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Bourdieu e o Brasil: esboço de uma genealogia acadêmica1 1 O estudo que originou este artigo contou com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).

RESUMO

A difusão e apropriação do pensamento de Pierre Bourdieu no Brasil tem se consolidado como objeto de estudo nas duas últimas décadas no interior das Ciências Sociais. O presente artigo junta-se, pois, a esta frente de análise, com o escopo circunscrito aos pesquisadores brasileiros que atuaram como divulgadores das ideias e das obras de Bourdieu entre as décadas de 1960 e 1990, a partir de contato direto e indireto com o sociólogo francês. Com o objetivo de compreender o papel desses então jovens investigadores na difusão do pensamento bourdieusianos no Brasil, construímos um esboço da genealogia acadêmica de Bourdieu no Brasil a partir de dados extraídos das plataformas Lattes e Acácia, de entrevistas e relatos de experiências publicados no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) e em periódicos científicos, bem como de contato direto com os sujeitos mapeados. Os resultados apontam para a existência de uma divulgação científica que ocorreu não apenas através da tradução de trabalhos originais de Bourdieu para o português e da publicação de artigos e coletâneas sobre sua obra, como também através da circulação de suas ideias por meio de cursos, palestras e orientações, de modo que esses interlocutores assumiram uma posição central na consolidação deste autor no campo acadêmico brasileiro.

Palavras-chave:
Pierre Bourdieu; Sociologia da Educação; Campo Acadêmico

ABSTRACT

The diffusion and appropriation of Pierre Bourdieu’s work in Brazil has been consolidated as an object of study in the last two decades within the Social Sciences. Therefore, this article joins this line of analysis, with the scope limited to Brazilian researchers who acted as disseminators of Bourdieu’s ideas and work between the 1960s and 1990s, from direct and indirect contact with the French sociologist. To understand the role of these then young researchers in the dissemination of Bourdieusian thought in Brazil, we developed an outline of Bourdieu’s academic genealogy in Brazil from data extracted from the Lattes and Acácia platforms, from interviews and reports of experiences published in the Center for Research and Documentation of Contemporary History of Brazil (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, CPDOC) and in scientific journals, as well as from direct contact with the mapped subjects. The results point to the existence of a scientific dissemination that occurred not only through the translation of Bourdieu’s original work into Portuguese and the publication of articles and collections about his work, but also through the circulation of his ideas through courses, lectures and supervisions, so that these interlocutors assumed a central position in the consolidation of this author in the Brazilian academic field.

Keywords:
Pierre Bourdieu; Sociology of Education; Academic Field

Introdução

A recepção, a presença e os usos do pensamento bourdieusiano no Brasil têm sido objetivados nos últimos anos de forma mais sistemática, seja pela sua herança teórica e conceitual (VASCONCELOS, 2002VASCONCELOS, Maria Drosila. Pierre Bourdieu: a herança sociológica. Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 77-87, abr. 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-73302002000200006. Acesso em: 22 jul. 2022.
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), seja em função de um campo específico, como a Sociologia da Educação (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins; NOGUEIRA, Maria Alice. A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições. Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 15-36, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-73302002000200003. Acesso em: 24 jul. 2022.
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; OLIVEIRA; SILVA, 2021SILVA, Camila Ferreira da; LOPES, Rodrigo de Macedo. A internacionalização da Sociologia brasileira: mapeamento das cartografias acadêmicas dos estudantes de pós-graduação. Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, v. 52, n. 2, p. 179-207, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufc.br/handle/riufc/60819. Acesso em: 19 jul. 2022.
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), seja ainda pelo diálogo com outros pensadores (ANJOS, 2004ANJOS, José Carlos. Bourdieu e Foucault: derivas de um espaço epistêmico. Anos 90, Porto Alegre, v. 11, n. 19, p. 139-165, 2004. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/6354/3805. Acesso em: 22. jul. 2022.
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; BENDER; COELHO, 2018BENDER, Mateus; COELHO, Gabriel Bandeira. Anthony Giddens e Pierre Bourdieu: é possível falar em pós-estruturalismo? Interfaces Científicas - Humanas e Sociais, Aracaju, v. 7, n. 1, p. 59-70, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.17564/2316-3801.2018v7n1p59-70. Acesso em: 19 jul. 2022.
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) ou pelos usos contemporâneos de seus constructos teórico-metodológicos (PIOTTO; NOGUEIRA, 2021PIOTTO, Débora C.; NOGUEIRA, Maria Alice. Um balanço do conceito de capital cultural: contribuições para a pesquisa em educação. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 47, p. 1-35, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1590/s1517-97022021470100302. Acesso em: 19 jul. 2022.
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). Situamo-nos, pois, nessa linha de reflexões em torno de Bourdieu e, mais especificamente, dos processos decisivos para a circulação de suas ideias no Brasil. Estudos recentes já demonstraram como os movimentos de tradução de suas obras para a língua portuguesa e publicação em território nacional, bem como a circulação de investigadores brasileiros em universidades francesas foram cruciais para sua inserção e posterior consolidação como uma das referências mais citadas nos trabalhos no campo das Ciências Humanas e Sociais na atualidade (BASTOS et al., 2006BASTOS, Elide Rugai et al. Conversas com sociólogos brasileiros. São Paulo: Editora 34, 2006.; BORTOLUCI; JACKSON; PINHEIRO FILHO, 2015BORTOLUCI, José Henrique; JACKSON, Luiz C.; PINHEIRO FILHO, Fernando A. Contemporâneo clássico: A recepção de Pierre Bourdieu no Brasil. Lua Nova, São Paulo, n. 94, p. 217-254, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-64452015009400008. Acesso em: 22 jul. 2022.
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). Resta-nos, então, interrogar os agentes e as relações que sustentaram esses processos.

Rocha e Peters (2020ROCHA, Maria Eduarda da Mota; PETERS, Gabriel. Facetas de um Bourdieu tupiniquim: momentos de sua recepção no Brasil. BIB, São Paulo, n. 91, p. 1-30, 2020. Disponível em: https://bibanpocs.emnuvens.com.br/revista/article/view/494. Acesso em: 16 jul. 2022.
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) esclarecem que

Entre os anos de 1960 e 1970, Bourdieu começou a colocar em marcha um verdadeiro programa de internacionalização da sua obra, estabelecendo parcerias com autores do continente americano. Cabe então assinalar a posição semiperiférica que o Brasil ocupa nessa história. Por um lado, pesquisadores brasileiros estabeleceram uma cooperação regular e duradoura com o autor francês, sem caso comparável entre os demais países da América Latina (ROCHA; PETERS, 2020ROCHA, Maria Eduarda da Mota; PETERS, Gabriel. Facetas de um Bourdieu tupiniquim: momentos de sua recepção no Brasil. BIB, São Paulo, n. 91, p. 1-30, 2020. Disponível em: https://bibanpocs.emnuvens.com.br/revista/article/view/494. Acesso em: 16 jul. 2022.
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, p. 2).

