências empíricas revelam um aumento significativo do trabalho feminino, que alcança mais de 40% da população ocupada no Brasil; embora ainda seja marcado pela informalidade, pela divisão sexual do trabalho e pelos rendimentos em média menores que os dos homens. Portanto, o objetivo geral deste artigo é verificar se as técnicas utilizadas na implementação do Programa Mulheres Mil são capazes de fomentar a equidade de gênero por meio da inclusão educacional e produtiva e como se dá esse processo. O método de pesquisa proposto foi o estudo de caso, com abordagem qualitativa. Os resultados demonstram que o programa não atingiu seu objetivo de incluir produtivamente essas mulheres, pois a maioria delas ainda está desempregada. Notou-se também que, ao utilizar a metodologia de avaliação e reconhecimento de aprendizagem prévia, o programa tende a reforçar as normas de gênero já existentes. Recomenda-se a reestruturação do programa, considerando a adequação da sua metodologia aos projetos de vida das mulheres, bem como à realidade do mercado de trabalho local.

Políticas públicas; Gênero; Mulheres; Equidade

Abstract

Empirical evidence shows a significant increase in women’s labor, which reaches more than 40% of the employed population in Brazil, although it is still marked by informality, sexual division of labor, and lower average income than men. Therefore, the main aim of this article is checking whether the techniques used to implement the “Thousand Strong Women Program” (PMM) are capable of promoting gender equity through educational and productive inclusion and how this process takes place. The research method proposed has been the case study with a qualitative approach. The results show that the program did not achieve its goal of including these women on a productive basis, because most of them are still unemployed. It was also noticed that, by using the methodology of prior learning assessment and recognition, the program tends to reinforce the existing gender norms. It is recommended to restructure the program, considering the adequacy of its methodology to women’s life projects, as well as the reality of the local labor market.

Public policies; Gender; Women; Equity

Resumen

La evidencia empírica revela un aumento significativo de la mano de obra femenina, que alcanza más del 40% de la población ocupada en Brasil, aunque todavía está marcado por la informalidad, la división sexual del trabajo y los ingresos, en promedio, menos que los hombres. Por lo tanto, el objetivo de este artículo es verificar si las técnicas utilizadas en la ejecución del “Programa de Mujeres Mil” (PMM) son capaces de promover la equidad de género a través de la inclusión educativa y productiva y cómo este proceso se lleva a cabo. El método de investigación propuesto fue el estudio de caso con un enfoque cualitativo. Los resultados muestran que el programa no logró su objetivo de incluir productivamente estas mujeres, porque la mayoría de ellas todavía están desempleadas. También se observa que cuando se utiliza la metodología de evaluación y el reconocimiento del aprendizaje previo, el programa tiende a reforzar las normas de género existentes. Se recomienda la reestructuración del programa, considerando la adecuación de su metodología a los proyectos de vida de las mujeres, así como a la realidad del mercado de trabajo local.

Políticas públicas; Género; Las mujeres; Equidad

1 Introdução

A primeira onda do feminismo no Brasil, assim como na Europa, se caracterizou por meio da luta pelo voto, direito adquirido pelas mulheres na promulgação do novo código eleitoral brasileiro, em 1932. Contudo, é na década de 1960 que o movimento feminista surgiu como maior força, questões sobre as relações de poder entre homens e mulheres ocuparam, pela primeira vez, a agenda do movimento. Na década de 1970, no regime militar, aconteceram as primeiras manifestações feministas no Brasil (PINTO, 2010PINTO, C. R. J. Feminismo, história e poder. Revista Sociologia e Política, v. 18, n. 36, 2010, p. 15–23. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782010000200003
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).

Em 1975, as Nações Unidas inauguravam a década da mulher, viabilizando a repercussão de uma temática de gênero em nível internacional. Como pontos básicos estavam a denúncia da discriminação das mulheres e a luta pela igualdade de direito. Assim, o movimento de mulheres no Brasil, na década de 1970, tinha uma dupla identidade: de um lado fazia parte do movimento contra a ditadura, reconhecia-se a condição da mulher, enquanto problema social. O movimento das mulheres se dispunha a aprofundar questões culturais e a formar um campo político específico, assim como contestava as estruturas econômicas de dominação. Sua diversidade expressava-se pelas inúmeras formas de organização e reivindicações e, também, pela ausência de estruturas hierárquicas (BARSTED, 1994BARSTED, L. A. L. Em busca do tempo perdido: mulher e políticas públicas no Brasil 1983-1993. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, n. 2, 1994.).

Conforme a referida autora, no início da década de 1980, o movimento feminista foi elemento ativo da grande frente contra a ditadura e a favor do restabelecimento democrático. Esse movimento se mostrava muito organizado por todo o país através de impressa alternativa, centro de estudos e pesquisas, organizações não governamentais e grupos autônomos. Foi nessa época que o movimento ganhou o reforço das classes populares, diferentemente da década de 1960 (liderado pela classe média intelectualizada), desenvolvendo uma interface que gerou novas percepções, discussões e ações em ambos os lados (PINTO, 2010PINTO, C. R. J. Feminismo, história e poder. Revista Sociologia e Política, v. 18, n. 36, 2010, p. 15–23. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782010000200003
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).

Sob o impacto desses movimentos, foram implantadas as primeiras políticas públicas com recorte de gênero. Assim, em 1983, foram criados os conselhos estaduais da condição feminina nos Estados de São Paulo e Minas Gerais, totalizando 11 conselhos estaduais e cerca de 40 conselhos municipais (FARAH, 2004FARAH, M. F. S. Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 12, n. 1, abr. 2004. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2004000100004
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). Em 1984 foi criado o Conselho Nacional da Condição da Mulher (CNDM), e a Constituição Federal de 1988 também reflete a mobilização de mulheres nessa década (PINTO, 2010PINTO, C. R. J. Feminismo, história e poder. Revista Sociologia e Política, v. 18, n. 36, 2010, p. 15–23. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782010000200003
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).

Na década de 2000, fortaleceu-se a tendência de formulação de propostas de políticas públicas, priorizando a luta pela superação da desigualdade entre mulheres e homens na sociedade brasileira. Com base na plataforma de ação desenvolvida na Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Beijing, em 1995, e na trajetória do movimento das mulheres no Brasil, formulou-se uma agenda relacionada à questão de gênero: violência, saúde, meninas e adolescentes, geração de emprego e renda, educação, trabalho, infraestrutura urbana e social, questão agrária, incorporação da perspectiva de gênero por toda política pública (transversalidade), acesso ao poder político e empoderamento (FARAH, 2004FARAH, M. F. S. Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 12, n. 1, abr. 2004. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2004000100004
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). É nessa época que o movimento se profissionalizou, através da criação de organizações não governamentais (ONGs), que focaram seus esforços na intervenção junto ao Estado, na busca pela aprovação de medidas protetoras e por espaços para a maior participação política de mulheres (PINTO, 2010PINTO, C. R. J. Feminismo, história e poder. Revista Sociologia e Política, v. 18, n. 36, 2010, p. 15–23. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782010000200003
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).

Matos (2010)MATOS, M. Movimento e teoria feminista: é possível reconstruir a teoria feminista a partir do Sul Global? Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 18, n. 36, jun. 2010. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782010000200006
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caracteriza o momento, a partir da década de 2000, pelo “feminino difuso” e pela forte dissociação entre o pensamento feminista e o movimento. Essa fase pode ser definida como um processo de democratização de gênero no âmbito das instituições e da (re) formulação de políticas públicas, assim como do ressurgimento da agenda clássica do feminismo na busca por direitos. Tais ações são influenciadas pelo movimento contemporâneo de transnacionalização do feminismo, pela globalização das agendas locais das mulheres e pela intensificação das estratégicas feministas horizontais.

Observa-se também que, entre 2004 e 2013, houve tentativas de mudanças no enfrentamento das desigualdades vivenciadas pelas mulheres, em termo de políticas e do orçamento público, principalmente em decorrência dos Planos Nacionais de Políticas Para as Mulheres (PNPM) (BRASIL, 2004BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. IPlano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2004., 2008BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. IIPlano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2008., 2013BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. III Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2013.). Porém, para a Articulação de Mulheres Brasileiras (2011)ARTICULAÇÃO DE MULHERES BRASILEIRAS. Políticas públicas para igualdade: balanço de 2003 a 2010 e desafios do presente. Brasília, DF: Centro Feminista de Estudos e Assessoria, 2011., o desenvolvimento do primeiro, assim como o segundo plano, aconteceu numa arena política tensa e complexa; e, no seu conjunto, apesar dos avanços, não foram concebidos a partir das perspectivas de enfrentamento das desigualdades vivenciadas pelas mulheres. Por sua vez, as políticas sociais relacionadas à qualificação social e profissional, apesar das decisões e compromissos assumidos no II PNPM, não conseguiram engendrar mudanças em termos de ampliação do acesso das mulheres ao mercado de trabalho.

Dentre essas políticas relacionadas à inclusão social e profissional feminina, insere-se o Programa Mulheres Mil (PMM), que é reconhecido como Política Pública afirmativa, de inclusão social e equidade, instituído pela Portaria n° 1.015, de 21 de julho de 2011, integrando o Plano Brasil Sem Miséria (BRASIL, 2011). O programa foi decorrente da cooperação internacional Brasil-Canadá – Promoção de Intercâmbio de Conhecimento para a Promoção da Equidade (PIPE) – sendo concebido e estruturado a partir dos conhecimentos desenvolvidos pelos Community Colleges Canadenses e em suas experiências de promoção da equidade, de atendimento às populações desfavorecidas e do desenvolvimento e aplicação do sistema de avaliação e reconhecimento de aprendizagem prévia, que conjuga várias ferramentas, como: o questionário socioeconômico, mapa da vida e o portfólio.

