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“Eu sou do interior... eu vim estudar em Porto Alegre” : memórias de experiências sensíveis em uma moradia estudantil (1974-1983)

“I am from the countryside… I came to study in Porto Alegre”: memories of sensible experiences in a student residence (1974-1983)

RESUMO

Inscrita no campo da História da Educação, o estudo investiga as memórias de cinco mulheres que, na condição de estudantes, habitaram a Casa Estudantil Universitária de Porto Alegre (CEUPA), entre 1974 e 1983. Por meio da metodologia da História Oral, busca-se conhecer quem são elas, as motivações para ingresso na Casa, bem como perceber possíveis marcas do período vivido na instituição em seus processos formativos. Entende-se a CEUPA como instituição educativa, isto é, um lugar que educa os jovens que lá estão, considerando as aprendizagens desenvolvidas que podem transcender os espaços formais de educação. É possível dizer que a presença feminina nesta moradia representa a expressão de luta das mulheres, em décadas pretéritas, para conquistarem outras inserções na sociedade brasileira, através do investimento no ensino superior. Essas narrativas que resistiram ao tempo indicam memórias que comovem, evidenciam percursos que, de certo modo, romperam com modelos femininos vigentes. Entre disputas e afetos, conseguiram ocupar, ainda que timidamente, posições de liderança na Casa. Em meio a cumplicidades, construíram estratégias que lhes permitiram o exercício de autonomia e de solidariedade no espaço de convivência estudantil. A pesquisa toma por inferência o entendimento do tempo que estiveram na residência estudantil como uma experiência sensível nas biografias das moradoras, que produz ressonâncias nos seus itinerários, tendo em vista que, para muitas, foi talvez a única possibilidade de permanência no ensino superior.

Palavras-chave:
Casa de Estudante; História Oral; Casa Estudantil Universitária de Porto Alegre; História da Educação.

ABSTRACT

Situated within the field of history of education, the study investigates the memories of five women who, as students, lived in the University Student House of Porto Alegre (CEUPA), between 1974 and 1983. Through the methodology of oral history, this investigation seeks to know who they are, their motivations to live in this house, as well as possible traces of the period they lived in this institution left on their educational process. CEUPA is understood as an educational institution, that is, a place that educates young people who live there, considering that learning processes can go beyond formal spaces of education. It is possible to say that the feminine presence in this house represents the expression of women's fight, in past decades, to conquer other spaces in Brazilian society, through the investment in higher education. These narratives that resisted time indicate moving memories and reveal trajectories that, in a certain way, broke feminine models that prevailed at the time. Between disputes and affections, they conquered, although timorously, leadership positions in the house. Among actions of complicity, these women constructed strategies that enabled the exercise of autonomy and solidarity in a context of student coexistence. This research infers that the time they lived in the student residence was a sensible experience in the biographies of these former residents, producing resonances in their trajectories, because, for many of them, it was perhaps the only possibility of permanence in higher education.

Keywords:
Student residence; Oral History; University Student House of Porto Alegre; History of Education.

Um lugar para morar: a CEUPA

Neste texto, discutem-se memórias da experiência do morar em uma Casa de Estudante. Inscrita no campo da História da Educação, nas interfaces com os estudos da História das Instituições Educativas, tem-se como objeto de estudo uma moradia estudantil localizada em Porto Alegre, que, desde o final da década de 1960, se caracteriza pela autogestão. É a Casa Estudantil Universitária de Porto Alegre (CEUPA), fundada em 1950.

Por meio de testemunhos, produzidos a partir das referências metodológicas da História Oral, pretende-se discutir as memórias desta moradia estudantil em um grupo de cinco mulheres que habitou a Casa nos anos de 1970 e início dos anos 1980. Assim, a pesquisa propõe-se a indagar quem são elas, de onde vêm, quais as motivações que as levaram a buscar esse tipo de residência. Entendendo as Casas de Estudantes como lugares que promovem, de certo modo, o acesso e a permanência no ensino superior, objetiva-se investigar a possível atuação da instituição em questão na formação dessas mulheres. Portanto, indaga-se: Quais os significados de morar nesse lugar? Em que medida o “ato de habitar” (RICOEUR, 2007RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007.) a CEUPA pode ter produzido marcas nesses sujeitos, provocando ressonâncias em seus itinerários de vida? Essas são perguntas que atravessam a concepção da pesquisa que toma por inferência a percepção do período vivido em residência estudantil como uma experiência sensível nas biografias de seus ocupantes, tendo em vista que, para muitos, foi, quiçá, o único meio de se manterem na condição de estudantes, pela segurança de poder contar com um lugar que os acolhesse.

Ricoeur (2007RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007., p. 58) discute os significados da memória dos lugares associados à memória corporal, “as ‘coisas’ lembradas são intrinsecamente associadas a lugares E não é por acaso que dizemos, sobre uma coisa que aconteceu que ela teve lugar”. Segundo o autor, “o ato de habitar constitui a mais forte ligação humana entre data e lugar”, portanto, aqui se entende as Casas de Estudantes como “lugares memoráveis” (RICOEUR, 2007RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007., p. 59), capazes de evocar potentes lembranças entre aqueles que as habitaram por um período de suas existências.

Essa organização estudantil está ancorada no conceito de instituição educativa (MAGALHÃES, 2004MAGALHÃES, J. P. de. Tecendo Nexos: história das instituições educativas. Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2004.). Trabalha-se aqui com uma noção ampliada do processo educativo, para além da escolarização, interessada em buscar, por meio da construção de uma história dessa instituição, memórias das experiências dos sujeitos habitantes. Magalhães (2004MAGALHÃES, J. P. de. Tecendo Nexos: história das instituições educativas. Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2004.) expande esse conceito, ao identificar nas sociedades a existência de instituições que se apresentam de formas diferenciadas e hierarquizadas, sendo, no entanto, todas elas educacionais. Nesse sentido, a moradia estudantil inscreve-se como instituição educativa, considerando sua capacidade de se colocar como lugar formativo para seus moradores.

No desenvolvimento da pesquisa, encontraram-se narrativas que resistiram ao tempo. Essas “vidas banais” (FOUCAULT, 1996FOUCAULT, M. La vida de los hombres infames. Buenos Aires: Editorial Altamira, 1996. p. 175-201.) estiveram nos anos 1970 e/ou 1980 em uma Casa de Estudantes. Movida por um desejo de “restaurar um esquecimento”, tomada pelo gosto de colocar-se a “encontrar os homens [e as mulheres] através dos traços que eles deixaram” (CERTEAU, 2008CERTEAU, M. de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008., p. 46), procuraram-se rastros de outrora, de certo modo ainda presentes na situação autogestional de muitas dessas moradias. Trazendo Ricoeur (2007RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Unicamp, 2007., p. 48) mais uma vez para a discussão, pretende-se com esses escritos instaurar uma “luta contra o esquecimento”. O ato de rememorar, a luta para não esquecer, insere-se nas possibilidades múltiplas de elaboração das representações daquele tempo vivido, um tempo em que as narradoras estavam na condição de jovens universitárias que encontraram um lugar que as abrigasse.