Esse panorama de internacionalização de seu trabalho, na ponte com o Brasil, coincidiu com o cenário da ditadura militar (1964-1985), da reforma e expansão da pós-graduação e dos trânsitos dos pesquisadores brasileiros em função de tal expansão e também da necessidade de se exilar frente às perseguições da ditadura. Nesse sentido, os contatos diretos ou indiretos com Pierre Bourdieu - na condição de orientandos, discentes de seus seminários, interlocutores ou mesmo orientandos de seus pares - levaram os então mestrandos e doutorandos brasileiros que estavam a realizar sua formação na França a atuarem como divulgadores de suas ideias e obras. Esta é a porta de entrada de nossa investigação, que tomou como objeto de estudo a genealogia de Bourdieu no Brasil ligada à difusão de suas ideias e obras, com o objetivo geral de compreender o papel desses então jovens investigadores brasileiros na difusão do pensamento bourdieusianos no Brasil.

Em diálogo com a Genealogia Acadêmica (CRONIN; SUGIMOTO, 2014CRONIN, Blaise; SUGIMOTO, Cassidy R. Beyond bibliometrics: Harnessing multidimensional indicators of scholarly impact. MIT Press, 2014.), realizamos um trabalho de mapeamento dos pesquisadores e pesquisadoras brasileiros que tiveram contato direto ou indireto com Pierre Bourdieu em suas estadias na França durante seus mestrados ou doutorados entre as décadas de 1960 e 1990, e que exerceram e ainda exercem papel de divulgadores do pensamento desse sociólogo francês no Brasil. Construímos, então, um esboço de uma genealogia de cunho qualitativo a partir de dados extraídos das plataformas Lattes e Acácia, de entrevistas e relatos de experiências publicados no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) e em periódicos científicos, bem como de contato direto com os sujeitos mapeados. Nossa genealogia leva em consideração o tipo de ligação com Bourdieu, o papel na difusão de sua obra e a descendência por meio das orientações que os pesquisadores brasileiros passaram a realizar quando de suas atuações nos programas de pós-graduação no país.

O artigo é composto por três seções, a primeira trata das relações entre Brasil e França nos processos de consolidação das Ciências Sociais brasileiras; a segunda se debruça sobre a formação de discípulos e divulgadores do pensamento bourdieusianos a partir da circulação de mestrandos e doutorandos brasileiros nos círculos acadêmicos de Pierre Bourdieu; e a terceira seção, por fim, traz um desdobramento desse debate a partir da atuação desses divulgadores no Brasil.

Consolidação das Ciências Sociais no Brasil e diálogos com a França

A divulgação das ideias sociológicas ocorreu no Brasil de maneira muito rápida, pois, ainda no século XIX foram criadas algumas cátedras de sociologia em instituições de educação secundária no país (OLIVEIRA, 2013OLIVEIRA, Amurabi. Revisitando a história do ensino de Sociologia na Educação Básica. Acta Scientiarum. Education, Maringá, v. 35, n. 2, p. 179-189, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.4025/actascieduc.v35i2.20222. Acesso em: 20 jul. 2022.
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; BODART; CIGALES, 2021BODART, Cristiano das Neves; CIGALES, Marcelo Pinheiro. O ensino de sociologia no século XIX: experiências no estado do Amazonas, 1890-1900. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 28, p. 123-145, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0104-59702021000100007. Acesso em: 22 jul. 2022.
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). Isso significa que, de forma quase concomitante ao surgimento da disciplina na França e ao Departamento de Sociologia na Universidade de Chicago - experiências consideradas pioneiras neste campo -, surgiram experiências, que, apesar de incipientes, demonstravam o alcance e interesse das teorias sociológicas entre os intelectuais brasileiros.

A passagem do século XIX para o século XX, marcada no Brasil pelo fim da escravidão (1888) e do Império (1889) e posteriormente pelo advento da Nova República (1930), mostrou-se especialmente profícua para o surgimento de um esforço interpretativo da sociedade brasileira que buscasse se basear em novos alicerces científicos. Meucci (2011MEUCCI, Simone. Institucionalização da Sociologia no Brasil: primeiros manuais e cursos. São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2011.), ao analisar manuais de sociologia produzidos entre as décadas de 1920 e 1940 no Brasil, observa uma importante presença de autores como Durkheim e Le Play, indicando assim uma forte presença de ideias provindas de autores franceses entre intelectuais brasileiros, que naquele momento buscavam realizar as primeiras sínteses sociológicas no Brasil.

Também é necessário mencionar a criação dos primeiros cursos de Ciências Sociais no Brasil a partir da década de 19302 2 Os primeiros cursos de ciências sociais criados no Brasil foram os da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (1933), Universidade de São Paulo (1934), Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná (1938) e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Bahia (1941). . É fato que desde o século XIX as Faculdades de Direito vinham outorgando títulos na área de “ciências jurídicas e sociais”, todavia, a criação dos primeiros cursos de Ciências Sociais demarcou o início do processo de autonomização acadêmica de áreas como Antropologia, Ciência Política e Sociologia. Nesse contexto de novos cursos devemos destacar a relação que a Universidade de São Paulo (USP) estabeleceu com a França, especialmente a partir do que ficou conhecido como “missão francesa”, constituída por professores franceses que se tornaram os primeiros professores catedráticos desta instituição3 3 Esta “missão” iniciou-se ainda em 1934, quando chegaram Émile Coornaert (história), Pierre Deffontaines (geografia), Robert Garric (literatura francesa), Paul-Arbousse Bastide (sociologia), Étienne Borne (filosofia e psicologia) e Michel Berveiller (literatura greco-latina) - somente Berveiller e Arbousse-Bastide renovam os seus contratos com a universidade no ano seguinte. Em 1935, chegaram Fernand Braudel (história), Pierre Hourcade (literatura francesa), Pierre Monbeig (geografia), Claude Lévi-Strauss (segunda cadeira de sociologia) e Jean Maugüé (filosofia). Monbeig e Maugüé permaneceram no país até 1944 e 1947, respectivamente. A partir de 1938 chegou um novo grupo de docentes composto pelos seguintes nomes: Jean Gagé (no lugar de Braudel), Alfred Bonzon (literatura francesa), Paul Hugon (economia) e Roger Bastide (substituto de Lévi-Strauss). . Apesar de esse modelo não ter sido adotado por todas as instituições que naquele momento criavam os primeiros cursos de Ciências Sociais, é relevante considerar que a USP encontrou condições singulares para a autonomização desse campo (MICELI, 1989), de modo que seu desenvolvimento teve impactos também sobre as demais instituições.

Poderíamos afirmar, portanto, que havia àquele tempo - no processo de formação do campo das Ciências Sociais brasileiras - uma intensa circulação de agentes vinculados ao campo das Ciências Sociais francesas, por meio não apenas da presença de pesquisadores oriundos daquele país, como também através da tradução de trabalhos, e principalmente da circulação de ideias, tanto no ensino superior quanto na educação secundária, se considerarmos que entre 1925 e 1942 a Sociologia estava presente também nesse nível educacional.

Apesar de ter ocorrido a outorga de títulos de mestres e doutores em Ciências Sociais em instituições brasileiras já a partir da década de 1940, foi apenas com a Reforma Universitária de 1968 que surgiram os primeiros cursos stricto sensu no país. Em meio a esse processo, inúmeros professores brasileiros receberam financiamento para realizar seus estudos pós-graduados no exterior, o que também fora viabilizado pela criação, em 1951, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), principal órgão responsável pelo financiamento desse tipo de formação.

