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Editorial

Editorial

A preparação de cada número da Educar em Revista, nos convida sempre a refletir sobre o contexto em que o número virá a público. O número 38, do último quadrimestre de 2010, encerra um ano muito intenso de debates no campo educacional, muito animado no contexto político e muito rico para nosso periódico.

O ano começou com a Primeira Conferência Nacional de Educação - CONAE. Foi um ano de avaliação dos programas de pós-graduação (fechamento do Triênio), todos que aí atuam seja como docentes ou como discentes, sabem que isto é motivo de muito debate na academia. Na educação básica, foi um ano de divulgação de um novo resultado do Índice de Educação Básica - IDEB, e com estas boas notícias e grandes preocupações sobre o que estamos garantindo às novas gerações se impõe. Foi o ano em que fomos à Copa e perdemos, mas também é o ano em que temos eleição para presidente, portanto, os desafios, não apenas educacionais, mas de construção de políticas públicas de superação do nosso cenário de desigualdades precisa/precisou estar em pauta.

A Educar em Revista ingressou, no fim do primeiro semestre, em uma importante base de periódicos a Redalyc, "Red de Revistas Científicas da América Latina y El Caribe, España y Portugal".

Estes episódios não têm relação direta entre si, tampouco com os textos da revista, estes inclusive são produzidos em períodos diferentes, pois a alta demanda pela Educar, se é sempre motivo de festejo pela equipe editorial, pois mostra a consolidação de nosso periódico na comunidade científica, também tem feito os autores esperarem muito para ver sua produção circular.

Mas, o mais interessante ou desafiador no contexto brasileiro, é que nossas reflexões têm mais permanência na conjuntura do que gostaríamos, inclusive. Os grandes desafios para a universalização do acesso à educação, em sentido amplo, que permitiria que nossos alunos da educação básica, do ensino superior ou da pós-graduação convertessem os processos de avaliação em mero espaço de acompanhamento e monitoramento, ainda estão por se fazer. As tensões no campo da avaliação refletem o fato de que ainda temos muito que avançar para garantir uma formação de qualidade as novas gerações de brasileiros, e para isto, precisamos resolver problemas estruturais (muitos apontados no documento da CONAE) que possam fazer diferença em curto prazo na qualidade da instituição escolar.

Os dados do IDEB demonstraram um movimento do sistema educacional na direção de ensinar melhor habilidades de domínio da Língua Portuguesa e da Matemática, em especial desta segunda. Estas são as áreas de avaliação da proficiência dos alunos no sistema. Informa também que o componente fluxo (aprovação, reprovação, evasão) tem sido positivo em termos de inclusão social. Pela composição destes componentes passamos de um IDEB 3,8 para 4,6 (INEP, 2010). Isto é importante e alvissareiro, porém nos desafia a continuar investigando o que mais esta escola está (ou não está) oferecendo às novas gerações.

Mas, ao mesmo tempo, os dados da educação básica revelam que a escola não tem ensinado com a mesma efetividade as habilidades nos dois componentes curriculares citados. Nossos alunos ainda apresentam mais dificuldades no domínio da Língua Portuguesa, pelo menos naqueles quesitos que o Prova Brasil tem sido capaz de mensurar. Os resultados de 2009 revelam que os alunos, em média, alcançaram 204 pontos na proficiência de Matemática e 184 pontos em Português na 4ª série; o mesmo se passa nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Assim, parece pertinente fecharmos o ciclo neste ano com um dossiê intitulado Metalinguagem e aquisição da escrita, organizado por Sandra Regina Kirchner Guimarães, que certamente não tem de responder as demandas do sistema de avaliação, mas demonstra que as preocupações que se explicitam na conjuntura educacional, são substantivas e de longo prazo para os pesquisadores no campo educacional.

Este número, na Sessão de Demanda Contínua, nos brinda com outros enfoques sobre nossos desafios no atendimento de jovens e adultos que não tiveram acesso à escola no tempo esperado, mas continuam sujeitos de direito, na formação de licenciados de diferentes áreas do ensino. E, nos convida a refletir sobre elementos mais amplos da pesquisa social e de como a educação insere-se neste contexto. Assim, cabe passar apresentação desta sessão.

O primeiro artigo da Sessão Demanda Contínua, é de Gladys Beatriz Barreiro, intitulado O "Programa Alfabetização Solidária": terceirização no contexto da Reforma do Estado,, apresenta uma reflexão sobre os contornos que a política educacional assumiu ao longo da década de 1990 com a incorporação de uma lógica privada da gestão pública do Estado. A autora analisa como a flexibilização da forma pública e direta de oferta educacional, institui processos que associam subvenção social pública à execução das políticas por entidades privadas sem fins lucrativos, ou na denominação cotidiana ONGs. Analisando o caso específico de um programa de alfabetização de jovens e adultos, a autora problematiza a concepção das políticas sociais daquele período e suas implicações para a inclusão social, seja do ponto de vista educacional, chamando a atenção para o quanto a forma filantrópica de atendimento aos analfabetos adultos, pode negar a condição de cidadania via a construção de "subjetividades assistidas"; seja do ponto de vista da desmontagem das relações de trabalho, quando todo o programa se sustentava em vínculos temporários dos alfabetizadores.