Nesse sentido, aqui se destacam as potências dos documentos orais, documentos que não estão nos arquivos institucionais, mas são produzidos pelo historiador, em uma troca dialógica, por meio de entrevista, evento em que se agregam questões relacionadas à memória, à narrativa e às subjetividades (PORTELLI, 2016PORTELLI, A. A arte da escuta. Rio de Janeiro: Letra e Voz, 2016.). Assim, Portelli entende a História Oral como “arte da escuta”, em que, ao mesmo tempo, temos acesso “ao significado histórico da experiência pessoal, por um lado, e ao impacto pessoal das questões históricas, por outro” (PORTELLI, 2016PORTELLI, A. A arte da escuta. Rio de Janeiro: Letra e Voz, 2016., p. 16). Na entrevista, quem lembra “não recorda passivamente os fatos, mas elabora, a partir deles e cria significado através do trabalho de memória e do filtro da linguagem” (PORTELLI, 2016PORTELLI, A. A arte da escuta. Rio de Janeiro: Letra e Voz, 2016., p. 18).

Cabe dizer que a escolha em pesquisar essas moradias autogeridas, implica em adentrar por caminhos “às margens do instituído” (CUNHA, 1999CUNHA, M. T. S. Nas margens do instituído: memória/educação. História da Educação, ASPHE, FaE, UFPel, Pelotas (5), p. 39-46, abr. 1999.). Ou seja, para aquele que vivia em uma Casa Estudantil mantida pela Universidade, por exemplo, a preocupação com o mínimo necessário para sua subsistência, em tese, não existia. Distinta é a situação das residências autogestionadas, por estarem em situação periférica, eram/são necessárias ações coletivas contínuas por parte de seus integrantes na intenção de promover sua sustentabilidade. Sendo assim, por meio das narrativas desse grupo de mulheres, também se deseja discutir os modos de organização dessa Casa e analisar os sentidos e as formas de ser/estar estudante nessas coletividades em décadas pretéritas.

As informações preliminares dos itinerários dessas instituições1 1 Para maiores informações sobre Casas de Estudante em Porto Alegre, consultar HINTERHOLTZ, Marcos (2017). indicam histórias de abandonos, de lutas e de resistências vividas por aqueles e aquelas que tinham nessas moradias uma espécie de fortaleza, que lhes garantia onde morar. E, nesse sentido do esquecimento, das invisibilidades, cumpre dizer que as pesquisas até o momento indicam que a temática da moradia estudantil ainda é pouco visitada pela historiografia da educação, assim como na produção científica brasileira de um modo geral. Isso pode ser decorrente da redução desses espaços ao seu caráter de assistência estudantil, em abordagens que não os contemplam enquanto lugar de educação e de troca de saberes. Portanto, como pesquisadora, percebo que o “estado da questão” (CERTEAU, 2008CERTEAU, M. de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.) das Casas de Estudante pelas lentes da História da Educação no sul do Brasil está por se fazer.

E o que se sabe sobre essa Casa de Estudantes? Sua idealização2 2 Informações consultadas no site institucional da CEUPA (www.ceupa.com.br). resulta de uma iniciativa da Associação dos Ex-Alunos do Colégio Sinodal3 3 Escola fundada pelo Sínodo Rio-Grandense, entidade constituída por imigrantes alemães e seus descendentes, seguidores da religião evangélica de confissão luterana, em São Leopoldo/RS. (AEACS), instituição de confissão evangélico luterana, localizado em São Leopoldo, município fundado por imigrantes alemães e que compõe a região metropolitana de Porto Alegre. Em 1950, essa Associação alugou um prédio e constituiu a "Casa do Ex-Aluno do Colégio Sinodal", destinada a abrigar em Porto Alegre, estudantes oriundos daquele estabelecimento de ensino que ingressariam no ensino superior. A princípio, foram oferecidas vinte vagas no prédio que se localizava na Rua General Vitorino, no Centro Histórico da cidade. Em 1954, após uma campanha onde foi rifado um automóvel, foi adquirida uma casa na Rua Sarmento Leite, em uma região bem próxima ao Centro Histórico, o bairro Cidade Baixa. Diante da percepção de aumento da demanda pela moradia estudantil e da necessidade de atender estudantes, não exclusivamente do Colégio Sinodal, a Casa transformou-se e, em 1960, assumiu a nomenclatura Casa do Estudante Evangélico do Rio Grande do Sul (CEERGS). Entretanto, ainda permanecia a forte vinculação com a Igreja Evangélica de Confissão Luterana. Na década de 1960, as informações consultadas indicam que foram adquiridas mais duas unidades no mesmo bairro, uma delas seria a residência para as moças, por meio dos recursos advindos da Igreja Luterana. Destaca-se que, naquela temporalidade, já se manifestava uma preocupação com o oferecimento da moradia estudantil não apenas para os rapazes, o que evidencia a presença das mulheres no ensino superior.

Essas três unidades garantiriam moradia para 68 estudantes, mas, a partir daí, instituiu-se a autogestão, a responsabilidade pela manutenção da Casa passaria aos estudantes. Assim, foi em 1968 que se chegou à nomenclatura atual, Casa do Estudante Universitário de Porto Alegre, que não mais comporta a presença da Igreja Luterana. A CEUPA congregou os moradores das três unidades, próximas umas das outras: a Casa I, a mais antiga, a sede, na Rua Sarmento Leite; a Casa II, na Rua José do Patrocínio; e a Casa III, na Rua Luis Afonso, residência exclusiva das moças até meados dos anos 1980.

Feitas essas considerações acerca da história da instituição, cabe dizer que se pretende neste texto, a partir das narrativas de memória de cinco antigas moradoras da CEUPA, capturar “pequenas atmosferas” da Casa (VILLA, 1925VILLA, J. M. Una habitación histórica de la residência de estudiantes. Madri, 1925., p. 7), empreender uma busca articulatória das representações em torno de suas participações naquela coletividade, promovendo leituras de como tais experiências foram subjetivadas na formação pessoal de cada uma das entrevistadas. Trata-se de uma procura por representações para além da oficialidade dos estatutos que regeram a Casa, das atas das assembleias e da imprensa local. A proposta é, desse modo, refletir sobre as formas de significação dessa experiência, multiplicando4 4 O sentido de “multiplicar” não está em apresentar um caso individual, mas em contribuir na introdução de um caso particular na composição de um quadro sobre o universo estudantil universitário da Porto Alegre das décadas de 1960 e 1970. Certeau destaca a diferença entre o particular e o individual, para quem o conhecimento histórico busca medir os “desvios com relação às construções formais presentes” (CERTEAU, 2008, p. 86) O particular, neste sentido, está no “limite do pensável” (CERTEAU, 2008, p. 87). Mas adverte: “Não é possível ser pensando se não for universal” (CERTEAU, 2008, p. 87). as imagens sobre o ser estudante universitário em Porto Alegre em outras temporalidades.