Nesse sentido, pressupõe-se que sua implementação esteja relacionada com a perspectiva “top down”, pois ela coincide com os objetivos incorporados nas decisões centrais. Os pesquisadores dessa abordagem veem os formuladores da política como atores principais e concentram suas atenções sobre os fatores que podem ser manipulados no nível central (MATLAND, 1995MATLAND, R. E. Synthesizing the implementation literature: The ambiguity-conflict model of policy implementation. Journal of Public AdministrationResearch and Theory, v. 5, n. 2. p. 145–174, Apr. 1995. doi: https://doi.org/10.1093/oxfordjournals.jpart.a037242
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).

Logo, Carpenedo (2011)CARPENEDO, M. Quando a resistência se torna política publica. Analisando a produção de subjetividade(s) nas políticas públicas de equidade de gênero no campo do trabalho. 2011. 150 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011. analisou a produção de subjetividades nas políticas públicas de equidade de gênero no campo do trabalho, concluindo que elas propõem a diminuição das desigualdades de gênero no mundo laboral, ao mesmo tempo em que traem seus preceitos de equidade, ao produzirem novas hierarquias entre os sujeitos ou, ainda, ao reproduzirem as já conhecidas hierarquias entre homens e mulheres, muitas vezes por meio do reforço do papel cuidador e reprodutor da mulher. Ou seja, há uma naturalização desses papéis e, até mesmo, incentivo à criação de associações e cooperativas, que se colocam mais como uma alternativa ante a vulnerabilidade e à miséria do que como uma forma de inclusão decente das mulheres no setor produtivo.

Por conseguinte, muitas das políticas públicas continuam a ver as mulheres como promotoras do bem-estar social, correndo-se o risco de as políticas públicas educacionais de gênero também continuarem sendo orientadas, na sua maioria, às mulheres de baixa renda da área urbana e rural, com o objetivo de que elas possam aperfeiçoar suas habilidades na costura, na nutrição, na saúde, no planejamento familiar, no secretariado e no artesanato, para que seus filhos possam ter melhores oportunidades de vida (STROMQUIST, 1996STROMQUIST, N. P. Políticas públicas de Estado e equidade de gênero: perspectivas comparativas. Revista Brasileira de Educação, n. 1, p. 27–49, jan./abr. 1996.).

Esses enfoques de gênero muitas vezes incidem na promoção do bem-estar social para a maioria das mulheres carentes envolvidas no programa, mas não oportunizam autonomia, nem a essas nem às mulheres como um grupo (STROMQUIST, 1996STROMQUIST, N. P. Políticas públicas de Estado e equidade de gênero: perspectivas comparativas. Revista Brasileira de Educação, n. 1, p. 27–49, jan./abr. 1996.), como demonstram as pesquisas realizadas com foco no Programa Mulheres Mil, em diversas cidades brasileiras. Como pontuam Braga (2011)BRAGA, A. C. F. Projeto Mulheres Mil e gênero: comercialização das pequenas produções das mulheres no setor Santa Bárbara em Palmas – TO. 2011. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação Agrícola) – Programa de Pós-Graduação em Educação Agrícola, Instituto de Agronomia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011., Lagos (2014)LAGOS, M. B. “Palmas para Mulheres Mil” em comunidades quilombolas: a participação do IFPR, campus Palmas no Programa Nacional de Inclusão Social. 2014. 140 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Pato Branco, 2014., Araújo (2015)ARAÚJO, S. M. P. Mulheres em situação de fragilidade social e o Programa Mulheres Mil: o papel das políticas na perspectiva de emancipação para o trabalho. 2015. 152 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação) – Programa de Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação, Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2015., Bravin (2015)BRAVIN, S. M. R. A contribuição do Programa Mulheres Mil para a formação de capital social. 2015. 189 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade do Contestado, Canoinhas, 2015., Gois (2016)GOIS, É. L. P. Programa Mulheres Mil: interfaces de gênero na capacitação de mulheres para o mercado de trabalho em Palmas. 2016. 145 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade Federal de Tocantins, Tocantins, 2016. e Ferreira (2016)FERREIRA, S. M. “Mulheres Mil” como política pública de inclusão social: uma análise do empoderamento feminino. 2016. 119 f. Dissertação (Mestrado profissional em Políticas Públicas) – Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2016., o Programa Mulheres Mil proporcionou aumento da autoestima, considerável processo de mudança interpessoal e intrapessoal, visibilidade social na área educacional e maior participação das egressas na comunidade local; mas, não foi capaz de alterar o cenário de vulnerabilidade social em que se encontravam as mulheres participantes da política; ou seja, ele não contribuiu de maneira significativa para a elevação da escolaridade e para a entrada e/ou retorno dessas mulheres ao mercado de trabalho ( OLIVEIRA, 2013OLIVEIRA, M. A. S. M. Programa Mulheres Mil no Instituto Federal de Sergipe: interfaces com a educação e o trabalho. 2013. 157 f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) – Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, Universidade Federal de Sergipe, Sergipe, 2013.; RIBEIRO, 2013RIBEIRO, L. É. G. A qualificação profissional e cidadã: um estudo do Programa Mulheres Mil, a partir da experiência do Instituto Federal de Goiás, campus de Luziânia. 2013. 155 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013.; LAGOS, 2014LAGOS, M. B. “Palmas para Mulheres Mil” em comunidades quilombolas: a participação do IFPR, campus Palmas no Programa Nacional de Inclusão Social. 2014. 140 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Pato Branco, 2014.; ARAÚJO, 2015ARAÚJO, S. M. P. Mulheres em situação de fragilidade social e o Programa Mulheres Mil: o papel das políticas na perspectiva de emancipação para o trabalho. 2015. 152 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação) – Programa de Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologias Aplicadas à Educação, Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2015.; BRAVIN, 2015BRAVIN, S. M. R. A contribuição do Programa Mulheres Mil para a formação de capital social. 2015. 189 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade do Contestado, Canoinhas, 2015.; SILVA, T. M., 2015; NASCIMENTO, 2015NASCIMENTO, S. D. Geração de renda para as mulheres: uma avaliação de impactos do programa mulheres mil na ótica das egressas em São Luís MA. 2015. 130 f. Dissertação (Mestrado em Políticas Públicas) – Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2015.; PEREIRA, 2015PEREIRA, J. S. A. Programa Mulheres Mil: uma análise no campo das políticas de inclusão do IFSC. 2015. 171 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2015.; SILVA, C. R. C., 2015; TELES, 2015TELES, F. B. M. Programa Mulheres Mil: um olhar sobre a inserção das egressas no mundo do trabalho. 2015. 142 f. Dissertação (Mestrado em Educação Profissional) – Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional, Universidade de Brasília, Brasília, 2015.; GOIS, 2016GOIS, É. L. P. Programa Mulheres Mil: interfaces de gênero na capacitação de mulheres para o mercado de trabalho em Palmas. 2016. 145 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade Federal de Tocantins, Tocantins, 2016.; FERREIRA, 2016FERREIRA, S. M. “Mulheres Mil” como política pública de inclusão social: uma análise do empoderamento feminino. 2016. 119 f. Dissertação (Mestrado profissional em Políticas Públicas) – Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2016.).

Nesse contexto, como também destaca Carpenedo (2011)CARPENEDO, M. Quando a resistência se torna política publica. Analisando a produção de subjetividade(s) nas políticas públicas de equidade de gênero no campo do trabalho. 2011. 150 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011., as políticas públicas de equidade de gênero promovem a entrada das mulheres em mercados marginalizados, marcados pela informalidade e ausentes de vínculos e de cobertura dos sistemas de seguridade social; perpetuando, assim, o lugar complementar e secundário do trabalho feminino no Brasil. Dessa forma, sabendo-se que a implementação de uma política pública se dá por meio das escolhas de instrumentos, técnicas e ferramentas (LASCOUMES; LE GALÈS, 2007LASCOUMES, P.; LE GALÈS, P. Introduction: understanding public policy through its instruments — from the nature of instruments to the sociology of public policy instrumentation. Governance, n. 20, p. 1–21, 2007. doi: 10.1111/j.1468-0491.2007.00342.x
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) e que, do ponto de vista comportamental, a escolha desses instrumentos reflete pressupostos e preconceitos sobre como diferentes pessoas se comportam (SCHNEIDER; INGRAM, 1997), indaga-se: como as técnicas utilizadas no Programa Mulheres Mil perpetuam/alteram essas desigualdades?

Como resposta ao referido questionamento, foi feito uso de um estudo de caso, especificamente, objetivando examinar a implementação do Programa Mulheres Mil no Espírito Santo, por meio da análise de sua metodologia de acesso, permanência e êxito, que busca articular um conjunto de ações, visando a consolidar as políticas públicas e diretrizes governamentais de inclusão educacional, social e produtiva de mulheres, em situação de vulnerabilidade social.

2 Revisão de literatura

Considerando os objetivos propostos, a revisão de literatura centrou-se em dois tópicos: a Construção Social do Gênero e Políticas Públicas com Recorte de Gênero.

