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O espaço das desigualdades educativas em São Paulo e em Recife

RESUMO

Neste artigo nós apresentamos um estudo empírico sobre as clivagens sociais e educacionais Recife e São Paulo, cidades caracterizadas pela urbanização acelerada e configurações urbanas fortemente desiguais. Com base na noção de espaço social e, em dados estatísticos do último Censo Populacional (IBGE/ 2010), apresenta-se um estudo sobre o espaço das disparidades educacionais nas duas metrópoles. O objetivo foi testar a pertinência da noção de espaço social no contexto brasileiro, identificando de uma só vez, a distribuição dos grupos sociais e seus investimentos educativos. Argumenta-se que a noção de espaço social é capaz de integrar vários outros conceitos chaves da sociologia bourdiesiana. Mobilizamos um grande conjunto de variáveis capturadas simultaneamente, trazendo à tona as diferenças internas das duas metrópoles e entre as cidades. A originalidade do estudo reside em partir dessa gama ampla de indicadores objetivos, relativos às condições de vida, associando-o ao uso de indicadores suscetíveis de serem percebidos como “subjetivos”. Como esperado, o primeiro eixo corresponde a uma forte correlação entre longevidade, renda domiciliar e nível de escolaridade. O segundo eixo é o resultado da correlação entre a posse do diploma de ensino secundário e a presença de maior infraestrutura pública. Em Recife, esse segundo eixo concerne a alguns bairros da cidade. Em São Paulo observa-se a mesma correlação, contudo, com a particularidade de apresentar um conjunto muito maior de bairros em posições sociais intermediárias. Nota-se ainda que Recife possui um número muito maior de regiões em situação de extrema pobreza se comparado à São Paulo.

Palavras-chaves:
Pierre Bourdieu; espaço social; desigualdades educacionais; Análise de Componentes Principais; sociologia da educação

ABSTRACT

This paper presents an empirical study on the social and educational gaps between Recife and São Paulo, cities characterized by fast urbanization and strongly unequal urban configurations. Based on the notion of social space and statistical data from the last Population Census (IBGE/ 2010), we present a study on the space of educational disparities in the two metropolises. The objective was to test the relevance of the notion of social space in the Brazilian context, identifying at once, the distribution of social groups and their educational investments. We argue that the notion of social space can integrate several other key concepts of Bourdieusian sociology. We mobilize a large set of variables captured simultaneously, bringing to light the differences within the two metropolises and between the cities. The study’s originality lies in starting from this wide range of objective indicators related to living conditions, associating it with the use of indicators likely to be perceived as “subjective.” As expected, the first axis strongly correlates with longevity, household income, and education level. The second axis is the result of the correlation between the possession of a high school diploma and the presence of greater public infrastructure. In Recife, this second axis concerns a few neighborhoods in the city. In São Paulo, however, the same correlation is observed with a much larger set of neighborhoods in intermediate social positions. It is also noticeable that Recife has a much larger number of regions in extreme poverty compared to São Paulo.

Keywords:
Pierre Bourdieu; social space; educational inequalities; Principal Component Analysis; sociology of education

Introdução

Neste artigo examinamos a relação existente entre as desigualdades sociais e educacionais em dois contextos urbanos brasileiros: Recife e São Paulo. Explora o que ocorre nos extremos da riqueza e da pobreza nas duas capitais, com atenção às situações intermediárias, aí presentes, e ao aumento progressivo da escolarização e do emprego formal feminino. Resulta de análise estatística baseada nos dados do último Censo Populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE/ 2010) e disponíveis para as diferentes regiões intramunicipais de Recife e São Paulo.