Para que a pesquisa se expanda, é preciso uma imersão “nos silêncios, nas palavras e nas coisas” (ESCOLANO, 2015ESCOLANO, A. Arqueologia y rituales de la escuela. In: MOGARRO, M. J. (Org.). Educação e Patrimônio Cultural: Escolas, Objetos e Práticas. Lisboa: Edições Colibri, 2015. , p. 17), é preciso, por meio da análise dos vestígios que restaram, tentar chegar perto da complexa convivência estabelecida na moradia. Como um voyeur, perseguir os véus do tempo, entrar naquele lugar, caminhar por seus espaços, observar os pormenores, os murais com recados diversos, os livros nas estantes, a disposição dos móveis. Assim, imaginar o passado é uma perspectiva da qual não se escapa. Como seriam as convivências? O que conversavam? Como eram os jantares, os fins de semana? O que decidiam nas reuniões? Que conflitos se instalavam? Que cumplicidades se construíam? Seguindo nas trilhas de um tempo que passou, acompanha a pesquisadora uma espécie de desejo de abrir sorrateiramente as portas de cada quarto, espiar quem está lá dentro, o que faz, o que lê. É preciso buscar esses indícios esquecidos de uma instituição que ainda acolhe estudantes nos mesmos prédios habitados por aqueles que lá viveram os anos 1960 e 1970. Por fim, pretende-se, com este estudo, dar movimento a algo que pode estar em uma espécie de quietude e, a partir daí construir uma trama investigativa, tendo como personagens aqueles e aquelas “[...] sobre cujo silêncio foi construída a história” (RANCIÈRE, 1995RANCIÈRE, J. Sobre a história das mulheres no século XIX. In: DUBY, G.; PERROT, M. As mulheres e a História. Lisboa: Rolo & Filhos Artes Gráficas, 1995. , p. 54).

Assim, foram entrevistadas cinco mulheres até o momento, antigas moradoras da CEUPA (Quadro 1). As análises de suas narrativas permitem a produção deste texto que toma a fonte oral como documento privilegiado.

QUADRO 1
INFORMAÇÕES ACERCA DAS ENTREVISTADAS

Considero importante apresentar, em linhas gerais, os percursos da pesquisa. Primeiramente, entrei em contato com a Casa e solicitei autorização dos atuais integrantes para iniciar o trabalho. Dessa aproximação inicial, deu-se a indicação da primeira entrevistada, Gladis, mãe de uma estudante do Curso de Pedagogia/UFRGS. Na sequência, uma possibilidade de entrevista com Maria de Fátima, que pode ser avaliada como algo da ordem do imponderável. Por sua vez, ela sugeriu que conversasse com Lucia e Cornélia, que lembrou de Eva. As quatro tiveram alguns momentos de convivência na Casa, considerando-se que os tempos de moradia não são exatamente iguais entre as narradoras. Percebe-se que Lucia, Cornélia e Maria de Fátima mantêm laços de amizade, ainda são próximas pelas redes de afeto e afinidades políticas que estabelecem. Gladis é aquela que está mais distante, embora compartilhe com as demais visões de mundo semelhantes. Essas são ponderações importantes que produzem implicações na construção dessa versão de uma história da CEUPA.

Com exceção de Lucia que desejou ir à Faculdade de Educação/UFRGS para ser entrevistada e Eva que pediu para a conversa acontecer em seu local de trabalho, as demais me receberam em suas casas. Todas, apesar de suas singularidades, pareciam estar dispostas a falar, a rememorar o tempo vivido na CEUPA. Cornélia é, entre as cinco, a única que não tem filhos, mas apenas Lucia é casada. Ela reside em Canoas, município da região metropolitana; as demais vivem em Porto Alegre, na mesma cidade que buscaram para continuar a estudar no ensino superior.

Quatro delas, Fafá, Lucia, Eva e Cornélia foram alunas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS, apenas Gladis estudou nas Faculdades de Porto Alegre/FAPA, uma instituição de ensino superior privada e distante da região central da cidade. Importa destacar que, ao consultar os arquivos da instituição, nas décadas de 1970 e 1980, verificou-se que muitos estudantes, homens e mulheres, não eram alunos da UFRGS, mas da Pontifícia Universidade Católica/PUCRS, da Universidade do Vale dos Sinos/UNISINOS e da FAPA, instituições privadas de ensino superior. Aquele era um tempo em que poucos conseguiam ingressar na universidade pública, os que tomavam assento nos cursos oferecidos pela UFRGS, muitas vezes, vinham de camadas elitizadas da sociedade.

As cinco mulheres buscaram uma formação superior vinculada às humanidades, sendo este, possivelmente, mais um elemento que as aproxima. Assim, três delas cursaram Ciências Sociais, as demais ingressaram nos Cursos de Letras, História e Jornalismo. Cumpre salientar que duas deram continuidade aos estudos em nível de pós-graduação stricto sensu, Lucia é Doutora em Educação e Cornélia Doutora em Antropologia. Como entender essas afinidades pelas humanidades? Naqueles anos 1970 e 1980, os discursos dominantes ainda insistiam em inscrever a mulher em um determinado ideal de formação, de certo modo feminilizado, o qual era legitimado pela sociedade vigente.

Como já dito, a CEUPA tem, em suas origens, uma forte relação com a Igreja Evangélica de Confissão Luterana. Portanto, naquela temporalidade, era até certo ponto comum que moças praticantes dessa religião, comumente de descendência alemã, procurassem a instituição, foi o caso de Cornélia, filha de um pastor luterano, e de Lúcia, ambas naturais de Cachoeira do Sul. Gladis se insere nessa situação, pois é natural de um distrito de Cachoeira do Sul, conta que, no seu desejo de vir para Porto Alegre, teve ajuda de uma pessoa ligada à Igreja Luterana que a aproximou da CEUPA. Para as demais, a notícia sobre a existência da Casa se deu por diferentes modos. Todas afirmam que havia um processo de escolha, com entrevistas, e era grande o temor de não serem aceitas, nas palavras de Cornélia (2017ECKHERT, Cornélia. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.), “na seleção, eu me lembro que falei que eu queria demais, que não pressupunha outra possibilidade sem ser na Casa de Estudante. Eu tinha medo, porque tinha contatos na Casa, amizade com um pessoal mais velho, que isso fosse uma má influência. Aí consegui entrar”.

Entre todas as entrevistadas, apenas uma negra, Eva, aquela que foi mais econômica nas palavras, talvez por ter residido por pouco tempo na Casa, foram apenas seis meses. Chama atenção, entretanto, que, diferente das outras, ela lá ingressou por tempo determinado. Explica que sua entrada na CEUPA se deve ao fato da saída temporária de uma moça que viajara para a Alemanha e, assim, surgiu uma vaga; mas, no seu retorno, Eva precisou deixar a moradia.