Nesse contexto já de uma forte presença da Sociologia francesa no campo acadêmico brasileiro, a França se tornou um dos principais destinos formativos de pesquisadores brasileiros. Essa tendência formativa pode ser observada se analisarmos o perfil dos bolsistas nível 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), aqueles que se encontram hoje no topo da hierarquia acadêmica, pois, neste grupo a França e os Estados Unidos foram os principais destinos formativos no exterior, e ao analisarmos apenas os bolsistas 1A na área de Sociologia, a França foi isoladamente o principal destino formativo destes pesquisadores4 4 Entre os pesquisadores nível 1A do CNPq na área de Sociologia que realizaram estudos doutorais no exterior , 5 estudaram na França, 2 nos Estados Unidos, uma na Alemanha, uma no Canadá e uma no México (OLIVEIRA at al., 2022). . Notadamente nas gerações posteriores houve um crescente movimento de nacionalização da formação doutoral (LIMA, 2019LIMA, Jacob Carlos. A reconfiguração da sociologia no Brasil: Expansão institucional e mobilidade docente. Interseções. Revista de Estudos Interdisciplinares, v. 21, n. 1, p.1-37, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.12957/irei.2019.42300. Acesso em: 15 jul. 2022.
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), o que reflete a própria expansão da pós-graduação no Brasil, porém, podemos inferir que os pesquisadores formados em instituições francesas continuaram a dialogar com autores daquele país, e introduzi-los continuamente em programas de cursos no Brasil.

O que almejamos demonstrar nesta seção é que o diálogo com a Sociologia francesa é algo constitutivo do campo acadêmico das Ciências Sociais brasileiras, de modo que os diálogos e apropriações da obra de Bourdieu no Brasil se inserem em um espectro mais amplo das relações dos pesquisadores brasileiros com a Sociologia francesa.

Pesquisadores/as brasileiros/as na França e contato com Bourdieu e seus discípulos

O diálogo franco-brasileiro no âmbito das Ciências Sociais ganha, pois, dimensões contraditórias em função do cenário ditatorial da década de 1960 no Brasil, período que possibilita dois movimentos complementares que acabam por catalisar tal diálogo: o desenvolvimento da pós-graduação no Brasil e a saída dos intelectuais do país na condição de exilados (ROCHA, 2022bROCHA, Maria Eduarda da Mota. Uma travessia transatlântica A primeira geração de mediadores e mediadoras da obra de Bourdieu no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 34, n. 1, p. 31-53, . 2022b. Disponível em: https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2022.191190. Acesso em: 24 jul. 2022.
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). Os programas de pós-graduação demandavam cada vez mais doutores qualificados e a formação em grandes centros estrangeiros revelou-se como uma estratégia fundamental para a autonomização do campo científico brasileiro. Em entrevista, Carlos Benedito Martins relata, por exemplo, como logo após a defesa de seu trabalho de Mestrado, sua orientadora, Maria Andrea Loyola, falou “você vai para França. Vai lá trabalhar com o pessoal do Bourdieu” (OLIVEIRA, 2019OLIVEIRA, Amurabi. A Sociologia Brasileira e seus Desafios: entrevista com Carlos Benedito Martins. Política & Sociedade, Florianópolis, v. 18, n. 41, p. 13-26, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.5007/2175-7984.2019v18n41p13. Acesso em: 25 jul. 2022.
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) - esse relato remonta ao final da década de 1970, o que demonstra como a feitura do doutoramento na França era um caminho tencionado para os cientistas sociais no Brasil.

Bortoluci, Jackson e Pinheiro Filho (2015BORTOLUCI, José Henrique; JACKSON, Luiz C.; PINHEIRO FILHO, Fernando A. Contemporâneo clássico: A recepção de Pierre Bourdieu no Brasil. Lua Nova, São Paulo, n. 94, p. 217-254, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-64452015009400008. Acesso em: 22 jul. 2022.
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), ao tratarem da entrada do pensamento de Pierre Bourdieu no Brasil nas três fases de desenvolvimento das Ciências Sociais no país preconizadas por Jackson e Blanco (2014), demonstram que é no interior da ditadura militar que temos os primeiros movimentos de recepção das ideias bourdieusianas5 5 Vale a pena ressaltar que as ciências sociais brasileiras são um caso bastante atípico se compararmos com o que ocorreu em outros países latino-americanos que também passaram por experiências ditatoriais, uma vez que houve uma expansão no número de cursos de graduação e pós-graduação na área neste período (LIMA, 2019). . Para esses autores, é exatamente a circulação internacional de jovens investigadores brasileiros que iria desempenhar aqui um papel crucial na difusão das obras de Bourdieu, posto que esses jovens cientistas sociais em início de carreira passaram a atuar na mediação de novas perspectivas que estavam fervilhando nos países em que estavam realizando seus mestrados e doutorados naquele momento. A formação desses jovens investigadores liga-se, portanto, à renovação das Ciências Sociais brasileiras, ao passo que estamos diante de processos que se revelariam fundamentais para o lugar que determinados autores passariam a ocupar no campo científico brasileiro.

Poucos foram os brasileiros que chegaram a ter uma relação de orientação com Pierre Bourdieu, porém, ganha notoriedade a multiplicidade de formas pelas quais os contatos diretos e indiretos vão sendo construídos com os grupos com os quais Bourdieu dividia as coordenações das investigações e produções. Para além das orientações diretas, estamos a falar de espectadores de seus cursos e seminários, correspondentes, publicações na Actes de la recherche en sciences sociales, diálogos para as traduções de suas obras para o Brasil, bem como orientações por parte de professores discípulos de Bourdieu na França. De 1960 a 1990, portanto, esses diálogos foram responsáveis por consolidar no Brasil fortes representantes da sociologia bourdieusiana em uma geração de cientistas sociais, que viu esses esforços ganharem continuidade em redes de pesquisa cada vez mais bifurcadas - e que se estendem até a atualidade - e nas relações com as novas gerações que passariam a ser discentes e orientandos dessa geração de divulgadores de Bourdieu no Brasil.

Um exemplo dessas bifurcações pode ser visualizado na vinda de Michael Pollak ao Brasil no final da década de 1980. Orientando de Doutorado de Pierre Bourdieu na École Pratique des Hautes Études, além de ter sido contemporâneo de Sergio Miceli no grupo de orientandos de Bourdieu, Michael Pollak esteve no Brasil no ano de 1987 como professor visitante do CPDOC e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) do Museu Nacional, dialogando com pesquisadoras como Alzira Alves de Abreu e Aspásia Camargo (POLLAK, 1992POLLAK, Michael. Memória e identidade social. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 5, n. 10, p. 200-212, 1992. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/1941. Acesso em: 12 jul. 2022.
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).

Mais recentemente, as reverberações dessas redes acadêmicas podem ser expressas pelos trânsitos de Benoit Charles Marie Etienne De Lestoile no Brasil. O professor Benoit foi orientando de mestrado de Pierre Bourdieu na Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS) entre 1990 e 1991, e em duas oportunidades já atuou como Professor Visitante na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - 1994 e 2010-2011 -, com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Além disso, atuou como coorientador de doutorado em Antropologia Social na UFRJ (2013-2016).