2.1 A construção social do gênero

O termo gênero no seu uso mais recente surgiu entre as feministas norte-americanas que desejavam insistir no caráter fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo. A palavra significava uma rejeição ao determinismo biológico implícito no uso de termos como “sexo” ou “diferença sexual”. Nessa abordagem, o gênero é utilizado para designar as relações sociais entre os sexos, sendo que o seu uso repudia as justificativas biológicas e torna uma maneira de referir-se às origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos homens e das mulheres. Sendo assim, o gênero pode ser visto como uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado (SCOTT, 1995SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre v. 20, n. 2, p. 71–99, dez. 1995.). No Brasil, conforme Louro (2013)LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. 15. ed. Petrópols, RJ: Vozes, 2013., somente no final da década de 1980, as feministas passaram a utilizar o termo gênero.

Todavia, as preocupações teóricas relativas ao gênero como categoria de análise só apareceram no final do século XX. No seu uso mais simples “gênero” é sinônimo de “mulheres”, nessas circunstâncias, o uso de seu termo visa a indicar a erudição e a seriedade de um trabalho, pois “gênero” tem uma conotação mais objetiva e neutra para as ciências sociais do que “mulheres” (SCOTT, 1995SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre v. 20, n. 2, p. 71–99, dez. 1995.). Neste uso, acrescenta a autora, “o termo gênero não implica necessariamente a tomada de posição sobre a desigualdade ou o poder, nem mesmo designa a parte lesada” (SCOTT, 1995SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre v. 20, n. 2, p. 71–99, dez. 1995., p. 75).

Scott observa que é constante nas análises e no entendimento das sociedades um pensamento dicotômico e polarizado sobre os gêneros: masculino versus feminino, que se relacionam dentro de uma lógica invariável de dominação e submissão (LOURO, 2013LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. 15. ed. Petrópols, RJ: Vozes, 2013.). Observa-se que o termo “gênero” ainda continua concebendo e naturalizando a existência de uma visão binária sobre os papéis culturais e sociais; ou seja, as categorias de análise ainda continuam divididas entre os dois polos: homem e mulher (SALIH, 2013SALIH, S. Judith Butler e a teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.).

Para desconstruir esse pensamento dicotômico do gênero, algumas estudiosas utilizam as teorias pós-estruturalistas para embasar novas formulações sobre os gêneros, entre as quais estão Scott (1995)SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre v. 20, n. 2, p. 71–99, dez. 1995. e Butler (2013)BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.. Para Scott (1995SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre v. 20, n. 2, p. 71–99, dez. 1995., p. 86), o gênero “[...] é um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma primária de significar as relações de poder”. “[...] O gênero é, portanto, um meio de decodificar o sentido e de compreender as relações complexas entre diversas formas de interação humana”.

Por sua vez, Butler (2013)BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. realiza, em seu livro “Problemas de gênero”, uma investigação genealógica que averigua os efeitos do gênero e observa que o gênero é um feito, é ficcional. “Ela trabalha a partir da premissa de que o gênero é um construto discursivo, algo que é produzido e não um ‘fato natural’” (SALIH, 2013SALIH, S. Judith Butler e a teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2013., p. 74). As teorias estruturalistas e psicanalistas entendem que o sexo e o gênero são universais, estáveis e inatos; entretanto, Butler enfatiza que o sexo e o gênero são o resultado do discurso e da lei (SALIH, 2013SALIH, S. Judith Butler e a teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.). O gênero nem sempre se constituiu de forma coerente ou consistente nos diversos contextos históricos. Para Butler (2013)BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013., tornou-se impossível separar a definição de gênero dos interesses políticos e culturais em que invariavelmente ela é produzida e preservada.

Para a mesma autora, o gênero não é substantivo, tampouco é um conjunto de atributos flutuantes, pois seu efeito substantivo é perfomativamente produzido e imposto pelas práticas reguladoras da coerência do gênero. “Nesse sentido, o gênero é sempre um feito, ainda que não seja obra de um sujeito tido como preexistente à obra” (BUTLER, 2013BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013., p. 48). Para a estudiosa não há identidade de gênero por trás das expressões de gênero; isto é, essa identidade é performativamente constituída pelas próprias expressões entendidas como seus resultados.

Neste estudo, portanto, partiu-se da premissa de que as relações de gênero construídas ao longo da história das mulheres se edificaram nas relações de poder entre os sexos; sobretudo, no que se atribui à concepção de divisão sexual do trabalho, onde tais relações estabeleceram e ainda estabelecem diferenças e determinam as chamadas carreiras femininas e masculinas.

Na antiguidade greco-romana, a arte doméstica era considerada de forma semelhante à arte política ou à arte militar, no que se trata de governar os outros. Na gestão do oikos, ou seja, da casa, a esposa era uma figura fundamental, ocorrendo o estabelecimento de relações que eram ao mesmo tempo, de formação e de direção entre marido e mulher. O oikos aqui tomava a forma de um ensinamento e de um governo das condutas. A esposa era uma espécie de colaboradora do bom governo da casa, pois os cuidados da casa lhe eram confiados, enquanto o marido ficava disponível para os negócios. A administração da casa devia ser bem regulada para que o marido conseguisse tempo para se ocupar do gado e da terra, evitando que todo o esforço fosse perdido devido à desordem doméstica, sendo, por isso, os dois papéis complementares. Aristóteles, ao analisar a natureza política do vínculo conjugal, o tipo de autoridade que nele se exercia, atentou para o seguinte: a relação entre homem e mulher é evidentemente desigual. Contudo, tal desigualdade era distinguida daquela que separa o pai de seus filhos, daquela que separa o senhor dos escravos e daquela que separa os cidadãos que comandam e os que são comandados. Pois, nessa relação, apesar de somente o marido comandar, cada um recebe uma parte de autoridade, seu papel e suas funções em proporção à sua importância (FOUCAULT, 1984FOUCAULT, M. História da sexualidade 2: o uso dos prazeres. 4. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1984.).

Como se pode verificar, desde a antiguidade, as relações de poder conferem uma desigualdade entre mulheres e homens. No entanto, para Foucault (2010)FOUCAULT, M. O governo de si e dos outros: curso no Collège de France, 1982-1983. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010., a racionalidade do governado não é um resultado espontâneo de processos que escapam ao exercício do poder, é preciso que tal racionalidade tenha sido suscitada, provocada e motivada em relação a uma obediência. Mas, se poder pode ser compreendido como relações de poder, ou, como argumenta Silva (2007)SILVA, J. C. S. Foucault e as relações de poder: o cotidiano da sociedade disciplinar tomado como uma categoria histórica. Revista Aulas, v. 1, n. 3, p. 1–28, mar. 2007., como uma espécie de rede, seu funcionamento enseja a possibilidade de se pensar uma série de movimentos inesperados no cotidiano que concorrem para o enfraquecimento da noção de que são os discursos e as ações dos indivíduos e grupos dominantes que determinam aquilo que passará a ser um modo de funcionamento hegemônico na sociedade. As diferentes circunstâncias cotidianas, com suas surpresas e eventualidades, podem contribuir para o desencadeamento de práticas, de relações de poder.

Sendo assim, o que se defende é que não ocorra mais obediência a certas regras de conduta que foram construídas ao longo do tempo em nossa sociedade.

Além disso, Carpenedo e Nardi (2013)CARPENEDO, M.; NARDI, H. C. Mulheres brasileiras na divisão internacional do trabalho reprodutivo: construindo subjetividade(s). Revista de Estudios Sociales, n. 45, p. 96–109, abr. 2013. explicam que há um processo de incorporação massiva das mulheres dos países desenvolvidos no setor produtivo, algo que não vem sendo acompanhado por uma divisão das tarefas domésticas entre homens e mulheres:

Assim, temos um tensionamento claro entre cuidado, reprodução da população, manutenção da força de trabalho e as exigências crescentes do mercado de trabalho no contexto da reestruturação produtiva nos países desenvolvidos (CARPENEDO; NARDI, 2013CARPENEDO, M.; NARDI, H. C. Mulheres brasileiras na divisão internacional do trabalho reprodutivo: construindo subjetividade(s). Revista de Estudios Sociales, n. 45, p. 96–109, abr. 2013., p. 97).

E no Brasil, ainda com tantos aspectos sociais a serem resolvidos, como tal processo estaria ocorrendo? Melo (2011)MELO, M. C. O. L. Mulheres gerentes entre o empoderamento e o teto de vidro. In: FREITAS, M. E.; DANTAS, M. (Org.). Diversidade sexual e trabalho. São Paulo: Cengage, 2011. destaca que a equidade de gênero é um processo lento e, para que a mesma aconteça, é preciso que ocorram mudanças de intenções, valores, atitudes e crenças, enfim, novas práticas sociais1 1 Na percepção de Bourdieu (1989, p. 261), as práticas sociais “representam o produto de uma relação dialética entre a situação e o habitus [...] que integrando todas as experiências passadas funcionam em cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações e torna possível cumprir tarefas infinitamente diferenciadas graças à transferência analógica de ‘esquemas’ adquiridos numa prática anterior”. . Ou seja, as transformações deveriam envolver o exercício de novas práticas sociais em distintos contextos, como, por exemplo, no âmbito das famílias, escolas, governo e comunidades, levando-os a pensar, sentir, e agir de modo diferenciado. Todavia, o trabalho feminino sempre sofreu limitações e desafios. A primeira limitação diz respeito ao ingresso no mercado de trabalho. A segunda é a superação das disparidades de gênero presentes nas relações de trabalho, pois, no processo de inserção profissional, muitas vezes, as ocupações ou a remuneração são inferiores, além de serem marcadas pela ausência de mobilidade e falta de oportunidades de crescimento profissional (LIPOVETSKY, 2000LIPOVETSKY, G. La mujer y la actividad professional. In: BAREA TEJEIRO, J. et al. Dimensiones Económicas y sociales de la familia. Madrid: Fundación Argentaria, 2000. p. 131–140.; SAMPAIO, 2007SAMPAIO, D. F. Relações de gênero na indústria automotiva: a problemática da divisão sexual do trabalho e da visão essencializada da mulher: um estudo de caso. 2007. 191 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia, Programa de Pós-Graduação em Sociologia) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007.).