Com este estudo empírico, nós testamos a pertinência da noção de espaço social, desenvolvida por Pierre Bourdieu (2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Trad. Ione Ribeiro Valle; Nilton Valle, Rev. Téc. Maria Tereza de Queiroz Piacentini. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011.), recorrendo como o autor, ao apoio de métodos estatísticos de Análise Geométrica de Dados (AGD), mais apropriados à concepção relacional do mundo social e à multidimensionalidade da realidade social (LEBARON; LE ROUX, 2013LEBARON, Frédéric; LE ROUX, Brigitte. “Geometrie du champ”. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, v.200, p.106-109, 2013.). Se a importância da quantificação na sociologia da educação de Bourdieu remonta à Les Héritiers (1964), o desenvolvimento das noções de espaço social e de campo, progressivamente, realizadas em La Distinction (1979), em La Noblesse d’État (1989), por exemplo, foram realizados com o apoio de Análises de Correspondências Múltiplas (ACM). Nesta perspectiva, a articulação com a teoria bourdieusiana reside também na escolha das variáveis. Essa dimensão foi absolutamente central neste estudo, revelando sua gênese na sociologia bourdieusiana.

Em “Espaço social e gênese das classes”, Bourdieu (2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Trad. Ione Ribeiro Valle; Nilton Valle, Rev. Téc. Maria Tereza de Queiroz Piacentini. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011.) define o espaço social como um espaço de posições contrapondo-se às classes no papel, ou seja, definidas e nomeadas, a partir de categorias mais ou menos abstratas, presentes em certas tradições marxistas. Para ele, “Com base no conhecimento no espaço das posições, podemos recortar classes no sentido lógico do termo, quer dizer, conjunto de agentes que ocupam posições semelhantes e que, colocados em posições semelhantes e sujeitos a condicionamentos semelhantes, têm, com toda probabilidade, atitudes e interesses semelhantes, logo, práticas e tomadas de posição semelhantes”. (BOURDIEU, 2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Trad. Ione Ribeiro Valle; Nilton Valle, Rev. Téc. Maria Tereza de Queiroz Piacentini. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011., p.136). Por meio do inquérito estatístico - segundo Bourdieu, o único meio de construir o espaço social-, nós buscamos relacionar as posições sociais, em Recife e em São Paulo, aos investimentos educacionais, passíveis de serem apreendidos dentro dos limites das estatísticas disponíveis para as duas cidades. Ainda de acordo com a formulação bourdiesiana de espaço social, os agentes se distribuem no espaço, em uma primeira dimensão, em função do volume de capital e em uma segunda dimensão, segundo a composição do seu capital1 1 Os estudos que buscam testar a pertinência da noção de espaço social em outras realidades nacionais revelam que a ambição de Bourdieu, de propor conceitos com potencial de serem aplicados universalmente, não foi em vão. Ver, por exemplo, Johs Hjellbrekke & Olav Korsnes (2013) para o caso da Noruega. Para as cidades latino-americanas, consultar os estudos da equipe de Alícia Gutierrez e Manuel Giovine (2017) sobre a cidade de Córdoba, na Argentina. Ver também, Perosa, Lebaron e Leite (2015), para o caso da cidade de São Paulo. . Vejamos, por exemplo, como reconstruímos o espaço social das duas metrópoles. Primeiramente, com base na apreensão de diferentes formas de capital (capital econômico e cultural, principalmente, uma vez que não dispúnhamos de informações estatísticas de outras formas de capital). Em segundo lugar, porque relacionamos o espaço das posições sociais a uma série de decisões, jamais completamente livres, concebidas na perspectiva bourdieusiana como “tomadas de posições”.

Nós argumentamos que a noção de espaço social é capaz de integrar vários outros conceitos chaves da sociologia bourdiesiana, tais como, estrutura de capitais, campo, habitus, capital, homologias estruturais, illusio, etc. Com este estudo, nós reconstruímos o espaço social das desigualdades educacionais, com o intuito de explorar as cidades à luz da teoria de Pierre Bourdieu. Por desigualdades educacionais entendemos as diferenças de acesso e de orientação no interior dos sistemas de ensino derivadas da origem social, geográfica, de gênero, etnicorracial, etc (LEBARON, 2014LEBARON, Frédéric. 35 grandes notions de la sociologie. França, Dunod, 2014.).