Foi a partir da compreensão dos múltiplos elementos que contribuíram para a difusão das obras de Bourdieu no Brasil que delimitamos os caminhos para nosso mapeamento dos professores e professoras pesquisadores que atuaram, no recorte temporal de nosso estudo, como interlocutores de Bourdieu ou de seus pares na França e como divulgadores quando da volta ao país. Nesse sentido, a partir de um levantamento nas Plataformas Acácia/Genealogia Acadêmica do Brasil6 6 http://plataforma-acacia.org/ e Lattes7 7 https://lattes.cnpq.br/ , foi possível identificar os descendentes de Bourdieu no Brasil e avançar no mapeamento dos pesquisadores que estabeleceram ligações diretas ou indiretas com Bourdieu nesse ínterim. Foi necessário ainda recorrer às entrevistas concedidas e publicadas na página eletrônica do CPDOC8 8 https://cpdoc.fgv.br/acervo/historia-oral/entrevistas-para-download por parte desses cientistas sociais da primeira geração de divulgadores e, em última instância, ao contato direto com os/as professores mapeados por e-mail para confirmação de algumas informações. O resultado do mapeamento e seleção dos agentes encontra-se sintetizado no Quadro 1.

Nosso recorte possibilitou o mapeamento de nove docentes/pesquisadores, sendo cinco homens e quatro mulheres. Seis deles estabeleceram, em algum momento de sua formação, contato direto com Pierre Bourdieu: 3 na condição de orientandos (Aspásia Brasileiro Alcantara de Camargo no mestrado, Roberto Grün em Estágio de complementação de doutoramento e Sergio Miceli Pessôa De Barros no doutorado); e 3 na condição de interlocutores diretos (Maria Alice Nogueira, Renato Ortiz e Moacir Gracindo Soares Palmeira) - este último foi ainda estudante dos seminários lecionados por Bourdieu na EHESS. Nota-se ainda que eles atingiram posições prestigiosas na hierarquia acadêmica, tornando-se professores em instituições relevantes no campo acadêmico brasileiro, além de terem posições de destaque junto a agências de fomento e associações científicas9 9 Atualmente Sergio Miceli é bolsista 1A do CNPq, Carlos Martins 1B, Maria Alice Nogueira 1A, Ione Valle 1D e Ana Maria Almeida 1D. .

QUADRO 1
Professores/as Pesquisadores/as selecionados por contato direto/indireto COM Pierre Bourdieu-Genealogia.

É importante mencionar que havia uma importante rede de pesquisadores no Brasil que manteve contato com Bourdieu. Rocha (2022aROCHA, Maria Eduarda da Mota. A internacional científica e o Bourdieu tupiniquim. In: ROCHA, Maria Eduarda , Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022a. p. 27-50.), ao buscar mapear esses agentes, indica a relevância dos pesquisadores brasileiros na rede internacional de colaboração que Bourdieu tinha com as Américas, possuindo o lugar de destaque na América Latina. Ainda segundo a autora, havia dois grupos que mantinham um contato mais intenso, aquele de São Paulo capitaneado por Sérgio Miceli, e o do Rio de Janeiro capitaneado por Moacir Palmeira. Notadamente nesta rede havia outros agentes relevantes, como José Sérgio Leite Lopes, Lygia Sigaud (1945-2009), Maria Andrea Loyola, dentre outros, porém, o enfoque de nosso artigo recai sobre pessoas que tiveram contato com Bourdieu em seu processo de formação stricto sensu, constituindo um grupo de “ex alunos” no sentido mais ampliado do termo. Nosso argumento é que a rotinização do conhecimento sociológico por meio da docência teve um papel central na difusão do pensamento de Bourdieu no Brasil, em que pese ainda a relevância da rede de pesquisadores que não necessariamente vivenciaram essa ocasião.

Sobre essa interlocução, Palmeira afirma que quando de sua ida à França para a defesa de sua tese de doutorado:

[...] o Bourdieu me chamou para ficar mais um ou dois meses no Centre, que na época Centre de Sociologie Européenne, não tinha havido ainda a divisão. E aí, enfim, conseguiu lá, deu lá, como se fosse uma bolsa e fiquei mais ou menos, não sei se um ou dois meses, foi ótimo, realmente, fiquei por lá, depois em 1976, voltei para o Congresso de Americanistas e cheguei já atrasado para o Congresso e aí ele de novo me chamou, eu fiquei, não sei ,uma das vezes eu fiquei um mês, a outra dois meses. E aí, enfim, mantínhamos alguma correspondência, e enfim, começamos a querer trazê-lo para o Brasil, mas aí era, dizia que era nosso Frank Sinatra, parecia [riso], então se manteve essa relação (PALMEIRA, 2019PALMEIRA, Moacir Gracindo Soares. Moacir Gracindo Soares Palmeira: depoimento (2009/2012). Entrevistadores: Celso Castro, Helena Maria Bousquet Bomeny, Karina Kuschnir e Mário Grynszpan. Rio de Janeiro: CPDOC, 2019. Entrevista concedida ao Projeto “Cientistas sociais de países de Língua Portuguesa: histórias de vida”., p. 58).

Sergio Miceli e Moacir Palmeira, dessa forma, representam a primeira onda de difusão da obra de Bourdieu no Brasil, e aqui a Fundação Getúlio Vargas e o Museu Nacional devem ser compreendidos como espaços privilegiados para essa disseminação (ROCHA, 2022bROCHA, Maria Eduarda da Mota. Uma travessia transatlântica A primeira geração de mediadores e mediadoras da obra de Bourdieu no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v. 34, n. 1, p. 31-53, . 2022b. Disponível em: https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2022.191190. Acesso em: 24 jul. 2022.
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). O contato de Roberto Grün com Bourdieu, no seu Estágio de complementação de doutoramento no ano letivo 1988/1989, por exemplo, expressa bem como Sergio Miceli estabeleceu uma relação duradoura com Bourdieu e possibilitou a entrada de outros pesquisadores nessa rede (ROCHA, 2022b).

Sergio Miceli foi responsável ainda pela organização da primeira grande coletânea de Bourdieu publicada fora da França: A economia das trocas simbólicas, publicada em 1974, cuja apresentação escrita por Miceli (“A força do sentido”) é considerada uma das principais apresentações do trabalho de Bourdieu no Brasil. Segundo Miceli, seu contato com a obra de Bourdieu antecedeu o processo de orientação:

A gente tinha esse grupo na PUC, de estudos. E, uma vez... A gente lia Les Temps Modernes, essas coisas. Tinha um número especial sobre os problemas do estruturalismo. O estruturalismo estava na moda, a gente lia tudo de estruturalismo - Levi Strauss, La pensée sauvage, isso tudo era obsessão. E tinha um artigo do Bourdieu chamado O Campo Intelectual e Projeto Criador. Eu li e fiquei fascinado. Eu disse para o pessoal: “Olha gente, vamos fazer um seminário sobre o texto, porque esse cara, realmente, dá uma... Ele tem uma rota para a sociologia da cultura, diferente dessa coisa mais quadradona.” E, aí, nós discutimos o texto e eu comecei a olhar o que tinha dele - de livro que já tinha publicado. Então, eu fui ler: A Reprodução, Les héritiers... Depois que eu li uns dois ou três, eu disse: “Quem sabe fazer uma seleção desse cara que é tão bacana.” Aí eu escrevi para ele, e ele me mandou as coisas que eu não conhecia e disse: “Pensa no que você acha que vai funcionar mais no Brasil, e você faz a proposta.” Nós temos uma correspondência. Aí eu fiz uma proposta. Ele disse: “Ah, tudo bem. Essa proposta está boa, mas eu acho que você deve incluir isso e tirar isso.” Ele fez umas ponderações, e eu fui. Até que fechamos a coisa. Eu distribuí a tradução, fiz alguns dos textos e fiz aquela introdução. Investi, loucamente, naquela tradução. E eu acho que a introdução foi o que, realmente, pegou ele. (…) Aquilo é que pegou ele, porque era a primeira coletânea dele... Não, tinha saído, meses antes, uma na Alemanha, mas pequena. Era a primeira coletânea importante dele. (BARROS, 2012, p. 7-8).