Diante desse cenário histórico e socialmente desigual, como reportado pelo Banco Mundial (2011)BANCO MUNDIAL. Relatório sobre o desenvolvimento mundial de igualdade de gênero e desenvolvimento. Washington, DC: The International Bank for Reconstruction and Development, 2011., diversos países desenvolveram estratégias para fomentar a equidade de gênero, por meio das políticas públicas específicas para as mulheres.

2.2 Políticas Públicas com recorte de gênero

Nos últimos anos, as mulheres obtiveram ganhos significativos em direitos, educação e saúde, em acessos a empregos e meios de subsistência; entretanto, o processo não tem acontecido facilmente e de maneira uniforme para todos os países ou para todas as mulheres. A taxa de mortalidade entre mulheres em relação aos homens é mais alta nos países de baixa e média renda comparativamente àqueles países de alta renda. As mulheres continuam ocupando setores caracterizados como “femininos” e mal remunerados. O segmento feminino também tem uma maior probabilidade de ser vítima da violência doméstica e, em quase todos os países, a representação das mulheres na política e nos cargos de alta gerência em empresas continua inferior à dos homens. Para as mulheres pobres e muito pobres ainda existem lacunas consideráveis de gênero, e esses hiatos, em termos de ganhos e produtividade, persistem em todas as atividades econômicas, seja na agricultura, no emprego assalariado ou no empreendedorismo (BANCO MUNDIAL, 2011BANCO MUNDIAL. Relatório sobre o desenvolvimento mundial de igualdade de gênero e desenvolvimento. Washington, DC: The International Bank for Reconstruction and Development, 2011.).

Bruschini (2007)BRUSCHINI, M. C. A. Trabalho e gênero no Brasil nos últimos dez anos. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 132, p. 537–572, dez. 2007. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742007000300003
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registrou os contrastes da situação das mulheres no mercado de trabalho, observando, de um lado, o aumento constante da participação feminina e, de outro, o grande desemprego de mulheres e a má qualidade do trabalho feminino; ou seja, ali, a conquista de bons empregos, o acesso a carreiras e profissões de prestígio para as mulheres escolarizadas, e aqui, a prevalência do trabalho feminino em atividades precárias e informais. A referida autora acrescenta, relatando sobre as alterações no perfil feminino: mais velhas, casadas, mães e voltadas tanto para o trabalho quanto para a família em 2005; em contraste com o perfil das trabalhadoras até o final de 1970, que eram, na sua maioria, jovens, solteiras e sem filhos. Porém, ainda persistem as responsabilidades das mulheres pelas atividades domésticas e cuidados com os filhos e outros familiares, o que indica a continuidade de modelos tradicionais, que sobrecarregam as novas trabalhadoras, em virtude do tempo consumido com as tarefas do cuidado.

Essa situação não é específica de países em desenvolvimento, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos existem versões modernas da divisão do trabalho tradicional: homens e mulheres participam do mercado de trabalho, todavia as mulheres continuam especialistas no trabalho doméstico. Assim, na França, como em outros países europeus, muitas mulheres ainda acumulam atividade profissional e vida familiar (CROMPTON; LYONETTE, 2006CROMPTON, R.; LYONETTE, C. Work-life “balance” in Europe. Acta Sociologica, v. 49, n. 4, p. 379–393, 2006. doi: https://doi.org/10.1177/0001699306071680
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; MANDEL; SEMYONOV, 2006MANDEL, H.; SEMYONOV, M. Welfare state paradox: state interventions and women’s employment opportunities in 22 countries. American Journal of Sociology, v. 111, n. 6, p. 1910–1149, 2006. doi: https://doi.org/10.1086/499912
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). As mulheres europeias vêm optando pelo trabalho parcial, contudo, esses trabalhos tratam, na sua maioria, de empregos pouco qualificados, concentrados em algumas atividades e profissões que oferecem baixos salários e horários instáveis, contribuindo para a divisão sexual do mercado de trabalho (MARUANI, 2008MARUANI, M. Emprego, desemprego e precariedade: uma comparação europeia. In: COSTA, A. O. et al. (Org.). Mercado de trabalho e gênero: comparações internacionais. Rio de Janeiro: FGV, 2008. p. 35–51.).

De acordo com Segnini (2000)SEGNINI, L. R. P. Educação e trabalho: uma relação tão necessária quanto insuficiente. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 2, p. 72-81, abr./jun. 2000. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88392000000200011
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, a precariedade no trabalho é um processo social que atinge atualmente homens e mulheres no mercado laboral; porém, as mulheres já estavam em maior número nas ocupações precárias e ainda presenciam taxas maiores de informalidade e precariedade, apesar dos indicadores de escolaridades mais elevados. Com relação ao Brasil, nota-se que as mulheres que se movimentaram para ocupações de nível superior são predominantemente brancas, enquanto, as mulheres oriundas de classes mais pobres e, em sua maioria negras, se dirigem para a produção na indústria e para o setor de prestação de serviços, com destaque para o serviço doméstico, setor em que persistem os níveis salariais mais baixos e maior nível de informalidade (IBGE, 2014INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Rio de Janeiro: IBGE, 2014. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv91983>. Acesso em: 15 mar. 2015.
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). Sendo assim, para Lisboa e Manfrini (2005)LISBOA, T. K.; MANFRINI, D. B. Cidadania e equidade de gênero: políticas públicas para mulheres excluídas dos direitos mínimos. Katálysis, Florianópolis, v. 8, n. 1, p. 67–77, jan. 2005. doi:http://dx.doi.org/10.1590/%x
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, os principais desafios às mulheres pobres no Brasil referem-se à dificuldade de acesso ao mercado de trabalho, à moradia (saneamento básico, educação, saúde e segurança) e à luta contra a discriminação salarial.

Mesmo com maior escolaridade, a mulher continua sendo considerada uma força de trabalho secundária por diversas instâncias (empresários, instituições do mercado de trabalho, formuladores das políticas públicas e até pelas teorias econômicas) e, apesar do avanço das taxas de ocupação de empregos e as contribuições para a economia dos países, as mulheres ainda são consideradas mais caras e menos produtivas, apesar de não haver evidências estatísticas de produtividade segmentada por sexo. A perspectiva que considera a mulher como força de trabalho secundária contribui para debilitar a sua posição e a confinar as mulheres a um lugar subordinado no mercado de trabalho, tal como tem sido na história da humanidade escrita pelos homens (ABRAMO, 2007ABRAMO, L. W. A inserção da mulher no mercado de trabalho: uma força de trabalho secundária? 2007. 328 f. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.).

Todavia, apesar das dificuldades, a partir da declaração dos direitos da mulher, de Olympe de Gouses, até os dias atuais, já houve no Brasil muitas conquistas em relação à cidadania feminina e com respeito à implementação de políticas públicas de gênero. Inicialmente, pela conquista do direito ao voto e, recentemente, com a Constituição de 1988, que incorporou pontos fundamentais aos direitos políticos, sociais, sexuais e reprodutivos da mulher. O movimento feminista teve e tem papel fundamental nestas conquistas, como apontam Lisboa e Manfrini (2005)LISBOA, T. K.; MANFRINI, D. B. Cidadania e equidade de gênero: políticas públicas para mulheres excluídas dos direitos mínimos. Katálysis, Florianópolis, v. 8, n. 1, p. 67–77, jan. 2005. doi:http://dx.doi.org/10.1590/%x
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, uma vez que ele auxiliou na inclusão da questão de gênero na agenda pública e sob o seu impacto, na década de 1980, foram implementadas as primeiras políticas públicas com recorte de gênero (FARAH, 2004FARAH, M. F. S. Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 12, n. 1, abr. 2004. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2004000100004
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).

Com base na plataforma de ação definida na Conferência Mundial em Beijing, em 1995, e na trajetória do movimento de mulheres no Brasil, constituiu-se no país uma agenda relacionada às questões de gênero, buscando-se o empoderamento feminino, visto, conforme Malhotra, Schuler e Boender (2011), sob diversas dimensões, em termos do empoderamento político, familiar, econômico, dentre outros.

A incorporação da dimensão de gênero nas políticas públicas aponta para a implementação de projetos específicos voltados às mulheres, que tenham a capacidade de responder à singularidade da situação feminina, desenvolvendo medidas de discriminação positiva para neutralizar as dificuldades iniciais compartilhadas por alguns grupos de mulheres (LISBOA, MANFRINI, 2005).

Como resposta a essa agenda, tentativas de mudanças ocorreram entre 2003 e 2010 no enfrentamento das desigualdades vivenciadas pelas mulheres, em termos de políticas e do orçamento público, principalmente em decorrência do I PNPM. O I Plano Nacional foi fruto da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (CNPM), que aconteceu em julho de 2004. Ele traduzia em ações o compromisso de enfrentar a desigualdade entre mulheres e homens no Brasil e reconheceu o papel fundamental do Estado, através de ações e políticas públicas no combate às desigualdades sociais. Já o II PNPM foi estruturado em decorrência da II CNPM, do Plano Plurianual 2008–2011 e da agenda do governo. Ele contava com 91 metas, cinco prioridades e 394 ações distribuídas em 11 grandes áreas de atuação, incluindo seis novas áreas estratégicas que se somaram àquelas existentes no primeiro plano.