Interessante o fato de Lucia e Cornélia terem residido na CEUPA, junto com suas irmãs. Ainda com relação à seleção para ingresso, Lucia lembra sua preocupação diante da possibilidade de ambas, ela e a irmã, não serem aceitas, pois, de acordo com o que narrou, seria muito difícil para a família se apenas uma pudesse continuar a estudar. Mas as duas conseguiram, ao mesmo tempo, experimentar a moradia estudantil. Tal situação faz pensar nas possíveis influências da Igreja Luterana nesse processo de entrada/permanência na Casa. E então, fica o questionamento: por que Eva não conseguiu conservar-se na CEUPA? Teria a questão étnico-racial alguma relação com a provisoriedade de sua situação?

Gladis (2017LUDWIG, Gladis. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.) explica que os critérios para poder integrar-se à Casa eram “ser carente, tinha que ser do interior, tinha que estar cursando a faculdade ou cursinho pré-vestibular”. Nesse sentido, Maria de Fátima lembra que quando ingressou, em 1974, era estudante de cursinho pré-vestibular. Lucia (2017PRASS, Lucia. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.) comenta que, no dia da seleção, acreditava que pessoas ligadas à Igreja Luterana interferissem no processo de escolha, mas logo percebeu que não, “o pessoal era bem independente, fizeram a entrevista, perguntaram coisas que nem imaginava, enfim. E a gente tinha que comprovar a questão da renda”. Além disso, destaca que era necessário explicitar essa “disposição para dar conta das tarefas”, continua dizendo que “tu tinhas que dar conta das tuas coisas, tu tinhas que também lavar tua roupa, se virar”.

Em comum, narraram histórias comoventes, são memórias de mulheres que enfrentaram, cada uma a seu modo, as adversidades que a vida lhes apresentou. As frases "Eu sou do interior... Eu vim estudar em Porto Alegre” foram recorrentes nas entrevistas e marcam o início da construção discursiva. Por considerá-las emblemáticas, agiram como fios condutores das narrativas, portanto, foram escolhidas para intitular este texto.

Portanto, todas vieram de diferentes lugares do Rio Grande do Sul, essa era uma das condições para estar na CEUPA. Maria de Fátima e Eva vieram de regiões longínquas de Porto Alegre. Nenhuma afirmou ter outra possibilidade de permanecer no ensino superior. Tendo em vista as condições econômicas das famílias das cinco mulheres, como para tantos outros e outras, parece ter sido muito importante residir em uma moradia estudantil. Todavia, nem todas foram de imediato para a CEUPA. Gladis, Maria de Fátima e Eva indicaram a passagem por pensões em condições provisórias. Eva (2018CARDOSO, Eva. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2018.) diz que morava “aqui e acolá”, sugerindo a ausência de um lugar determinado que considerasse sua casa. Maria de Fátima (2017SOUZA, Maria de Fatima. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.) explica que trabalhava em um bar que se localizava próximo da CEUPA e ali ficou sabendo de sua existência. Assim, foi por influência de um morador, que veio a ser seu grande amigo, que a conduziu até a residência em questão, em suas palavras “foi através dele, na verdade, que eu fui morar na Casa do Estudante, aí eu sai da minha tia em 1974”.

Cada entrevista permitiu perceber peculiaridades das narradoras. Gladis pareceu ser a mais ousada, afinal, ela e outra colega, em 1982, ocuparam a Casa I, uma das unidades dos rapazes, inaugurando o princípio da moradia mista, que prevalece até o presente. Maria de Fátima e Eva, pelo que disseram, deixam perceber que, entre as cinco, eram as que mais enfrentavam dificuldades econômicas para se manter em Porto Alegre. Maria de Fátima que vinha de uma família de Uruguaiana com quinze irmãos, conta que trabalhou em lavanderia e bares. Mas a vida lhe reservara outras dificuldades vividas no contexto da moradia estudantil. Em pouco tempo, engravidou de seu namorado, também morador da Casa. Ela precisou deixar em suspenso o sonho de estudar, voltou para sua cidade natal e lá teve seu bebê, tentou se manter trabalhando em Uruguaiana, mas não conseguiu. Assim que o filho estava um pouco maior, retornou para Porto Alegre e foi acolhida, mais uma vez, pela CEUPA. Percebe-se que, para Eva, apesar do pouco tempo, a experiência da moradia estudantil foi intensa, pois explica que, logo em seguida, exercitou outras aprendizagens da vida em coletivo, filiou-se ao recém-criado Partido dos Trabalhadores (PT)5 5 Segundo Schwarcz e Starling (2015, p. 477), “a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), em 1980, significava a criação de um partido de massas que se organizava de baixo pra cima, estava pronto a incorporar a experiência de luta dos sindicatos operários e dos movimentos populares, e pretendia obter capilaridade social nas periferias das cidades e na área rural. O PT nasceu da ação dos trabalhadores, com o objetivo de reafirmar, por meios democráticos, o papel da luta social e do princípio igualitário na transformação da sociedade brasileira”. e participou das lutas do Movimento Negro Unificado. A adesão ao discurso do Partido dos Trabalhadores não atingiu apenas a Eva, pois Lucia também passou pelo que chama “uma transformação”, de moça interiorana, com casamento em vista, desiste do noivado em Cachoeira do Sul e, nesse processo de reinvenção de si, converte-se em militante do PT. Enfatiza que essa construção se deve à CEUPA, identifica o lugar como espaço educativo para formação de lideranças, explicou que “o Partido nasceu dentro da CEUPA”. Por fim, o que dizer de Cornélia? Uma antropóloga, estudiosa de memória, professora universitária, que conseguiu construir sínteses preciosas sobre as vivências na Casa, assumiu suas dificuldades em deixar aquela moradia. É, entre as cinco, aquela que lá permaneceu por mais tempo. Sua entrevista possibilita perceber as questões de gênero que atravessavam as relações que se estabeleciam entre as moradoras da Casa III e os moradores das Casas I e II.

Ao que tudo indica, a proteção de contar com uma moradia permitiu a essas mulheres (exceto Eva) a viabilidade de iniciarem/darem continuidade à formação em nível superior. Eva chama a atenção para o fato de que “todas eram trabalhadoras, todas!”. Essa é uma evidência da situação das entrevistadas que permite pensar que não estavam apenas na condição de estudantes, estavam, de modos distintos, inseridas no mundo do trabalho. Pode-se dizer que são mulheres, em certa medida, precursoras, que deixaram suas referências familiares e vieram para a cidade grande em busca de outro tipo de vida.