O segundo artigo, de Ariella Silva Araujo, Ligiane Raimundo Gomes intitulado A noção de mobilidade social em Adolescentes, apresenta resultados de pesquisa que podem ser um instrumento importante de reflexão para os professores e estudantes da licenciatura em Ciências Sociais, uma vez que, a inclusão dos conteúdos de sociologia no Ensino Médio, faz com que, segundo a autora, seja tarefa destes "profissionais entender melhor esse desenvolvimento a fim de que eles possam elaborar intervenções mais significativas dentro de sua área". A pesquisa, realizada com 20 adolescentes no Estado de São Paulo, utiliza-se do método clínico piagetiano com questões que permitiram reflexões sobre a mobilidade social a partir da conversa sobre o que é ser rico/pobre na sociedade atual. Segundo a autora, a pesquisa encontrou evidências da dificuldade de compreensão dos conceitos sociais, fato flagrado nas "muitas das respostas (...) de caráter episódico e personalizado".

Ainda no campo da reflexão sobre a formação de professores nos cursos de licenciatura, o terceiro artigo de Ilse Abegg, Fábio da Purificação de Bastos e Felipe Martins Müller, intitulado Ensino-aprendizagem colaborativo mediado pelo WIKI do MOODLE. O artigo apresenta uma análise sobre o uso de uma ferramenta de colaboração em rede para atividades de resolução de problemas na disciplina de didática no curso de licenciatura em Física. Os problemas relativos ao domínio do instrumento e, especialmente, a dificuldade ainda de processos de aprendizagem mais coletivos e compartilhados, fazem do texto uma boa conversa sobre metodologia de ensino na escola atual.

De outro ponto de vista, o quarto texto deste número, também se preocupa com a formação construída no universo das licenciaturas. O texto A afetividade na relação professor-aluno e suas implicações na aprendizagem, em contexto universitário, de Renata da Silva Veras e Sandra Patrícia Ataíde Ferreira, apresenta resultados de uma pesquisa qualitativa que, utilizando a triangulação de observação, entrevistas e o suporte teórico de Wallon, reflete sobre o universo das relações professor aluno no curso de licenciatura em Pedagogia. Segundo as autoras, a pesquisa permitiu afirmar que neste contexto "adotar sentimentos de acolhimento e atenção no processo ensino-aprendizagem, bem como ao tomar decisões comprometidas com o desenvolvimento de todos" favoreceu "a compreensão, aceitação e valorização do outro" possibilitando "a promoção de uma experiência positiva da aprendizagem".

O quinto artigo trata do tema da juventude Escola e participação juvenil: É possível esse diálogo? de Juarez Dairell, Nilma Lino Gomes e Geraldo Leão. Neste relato, os autores traçam um perfil de quem é o jovem na região metropolitana de Belo Horizonte e apresentam um quadro que pode ajudar a refletir sobre as características da condição juvenil em qualquer grande centro urbano. Tais dados são o contexto para os autores analisarem que perspectivas os jovens tem para a participação e quanto a escola tem contribuído, ou não, para construir experiências de participação cultural, política e social entre os estudantes.

O sexto artigo de Eduardo Galak, El cuerpo y la policía. Una mirada de la incorporación y de la subjetivación en la educación a través de la película "Tropa de élite", nos chama a uma reflexão bastante ampla em termos educacionais. A partir da situação social problematizada no filme Tropa de Elite, do diretor brasileiro José Padilha, o autor discute o que é a tensão entre uma educação que forma corpos disciplinados e conformados ou sujeitos emancipados. Para isto, propõe uma interessante reflexão a partir dos conceitos de política e polícia, especialmente em Ranciere, ainda que não apenas nele. Para o filósofo Ranciere, a política é o espaço da igualdade, mas que se constrói pelo dissenso, por um convívio que possibilita a construção de uma subjetividade autônoma; enquanto a polícia é o espaço é o lugar da administração da vida coletiva, da reprodução de hierarquias. As reflexões de Galak não são imediatas, mas convidam a novos passeios sobre a produção de subjetividade na escola.

Este número da revista conta ainda com dois artigos da área de História da Educação, o sétimo texto, de Maria Aparecida Leopoldino Toledo intitulado A disciplina de história no Paraná: compêndios escolares, ensino secundário e formação de elites intelectuais, nos convida a uma incursão sobre a constituição da disciplina de História e a reflexão sobre o papel da "da obra de Dario Persiano de Castro Vellozo e sua atuação na instituição de ensino secundário paranaense".

O oitavo artigo, também da área de História, ocupa uma sessão interessante da revista, a sessão Conferências. O artigo é resultado das análises apresentadas pelos autores durante o evento de Comemoração de 10 anos de existência da Linha de Pesquisa História e Historiografia da Educação, do Programa de Pós-graduação em Educação, da Universidade Federal do Paraná, proferida e convertida em artigo pelos Professores Marcus Levy Albino Bencostta e Diana Gonçalves Vidal. A partir de reflexões sobre o campo da História da Educação no cenário científico nacional, os autores apresentam um balanço quantitativo e qualitativo da produção da linha na UFPR e provoca boas reflexões sobre os desafios de consolidação da pesquisa em educação em nossas instituições.

Finalmente, na Sessão Resenhas, temos a contribuição de Diogo Roriz que nos convida a leitura da obra de Boris Fausto, O crime do restaurante chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30, livro de 2009, que segundo avaliação do resenhista apresenta uma contribuição importante para a análise da produção da pesquisa em história a partir da abordagem da "micro-história", porém com a forma peculiar de Boris Fausto.

Boa Leitura a todos!

Andréa Barbosa Gouveia

Paulo Vinicius Baptista da Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2010
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