Observa-se, portanto, que ao contrário do que se poderia supor, o trabalho de Bourdieu já possuía alguma penetração no Brasil quando alguns de seus estudantes brasileiros decidiram realizar sua formação na França, indicando que as trajetórias desses estudantes ao mesmo tempo refletem a paulatina penetração da obra de Bourdieu no Brasil e também a aprofunda. Algo semelhante também ocorreu com Martins, que teve um contato intenso com a obra de Bourdieu antes de sua ida a França, segundo ele: “A Andreia tinha acabado de chegar da França e me passou as coisas do Bourdieu. Eu comecei a ler as coisas do Bourdieu naquela época. Então foi um período muito bom. Aí eu fiz uma tese mais qualitativa e tal” (MARTINS, 2015, p. 5).

O caso de Aspásia Brasileiro Alcantara de Camargo é particularmente singular, pois ela realizou seu mestrado com Bourdieu e seu doutorado com Alain Touraine, considerado um dos oponentes intelectuais de Bourdieu no campo acadêmico francês. Segundo seu depoimento: “E quando terminou essa fase, eu engrenei direto no Touraine, eu não sei nem por quê. Eu acho que é porque o Touraine era o que mais conhecia América Latina” (CAMARGO, 2012, p. 23). De fato, diferentemente de Bourdieu, que teve poucas experiências de orientação na América Latina, Alain Touraine desenvolveu inúmeras parcerias com pesquisadores da região, além de ter orientado nove teses doutorais sobre o Brasil (MENDES, 2019MENDES, Flávio. Alain Touraine e o Brasil: atores sociais e dependência em diálogos nos anos 1970. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, São Paulo, n. 106, p. 97-129, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-097129/106. Acesso em: 15 jul. 2022.
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). Do mesmo modo, chama a atenção o fato de Moacir Palmeira ter sido orientado por François Bourricaud, um notório crítico do trabalho de Pierre Bourdieu.

Na sequência, temos mais cinco docentes que estabeleceram, no período analisado, ligações indiretas com Pierre Bourdieu: 3 na condição de orientandos de interlocutores de Bourdieu na França (Ana Maria Fonseca de Almeida foi orientanda de Monique de Saint-Martin, Maria Alice Nogueira e Carlos Benedito Martins foram orientandos de Viviane Isambert-Jamati) - Martins frequentou ainda os seminários de Bourdieu -; 1 na condição de estudante do principal interlocutor de Bourdieu na França (Renato Ortiz foi aluno de Passeron na década de 1970); e 1 que frequentou seus cursos no Collège de France (Ione Valle frequentou o curso sobre Manet entre 1998 e 2000). Martins, apesar de ter sido orientado por Isambert-Jamati, destaca o diálogo ativo com Saint-Martin no processo de construção de sua tese (OLIVEIRA, 2019OLIVEIRA, Amurabi. A Sociologia Brasileira e seus Desafios: entrevista com Carlos Benedito Martins. Política & Sociedade, Florianópolis, v. 18, n. 41, p. 13-26, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.5007/2175-7984.2019v18n41p13. Acesso em: 25 jul. 2022.
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), ademais, em seu mestrado ele foi orientando de Maria Andrea Loyola, que foi uma das mais ativas interlocutoras do Bourdieu no Brasil (ROCHA, 2022aROCHA, Maria Eduarda da Mota. A internacional científica e o Bourdieu tupiniquim. In: ROCHA, Maria Eduarda , Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022a. p. 27-50.; 2022b), o que demonstra como esses agentes circulavam intensamente em diferentes círculos que gravitavam em torno de Bourdieu. Importante lembrar que Isambert-Jamati, que também orientou Maria Alice Nogueira, foi uma figura-chave no processo de consolidação da Sociologia da Educação na França (PEYRONIE, 2019PEYRONIE, Henri. Être sociologue de l’éducation et militant pour une pédagogie nouvelle et populaire: une impossibilité théorique pour la sociologie française de l’éducation dominante dans les années 1980 et 1990?. Les Sciences de l’education-Pour l’Ere nouvelle, Paris, v. 52, n. 2, p. 61-100, 2019. Disponível em: https://www.cairn.info/revue-les-sciences-de-l-education-pour-l-ere-nouvelle-2019-2-page-61.htm. Acesso em: 14 jul. 2022.
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), além de ter colaborado com Bourdieu já em 1967 na organização de um número especial na a Revue Française de Sociologie. No caso de Ione Valle, faz-se mister registrar que ela também realizou sua formação doutoral na França e se tornou uma relevante intérprete da obra de Bourdieu no campo da Sociologia da Educação, além de atuar na tradução de seus trabalhos em língua portuguesa.

Renato Ortiz organizou, em 1983, o volume sobre Pierre Bourdieu para a coleção “Grandes cientistas sociais”, sendo esta uma das coleções de maior impacto na divulgação de autores das Ciências Sociais no Brasil deste período.

Essa constelação inicial da Genealogia Acadêmica de Bourdieu no Brasil já nos fornece pistas de como os trabalhos desses pesquisadores e pesquisadoras brasileiras serviu de canal para disseminação do pensamento bourdieusiano em nosso território. Para além de elementos já consagrados na literatura especializada - a exemplo das traduções e publicações das obras de Bourdieu no Brasil -, o Quadro 1 revela ainda como a divulgação de Bourdieu acaba se fazendo presente no cotidiano profissional desses docentes, nas suas produções, publicações, palestras, cursos e orientações de mestrado e doutorado (nessas últimas vê-se uma continuidade da genealogia que remonta à ligação de Bourdieu com o campo científico brasileiro). Passemos, então, a explorar essas experiências e seus impactos na consolidação do pensamento bourdieusiano no Brasil.

Divulgadores do pensamento bourdieusiano no Brasil

Os nove docentes que aqui analisamos têm, desde a década de 1960, realizado uma mediação do pensamento bourdieusiano com o público brasileiro por meio das seguintes frentes: projetos de pesquisa, produções e publicações que dialogam com este referencial; realização de palestras, cursos e minicursos sobre temas correlatos; traduções e organizações de artigos e obras de Bourdieu no Brasil; além das orientações de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Essa profusão de práticas é reveladora dos muitos caminhos que marcaram a entrada e consolidação das ideias de Bourdieu nos trópicos. A partir das experiências dos divulgadores brasileiros com Bourdieu e com seus interlocutores franceses, é possível compreender seus pontos de partida no processo de apropriação de suas teorias e constructos e posteriormente na mediação propriamente dita com o cenário brasileiro.

