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La naissance de l'architecture scolaire: Lês écoles élémentaires parisiennes de 1870-1914

RESENHAS

La naissance de l'architecture scolaire. Lês écoles élémentaires parisiennes de 1870-1914

Ana Paula Pupo Correia

Mestranda em Educação da Universidade Federal do Paraná. anapupo@hotmail.com

CHÂTELET, A.-M. La naissance de l'architecture scolaire. Lês écoles élémentaires parisiennes de 1870-1914. Paris: Honoré Champion, 1999.

O livro de Anne-Marie Châtelet,1 1 Anne-Marie Châtelet, diplomada pela École Pratique des Hautes Études, de Paris, é Arquiteta e Doutora em História da Arte. Professora da Universidade de Arquitetura em Versailles. Livro publicado: CHÂTELET, A. M. Paris à l'ecole. Paris: Picard, 2000. O nascimento da Arquitetura Escolar, traz os resultados de sua tese de doutoramento, defendida em 1997, na disciplina de Ciências Históricas e Filológicas, da "École Pratique des Hautes Études". O conteúdo desta obra refere-se à arquitetura escolar parisiense, do período de 1870 a 1914. Conforme a própria autora aponta, seu trabalho destaca especialmente o crescimento da escola primária, como obra de grande importância da Terceira República na França.

Ao privilegiar o olhar na arquitetura escolar, Châtelet traz a tona uma importante discussão em relação aos estudos sobre os espaços escolares. Trata-se dos caminhos já percorridos por CARVALHO (1989), WOLFF, (1992), VIÑAO FRAGO E ESCOLANO (1998), SOUZA (1998), MONARCHA (1999), FARIA FILHO (2000) e BENCOSTTA (2001).2 2 CARVALHO, M. M. C. A Escola e a República. São Paulo: Brasiliense, 1989; WOLFF, S. F. S. Espaço e Educação: os primeiros passos da arquitetura das escolas públicas paulistas. São Paulo, 1992. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo; VIÑAO FRAGO, F.; ESCOLANO, A. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. DP&A, 1998; SOUZA, R. F. de. Templos de civilização - a implantação da escola primária graduada no estado de São Paulo (1890-1910). São Paulo: Unesp, 1999; MONARCHA, C. Escola Normal da Praça - o lado noturno das luzes. São Paulo: Ed. da Unicamp, 1999; FARIA FILHO, L. M. de. Dos pardieiros aos palácios. Passo Fundo: UPF, 2000; BENCOSTTA, M. L. A. Arquitetura e espaço escolar: reflexões acerca do processo de implantação dos primeiros grupos escolares de Curitiba (1903-1928). Educar em Revista, Curitiba, n. 18, p. 103-141, jul./dez. 2001. Segundo Frago: "Qualquer atividade humana precisa de um espaço e de um tempo determinado. Assim acontece com o ensinar e o aprender, com a educação. Resulta disso que a educação possui uma dimensão espacial e que, também, o espaço seja junto com o tempo, um elemento básico, constitutivo, da atividade educativa". (1998, p.61)

A importância do tema e a originalidade da obra deve-se aos recursos documentais utilizados por Châtelet. Essas fontes possibilitaram o estudo do espaço escolar mediante plantas arquitetônicas, normas da construção de edifícios estabelecidos pelo Estado, fotografias, revistas e coleções especializadas da época. Além disso, a autora fez uma pesquisa em todo serviço imobiliário da antiga direção de ensino da Prefeitura de Paris e nos documentos do arquivo público da cidade, para saber as datas, o custo e nomes de arquitetos das edificações escolares da época. Essas fontes contribuíram para reviver a importância dos espaços, propiciando uma dimensão significativa para melhor compreender a cultura escolar.

Fundamentada na leitura de Michel Foucault, Châtelet destaca a organização espacial das escolas através da regulamentação de suas disposições, e como esta influenciou o controle e a disciplina. Constatou que a definição precisa da classe e de seu mobiliário revelaram certa prática pedagógica. Estes recursos pedagógicos demonstraram a subordinação do aluno ao exercício de uma coerção: "a disciplina que rende os corpos dóceis" (FOUCAULT, 1999).3 3 "Todos podem ser observados com facilidade e o controle, mesmo que não seja contínuo, acaba por ser incorporado por alunos e professores". (p. 127) FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução: Raquel Ramalhete. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. Para a autora, o controle do espaço determinava o lugar de cada indivíduo e propiciava a submissão dos corpos e o controle dos menores movimentos. Ao analisar o espaço escolar, verifica-se que a dimensão precisa da classe e as posições do mobiliário influenciaram um novo planejamento arquitetônico. Assim, pode-se perceber que a escola primária internalizou as regras impostas pelo Estado e suas definições na arquitetura escolar visam introduzir uma disciplina para "produzir uma nação" e formar "a arma do trabalho".