Dentre as políticas desenvolvidas para a equidade de gênero estão o Programa Pró-Equidade de Gênero; a criação do Centro de Atendimento à Mulher – ligue 180; a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340 de agosto de 2006); o Programa Nacional Trabalho e Empreendedorismo da Mulher; o Programa Trabalho, Artesanato, Turismo e Autonomia das Mulheres; o Programa Mulheres Construindo Autonomia na Construção Civil; o Programa Mulheres Mil e a Política e o Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres. No final de 2011, ocorreu a III CNPM, que teve como resultado a elaboração do III PNPM, contemplando o triênio de 2013 a 2015. Ele tem como princípios norteadores: a busca pela autonomia das mulheres, a busca da equidade de gênero, o respeito à diversidade e ao combate a todas as formas de discriminação, a maior participação política das mulheres e a transversalidade de gênero em todas as políticas públicas. Ele também visa a reforçar o desenvolvimento de ações para a inserção e permanência das mulheres no mercado de trabalho, especialmente em profissões não tradicionais com o objetivo de reduzir a diferença de rendimentos (RIBEIRO, 2013RIBEIRO, L. É. G. A qualificação profissional e cidadã: um estudo do Programa Mulheres Mil, a partir da experiência do Instituto Federal de Goiás, campus de Luziânia. 2013. 155 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2013.).

Entretanto, para Silveira (2003)SILVEIRA, M. L. Políticas públicas de gênero: impasses e desafios para fortalecer a agenda política na perspectiva da igualdade. In: URBIS 2003; Congresso Internacional de Cidades; Seminário Nacional de Coordenadorias da Mulher no Nível Municipal. 2003, São Paulo. Anais... São Paulo: ILDES/Fundação Friedrich Ebert Stiftung, 2003. p. 1-11., é necessário indagar o modo como as políticas são construídas e a quem beneficiam, pois elas não são neutras. É preciso também observar a lógica tradicional do Estado que, muitas vezes, envereda para a fragmentação das ações. Para Lisboa e Manfrini (2005)LISBOA, T. K.; MANFRINI, D. B. Cidadania e equidade de gênero: políticas públicas para mulheres excluídas dos direitos mínimos. Katálysis, Florianópolis, v. 8, n. 1, p. 67–77, jan. 2005. doi:http://dx.doi.org/10.1590/%x
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, as políticas de gênero e as políticas específicas às famílias chefiadas por mulheres necessitam de ações em três eixos: capacitação dos profissionais e técnicos que trabalham com políticas públicas com recorte em gênero; atenção à transversalidade da questão de gênero nas diversas políticas públicas; políticas específicas de gênero, por meio de programas e projetos específicos às mulheres, que possam responder à particularidade da sua situação e à necessidade de desenvolver ações de apoio ao segmento feminino.

Pollack e Hafner-Burton (2000)POLLACK, M. A.; HAFNER-BURTON, E. Mainstreaming gender in the European Union. Journal of European Public Policy, v. 7, n. 3, p. 432–456, 2000. doi: https://doi.org/10.1080/13501760050086116
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também chamam a atenção para a questão da transversalidade de gênero. Essa concepção exige a incorporação sistemática das questões de gênero em todas as instituições governamentais e políticas. Esse conceito entrou na agenda política pública internacional, em setembro de 1995, quando foi apresentado na plataforma de ação da IV Conferência Mundial sobre as Mulheres em Beijing. A União Europeia introduziu rapidamente a perspectiva de gênero nas políticas públicas em várias áreas. Entretanto, as mesmas autoras ressaltam a importância de não se abandonarem ações específicas e positivas em favor das mulheres e reforçam a necessidade de repensar os objetivos fundamentais do país, a partir da perspectiva de gênero e não apenas de integrar mulheres e questões de gênero nas políticas públicas.

No Brasil, a incorporação formal da transversalidade de gênero e raça como princípio de governo ocorreu a partir do Plano Plurianual 2008–2011. Porém, Papa (2012)PAPA, F. C. Transversalidade e políticas públicas para mulheres no Brasil: percursos de uma pré-política. 2012. 177 f. Dissertação (Mestrado em Administração Pública e Governo) – Programa de Pós-Graduação em Administração Pública e Governo, Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2012. constatou que o governo federal está pouco preparado para implementar a transversalidade como diretriz de governo, pela inexistência de instrumentos institucionalizados. A pesquisa realizada pela referida autora, ainda demonstrou que a agenda das mulheres e da população negra avançou muito mais pela insistência militante de seus quadros técnicos e políticos do que pelas condições oferecidas pelo aparato estatal para apoiar tais políticas.

Segundo IPEA (2015)INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA - IPEA. Políticas sociais: acompanhamento e análise. Brasília, DF: IPEA, 2015., a transversalização da perspectiva de gênero no país permanece muito mais como uma diretriz orientadora da atuação governamental do que como um elemento de planejamento e gestão da política na prática. Percebe-se que, mais de dez anos após a SPM ser criada, o país alcançou êxito limitado no que se refere à incorporação da temática de gênero e/ou mulheres de forma sustentada e efetiva no governo federal.

Nobre (2016)NOBRE, M. Igualdade para todas: estratégias para políticas públicas e ações do movimento. Revista Estadual Feminista, v. 24, n. 2, p. 645–652, 2016. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1805-9584-2016v24n2p645
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, contudo, aponta que ainda no início da década de 2000, houve diversas críticas ao processo de empobrecimento analítico e metodológico da estratégia de transversalização do gênero, que transferiu a transformação das relações de gênero aos operadores de políticas públicas. A mesma autora, citando Standing (2007)STANDING, H. Gender, myth and fable: the perils of mainstreaming in sector bureaucreaties. In: CORNWALL, A.; HARRISON, E.; WHITEHEAD, A. (Orgs.). Feminisms in development: Contradictions, contestations and challenges. London: Zed Books, 2007, p. 101–111., acrescenta que a concretização dessa estratégia descontextualizou e banalizou as relações de poder em que o gênero se enquadra, e não tocou no cerne das políticas macroeconômicas dos países.

Labrecque (2010)LABRECQUE, M. F. Transversalização da perspectiva de gênero ou instrumentalização das mulheres? Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v. 16, n. 3, 2010. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-026X2010000300015
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também alega que, apesar de a maioria dos autores atribuir a perspectiva da transversalização do gênero à Conferência de Beijing, em 1995, outros concordam em afirmar que foi, acima de tudo, a partir de 2001 que a integração do gênero ao conjunto da estratégia do Banco Mundial se tornou sistemática nos contextos nacionais e locais. Entretanto, a transversalização do gênero, disseminada a partir da Conferência de Beijing, constitui-se numa “prática reguladora” da governança internacional provinda do sistema das Nações Unidas e que, nos últimos anos, aumentou as capacidades das mulheres no mercado de trabalho, sem que fosse questionado o panorama social e político, levando a que as causas estruturais das desigualdades de gênero não fossem colocadas em dúvida, tampouco as relações de poder em todos os níveis.

O relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) Mulheres, intitulado Progress of the World’s Women2015–2016, reconhece as dificuldades de implementação efetiva da transversalização de gênero e defende que o enfrentamento das desigualdades tem mais chances de alcançar resultados substantivos quando se utiliza da estrutura de direitos humanos para associar a política e a economia, ampliar a noção de trabalho e retomar o princípio da universalidade (NOBRE, 2016NOBRE, M. Igualdade para todas: estratégias para políticas públicas e ações do movimento. Revista Estadual Feminista, v. 24, n. 2, p. 645–652, 2016. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1805-9584-2016v24n2p645
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). De acordo com Sorj (2016)SORJ, B. Igualdade de gênero e políticas macroeconômicas. Revista Estudos Feministas, v. 24, n. 2, p. 617–620, ago. 2016. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1805-9584-2016v24n2p617
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, o documento sustenta ainda que, para corrigir as desvantagens socioeconômicas das mulheres é preciso fortalecer as políticas sociais com políticas de emprego, de proteção social e serviços sociais de natureza universal.

3 Procedimentos metodológicos

A fim de atingir os objetivos propostos, foi realizado um estudo de caso com abordagem qualitativa, optando-se pela análise de documentos, registros em arquivos, visitas, entrevistas informais e semiestruturadas.

O presente estudo de caso teve como foco o projeto do Programa Nacional Mulheres Mil, assim como os projetos implementados nas cidades de Alegre, Aracruz, Colatina, Guaçuí, Guarapari, Ibatiba, Mucurici, Piúma e Vitória. Também utilizou o guia metodológico do programa e o III PNPM.

Como fontes de evidências, foram utilizados os relatórios gerados pelo Sistema acadêmico do Instituto Federal do Espírito Santo (IFES), considerando: as relações de alunas matriculadas, relatórios de levantamentos socioeconômicos, relatórios de acompanhamento das atividades do programa, relatórios finais do programa e análises dos rendimentos e permanências das alunas que participaram do programa entre 2011 e 2014.

O primeiro contato com os gestores do programa no IFES ocorreu por e-mail, informando que uma das pesquisadoras era servidora da instituição e que sua pesquisa tinha sido contemplada pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) para avaliar o acesso, a permanência e os resultados do Programa Mulheres Mil no Espírito Santo.