Moacir Palmeira frequentou os seminários de Bourdieu, e lá atuavam como assistentes pesquisadores como Jean-Claude Passeron, Luc Boltanski, Jean-Claude Chamboredon, Monique De Saint Martin, Madeleine Lemaire, entre outros. Nesse mesmo tipo de experiência, temos Renato Ortiz, que foi estudante de Passeron, e que afirma o seguinte sobre essa época de sua formação: “[...] se você tem bons professores, é uma dádiva [...] porque o que está em pauta não é aquilo que está sendo dito explicitamente apenas, mas o que está implícito, a maneira como é dita” (ORTIZ, 2010ORTIZ, Renato. Renato Ortiz: depoimento (2008). Entrevistadores: Helena Bomeny e Arbel Griner. Rio de Janeiro: CPDOC, 2010. Entrevista concedida ao Projeto “Cientistas sociais de países de Língua Portuguesa: histórias de vida”., p. 14). Todos os docentes analisados nessa investigação tiveram experiências na condição de estudante/discípulo, seja diretamente com Bourdieu, seja por seus mais importantes interlocutores à época e, por isso, os processos de ensino e aprendizagem na formação internacionalizada desses docentes foram cruciais para os direcionamentos que suas carreiras tomaram.

Carlos Benedito Martins, por sua vez, revela como essa rede de interlocutores de Bourdieu era marcada por um trabalho colaborativo e dialógico, em que vários acadêmicos se reuniam na discussão dos trabalhos em andamento, quando nos informa que, além de sua participação no séminaire fermé, ele acabou por se aproximar tanto de Bourdieu quanto de Monique de Saint-Martin e Viviane Isambert Jamati (esta última, sua orientadora)10 10 “[...] a Monique me introduziu do grupo do Bourdieu. Quer dizer, eu era orientando da Viviane Isambert Jamati; mas, na verdade, quem me orientava na minha tese era a Monique, a Monique junto com o Bourdieu” (OLIVEIRA; MARTINS, 2019, p. 18). .

Nesse momento em que os docentes investigados estavam desenvolvendo suas dissertações ou teses junto ao grupo de Bourdieu, é possível vislumbrar as seguintes frentes de pesquisa:

A educação é tema central quando observamos os trabalhos que foram orientados pelos interlocutores franceses, enquanto o próprio Bourdieu esteve mais diretamente envolvido em trabalhos que tratavam dos campos intelectual e econômico. É importante mencionar, no entanto, que havia um forte interesse pela obra de Bourdieu dedicada à educação, não à toa A Reprodução foi sua primeira obra traduzida para o português, apenas cinco anos após sua publicação na França, ainda que tenha sido uma tradução que não contou com a devida apresentação da obra, além de contrastar de forma significativa com outros trabalhos que ganhavam visibilidade no campo educacional no mesmo período, que visibilizavam o papel mais engajado e transformador da educação, seguindo a esteira do que vinha sendo produzido por Paulo Freire.

Cabe também ressaltar o papel que Monique de Saint-Martin teve como principal mediadora do grupo de trabalho de Bourdieu junto a pesquisadores brasileiros (ROCHA, 2022aROCHA, Maria Eduarda da Mota. A internacional científica e o Bourdieu tupiniquim. In: ROCHA, Maria Eduarda , Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022a. p. 27-50.), de modo que sendo a educação seu principal foco de pesquisas, e tendo participado ativamente do grupo de pesquisadores que contribuíram com Bourdieu nesse campo (ALMEIDA et al, 2015ALMEIDA, Ana Maria F.; PEROSA, Graziela Serroni; ERNICA, Mauricio. Contribuição para uma história de Os Herdeiros-Entrevista com Monique de Saint-Martin. Educação & Sociedade, Campinas, v. 36, p. 181-194, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015139476. Acesso em: 15 jul. 2022.
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), era de se supor que sua atuação também impactasse a agenda dos jovens pesquisadores que buscavam dialogar com esse grupo francês.

Também Isambert-Jamati teve um pape relevante, considerando que ela foi central na recepção de estudantes brasileiros que dirigiam-se para a França a fim de realizar estudos doutorais no campo das Ciências da Educação (NOGUEIRA, 2011NOGUEIRA, Maria Alice. Contribuições francesas para o pensamento educacional e a formação de pesquisadores brasileiros. Cadernos de Estudos Sociais, Recife, v. 26, n. 1, p. 5-10, 2011. Disponível em: https://periodicos.fundaj.gov.br/CAD/article/view/1442. Acesso em: 26 jul. 2022.
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), tanto Carlos Benedito Martins quanto Maria Alice Nogueira finalizam suas teses em períodos próximos, passando a impactar de forma mais decisiva a Sociologia da Educação no Brasil a partir do final dos anos de 1980 - não à toa ambos contribuem para o número especial “Contribuições Das Ciências Humanas Para A Educação: A Sociologia” da revista Em Aberto em 1990, dialogando diretamente com a obra de Bourdieu, eles publicaram neste dossiê os seguintes artigos: “A sociologia da educação do final dos anos 60/início dos anos 70: o nascimento do paradigma da reprodução” (NOGUEIRA, 1990) e “A pluralidade dos mundos e das condutas sociais: a contribuição de Bourdieu para a sociologia da educação” (MARTINS, 1990MARTINS, Carlos Benedito. A pluralidade dos mundos e das condutas sociais: a contribuição de Bourdieu para a sociologia da educação. Em aberto, Recife, v. 9, n. 46, p. 59-72, 1990.).

QUADRO 2
Dissertações e teses dos professores/as pesquisadores/as selecionados por contato direto/indireto com pierre Bourdieu - genealogia.

Interessante perceber que ambos tiveram papeis fundamentais na institucionalização da Sociologia da Educação no Brasil, por um lado, Martins esteve à frente por anos do Grupo de Trabalho (GT) “Educação e Sociedade” da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS) e, por outro, Nogueira foi uma das fundadoras do GT “Sociologia da Educação” na Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), ademais ambos ajudaram a consolidar linhas de pesquisa em Sociologia da Educação em seus respectivos programas de pós-graduação, que representam alguns dos poucos nas áreas de Sociologia e de Educação com linhas específicas em Sociologia da Educação (OLIVEIRA; SILVA, 2020OLIVEIRA, Amurabi; SILVA, Camila Ferreira da. A diversidade de agentes e agendas na sociologia da educação no Brasil. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, São Paulo, n. 110. p. 99-131, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-099131/110. Acesso em: 13 jul. 2022.
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).

Maria Alice Nogueira, apesar de não ter frequentado os cursos de Bourdieu durante seu período de formação doutoral, teve Os Herdeiros e A Reprodução como uma das leituras obrigatórias neste período, ainda que destaque o impacto ainda mais decisivo de Aparelhos Ideológicos do Estado, publicado em 1970 por Louis Althusser e L’école capitaliste eN France, publicado em 1971 por Christian Baudelot e Roger Establet (OLIVEIRA; SILVA; VALLE, 2021SILVA, Camila Ferreira da; LOPES, Rodrigo de Macedo. A internacionalização da Sociologia brasileira: mapeamento das cartografias acadêmicas dos estudantes de pós-graduação. Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, v. 52, n. 2, p. 179-207, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufc.br/handle/riufc/60819. Acesso em: 19 jul. 2022.
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). Ela teve um papel central na difusão do autor no campo educacional brasileiro, principalmente a partir dos anos de 1990, consolidando essa posição com a organização juntamente com Afrânio Catani da coletânea Escritos de Educação, publicada originalmente em 1998 (PONTES, 2022PONTES, Thiago Panica. Sombras hermenêuticas de uma força viva: Pierre Bourdieu e o espaço da educação no Brasil. In: ROCHA, Maria Eduarda. Bourdieu à brasileira. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2022. p. 237-271.). Para organização deste trabalho ela entrou em contato direto com o autor, trocando correspondência com ele, tornando-se uma importante mediadora neste campo.