Estar na Casa: entre disputas e afetos

Na busca por produzir uma inteligibilidade acerca dos possíveis significados do morar nesta Casa de Estudante para os sujeitos desta pesquisa, importa discutir questões atinentes às relações cotidianas que se efetivavam, por meio da análise de seus testemunhos.

Como primeiro tema, interessa investigar como se davam as relações entre rapazes e moças. Convém lembrar que até o início dos anos 1980, as residências não eram mistas, das três unidades que constituem a CEUPA, uma era destinada às moças. Nesse sentido, Maria de Fátima explica que, nos anos 1970, a participação política, no que se refere à gestão da Casa, ainda era dominada por rapazes, as moças atuavam de modo periférico. Segundo as narradoras, tudo que dizia respeito à autogestão era discutido em assembleias, algumas diziam respeito a cada unidade da CEUPA, outras envolviam a instituição por inteiro. Lucia lembra que “nas assembleias das gurias os assuntos eram esses... relacionamento, situações envolvendo os cuidados”. E explica que essa era uma diferença em relação às reuniões das unidades habitadas pelos rapazes.

Esclareceram que as assembleias iniciavam somente após as 23h, para aguardar aqueles e aquelas que estudavam/trabalhavam à noite e se estendiam madrugada adentro, eram “discussões intermináveis” (GLADIS, 2017LUDWIG, Gladis. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.), momentos de exercício de democracia em um tempo de pequena abertura política no país. Entretanto, Cornélia (2017) destaca que, nessas reuniões mistas, os discursos dos rapazes costumavam ser muito longos e as moças pouco falavam, ficavam a observar. No mesmo sentido, Eva percebe uma participação protocolar das moças nesses eventos deliberativos, assim ela diz “como sempre, né? Eles só queriam as mulheres pra fazer ata! A ata deixa pras mulheres, mas a fala era deles!”. Isso faz pensar nos lugares de sujeito historicamente ocupados por mulheres e homens em diferentes espaços. Apesar de terem direito a ocupar vagas em uma das três unidades da CEUPA, o que se nota, pelos documentos orais analisados, é que, naquela temporalidade, as mulheres pouco atuavam na gestão da instituição.

Nessa perspectiva, chama atenção a fala de Cornélia em relação aos cargos de gestão da Casa, especialmente, os de mais alta hierarquia, que, no tempo em que lá esteve, jamais foram ocupados por mulheres, o máximo que conseguiam eram funções de secretária, tesoureira, típicas ações de assessoramento e não de comando. Reforça essa situação a narrativa de Gladis que, apesar da ousadia de ter ido morar em uma das casas dos rapazes, diz “eu nunca participei dessa gestão, eu nunca fui de nenhuma diretoria, nada, eu ainda estava bem assim, perdida. Mas pelo que eu via, eles iam aos gabinetes dos deputados pedir dinheiro, faziam campanhas, até iam pro sinal, eles faziam, iam pedindo”. Observa-se que não se inclui em nenhuma atividade, refere-se a “eles” como os responsáveis pelas dinâmicas de sustentabilidade da Casa. Ainda sobre este tema, em meio às recordações do cotidiano, Eva destaca os embates que se davam pelos usos dos espaços coletivos nas três unidades. A Casa I é aquela que conta com um amplo pátio, desfrutado pelos moradores para realização de práticas esportivas e atividades festivas. Segundo a entrevistada, conflitos aconteciam de modo recorrente, pois os rapazes criavam obstáculos para permitir que as meninas jogassem vôlei no pátio.

Para discutir as relações de gênero e os campos de disputas entre rapazes e moças da CEUPA, Louro (2004LOURO, G. L. Mulheres na Sala de Aula. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Editora da UNESP, 2004.) explica a importância de compreender as representações do masculino e feminino como construtos históricos, que, ao longo do tempo, indicaram os lugares que homens e mulheres deveriam ocupar na sociedade. Entretanto, afirma que essas posições de sujeito são também atravessadas por outras clivagens como classe, etnia, religião, idade etc. Em meio a essas questões, constituem-se também relações de poder, “de tal forma que os diversos sujeitos sociais exercitam e sofrem efeitos do poder. Todos são, ainda que de modos diversos e desiguais, controlados e controladores, capazes de resistir e de se submeter” (LOURO, 2004LOURO, G. L. Mulheres na Sala de Aula. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Editora da UNESP, 2004., p. 478). Por conseguinte, Louro não entende as mulheres como seres subjugados, dominadas pelos homens, considerando que, mesmo “nas situações em que mais se pretendeu silenciá-las e submetê-las, elas foram capazes de engendrar discursos discordantes, construir resistências, subverter comportamentos” (LOURO, 2004LOURO, G. L. Mulheres na Sala de Aula. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Editora da UNESP, 2004., p. 479).

As mudanças percebidas nos anos 1970 e 1980 indicam um processo de complexificação das subjetividades masculinas e femininas, em que tanto homens como mulheres constituíram outras identidades, “assumindo, transformando ou rejeitando as representações que lhe são propostas” (LOURO, 2004LOURO, G. L. Mulheres na Sala de Aula. In: DEL PRIORE, M. (Org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Editora da UNESP, 2004., p. 478). Talvez por isso, Lucia perceba as relações entre rapazes e moças de modo um pouco diferente, afirma que, no final de seu tempo na CEUPA, provavelmente refere-se a 1978, começava-se a se discutir, ainda que timidamente, a ideia da Casa mista. Cornélia explica que, apesar de não estarem à frente das posições de gestão, à medida que as moças passaram a ocupar outros espaços, mesmo secundários, de participação na Casa, construiu-se uma maior politização entre elas.

Ao avaliar essas questões, Cornélia afirma que na CEUPA havia “muita sexualidade, sociabilidade, sobretudo, muita vontade de se libertar de preconceitos morais, que era bem difícil naquela época”. E, nessa perspectiva, observa o exercício de liderança que se iniciava entre as moças, “começam a se tornar muito presentes junto aos meninos, contestando, inclusive, o fato de a Casa feminina ter uma empregada”. Constata, com os olhos do presente, o estranhamento da presença de uma empregada doméstica negra em meio a uma maciça maioria de mulheres brancas. Cumpre ainda ressaltar que apenas a Casa III contava com essa funcionária, uma prerrogativa da moradia das mulheres, portanto. Assim rememora:

uma figura maravilhosa, todo mundo se dava bem com ela, tinha esse papel maternal que desempenhava, tinha muitos papos, não lembro de ninguém ter conflitos com ela. A Teresa tinha televisão, ela podia ter. Ela morava lá, tinha um quarto que era só dela, e tinham várias relações em torno da Teresa principalmente na janta quando o pessoal chegava. (CORNÉLIA, 2017ECKHERT, Cornélia. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.).