A escolha de Recife e São Paulo como campo empírico tem sua razão de ser no fato de que são metrópoles brasileiras que experimentaram um processo de urbanização muito rápido, desde a virada do século XIX para as primeiras décadas do século XX (MORSE, 1970MORSE, Richard. Formação histórica de São Paulo. São Paulo, Editora: Difusão Européia do Livro, 1970.; SINGER, 1974SINGER, Paul. Desenvolvimento Econômico e Evolução Urbana. São Paulo, Editora Nacional, 1974.; FREYRE, 1961FREYRE, Gilberto. Sobrados e Mocambos. 3ª ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1961.; SOUZA, 2015SOUZA, Maria Angela de Almeida. Recife: Transformações na ordem Urbana. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015.)2 2 Esse processo ocorreu também em todo território nacional, em diferentes intensidades, quando a partir da década de 1960 o país tornou-se predominantemente urbano Fonte: IBGE, Censo demográfico 1940-2010. Disponível em https://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=POP122&t=taxa-urbanizacao, acesso em 20/09/2021. . Em ambos os casos, o crescimento econômico e a urbanização foram acompanhados pela formação de vários bairros “periféricos”, cuja população vive em condições precárias, às vezes sem serviços públicos básicos, como recursos sanitários, equipamentos de saúde e de educação suficientes. Em ambas as cidades, houve significativas reformulações urbanas ao longo de todo século XX. Em São Paulo, elas foram provocadas pelos fluxos migratórios desencadeados no processo de industrialização; em Recife, desde a primeira década do XIX, o aumento do contingente populacional esteve fortemente relacionado à intensa atividade comercial da cidade portuária. Recife, situada na região nordeste, e São Paulo, na região sudeste, oferecem a oportunidade de observar os contrastes regionais no Brasil.

Recife se consolidou como importante centro financeiro e comercial da região norte do Brasil com a abertura dos portos da colônia às nações (1808) graças ao seu forte potencial agro-exportador, voltado para a comercialização da cana de açúcar e algodão (PRADO Jr, 1994PRADO Jr, Caio. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1994., p. 127). Referência para o mercado internacional da época, Recife atraía viajantes, mercadores e comerciantes de variadas atividades e artigos para a urbe, contribuindo, desta forma, para a expansão da economia urbana. Além disso, as instalações das usinas para as áreas mais centrais da cidade, as campanhas de vacinação e o processo de modernização do sistema de esgoto, levou a população de Recife a crescer significativamente (DUARTE, 2005DUARTE, José Lins. Recife no tempo da maxambomba (1867- 1889). Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005., p. 55). Entre os anos de 1810 e 1872, estima-se que a população do Recife tenha praticamente quadruplicado, passando de 26.000 para 100.00 habitantes (ZANCHETTI, 1989ZANCHETTI, Silvio Mendes. O Estado e a Cidade do Recife (1836-1889). Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989., p.136).

No que diz respeito à consolidação do sistema de ensino, escolas primárias municipais e as escolas católicas privadas, dirigidas por diferentes congregações religiosas (jesuítas, salesianos, maristas e carmelitas), instalaram-se, inicialmente, na região central da cidade, lugar de comércio e de moradia da população mais abastada, que aí se misturava com a população pobre. Reformas urbanas, iniciadas em 1920 e que ganharam forma nas décadas de 1940 e 1950, retiraram a população pobre e suas habitações precárias do centro da cidade (FREYRE, 1961FREYRE, Gilberto. Sobrados e Mocambos. 3ª ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1961.), aterraram os manguezais e lotearam os antigos engenhos e sítios, no sentido oeste e norte. O loteamento, atualmente, corresponde a bairros de interessantes denominações: Boa Vista, Derby, Graças, Aflitos, Espinheiro, Jaqueira, Madalena, Torre, Campo Grande, Encruzilhada e Grande Casa Forte. Escolas privadas e públicas aí se instalaram para atender as tradicionais famílias rurais, os comerciantes e banqueiros, que outrora residiam no centro. Data dos anos 50, a edificação da zona sul, junto à praia, que abriga hoje a burguesia econômica da cidade. Em 1970, o contingente populacional de Recife atingiu pouco mais de 1 milhão de habitantes.