Após o primeiro contato, as visitas técnicas ocorreram em todos os nove campi do IFES que implementaram o programa, entre os meses de março e dezembro de 2014, tendo como objetivo conhecer as instalações disponibilizadas para a implementação do projeto e coletar informações secundárias sobre o acesso, a permanência e os resultados da política nas cidades que realizaram adesão à política.

Para complementar as informações secundárias coletadas, foram entrevistados os envolvidos no Programa Mulheres Mil no Estado do Espírito Santo, como: 11 gestores e gestoras locais nas cidades que implementaram o programa, uma pedagoga, três docentes, três assistentes sociais, duas psicólogas, um enfermeiro, um assistente administrativo, uma diretora, 59 mulheres egressas e 35 mulheres desistentes do programa entre 2011 e 2014. As entrevistas ocorreram entre agosto de 2014 e abril de 2015.

As entrevistas com os gestores e servidores do IFES ocorreram em todas as cidades que implementaram o programa no Espírito Santo, sendo do tipo entrevista informal e tendo como objetivo coletar informações básicas sobre a formulação e implementação do programa. Todos os gestores das nove cidades, que implementaram a política, foram ouvidos e forneceram os dados secundários necessários à descrição e à análise da pesquisa.

Por sua vez, as entrevistas com as 59 mulheres egressas do programa foram do tipo semiestruturadas ou por pautas e ocorreram após contatos dos gestores de cada cidade com as mesmas, convidando-as para uma entrevista coletiva que teve como objetivo verificar como foi o seu acesso, o desenvolvimento e os resultados do programa, segundo as suas percepções e sentimentos. Para a pesquisa foi utilizada a amostra não probabilista com aquelas egressas que demonstraram maior acessibilidade, totalizando nove entrevistas coletivas. As entrevistas foram gravadas para a análise posterior de conteúdo.

A maioria das egressas entrevistadas tinha ensino fundamental incompleto, estava desempregada antes do programa, tinha renda familiar até dois salários mínimos, era beneficiária do Programa Bolsa Família, casada, pertencia a cor/raça preta ou parda e não possuía noções de informática.

As entrevistas com as 35 mulheres desistentes do programa foram realizadas por meio de telefone e versaram sobre os motivos da desistência, sendo realizadas em março de 2015.

A análise das entrevistas foi realizada por meio da análise qualitativa de conteúdo, e as categorias foram estruturadas após a pesquisa de campo e abordaram: a metodologia utilizada pelo programa e a oferta de cursos; os obstáculos para a permanência das mulheres no programa e a continuidade dos estudos; as dificuldades de inserção no mercado de trabalho após o programa e as contribuições do programa para o segmento feminino.

4 Análise dos resultados e discussão

O Programa Nacional “Mulheres Mil” propõe que mulheres moradoras de comunidades integrantes dos territórios da cidadania e/ou comunidades com baixo índice de desenvolvimento urbano tenham uma formação educacional, profissional e tecnológica, uma elevação de escolaridade, emancipação e acesso ao mundo do trabalho, por meio do estímulo ao empreendedorismo, economia solidária e empregabilidade.

A primeira turma do programa foi desenvolvida no estado do Rio Grande do Norte, em 2005, em caráter experimental. A sua expansão foi iniciada em 2007, com ações focadas nas regiões norte e nordeste, totalizando 13 projetos-piloto que beneficiaram 1191 mulheres, entre 2007 e 2010. Em 2013, esteve presente em 112 unidades da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e tecnológica e beneficiou 10 mil brasileiras. A partir de agosto de 2013, por meio do ofício circular no 51/2013 – DIR/Setec/MEC, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) passou a integrar o Programa Nacional Mulheres Mil e tinha a perspectiva de atingir 100 mil mulheres entre 2011 e 2014.

No Espírito Santo, o programa possuía a meta de beneficiar 2900 mulheres entre 2011 e 2014; entretanto, matriculou 1080 mulheres, não atingindo as meta de matrículas devido a problemas nos repasses de recursos, principalmente no segundo semestre de 2014.

4.1 A metodologia utilizada pelo programa e a oferta de cursos

O Programa Mulheres Mil se estrutura em torno da metodologia de acesso, permanência e êxito. Os serviços de acesso incluem ações de busca das alunas, composição da infraestrutura, ingresso e acolhimento. Para viabilizar o acesso das mulheres no programa, um escritório de acesso deverá ser estruturado e uma equipe multidisciplinar deverá se montada e capacitada para o programa. Das nove cidades visitadas, apenas o campus de Piúma estruturou um local adequado para receber as alunas, com computadores, mesas de escritório, mesa de reunião, geladeira, cadeiras, sofá e exposição dos produtos desenvolvidos pelas aulas. Nas demais cidades, os escritórios foram improvisados ou nem existiam. Em alguns casos, houve demora na compra dos equipamentos ou demora no repasse de recursos financeiros para a aquisição de materiais, equipamentos e móveis para o programa.

Constatou-se que as equipes multidisciplinares foram estruturadas considerando a disponibilidade de pessoal, existindo equipes formadas por assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros, docentes, assistentes administrativos, pedagogos, educadores e gestores. Até junho de 2013, todas as equipes eram constituídas de voluntários; porém, a partir de julho de 2013, quando o programa foi integrado ao Pronatec, todos os participantes das equipes do programa nos Institutos Federais passaram a receber uma bolsa, que variava de acordo com a carga horária dedicada ao programa e a função exercida.

O programa no Espírito Santo optou por cursos de Formação Inicial e Continuada (FIC), com duração entre 160 e 200 horas. Observou-se que os cursos foram escolhidos muito mais em função dos conhecimentos prévios das alunas do que nas possibilidades locais de trabalho, como pode ser evidenciado no Quadro. Visualiza-se a imagem da mulher como reprodutora, cuidadora de crianças e idosos e responsável pelos afazeres domésticos, conforme tem sido naturalizado durante séculos. Dessa forma, corrobora-se o posicionamento de Lascoumes e Le Galès (2007)LASCOUMES, P.; LE GALÈS, P. Introduction: understanding public policy through its instruments — from the nature of instruments to the sociology of public policy instrumentation. Governance, n. 20, p. 1–21, 2007. doi: 10.1111/j.1468-0491.2007.00342.x
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, que defendem que os instrumentos constituem uma forma concentrada de conhecimento sobre o controle social e as formas de exercê-los, como é o caso da manutenção do segmento feminino em ocupações relacionadas à reprodução social.

Quadro
Cursos oferecidos pelo IFES no Programa Mulheres Mil, entre 2011 e 2014.

Nessa concepção, conforme ressalta Foucault (1984)FOUCAULT, M. História da sexualidade 2: o uso dos prazeres. 4. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1984., enquanto o pai cumpre o papel de provedor, a mãe assume a criação dos filhos no lar, ou, como destaca Mancini (2005)MANCINI, M. Mulheres profissionais bem-sucedidas: um estudo exploratório no contexto organizacional brasileiro. 2005. 284 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2005., antigamente, os homens eram considerados responsáveis pelo sustento da casa e as mulheres pelos afazeres domésticos. Tal concepção remete a uma divisão tradicional do trabalho com base no gênero, que ajuda a perpetuar a manutenção de mulheres em profissões e funções de mercados informais, muitas vezes ausentes de vínculos e cobertura dos sistemas de seguridade social (CARPENEDO, 2011CARPENEDO, M. Quando a resistência se torna política publica. Analisando a produção de subjetividade(s) nas políticas públicas de equidade de gênero no campo do trabalho. 2011. 150 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.; GOIS, 2016GOIS, É. L. P. Programa Mulheres Mil: interfaces de gênero na capacitação de mulheres para o mercado de trabalho em Palmas. 2016. 145 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) – Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, Universidade Federal de Tocantins, Tocantins, 2016.).

Com relação à oferta dos cursos, na maioria das vezes, eles foram determinados pelo IFES, sem considerar os projetos de vida do segmento feminino, como relata uma psicóloga lotada em um Centro de Referência de Assistência Social (CRAS):

Deveria-se levar em consideração o histórico dessa mulher e o que ela pretende. Enquanto os cursos forem oferecidos de acordo com a procura das usuárias, continuaremos a oferecer cursos que favorecem a informalidade e a divisão sexual do trabalho, pois essa é a realidade delas. E assim, a reprodução dessa realidade é passada de mãe para filha (PSICÓLOGA 1).

Percebe-se na fala da entrevistada, a necessidade de entender o contexto histórico e social e ainda o projeto de vida dessas mulheres para então oferecer cursos que venham a agregar maior autonomia para as mesmas. Entretanto, a proposta curricular do programa foi estruturada pelo IFES a partir da análise e aproveitamento dos conhecimentos prévios que essas mulheres traziam de suas vidas, conforme recomendação da metodologia utilizada. A identificação dos saberes foi alicerce para desenvolver o mapeamento dos conhecimentos preliminares das mulheres, bem como para identificar os objetivos acadêmicos, o desenho dos itinerários formativos e a qualificação para geração de emprego e de renda. Nesse sentido, como argumenta Rosa (2016)ROSA, S. M. M. Reconhecimento de saberes no Programa Mulheres Mil: entre a colonialidade do poder e de gênero. 2016. 287 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2016., a metodologia do PMM já direciona a qualificação para saberes práticos, afirmando:

Responder ao que se identifica e se reconhece como saberes das mulheres-trabalhadoras é uma tarefa complexa, porque no processo imbricam-se tanto os marcadores sociais e as relações sociais por eles determinados quanto os objetivos definidos pela qualificação. Nesse sentido, inicialmente importa destacar que um dos objetivos centrais do Programa Mulheres Mil é contribuir para a inserção das mulheres-trabalhadoras no mundo do trabalho, por meio da oferta de qualificação profissional. Portanto, a documentação já direciona o processo para o reconhecimento de saberes práticos (p. 173).