Cornélia ocupou um tempo da entrevista lembrando de Teresa. Detalhou o cuidado que se tinha com seus direitos trabalhistas, o respeito ao seu horário de trabalho, com suas folgas. Entretanto, diz não recordar de sua saída, se teria sido uma escolha dela ou se a Casa dispensou seus serviços, mas afirma que não houve nova contratação, assim reflete “eu lembro que se chegou a ter uma discussão sobre o porquê dessa mordomia, não fazia sentido se a gente estava lutando pelos direitos da mulher ”.

E é nesse contexto que Gladis, aquela que se dizia “perdida” nas questões políticas, junto com uma colega, em 1982, decidem, em uma ação inusitada, deixar a Casa feminina. As duas se mudaram para uma das unidades ocupadas pelos rapazes, em uma atitude precursora, quase revolucionária, considera ser aquele “um ato político”, o qual precisou enfrentar as consequências. Ela explica, “subverti, nosso objetivo era provar que homens e mulheres podiam dividir o mesmo espaço sem que necessariamente tivesse alguma coisa. Até mesmo que eu tivesse alguma atração, pra mim era uma questão de princípio”. Importante destacar que, em 1982, um grupo de moças ocupou a Casa do Estudante Universitário (CEU/UFRGS), na mesma perspectiva de romper com a exclusividade masculina na moradia estudantil e abrir um espaço com legitimidade para incluir as mulheres estudantes da universidade. Aquele era um momento de início de abertura política no país que pode ter promovido ressonâncias nessas ações das moças que, por meio de suas lutas, abriram caminho para novas posições acerca das mulheres e suas relações com a moradia estudantil. Ao examinar os testemunhos, é possível dizer que nenhuma das cinco escapou de ser afetada pelo clima de reabertura política do país, de retomada do conceito de democracia, que viabilizou a constituição de novos partidos políticos, que promoveu a emergência de outras pautas relativas aos direitos das mulheres na sociedade brasileira.

Entretanto, essa ousadia de Gladis teve um preço. Pelos seus relatos, percebe-se que os enfrentamentos cotidianos foram mais duros na convivência com os rapazes. Parece que os pactos selados na Casa III (das mulheres), em relação à presença dos namorados, manutenção de sigilo entre os familiares, não faziam sentido na unidade que foi morar. Explica que foi difícil para seus pais e irmãos compreenderem sua atitude, recordou que, ao visitarem-na, presenciaram cenas que não lhes agradaram. Segundo Gladis, os rapazes, ao saberem de sua intenção de dividir a mesma Casa, diziam “tu quis vir pra cá, tu que tem que te submeter”. Ela prossegue, “foi difícil pra mim, porque eu sou bem do interior e aí eu era tida como louca, transgressora, tudo porque eu era do PT, fui morar numa Casa de Estudante”. Ao examinar sua fala, nota-se quantos elementos se confundem, a moça que veio do interior de Cachoeira do Sul, de uma zona praticamente rural, rompe com o que estava instituído, ocupa uma residência masculina e, por isso, é vista como uma pessoa fora do normal. Para além disso, a vinculação ao Partido dos Trabalhadores completa o quadro de transgressão de um modelo feminino ainda vigente no início da década de 1980.

Mas, voltando para a Casa III, importa trazer para a cena alguns outros aspectos vividos no cotidiano. As cinco entrevistadas lembram que, embora contassem com a presença de Teresa, funcionária de serviços domésticos responsável pelo jantar, havia uma divisão de tarefas e uma escala para a limpeza da residência. Gladis usa a metáfora de um “quartel” e Lucia usa a palavra “forte” para definir a exigência do cumprimento com as obrigações, em suas palavras, “se não limpou direito tu era reescalada, então tinha que fazer direitinho”. Entretanto, Gladis recorda que havia regras internas, combinadas entre as moradoras de cada quarto, que podiam ser diferentes das normativas gerais da Casa, pois só valiam nos seus dormitórios. Maria de Fátima reforça essa questão ao usar a expressão “acordos tácitos” para explicar como se construíam arranjos normativos específicos da Casa que, muitas vezes, nem passavam na Assembleia, pois eram questões internas de cada unidade.

Há uma situação trazida por Maria de Fátima que evidencia as táticas utilizadas pelas moradoras para driblar preceitos regulamentares da Casa. Essa moradora, como destacado anteriormente, engravidou, voltou para Uruguaiana, e o pai da criança permaneceu na CEUPA. Maria de Fátima recorda que logo que noticiou sua gravidez, “o pessoal fez uma campanha pra eu ficar na Casa”. Entretanto, destaca que familiares de algumas colegas não concordaram com sua presença naquele estado, que contrariava os estatutos estabelecidos. Diante disso, decidiu ir embora, isso foi em 1975. Tentou permanecer no interior, não conseguiu. Deixou o bebê com sua mãe e retornou para Porto Alegre, onde viveu em uma pensão. Assim, explica:

E aí os meninos falaram, não, tu vai voltar pra Casa! Aí eu voltei pra CEUPA nessa época e se deu uma situação bem interessante porque logo que eu voltei, o pai do meu filho saiu de lá. Mas chegavam as férias, o Carlos (filho) vinha pra cá. Ele vinha no início de dezembro e só ia embora quando começavam as aulas de novo. E vinha uma irmã minha pra ficar com ele na hora que eu ia trabalhar e as moradoras da Casa, minhas amigas, também tomavam conta dele e, por elas, ele não ia embora. (Maria de Fátima, 2017SOUZA, Maria de Fatima. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.).

Essa foi a narrativa mais forte escutada nesse processo das entrevistas. As estratégias utilizadas pelas moradoras ao viabilizar condições para Maria de Fátima ficar um tempo com seu filho evidenciam a humanidade da moradia estudantil como comunidade, na perspectiva da vida em comunhão. Entende-se que havia certa adaptação das regras, conforme as situações concretas se apresentavam. Tais regras, portanto, não eram absolutizadas, mas sim iam se ajustando aos movimentos de vida das integrantes da CEUPA. Nessa perspectiva de acolhimento, Gladis comenta que quando os pais e irmãos vinham visitá-las, eles eram acomodados na Casa, segundo ela “dava-se um jeito”, eram instalados em colchões nos quartos ou na sala.

Pode-se observar que se constituíam relações aparentemente horizontalizadas, mas também transversalizadas por disputas de poder entre os pares. Todas confirmam que a distribuição dos quartos se dava por relações hierárquicas, assim, havia, no andar de baixo, quartos mais independentes para duas pessoas e outros que comportavam seis ocupantes, distribuídos em beliches. Segundo Lucia, “o quarto das duas era um privilégio, esse quarto era só pras mais top, top”. Quando chegou, foi destinada ao quarto “das seis”, seguindo em suas palavras, “tive que ir pro quarto das seis, ali tinham algumas mais velhas que iriam me monitorar”.