São Paulo deixou de ter as características de uma cidade comercial provinciana para tornar-se, gradativamente, o maior centro econômico brasileiro entre as últimas décadas do século XIX e as primeiras décadas do século XX. A riqueza proporcionada pelo café e mais tarde a indústria de substituição de importação acarretou uma população de 600 mil habitantes em 1920 e de 2 milhões em 1940 acompanhadas da explosão da população escolar, obrigatória desde 1934 no país. Como em Recife, a chegada de escolas privadas, predominantemente católicas, mas também laicas, não raro, criadas por grupos de imigrantes europeus, deram origem a um sólido mercado escolar, segmentado pela origem social e por gênero (PEROSA, 2010PEROSA, Graziela S. A passagem pelo sistema de ensino em três gerações: classe e gênero na segmentação do sistema de ensino. Educação & Sociedade. v. 31, n. 111, p. 391-409, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-73302010000200006. Acesso em: 12 jul. 2022.
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201000...
; ALMEIDA, 2017ALMEIDA, Ana Maria F. et al. A educação privada na Argentina e no Brasil. Educação e Pesquisa. v. 43, n. 4, p. 939-956, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1517-97022017101177284. Acesso em: 19 maio. 2022.
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201710...
), com características estruturais próximas ao que Fritz Ringer demonstrou para os sistemas de ensino francês e alemão (RINGER, 1979RINGER, Fritz. Education and society in modern Europe. Bloomington: Indiana University Press, 1979., 2003).

Os dados do último censo populacional brasileiro e do censo escolar (IBGE/2010 e INEP/2010) contribuem para visualizar alguns aspectos estruturais do estado recente do sistema de ensino nas duas cidades. Em Recife, a rede pública de ensino responde por 64% das matrículas, deixando um espaço muito maior para a iniciativa privada. Apesar da oferta escolar privada altamente variada, em São Paulo o poder público atende a quase 80% das matrículas, um percentual que se acentua nas regiões mais pobres da cidade e pode chegar a apenas 36% em Pinheiros, região na qual concentram-se os domicílios de maior capital econômico e cultural.

QUADRO 1
Síntese de indicadores educacionais.

A despeito dos avanços na redução das taxas de analfabetismo, historicamente muito elevadas no país, Recife ainda possui o triplo da população não alfabetizada, se comparada à São Paulo. A diferença entre as taxas de abandono do ensino médio é mais do que o dobro daquela encontrada em São Paulo, sabendo que a evasão escolar está fortemente associada às situações de baixa renda das famílias e à necessidade premente do trabalho de crianças e jovens. Quanto à desigualdade da distribuição de renda, ela vem aumentando, com poucos momentos de recuo (HASENBALG; SILVA, 2003HASENBALG, Carlos; SILVA, Nelson do Valle. Origens e destinos: desigualdades sociais ao longo da vida. Topbooks. Rio de Janeiro, 2003.; PIKETTY, 2019PIKETTY, Thomas. Capital et Ideologie. Paris: Editions Seuil, 2019.). No caso de Recife, a concentração de riqueza praticamente não foi alterada nas últimas décadas (o índice GINI 0,68 permaneceu praticamente o mesmo entre 1990 e 2010). São Paulo, por sua vez, manteve crescente sua concentração de renda: de 0,57, em 1990 passou para 0,64, em 2010. As informações de 2018 mostram a estabilidade dos padrões de desigualdade nas metrópoles brasileiras com Recife apresentando 0,60 de Índice Gini de Renda e São Paulo 0,58%. Nesse contexto de expansão escolar e aumento das desigualdades sociais das últimas décadas, torna-se pertinente interrogar em que medida a “democratização quantitativa”, como simples acesso generalizado à escola, produz a translação das desigualdades para o interior do sistema de ensino, como argumentaram Bourdieu e Passeron em Os Herdeiros (BOURDIEU; PASSERON, 1964BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Les Héritiers, Paris, Editions Minuit, 1964.) e, mais tarde, em “Os excluídos do interior” (BOURDIEU, 1992). No contexto de metrópoles brasileiras, caracterizadas pelo aumento recente do nível de escolaridade da população, qual seria o estado atual das desigualdades socioeducativas?3 3 Naturalmente, nós nos propomos a apresentar o estado do sistema de ensino nas duas capitais brasileiras, dentro dos limites das estatísticas nacionais e adicionalmente, com os dados de duas municipalidades distintas, a partir dos mesmos indicadores. Assim, se o estado das desigualdades educacionais apresentado neste texto é limitado isso se deve, em boa medida, à disponibilidade de estatísticas comparáveis para as duas cidades e agregadas por diferentes regiões intramunicipais. Em que medida a ampliação do acesso ao ensino secundário teria contribuído para aumentar a proporção das posições intermediárias na estrutura social nas duas cidades?