Sobre as ações articuladas e intersetoriais, observou-se que a interlocução entre os demandantes (prefeituras) e os ofertantes (IFES) se mostrou frágil. Essa parceria tem como objetivo avaliar a necessidade de cursos de acordo com a demanda do local de execução do programa, assim como, acompanhar o desenvolvimento das alunas e encaminhar as egressas para o mercado de trabalho. Todavia, na maioria das cidades visitadas, a missão das prefeituras, via CRAS, foi divulgar os cursos para a comunidade e realizar a pré-matrícula. Essa divulgação ocorreu através das rádios ou através dos próprios usuários dos CRAS, como foi possível verificar nas falas das egressas: “Eu fiquei sabendo por uma professora, eu trabalhava na época na casa dela”. Outra egressa comentou:

Primeiro foi minha prima Gabriela que já fazia outros cursos aqui no CRAS, aí depois entraram eles (companheiros de curso) e minha filha me questionou e disse: “Mãe porque a senhora não faz nada? Só fica em casa, é bom pra sair um pouco.” Então fui lá ver me matriculei, é bom pra gente que tem idade... eu não sei fazer nada, mas fui lá fazer companhia me divertir com o pessoal. Aí eu vim e gostei, gostei da professora, dos outros alunos... (EGRESSA 2).

Constatou-se, portanto, na fala da egressa, que, algumas vezes, o objetivo da matrícula não foi a busca por uma colocação no mercado de trabalho. Enfim, foram diversos os motivos pelos quais as mulheres procuraram o programa: algumas mulheres se matricularam, pois consideravam que os cursos eram uma “terapia”, como motivo para sair de casa; pelo auxílio financeiro que o programa proporcionava; enquanto algumas procuravam um aperfeiçoamento e outras vieram em busca de uma oportunidade de emprego.

Logo, percebeu-se que, por vezes, o objetivo principal da mulher que procurou pelo programa foi sair de casa e socializar-se, haja vista que, de acordo com Marques (2010)MARQUES, E. Redes sociais, segregação e pobreza. São Paulo: Editora UNESP: Centro de Estudos da Metrópole, 2010., quando comparadas com as classes médias, as redes de indivíduos em situação de pobreza tendem a serem menores, mais locais, menos coerentes e com uma sociabilidade menos diversificada. O mesmo autor também aponta que, na análise individual de variabilidade da sociabilidade dos sexos, percebe-se que as mulheres pobres têm menores proporções nas esferas do trabalho e do lazer, e maiores, na esfera da igreja.

4.2 Os obstáculos para a permanência das mulheres no programa e a continuidade dos estudos

Após o início do programa, o mesmo deve ser acompanhado através do módulo de permanência e êxito. Os objetivos são facilitar a permanência das mulheres, minimizando as possibilidades de baixo rendimento e desistências, promover o aconselhamento das educandas por meio de serviços de assistência e apoio, e viabilizar e firmar parcerias com as instituições públicas e privadas para possibilitar a inserção das egressas no mundo do trabalho. Esse apoio deve ser estruturado em torno de serviços de psicologia e assistência social, assistência médico-odontológica, transporte e alimentação, acesso à creche, material didático, uniforme e assistência estudantil.

Todavia, o IFES encontrou algumas dificuldades nessa fase de implementação do programa. De acordo com os depoimentos de 35 mulheres desistentes do programa, naquelas cidades que tiveram maiores índices de evasão (Guarapari, Piúma, Alegre e Aracruz), os principais motivos para o não prosseguimento foram: conseguiram empregos e os horários dos cursos não eram compatíveis; não tinham onde, nem com quem deixar os seus filhos para continuar no programa; atrasos nos repasses financeiros (auxílio estudantil); problemas de relacionamento com os professores e necessidade de acompanhar familiares doentes.

Com relação aos repasses financeiros, houve atrasos na maioria das cidades, dificultando a permanência dessas mulheres, pois dependiam de transporte para a locomoção até o local dos cursos, e necessidade de alimentar-se durante a permanência no campus, pois a duração diária dos cursos era de 4 horas. Segundo Montoya Ruiz (2013)MONTOYA RUIZ, A. M. Seguridad humana para las mujeres en las ciudades: reflexiones para politicas publicas urbanas con enfoque de género. Estudios Socio-Juridicos, v. 15, n. 1, p. 115–137, jun. 2013., é necessário que exista certa proximidade com os serviços que as mulheres utilizam nas cidades, assim como, proximidade com suas atividades de trabalho.

O IFES também teve dificuldade de preparar um local apropriado, com profissionais adequados para a permanência dos filhos das alunas nos locais dos cursos. Além disso, a parceria com as prefeituras se mostrou incipiente, já que não houve garantia de vagas nas creches públicas desses municípios, impedindo a participação dessas mulheres até o final do programa. Entretanto, percebeu-se que as desistências das alunas foram menores nas cidades onde houve maior acolhimento e acompanhamento das mulheres ao longo do programa. Nas cidades de Colatina, Ibatiba e Mucurici, as gestoras locais se empenharam para conhecer cada uma das participantes do programa, assim como, as suas dificuldades. Isso motivou muitas alunas a continuarem no programa, apesar dos muitos problemas enfrentados.

Com respeito à continuidade dos estudos das 59 egressas entrevistadas, a maioria não continuou os estudos após o programa. Notou-se que a maioria das mulheres ainda não despertou para o interesse pela continuidade dos estudos; contudo, tal fato ocorre po elas, na maioria das vezes, não terem com quem deixar seus filhos e netos para continuarem os estudos, conforme relatou uma das egressas:

Eu particularmente porque não tenho com quem deixar o meu filho. Não consegui vaga na creche e o outro motivo é porque sou medrosa, tenho medo de arrumar um trabalho e não conseguir dar conta (EGRESSA 3).

Uma assistente social comentou sobre as dificuldades das mulheres:

Nós até tentamos, implementar uma turma do EJA [Educação de Jovens e Adultos], mas há muitas avós querendo fazer, mas tomam conta dos netos para os filhos estudarem e o EJA é alfabetização, começa bem do início e a necessidade das pessoas aqui é um complemento, como um supletivo que desse preparo para eles fazerem a prova e obterem diploma. Na verdade elas querem, mas não podem; normalmente esses cursos são a noite e a maioria tem que tomar conta da casa, dos filhos, netos e não há como elas virem, e a quantidade que pode vir, não dá pra formar turma (ASSISTENTE SOCIAL 1).

Assim, conforme a fala da assistente social, é diversa a dificuldade das mulheres do PMM para complementarem seus estudos, principalmente, porque persistem as responsabilidades das mulheres pelas atividades domésticas e cuidados com os filhos e outros familiares, o que indica, como pontua Bruschini (2007)BRUSCHINI, M. C. A. Trabalho e gênero no Brasil nos últimos dez anos. Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 132, p. 537–572, dez. 2007. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742007000300003
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, a continuidade de modelos tradicionais de gêneros, que sobrecarregam as mulheres, em virtude do tempo consumido com as tarefas do cuidado.

4.3 Dificuldades de inserção no mercado de trabalho após o programa

O III PNPM reforçou a importância de que sejam desenvolvidas ações para a inserção e permanência das mulheres no mercado de trabalho e, especialmente, em profissões não tradicionais, visando a reduzir as diferenças de rendimentos, assim como, incentivar a inserção em ocupações que não reforcem a divisão sexual do trabalho. Além disso, tem como proposta aumentar a formalização das mulheres, a carteira assinada e a garantia de direitos trabalhistas.

Os cursos, porém, oferecidos pelo programa no Estado do Espírito Santo, no geral, não proporcionaram a inclusão das egressas no mundo do trabalho e ainda reforçaram a divisão sexual do trabalho, quando se optou pelos cursos de camareira, artesanato, cuidadora de idosos, culinária, recepcionista e costura. Observou-se também que, quando houve uma oportunidade de trabalho, na maioria das vezes, foi informal com reduzida mobilidade e visibilidade social.

Conforme Rosa (2016)ROSA, S. M. M. Reconhecimento de saberes no Programa Mulheres Mil: entre a colonialidade do poder e de gênero. 2016. 287 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2016., em relação à inserção no mundo do trabalho, há uma dificuldade de atribuição de valor social ao trabalho doméstico, ao qual, justamente a maioria das mulheres que frequenta o programa estaria vinculada, além da dificuldade de identificação e reconhecimento de saberes.

Ao ser perguntado às egressas sobre as dificuldades de inserção no mercado de trabalho após o programa, elas comentaram: “Difícil arrumar emprego com pintura. Trabalhar mais no individual, a gente faz em casa. Consegui vender meus paninhos todos”. Essa dificuldade de acesso ao mercado laboral, ou mesmo, de montar o próprio empreendimento e oferecer seus produtos, foi também pontuada por outras egressas, afirmando:

Eu acho que eles não valorizam o trabalho aqui, principalmente de doméstica. Então raramente você encontra carteira assinada, o salário é bem pouquinho, menos que um salário mínimo. Eu sempre, desde que cheguei aqui, trabalhei e saí por causa disso, porque não priorizam, não valorizam o serviço. É bom em escolas, se você tem estudo pra fazer concurso na prefeitura, mas a não ser é muito difícil serviço (EGRESSA 5).