De qualquer modo, a questão de uma maior liberdade no morar é evidente nas narrativas examinadas. Um exemplo emblemático é o fato de todas terem a chave da casa, ou seja, o direito de ir e vir, a qualquer hora, estava garantido. Na esteira desse tema, observa-se que Gladis foi aquela que mais comentou o ambiente de autonomia que havia na Casa, em suas palavras “a gente podia levar o namorado pra lá, mas a combinação nossa era que quando viesse a mãe ou o pai de alguma delas, nós não teríamos os namorados, para manter as aparências. E aí isso era respeitado”. Continua explicando que os namorados costumavam dormir em “caminhas no chão”, possivelmente do mesmo modo que os familiares das moradoras eram acomodados. Cornélia entrou nesse tema ao lembrar o estranhamento ao chegar à Casa e, logo nos primeiros dias, quando abriu a porta do aposento a ela destinado, se deparou com a colega de quarto “transando com o namorado”. Segundo a narradora, isso a assustou, pois não tinha conhecimento dos “acordos tácitos”, trazendo para a cena a expressão utilizada por Maria de Fátima.

E é Gladis quem nos diz como se formavam os grupos na Casa III, conta que suas colegas de quarto “eram bem do interior, então era mais ou menos a mesma cultura, geralmente as descendentes de alemães, italianas e lá em cima eram mais as hippies, as maconheiras como dizem, eram mais outro tipo, outro grupo ”. Maria de Fátima complementa a explicação da divisão na Casa, “diziam que as comunistas moravam no apartamento quatro, que éramos nós, aí em cima eram só as guriazinhas bonitinhas das festas ”. Contudo, faz questão de afirmar que essa expressão “bonitinhas das festas” referente às suas colegas era uma “injustiça”, pois as “comunistas” não estavam apenas no seu quarto, “a gente tinha uma comunista no um, outra no dois e no três”. Havia também o grupo das “estudiosas”, ao qual, segundo Maria de Fátima, pertencia Cornélia, “eram aquelas que só queriam estudar”. Alguns “extremismos”, palavra utilizada por Cornélia foram rememorados. Ela conta de um abaixo assinado que circulou na Casa diante do fato de uma moradora ter comprado uma televisão, artefato considerado por algumas uma alienação e, portanto, não deveria estar entre elas.

Poucas foram as lembranças de acontecimentos cotidianos que evidenciam as dificuldades da casa autogestionada. O que foi trazido reforça as estratégias que utilizavam para dirimir os problemas que surgiam. Cornélia recorda o mau funcionamento dos chuveiros, “a gente passava o tempo todo procurando qual chuveiro que funcionava”. Quando se encontrava um que funcionasse, segundo a antiga moradora, “a gente tinha que contar com a solidariedade das pessoas e dizia oi, tudo bem? Posso tomar um banho? E aí já ficava, já tomava um mate e tal... Então tinha essa tolerância, um dia tu poderias precisar do próximo”. Prossegue dizendo que havia uma “forte sociabilidade, ludicidade, momentos de decidir que a gente faria a comida juntos, o jantar juntos”.

Após essas reflexões, ainda cabe apresentar outras faces da Casa III. As entrevistadas lembram que havia ambiente de leitura, com uma espécie de biblioteca. Maria de Fátima diz ter conhecido escritores latino-americanos na CEUPA, como Eduardo Galeano, Gabriel Garcia Marques; Cornélia destaca os grupos de estudo que faziam, a partir de leituras de grandes pensadores como Brecht e Marx. Eva diz não recordar de estudo na Casa, mas comenta que leituras circulavam, lembra de uma colega de quarto que costumeiramente lia a bíblia como livro de referência, enquanto ela lia o evangelho segundo o espiritismo, “as duas parelho, ela lia na cama de cima do beliche e eu ali embaixo. Tinha muito respeito, tolerância!”.

De tudo o que disseram, observam-se alguns elementos fortes nas memórias dessas mulheres que foram partilhados com a pesquisadora. A Casa III pode ser percebida como um lugar que evocou memórias sensíveis, memórias de um lugar que teve importância na formação política/democrática, de sujeitos ativos naquele microcosmos e na sociedade. Além disso, para muitas, pode ter sido um lugar de construção de vínculos afetivos, de solidariedade e de exercício de alteridade.

Deixar a Casa: significados de uma experiência sensível

Outro tema abordado nas entrevistas foi a decisão de sair da Casa. Já sabemos que, para Eva, o dia de ir embora estava marcado, enquanto para Gladis, Lucia e Maria de Fatima parece ter sido um caminho previsível em seus percursos. Exceto Maria de Fátima, as demais concluíram a graduação no ensino superior, foram morar com amigos em outro tipo de habitação, casaram, descasaram, tiveram filhos. Mas para Cornélia entende-se que foi mais difícil deixar a CEUPA, assim ela diz “eu acho que fui a moradora que mais ficou na Casa, porque eu não queria sair de jeito nenhum e, na realidade, só podiam ficar moradores de graduação, de pós-graduação não podia, eu só sai quando entrei no pós, foi em 1981”. Afirma que cursou uma segunda graduação para ter o direito de lá permanecer. Percebe-se que para ela, especialmente, a moradia estudantil representou um esteio que a acolheu por alguns anos, uma espécie de refúgio permeado de afetos, difícil de se afastar.

E o que dizer do significado da Casa para as outras mulheres? Gladis aponta como grande legado pessoal o rompimento com uma visão de mundo individualista, “foi uma experiência bem intensa, foi um ano e pouco, mas que marcou, que eu consegui assim reafirmar os conceitos, tomar caminhos, como mulher, como pessoa”. Para Maria de Fátima, Eva e Lucia, o grande legado é a formação política que se fomentou na CEUPA, atrelada à constituição do Partido dos Trabalhadores. Contudo, para Maria de Fátima, outros significados em sua biografia determinaram, no aspecto pessoal, seu itinerário: “eu tenho dois filhos com dois pais moradores da Casa. Eu acho assim, se eu não tivesse morado na Casa eu não teria conhecido os dois”.

No ano em que este texto foi escrito, elas são mulheres maduras, Gladis está efetivamente aposentada e Lucia prepara-se para encerrar a vida profissional. Cornélia é professora da UFRGS, Eva é funcionária da mesma universidade e Maria de Fátima, que não conseguiu concluir o Jornalismo quando jovem, é aluna da UFRGS, do Curso de Ciências Sociais. Todas são pessoas ativas na sociedade, a paixão pela dança, pela fotografia, pela militância e pela pesquisa acadêmica identificam as cinco mulheres no tempo presente.

Algo ainda importante a ser reforçado é o fato deste estudo localizado pautar-se nos possíveis significados da moradia estudantil para essas cinco mulheres. Portanto, constituiu-se uma, entre tantas possíveis, versões da história da CEUPA, elegendo-se como empiria documentos orais, narrativas de cinco moradoras que lá estiveram entre os anos 1970 e início da década seguinte. É bem possível que, se as entrevistadas fossem outras, outras memórias teriam emergido, pois a passagem pela CEUPA pode assumir significados diversos, considerando as subjetividades de cada sujeito, as origens familiares, os discursos que ora aderiam, ora não aderiam. É princípio da pesquisa a não homogeneização das “moradoras da Casa”.