Também no campo da educação Ione Valle realizou inicialmente um percurso formativo comum entre os agentes da Sociologia da Educação no Brasil, transitando entre a Educação e as Ciências Sociais (OLIVEIRA; SILVA, 2020OLIVEIRA, Amurabi; SILVA, Camila Ferreira da. A diversidade de agentes e agendas na sociologia da educação no Brasil. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, São Paulo, n. 110. p. 99-131, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-099131/110. Acesso em: 13 jul. 2022.
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), tendo se graduado em Pedagogia e realizo o mestrado em Ciências Sociais, consolidando sua inserção na Sociologia da Educação em seu doutorado realizado na Universidade René Descartes, Paris V, sob a supervisão de Gabriel Langoüet. Além de tornar Bourdieu cada vez mais central em seu próprio trabalho e afirmando-o como central no campo da Educação (VALLE, 2007VALLE, Ione Ribeiro. A obra do sociólogo Pierre Bourdieu: uma irradiação incontestável. Educação e Pesquisa, v. 33, p. 117-134, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100008. Acesso em: 15 jul. 2022.
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), ela tem atuado de forma ativa como tradutora de seus trabalhos principalmente a partir dos anos de 2010, tendo traduzido Homo Academicus (2011), Os Herdeiros (2014) e mais recentemente com Charles Soulié organizou a coletânea Pierre Bourdieu: uma sociologia ambiciosa da educação (VALLE; SOULIÉ, 2019), com textos inéditos em língua portuguesa.

A envergadura desses trabalhos colocou os/as docentes brasileiros divulgadores do pensamento bourdieusiano em um caminho dialógico com o pensamento deste sociólogo e de seus discípulos franceses, transmutando-se em ponte incontornável entre Brasil e França e, mais especificamente, entre as teorias bourdieusianas e a realidade brasileira.

Para Rocha e Peters (2020ROCHA, Maria Eduarda da Mota; PETERS, Gabriel. Facetas de um Bourdieu tupiniquim: momentos de sua recepção no Brasil. BIB, São Paulo, n. 91, p. 1-30, 2020. Disponível em: https://bibanpocs.emnuvens.com.br/revista/article/view/494. Acesso em: 16 jul. 2022.
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, p. 7-8),

O fato de Miceli ter sido o único latino-americano a ter sua tese orientada por Bourdieu lhe rendeu um lugar privilegiado e precoce na rede, em uma época em que o sociólogo francês ainda tinha tempo disponível para uma interlocução intensa com seus colaboradores. Essa proximidade prolongou-se também em razão dos muitos trabalhos de publicação assumidos pelo brasileiro, o que fica evidente nas cartas que eles trocaram nos anos de 1970 e 1980. A participação na rede de colaboração organizada em torno de Bourdieu na década de 1970, sobretudo a partir das iniciativas organizacionais de Monique de Saint Martin, conferia um capital social e simbólico expressivo. Ele precisava, contudo, ser convertido nos termos do campo da sociologia brasileira para render o prestígio do posto de mediador da obra do francês no Brasil.

Temos, então, que esses divulgadores brasileiros, ao promoverem uma transferência de ideias de um campo nacional para outro (BOURDIEU, 2002BOURDIEU, Pierre. As condições sociais da circulação internacional das idéias. Tradução: Fernanda Abreu. ENFOQUES - Revista Eletrônica, Rio de Janeiro, v.1, n. 01, p. 106-117, 2002. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/enfoques/article/view/12679. Acesso em: 15 jul. 2022.
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), traçavam um caminho de legitimação não apenas do pensamento de Bourdieu no Brasil, mas também de consagração de suas vozes como herdeiros dessa tradição em terras tropicais. Deve-se considerar nesse processo que, ao passo que Bourdieu era um autor ainda pouco conhecido nas décadas de 1960 e 1970 no Brasil, ao longo dos anos de 1980 ele vai se consolidando como um dos principais sociólogos no mundo acadêmico, o que perpassa outras instâncias de consagração intelectual, como sua entrada no Collège de France em 1981 (OLIVEIRA; SILVA, 2022OLIVEIRA, Amurabi; MELO, Marina F.; PEQUENO, Mayres; RODRIGUES, Quemuel B. O perfil dos bolsistas de produtividade em pesquisa do CNPq em Sociologia. Sociologias, Porto Alegre, v. 24, n. 59, p. 170-198, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/15174522-106022. Acesso em: 16 jul. 2022.
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).

Como já dito, Moacir Palmeira foi orientado por um dos críticos do trabalho de Bourdieu, no entanto, ele chega a afirmar que as formulações teóricas de Bourdieu e Althusser foram as principais referências teóricas para sua tese (LOPES, 2013LOPES, José Sergio Leite. Entrevista com Moacir Palmeira. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 19, n. 39, p. 435-457. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ha/a/sPqBzXKsy94RnQLjZzNw5Jk/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 29 jul. 2022.
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). Ademais, isso não o impediu de traduzir o primeiro texto de Bourdieu para o português, o artigo O Campo Intelectual e Projeto Criador, presente na coletânea Problemas do Estruturalismo (POUILLON et al., 1968POUILLON, Jean et al.. Problemas do estruturalismo. Rio de Janeiro, Zahar Ed, 1968.).

Pensando a continuidade desse movimento de divulgação no Brasil, temos como um dos elementos mais importantes - e geralmente ignorado pela literatura especializada - a descendência dessa geração de primeiros divulgadores. Estamos a falar de sua atuação como orientadores de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Juntos, os nove docentes aqui analisados somam 371 orientações concluídas e em andamento e, apesar de não conseguirmos aferir em que medida há traços do referencial bourdieusiano em todos esses trabalhos, é possível aventar uma continuidade no sentido desse referencial por meio dos mestrandos e doutorandos que passam a ser orientados pela geração dos primeiros divulgadores. Esse certamente é um traço que contribui para o lugar ocupado por Bourdieu atualmente nas Ciências Humanas e Sociais no Brasil.

Nesse sentido, compreendemos que o processo de internacionalização do pensamento bourdieusiano, no caso brasileiro, passa necessariamente pelos trânsitos de pesquisadores em formação nas décadas de 1960 a 1990, que trabalham com Bourdieu e seus interlocutores, bem como pelas frentes de trabalho desenvolvidas por tais pesquisadores quando do seu retorno ao país de origem. Das traduções e publicações das obras do Bourdieu no país, até as orientações que passam mais tarde a realizar no interior dos programas de pós-graduação, temos um cenário em que o diálogo franco-brasileiro possibilitado por esse grupo contribuiu concomitantemente para a consolidação de Bourdieu na América Latina e no Brasil e para a consolidação desses docentes no campo científico brasileiro.