Educação e segregação social

A representação do senso comum, da mídia e de muitos pesquisadores, tende a descrever as cidades pela análise de casos extremos, opondo as « favelas » e os « bairros pobres » aos bairros « nobres e ricos », espelhando o modelo dual proposto por Sassen (2001SASSEN, Saskia. The global city: New York, London, Tokyo. New Jersey, Princeton University press, 2001.) para as global cities (OBERTI; PRÉTECEILLE, 2016OBERTI, Marco; PRÉTECEILLE, Edmond. La ségrégation urbaine. Paris, La Découverte, Collection Repères, 2016.; PRÉTECEILLE; RIBEIRO, 1999)4 4 De acordo com Sassen (2004), as “global cities”podem ser caracterizadas por uma dupla dinâmica de dispersão e concentração geográfica, própria do fenômeno da globalização, marcado pelo crescimento da presença de multinacionais, pela importância assumida pelo setor de serviços e pela exigência de profissionais altamente qualificados. Tais características são comuns a São Paulo e Recife que concentram, atualmente, fortes demandas por educação. . Muitos estudos das ciências sociais tendem a se concentrar no caso particular dos bairros pobres e estigmatizados, da mesma maneira que a literatura educacional privilegia investigações de escolas situadas em espaços de vulnerabilidade social, deixando a educação dos grupos dominantes e das posições intermediárias relativamente menos exploradas.5 5 Os estudos sobre a escolarização dos grupos dominantes e das classes médias altas foram particularmente desenvolvidos no Brasil, na perspectiva sociológica bourdiesiana, por Maria Alice Nogueira e Ana Maria Almeida (2002) e Graziela Perosa (2009), dentre outros estudos mais recentes.

Mais recentemente, alguns estudos urbanos, como aqueles desenvolvidos por Eduardo Marques (2014MARQUES, Eduardo Cesar Leão. Estrutura Social e Segregação em São Paulo: Transformações na Década de 2000. Dados. v. 57, p. 675-710, 2014.) sobre São Paulo revelaram que se os casos extremos nas cidades, as regiões mais ricas e mais pobres, podem ser socialmente homogêneos, há muitas regiões da capital paulista em que se observa uma forte heterogeneidade social, ainda que eles possam ser vistos e pensados como bairros e territórios de periferia. Nossos estudos precedentes sobre a chegada de escolas privadas às periferias de São Paulo apresentam resultados convergentes (PEROSA; DANTAS, 2017PEROSA, Graziela. S.; DANTAS, Adriana. S. R. A escolha da escola privada em famílias dos grupos populares. Educação e Pesquisa (USP. Impresso), v. 43, p. 987-1004, 2017.).

Na hipótese que fundamenta esta pesquisa a escolaridade é uma dimensão crucial para descrever a estrutura social das cidades, para além das desigualdades socioespaciais privilegiadas nos estudos urbanos. Uma segunda hipótese trabalhada diz respeito à aquisição do diploma do ensino médio, como um fator decisivo e que contribui para distinguir as frações dos grupos de elite e dos grupos populares tanto em Recife como em São Paulo.