O argumento central do texto aponta para o desenvolvimento do ensino primário público, decorrente do progresso na construção escolar na França. Naquele momento, verificou-se que o Ministério da Instrução Pública tornou-se uma verdadeira usina de fabricar colégios (p. 10). Em cada cidade, em cada bairro foi construído um edifício escolar que teria louros tanto para a República, quanto para seus representantes, que viam essas escolas como obras de grande importância da arquitetura pública nacional francesa.

No auge da Terceira República, através da campanha de implantação das escolas, foram construídos mais de 300 edifícios escolares, considerados atualmente como patrimônio histórico daquele período. Ao examinar principalmente o caso parisiense, essa pesquisa destacou a intervenção municipal sobre a política predial, assim como a influência da evolução urbana de todas as grandes cidades francesas nas novas construções escolares.

O olhar arquitetônico de Châtelet sobre as escolas, através da análise dos edifícios antigos, procurou detectar quais os edifícios reutilizados ou adaptados e quais os que realmente foram projetados para o fim escolar. Essa pesquisa contribuiu para definir um panorama das escolas e para compreender as grandes etapas do desenvolvimento da arquitetura escolar parisiense. Além da análise dos edifícios, foi pesquisado o orçamento municipal disponível para a construção das escolas nas cidades, o que possibilitou a afirmação da autora que variavam notadamente entre as escolas da cidade e as do campo.

A primeira parte do trabalho a autora consagra ao estudo da política ministerial nos primeiros anos da Terceira República. As leis oficiais definiam a arquitetura dos edifícios escolares, levando em consideração as questões principais sobre a "Maison d'école", e as organizações espaciais que as escolas deveriam seguir. Dentro da organização espacial, destacaram-se os diferentes projetos de sala de aula e como essa organização espacial foi marcada pelos modos de ensino: modo mutual, simultâneo e individual. A autora aponta também as principais leis que regulamentavam a arquitetura escolar, obrigando as cidades a direcionar parte do seu orçamento na construção das escolas, e como essas legislações influenciaram os projetos arquitetônicos das escolas implantadas por toda França.

A eficiência da lei Guizot (1833), para a autora, residia na obrigatoriedade da criação de escolas, por recursos obtidos através de impostos criados pelo Estado. Nos primeiros momentos, as propostas arquitetônicas eram inspiradas nos trabalhos realizados pelo principio pedagógico do modo mutual. Châtelet destaca algumas características importantes dessas leis, como as salas de aula podendo comportar aproximadamente 280 crianças. Nesse momento, o mobiliário não era preocupação de arquitetos e pedagogos, os alunos estudavam em mesas comuns. No modo de ensino mútuo, a posição das janelas era mais alta. Esse ensino necessitava de grande superfície de parede para possibilitar melhor visualização aos quadros de exercícios e, ainda, as janelas altas não permitiam que as crianças vissem a rua, impedindo a distração dos seus deveres. Por outro lado, a lei Boullon (1834) introduziu a obrigatoriedade da ginástica no ensino primário e, pela primeira vez na França, deu-se início à preocupação da construção para essas atividades. Outras leis importantes surgiram para a criação das "escolas-tipo" ou "modelo-tipo" e questões como o melhor lugar para se implantar uma escola, construção adequada, ventilação, aquecimentos, organização do espaço e mobiliário foram objetos discutidos entre o ministério e arquitetos do governo.

Na segunda parte da obra, Châtelet aborda a intervenção municipal na cidade de Paris, mais precisamente a organização e orientação da política financeira. Essa intervenção preocupava-se com a escolha da localização do terreno, dependendo do grau de importância dada à escola. As diferenças sociais eram definidas pelos bairros na cidade de Paris e, com isso, a configuração e a localização do terreno contribuíam para a identidade desses estabelecimentos. Além da localização das escolas, o ministério impôs modelos para os padrões arquitetônicos, definidos por leis e circulares. Essas leis eram aliadas à racionalidade econômica, imposta pela política financeira, entretanto, sem deixar de lado a preocupação estética. Os prédios escolares, por sua vez, não excessivamente luxuosos, deveriam destacar-se das estruturas urbanas e eram identificados como "edifícios escolares republicanos".