Considerações Finais

O objetivo deste artigo foi o de compreender o papel dos então jovens investigadores brasileiros, que estavam em trânsito na França e tiveram ligação direta ou indireta com Pierre Bourdieu entre as décadas de 1960 e 1990, na difusão do pensamento bourdieusiano no Brasil. Para tal, construímos um esboço da genealogia acadêmica de Bourdieu no Brasil, a qual demonstrou o potencial desta técnica no exercício de reconstrução dos laços acadêmicos que estiveram na base da consolidação da circulação das ideias e obras do sociólogo francês em solo brasileiro. Subvertendo o caráter quantitativo das genealogias acadêmicas, enveredamos por um caminho qualitativo, que visou demarcar as ligações diretas e indiretas e, sobretudo, como tais ligações foram responsáveis pelo direcionamento das carreiras acadêmicas dos então mestrandos ou doutorandos brasileiros que, nesse processo, transformaram-se em divulgadores de Bourdieu no Brasil.

Os/As nove docentes analisados estabeleceram relações diretas e indiretas com Bourdieu e seus interlocutores franceses por meio de orientação no mestrado ou doutorado, participação em seus seminários e correspondências diretas. Suas experiências constituíram importantes elos com a Sociologia francesa do período analisado e, em particular, com o pensamento bourdieusiano - incluindo dois pesquisadores que, mesmo sendo orientados mais tarde por professores notadamente críticos ao trabalho de Bourdieu, continuaram a dialogar com seu referencial. Nesse sentido, a genealogia que traçamos nos permitiu compreender que o papel que passaram a assumir, de divulgadores de Bourdieu no Brasil, esteve marcado pelas experiências e diálogos que consolidaram em seus trânsitos na França e, sobretudo, pelo trabalho que passaram a desenvolver no retorno ao país de origem, posto que suas atividades de pesquisa, orientação, produção e publicação estiveram ligadas, em graus distintos, à tarefa de continuar o debate pautado na perspectiva bourdieusiana.

Os resultados corroboram, portanto, o entendimento de que a consolidação de Bourdieu nas Ciências Humanas e Sociais brasileiras não pode ficar relegada unicamente aos processos de tradução de suas obras no Brasil, além disso, portanto, é necessário incorporar uma análise em torno do cotidiano do trabalho de seus divulgadores no campo acadêmico. Das orientações às publicações, passando por cursos, entrevistas e palestras, estamos diante de um grupo de divulgadores que tem desempenhado essa função por meio da totalidade de suas atuações no interior da academia.

É importante mencionar ainda que a França permanece como um importante espaço de formação acadêmica para pesquisadores brasileiros (SILVA; LOPES, 2021SILVA, Camila Ferreira da; LOPES, Rodrigo de Macedo. A internacionalização da Sociologia brasileira: mapeamento das cartografias acadêmicas dos estudantes de pós-graduação. Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, v. 52, n. 2, p. 179-207, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufc.br/handle/riufc/60819. Acesso em: 19 jul. 2022.
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), muitos dos quais têm dialogado com pesquisadores que continuam a debater a obra de Bourdieu na França e a produzir pesquisas orientadas por este referencial teórico. Assim, perdura a existência da formação de quadros no exterior de pesquisadores brasileiros voltados para a teoria bourdieusiana, como uma espécie de reverberação da primeira leva de seus divulgadores no Brasil. Ademais, ainda há obras de Bourdieu que só foram traduzidas tardiamente, como Os Herdeiros, obra publicada em português 50 anos após sua versão original em francês, e outras que permanecem inéditas no Brasil, e que têm sido objeto de reflexão por parte de pesquisadores brasileiros. Tendo isso em vista, os estudos de genealogia acadêmica a partir dessa primeira geração de divulgadores de Bourdieu - e também das gerações posteriores - tem potencial para um aprofundamento dos caminhos que possibilitaram a consolidação do legado bourdieusiano no Brasil.

REFERÊNCIAS

  • ALMEIDA, Ana Maria F.; PEROSA, Graziela Serroni; ERNICA, Mauricio. Contribuição para uma história de Os Herdeiros-Entrevista com Monique de Saint-Martin. Educação & Sociedade, Campinas, v. 36, p. 181-194, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015139476 Acesso em: 15 jul. 2022.
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  • ANJOS, José Carlos. Bourdieu e Foucault: derivas de um espaço epistêmico. Anos 90, Porto Alegre, v. 11, n. 19, p. 139-165, 2004. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/6354/3805. Acesso em: 22. jul. 2022.
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  • BARROS, Sérgio Miceli Pessôa de. Sérgio Miceli Pessôa de Barros (depoimento, 2012). Rio de Janeiro, CPDOC/Fundação Getulio Vargas (FGV), (2h 5min).
  • BASTOS, Elide Rugai et al. Conversas com sociólogos brasileiros. São Paulo: Editora 34, 2006.
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    » https://doi.org/10.1590/S0101-73302002000200006
  • 1
    O estudo que originou este artigo contou com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).
  • 2
    Os primeiros cursos de ciências sociais criados no Brasil foram os da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (1933), Universidade de São Paulo (1934), Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Paraná (1938) e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Bahia (1941).
  • 3
    Esta “missão” iniciou-se ainda em 1934, quando chegaram Émile Coornaert (história), Pierre Deffontaines (geografia), Robert Garric (literatura francesa), Paul-Arbousse Bastide (sociologia), Étienne Borne (filosofia e psicologia) e Michel Berveiller (literatura greco-latina) - somente Berveiller e Arbousse-Bastide renovam os seus contratos com a universidade no ano seguinte. Em 1935, chegaram Fernand Braudel (história), Pierre Hourcade (literatura francesa), Pierre Monbeig (geografia), Claude Lévi-Strauss (segunda cadeira de sociologia) e Jean Maugüé (filosofia). Monbeig e Maugüé permaneceram no país até 1944 e 1947, respectivamente. A partir de 1938 chegou um novo grupo de docentes composto pelos seguintes nomes: Jean Gagé (no lugar de Braudel), Alfred Bonzon (literatura francesa), Paul Hugon (economia) e Roger Bastide (substituto de Lévi-Strauss).
  • 4
    Entre os pesquisadores nível 1A do CNPq na área de Sociologia que realizaram estudos doutorais no exterior , 5 estudaram na França, 2 nos Estados Unidos, uma na Alemanha, uma no Canadá e uma no México (OLIVEIRA at al., 2022).
  • 5
    Vale a pena ressaltar que as ciências sociais brasileiras são um caso bastante atípico se compararmos com o que ocorreu em outros países latino-americanos que também passaram por experiências ditatoriais, uma vez que houve uma expansão no número de cursos de graduação e pós-graduação na área neste período (LIMA, 2019).
  • 6
    http://plataforma-acacia.org/
  • 7
    https://lattes.cnpq.br/
  • 8
    https://cpdoc.fgv.br/acervo/historia-oral/entrevistas-para-download
  • 9
    Atualmente Sergio Miceli é bolsista 1A do CNPq, Carlos Martins 1B, Maria Alice Nogueira 1A, Ione Valle 1D e Ana Maria Almeida 1D.
  • 10
    “[...] a Monique me introduziu do grupo do Bourdieu. Quer dizer, eu era orientando da Viviane Isambert Jamati; mas, na verdade, quem me orientava na minha tese era a Monique, a Monique junto com o Bourdieu” (OLIVEIRA; MARTINS, 2019, p. 18).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2022
  • Aceito
    24 Ago 2022
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