O interesse em valorizar a dimensão educacional está em pensar o desenvolvimento das cidades para além da dimensão econômica e observar sistematicamente a incidência de diferentes fenômenos entre os grupos sociais, acompanhando a recomendação do relatório Para Além do PIB de Stiglitz, Fitoussi e Sen (2009STIGLITZ, Joseph; SEN, Amartya; FITOUSSI, Jean-Paul. Performances économiques et progrès social. Paris, Odile Jacob, ed. 2, 2009.). Trata-se de uma abordagem pertinente para o estudo de contextos urbanos altamente desiguais porque traz à tona a distribuição dos recursos (sociais, econômicos, educacionais, etc) entre os grupos sociais, valorizando a aquisição de capital cultural como um aspecto central na estrutura social.

Há um consenso, há décadas, na literatura educacional internacional sobre a forte correlação encontrada entre o nível socioeconômico das famílias e o desempenho escolar (BOURDIEU; PASSERON, 1964BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Les Héritiers, Paris, Editions Minuit, 1964.; COLEMAN, 1966COLEMAN, James. S. et al. Report on Equality of Educational Opportunity. U.S. Government Printing Office for Departement of Health, Education and Welfare, 1966.;BOUDON, 1973BOUDON, Raymond. L´inégalités des chances. Paris, Armand Colin, 1973.). Os estudos de avaliação em larga escala, como o PISA, reforçam esta conclusão, embora a intensidade dessa associação varie entre os países (BAUDELOT; ESTABLET, 2009BAUDELOT, Christian; ESTABLET, Roger. L’Élitisme républicain. Paris, Seuil, 2009.). Pierre Merle (2012MERLE, Pierre. La ségrégation scolaire. Paris, La Découverte, 2012.), argumenta que a relação entre segregação social e segregação acadêmica é presente internacionalmente. Ele distingue três grupos entre os países da OCDE: aqueles em que há uma relação mais fraca entre nível socioeconômico e desempenho escolar, do qual fazem parte a Finlândia, a Dinamarca, a Noruega e o Canadá, entre outros; um grupo intermediário no qual se nota um nível elevado de correlação entre desempenho escolar e o nível sócio econômico, a exemplo da França e do Japão. Um terceiro grupo constituído por países em que os sistemas de ensino são muito pouco eficazes para combater as desigualdades anteriores à escola e no qual se inserem o Brasil, a Tailândia, a Turquia, Hungria e o México (MERLE, 2012MERLE, Pierre. La ségrégation scolaire. Paris, La Découverte, 2012., p. 18).

Para abordar as disparidades internas das duas cidades, nós nos apoiamos na noção de espaço social que convida a relacionar a posição social e as “tomadas de posição” relativas às práticas e às estratégias atinentes ao sistema de ensino. Bourdieu chamou de “tomada de posição” as “escolhas”, com aspas, que os agentes fazem nos mais diferentes domínios da prática, desde as estratégias educativas até as preferências políticas, passando pelo gosto ou pelas escolhas matrimoniais etc. Para ele, as “escolhas” não são decisões livres e conscientes de uma pessoa singular (HAUCHECORNE, 2020HAUCHECORNE, Mathieu. Prises de position. In: Gisèle Sapiro, Dictionnaire international Bourdieu. Paris, CNRS Éditions, 2020, p. 964, p. 680)6 6 Como argumenta o economista Robert Boyer (2003), longe de se limitar à análise da reprodução, a perspectiva bourdieusiana fornece uma série de determinantes de mudança. .

Por outro lado, o espaço social, construído por meio do inquérito estatístico, possibilita um exercício de topologia, útil tanto para descrever o conjunto das cidades como para reconhecer as diferentes configurações urbanas existentes no seu interior. A construção do espaço social, nesta perspectiva, é realizada não a partir de princípios teóricos sobre como se definem as classes sociais, mas a partir de um conjunto de propriedades pertinentes ao conjunto da população. Na ausência das categorias sócio-profissionais em escala intramunicipal para as duas cidades, nós consideramos aqui a renda domiciliar, o nível educacional da população e a infraestrutura pública, presentes em cada região das duas metrópoles. Bourdieu oferece vários exemplos de operacionalização da noção de espaço social (BOURDIEU, 1979BOURDIEU, Pierre. La distinction. Paris, Seuil, 1979.; 1989; 2011), nos quais ele recorre ao uso das análises de correspondências como instrumento para oferecer uma representação gráfica do caráter relacional e multidimensional da realidade social (LEBARON; LE ROUX, 2013LEBARON, Frédéric; LE ROUX, Brigitte. “Geometrie du champ”. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, v.200, p.106-109, 2013.).