Como eu disse, eu sempre trabalhei por conta própria, não dependo de ninguém, nem de prefeitura, só de Deus que me dá força. Eu sempre fiz croché e, às vezes, nem dou conta de atender tudo, mandar pra Vitória, então ajuda. Mas eu também sou vendedora de cama, mesa e banho e já tem 6 meses que não vendo, não sei o que está acontecendo, então esse ano não vai entrar pra mim muito não, por causa disso.

A maioria das pessoas que querem trabalhar têm que ser autônomos, é a única forma de conseguir renda. A gente tem intenção de montar uma cooperativa, mas não tem quem ajuda ou apoia. A cooperativa seria uma boa opção pra gente trabalhar, mas tá difícil pra conseguir emprego aqui (EGRESSA 6).

Acho que falta ajuda financeira, pois a maioria das meninas que fazem o curso aqui não têm condições de comprar uma máquina de costura, então como ela vai produzir uma peça que aprendeu no curso, sendo que ela não possui o seu “cantinho” em casa (DOCENTE 1).

Dessa forma, diante dos depoimentos, a informalidade fazia parte do cotidiano das mulheres, que não possuíam condições econômicas para adquirem as ferramentas e os maquinários necessários para o desenvolvimento da profissão, para a qual foram capacitadas no programa. Quando perguntado às egressas se estavam preparadas para montar um negócio, uma delas respondeu: “Eu não, para montar tem que ter mais capacitação, mais conhecimento. Conhecimento de leis, de como montar um negócio”. Outra comentou: “[...] quanto você gasta, quanto você ganha, do tempo em que você começa até o tempo que você ganhar aquele dinheiro, é... cobrir o dinheiro que foi gasto”.

As egressas comentaram ainda que gostariam de que os cursos tivessem uma carga horária maior, principalmente a prática, pois muitas têm medo de não realizarem seus serviços com a qualidade exigida pelo mercado. Outra solicitação foi com relação ao acesso ao microcrédito para comprarem equipamentos, matéria prima e instrumentos de trabalho para exercerem as atividades que aprenderam no programa.

Além disso, uma limitação relativa à inclusão das mulheres no mercado de trabalho está associada à alta rotatividade dos gestores locais e profissionais dos CRAS. Essa alternância de profissionais dificultou o estreitamento maior do relacionamento com os empregadores locais, pois a maioria desses profissionais possui contratos temporários, inviabilizando um relacionamento de longo prazo com o mercado de trabalho local.

Outra questão percebida na realidade concreta do PMM, no mesmo plano do III PNPM, passa pela ampliação de direitos e a valorização das trabalhadoras domésticas, por meio de mudanças na legislação social e aumento da formalização quando, na verdade, ao manterem essas mulheres em profissões consideradas femininas, o PMM, que deveria ser uma forma de contestação e inversão das normas de gênero, reforça e perpetua as relações patriarcais e a divisão sexual do trabalho existente na sociedade.

4.4 As contribuições do programa para o segmento feminino

Os objetivos das ações governamentais consistem em promover transformações positivas na vida dos cidadãos e a implementação do Programa Mulheres Mil no Espírito Santo promoveu bem-estar social para as mulheres. Apesar de não promover a equidade de gênero nem a inclusão educacional e produtiva da maioria das mulheres, o programa proporcionou uma maior autoestima, reconhecimento do trabalho realizado e aumento da consciência sobre a importância da saúde da mulher e de seus direitos, como pode ser verificado nas falas das egressas:

Eu aprendi muita coisa, saúde da mulher... palestras, o Sebrae [Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas] deu dicas financeiras muito legais, aprendi muito aqui... levei para casa (EGRESSA 9).

Acho que não só eu, mas como todo mundo, ganhamos a oportunidade de melhorar a nossa autoestima; no meu caso eu não costuro por dinheiro, mas é bom ter o reconhecimento de vestir alguém essa pessoa falar que foi você, então no meu caso foi outro bem que o curso me fez, o fato de você aprender a fazer bem feito (EGRESSA 10).

Eu mesma levei (o certificado), minhas netas chegam em casa eu coloco elas para lerem, conquistei meus certificados eles sentem muito orgulho, os meus filhos falam que eu não pude aprender coisas melhores mas esse certificado já me deixa boas lembranças até pra eles que estão crescidinhos, pra mim e pros meus amigos (EGRESSA 11).

O curso ajudou, me incentivou a investir mais no artesanato, por que eu já fazia, mas ficava em casa, se falasse vendia, mas se não falasse não vendia. Depois do curso eu fiquei sabendo da Casa das Artes e fiz a minha carteirinha de artesão. Com ela nós podemos viajar para as feiras de artesanato (EGRESSA 12).

Assim, conforme relatos, o programa foi capaz de proporcionar o aumento da autoestima e auxiliou aquelas mulheres que já trabalhavam em determinadas áreas dos cursos, de forma a oferecerem um produto ou serviço com mais qualidade, utilizando as técnicas aprendidas no programa.

Contudo, ainda não foi capaz de fomentar a equidade de gênero, pois a metodologia do programa ao enfatizar as aprendizagens prévias das alunas, oferece qualificação em áreas tradicionalmente femininas, marcadas pelo papel da mulher na sociedade que é de organizar, cozinhar, arrumar, cuidar e costurar. Dessa forma, essas políticas públicas reforçam as relações patriarcais e a divisão sexual do trabalho, por meio da adaptação da mulher ao status quo, como registrado por Stromquist (1996)STROMQUIST, N. P. Políticas públicas de Estado e equidade de gênero: perspectivas comparativas. Revista Brasileira de Educação, n. 1, p. 27–49, jan./abr. 1996., ao analisar políticas públicas educacionais com enfoque no gênero.

5 Considerações finais

Os resultados permitem concluir que o Programa Mulheres Mil teve limitações para o pleno alcance dos objetivos propostos, em termos da redução da pobreza e inclusão das mulheres com risco de vulnerabilidade social no mundo do trabalho. Mesmo com os auxílios financeiros destinados às alunas e à parceria realizada com os Institutos Federais de Educação, a técnica utilizada para a implementação do PMM, dentro da perspectiva “top down”, propiciou reduzida emancipação, não contribuindo para a melhoria do nível de escolaridade e não promoveu capacitação profissional condizente com o mercado laboral local; enfim, não fomentou a equidade de gênero.

Com relação às ações articuladas e intersetoriais, a interlocução entre os demandantes (prefeituras) e os ofertantes (Instituto Federal do Espírito Santo) se mostrou frágil. Essa parceria tem como objetivo avaliar a necessidade de cursos de acordo com a demanda do local de execução do programa, assim como, acompanhar o desenvolvimento das alunas e encaminhar as egressas para o mercado de trabalho. Todavia, na maioria das cidades visitadas, a missão das prefeituras, via CRAS, foi divulgar os cursos para a comunidade e realizar a pré-matrícula, e a atribuição do IFES foi ofertar e realizar os cursos de extensão. Logo, a intersetorialidade foi comprometida porque cada um dos atores envolvidos na política fez o seu papel, sem acompanhamento sistemático e sistêmico da implementação do programa, fato que foi agravado pela rotatividade dos agentes implementadores.

Por meio da metodologia de acesso, permanência e êxito, que se baseia na metodologia de avaliação e reconhecimento de aprendizagem prévia (PLAR) do Canadá, as parcerias realizadas para a implementação do programa determinaram os cursos oferecidos, selecionaram as mulheres e tentaram viabilizar a inclusão produtiva das mesmas. Contudo, o Programa Mulheres Mil, no Espírito Santo, não atingiu plenamente seus objetivos de incluir produtivamente, e também não foi capaz de despertar o desejo de empreender e, apesar de as egressas terem sido informadas sobre o microempreendedor individual, poucas mulheres, que trabalhavam informalmente, se interessaram pelo incentivo. Apenas duas associações foram formalizadas: em Mucurici, esforço do CRAS de Mucurici (ES); e outra em Piúma (ES), fruto do trabalho de uma ex-aluna do programa.

Além disso, o programa, após a sua finalização, não foi capaz de incentivar a continuidade dos estudos, devido a dificuldades que as prefeituras têm na estruturação de turmas que atendam à disponibilidade das egressas, que enfrentam, na maioria das vezes, obstáculos para gerir o trabalho, a casa e a escola, demonstrando a continuidade dos modelos tradicionais de gênero, que sobrecarregam as mulheres, em virtude do tempo consumido com as tarefas do cuidado.

Em função do exposto, recomenda-se a reestruturação do programa, com respeito a sua metodologia, considerando, em especial, os projetos de vida das mulheres. Sugere-se também, uma melhor definição de como os parceiros deverão agir e operacionalizar o programa, para que seja possível a inclusão educacional e produtiva das egressas do PMM.

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  • 1
    Na percepção de Bourdieu (1989BOURDIEU, P. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989., p. 261), as práticas sociais “representam o produto de uma relação dialética entre a situação e o habitus [...] que integrando todas as experiências passadas funcionam em cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações e torna possível cumprir tarefas infinitamente diferenciadas graças à transferência analógica de ‘esquemas’ adquiridos numa prática anterior”.
  • *
    Esse artigo faz parte dos resultados de um projeto de pesquisa financiado pela chamada MCT-CNPq/MDS-SAGI nº 24/2013 e também contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Mar 2018
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2016
  • Aceito
    03 Ago 2017
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