A intervenção dos arquitetos, contratados pelo Estado para a execução dos projetos das escolas, foi analisada na última parte do livro. Châtelet aponta que mesmo com a similaridade das plantas arquitetônicos houve mudanças nos traços das fachadas dos edifícios, estas sofreram influências das tendências arquitetônicas da época. Como o arquiteto trabalhava a partir de regras impostas pelo ministério, com o terreno já escolhido e respeitando a legislação vigente, sua independência para criação e execução dos projetos era limitada. Mesmo com esses limites, foi criada em suas fachadas uma diferenciação com características particulares em cada edifício escolar.

Ao direcionar o seu trabalho às escolas, em especial às grandes obras da Terceira República, a autora concluiu que os edifícios escolares respon-deram a diferentes projetos políticos impostos pelo ministério, como: os métodos pedagógicos, as leis financeiras e normas arquitetônicas. É por exigência imposta pelo Estado que "nascem" os edifícios escolares. Conclui, ainda, que o pensamento republicano foi marcado pela corrente racionalista de Augusto Conte. A sociedade, à época moderna, deveria ser organizada como o fundamento da política positivista, conforme as leis da razão. A idéia da arquitetura dirigida por um racionalismo no qual a maior preocupação, em meados do século XIX, não era discutir a importância dos estilos arquitetônicos da época, mas de procurar as principais condições de produção e uso das escolas. No entanto, refletia os inícios dos conceitos da arquitetura escolar da Terceira República. Essa arquitetura chegou a exprimir os ideais da República a tal ponto que seus edifícios são identificados hoje, como "edifícios republicanos" ou como "escolares Jules-Ferry", na qual a maioria dos prédios escolar ainda hoje está em uso.

A arquitetura escolar na França, influenciada pela produção de uma nação, seguia as regras impostas pelo estado; nesse sentido, a escola teve como tarefa a construção do valor social da República. Os discursos entre arquiteto e pedagogo foram determinantes, através do controle, da disciplina e do respeito à hierarquia, para a formação do "novo cidadão" e da "arma do trabalho" para o fortalecimento dos pensamentos republicanos.

Texto recebido em 15 maio 2002

Texto aprovado em 30 jun. 2002

  • 1
    Anne-Marie Châtelet, diplomada pela École Pratique des Hautes Études, de Paris, é Arquiteta e Doutora em História da Arte. Professora da Universidade de Arquitetura em Versailles. Livro publicado: CHÂTELET, A. M.
    Paris à l'ecole. Paris: Picard, 2000.
  • 2
    CARVALHO, M. M. C.
    A Escola e a República. São Paulo: Brasiliense, 1989; WOLFF, S. F. S.
    Espaço e Educação: os primeiros passos da arquitetura das escolas públicas paulistas. São Paulo, 1992. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo; VIÑAO FRAGO, F.; ESCOLANO, A.
    Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. DP&A, 1998; SOUZA, R. F. de.
    Templos de civilização - a implantação da escola primária graduada no estado de São Paulo (1890-1910). São Paulo: Unesp, 1999; MONARCHA, C.
    Escola Normal da Praça - o lado noturno das luzes. São Paulo: Ed. da Unicamp, 1999; FARIA FILHO, L. M. de.
    Dos pardieiros aos palácios. Passo Fundo: UPF, 2000; BENCOSTTA, M. L. A. Arquitetura e espaço escolar: reflexões acerca do processo de implantação dos primeiros grupos escolares de Curitiba (1903-1928).
    Educar em Revista, Curitiba, n. 18, p. 103-141, jul./dez. 2001.
  • 3
    "Todos podem ser observados com facilidade e o controle, mesmo que não seja contínuo, acaba por ser incorporado por alunos e professores". (p. 127) FOUCAULT, M.
    Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução: Raquel Ramalhete. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 1999.
  • Publication Dates

    • Publication in this collection
      04 Mar 2015
    • Date of issue
      Dec 2002
    Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná Educar em Revista, Setor de Educação - Campus Rebouças - UFPR, Rua Rockefeller, nº 57, 2.º andar - Sala 202 , Rebouças - Curitiba - Paraná - Brasil, CEP 80230-130 - Curitiba - PR - Brazil
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