Entretanto, pode-se dizer que a presença de Gladis, Maria de Fátima, Eva, Lucia e Cornélia nesta residência estudantil representa, de certo modo, a expressão da luta das mulheres para conquistarem outros espaços na sociedade brasileira. É Cornélia quem sintetiza essa ideia, “o fato de sair do interior, já era um sinal de empoderamento,6 6 Segundo León (2000), o conceito de empoderamento, na perspectiva do feminismo, emerge atrelado à ideia de poder, em meio aos movimentos sociais, vinculados às teorias das Ciências Sociais. O conceito se difunde nos movimentos de direitos civis nos Estados Unidos nos anos 1970, especialmente junto às mobilizações das pessoas negras, no sentido de luta pela valorização étnico-racial. Nos anos 1980, os movimentos de mulheres, notadamente os feminismos, adensam a discussão/teorização acerca do conceito. Para Costa (s.d., p. 7), “empoderamento é o mecanismo pelo qual as pessoas, as organizações, as comunidades tomam controle de seus próprios assuntos, de sua própria vida, de seu destino, tomam consciência da sua habilidade e competência para produzir e criar e gerir”. de tentar construir uma trajetória individual, mas ainda muito arraigada em um projeto de casamento”.

O investimento na formação educacional por meio do acesso e da permanência ao ensino superior era entendido como possibilidade de disputar com os homens as oportunidades que o mercado de trabalho oferecia. Por outro lado, nessas lutas, percebe-se a implicação de outras questões. Deixar a casa materna/paterna, vir para Porto Alegre em busca de estudo e de trabalho, enfrentar desafios cotidianos, descobrir a sexualidade, conhecer novas formas de sociabilidade e deparar-se com dificuldades de diferentes ordens são situações que têm ressonância na constituição das identidades dessas moradoras. Além disso, estar na Casa pode ser para muitas uma possibilidade de transgressão a um determinado modelo feminino atrelado a uma sociedade ainda patriarcal. O avanço das primeiras Casas de Estudantes femininas vem ao encontro do desejo pela emancipação das mulheres, tanto social e política quanto econômica e, por conseguinte, a viabilidade de ocupação de outros espaços na sociedade brasileira que ainda se mostra fortemente desigual entre os grupos sociais que a compõe.

REFERÊNCIAS

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    » http://www.agende.org.br/docs/File/dados_pesquisas/feminismo/Empoderamento.pdf
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  • LEÓN, M. Empoderamento: relaciones de las mujeres con el poder. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v. 8, n. 2, p. 191-205, maio/ago. 2000.
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  • PORTELLI, A. A arte da escuta Rio de Janeiro: Letra e Voz, 2016.
  • RANCIÈRE, J. Sobre a história das mulheres no século XIX. In: DUBY, G.; PERROT, M. As mulheres e a História Lisboa: Rolo & Filhos Artes Gráficas, 1995.
  • RICOEUR, P. A memória, a história, o esquecimento Campinas: Unicamp, 2007.
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  • VILLA, J. M. Una habitación histórica de la residência de estudiantes Madri, 1925.

Entrevistas

  • CARDOSO, Eva. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2018.
  • ECKHERT, Cornélia. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.
  • LUDWIG, Gladis. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.
  • PRASS, Lucia. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.
  • SOUZA, Maria de Fatima. Entrevista concedida a Doris Bittencourt Almeida em 2017.
  • 1
    Para maiores informações sobre Casas de Estudante em Porto Alegre, consultar HINTERHOLTZ, Marcos (2017HINTERHOLTZ, M. O lugar onde a Casa mora: memórias sobre a Casa do Estudante Universitário Aparício Cora de Almeida - CEUACA (1963-1981). 2017. Dissertação (Mestrado em Educação) - PPGEDU/UFRGS, Porto Alegre, 2017.).
  • 2
    Informações consultadas no site institucional da CEUPA (www.ceupa.com.br).
  • 3
    Escola fundada pelo Sínodo Rio-Grandense, entidade constituída por imigrantes alemães e seus descendentes, seguidores da religião evangélica de confissão luterana, em São Leopoldo/RS.
  • 4
    O sentido de “multiplicar” não está em apresentar um caso individual, mas em contribuir na introdução de um caso particular na composição de um quadro sobre o universo estudantil universitário da Porto Alegre das décadas de 1960 e 1970. Certeau destaca a diferença entre o particular e o individual, para quem o conhecimento histórico busca medir os “desvios com relação às construções formais presentes” (CERTEAU, 2008CERTEAU, M. de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008., p. 86) O particular, neste sentido, está no “limite do pensável” (CERTEAU, 2008CERTEAU, M. de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008., p. 87). Mas adverte: “Não é possível ser pensando se não for universal” (CERTEAU, 2008CERTEAU, M. de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008., p. 87).
  • 5
    Segundo Schwarcz e Starling (2015SCHWARCZ, L.; STARLING, H. Brasil: uma biografia. São Paulo: Cia. das Letras, 2015. , p. 477), “a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), em 1980, significava a criação de um partido de massas que se organizava de baixo pra cima, estava pronto a incorporar a experiência de luta dos sindicatos operários e dos movimentos populares, e pretendia obter capilaridade social nas periferias das cidades e na área rural. O PT nasceu da ação dos trabalhadores, com o objetivo de reafirmar, por meios democráticos, o papel da luta social e do princípio igualitário na transformação da sociedade brasileira”.
  • 6
    Segundo León (2000LEÓN, M. Empoderamento: relaciones de las mujeres con el poder. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v. 8, n. 2, p. 191-205, maio/ago. 2000.), o conceito de empoderamento, na perspectiva do feminismo, emerge atrelado à ideia de poder, em meio aos movimentos sociais, vinculados às teorias das Ciências Sociais. O conceito se difunde nos movimentos de direitos civis nos Estados Unidos nos anos 1970, especialmente junto às mobilizações das pessoas negras, no sentido de luta pela valorização étnico-racial. Nos anos 1980, os movimentos de mulheres, notadamente os feminismos, adensam a discussão/teorização acerca do conceito. Para Costa (s.d.COSTA, A. A. Gênero, poder e empoderamento das mulheres. Disponível em: <Disponível em: http://www.agende.org.br/docs/File/dados_pesquisas/feminismo/Empoderamento.pdf >. Acesso em: 12 jan. 2018.
    http://www.agende.org.br/docs/File/dados...
    , p. 7), “empoderamento é o mecanismo pelo qual as pessoas, as organizações, as comunidades tomam controle de seus próprios assuntos, de sua própria vida, de seu destino, tomam consciência da sua habilidade e competência para produzir e criar e gerir”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2018
  • Aceito
    03 Jun 2018
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