A primeira grande vantagem de uma análise de correspondências é oferecer uma visão do conjunto do universo pesquisado. Depois, permite trabalhar com um amplo número de variáveis, o que torna possível operacionalizar o estudo da multidimensionalidade e da interseccionalidade. Apesar da limitação na disponibilidade de estatísticas perfeitamente comparáveis para as duas cidades, a análise de correspondências contribui para construir uma visão menos empobrecida da realidade social, incluindo um número maior de variáveis e sem se limitar à dimensão estritamente econômica.

Esta análise relacional dos dados contribui para a reflexividade da pesquisa em sociologia da educação. Se por um lado, os estudos de casos (de bairros ou escolas específicas, etc) permitem um aprofundamento, oferecidos pelas observações etnográficas, pela longa duração em trabalho de campo, e como resultado, uma compreensão mais fina da realidade social, por outro lado, há também alguns riscos. Um dos mais evidentes é a generalização da representação de bairros e escolas de periferias, obscurecendo diferenças que podem ser captadas quando comparamos a composição dos bairros e suas posições na estrutura social da cidade (OBERTI; PRÉTECEILLE, 2016OBERTI, Marco; PRÉTECEILLE, Edmond. La ségrégation urbaine. Paris, La Découverte, Collection Repères, 2016.).

Fontes e métodos

Sem pretender apagar as particularidades da formação sócio-histórica de Recife e São Paulo, uma primeira preocupação metodológica foi estabelecer um conjunto de indicadores que permitisse torná-las comparáveis. Para tanto, testamos um mesmo conjunto de hipóteses utilizando as mesmas variáveis de renda e educação e, na medida do possível, os mesmos indicadores de infraestrutura pública, com base nos dados do último Censo Populacional do IBGE, de 2010. Para a realização do nosso estudo mobilizamos a técnica da Análise de Componentes Principais7 7 Foi utilizado, neste trabalho, o programa Spad em sua versão 7.1. e escolhemos como unidades territoriais aquelas cujas informações tivessem disponível em nível mais desagregado.

No caso de São Paulo, optamos pelas subprefeituras (31 no total) por serem as unidades administrativas mais descentralizadas que incluem distritos e bairros. Para Recife, utilizamos as áreas de ponderação estipuladas pelo IBGE (recorte territorial mais desagregado e, que, em geral, é maior que alguns bairros do Recife), tendo em vista que as informações educacionais só estavam disponíveis nesse nível de desagregação8 8 Uma vez extraídas as informações para as 40 áreas de ponderação que compõem a cidade de Recife, decidimos agrupá-las em conjuntos de bairros correspondentes, totalizando assim 33 áreas de bairros. Uma área de Ponderação contém em torno de 400 domicílios. .

Nós nos baseamos nas estatísticas municipais de Recife e São Paulo, extraídas do Censo Populacional IBGE/2010, pelos responsáveis pela produção de informações sobre os territórios das duas cidades. Encontramos nestes setores municipais de dados estatísticos, geógrafos e estatísticos empenhados em tornar essas informações “transparentes” para a população, gestores públicos, disponibilizando-as on-line em várias escalas pertinentes tanto no caso de Recife como de São Paulo9 9 Em 2011 foi publicada a Lei de Acesso à Informação no Brasil (Lei 12.527) que obrigou os órgãos e as entidades do poder público a assegurar a gestão transparente da informação, tornando obrigatória a divulgação de dados de interesse da população em sites oficiais desses órgãos na internet. Em São Paulo essas informações foram reunidas nas plataformas do Infocidade e GeoSampa (http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br e http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br ). .

O maior desafio foi encontrar as mesmas informações para as duas cidades, o que explica o caráter genérico de algumas medidas utilizadas neste estudo. Nos dois casos, encontramos uma variação de indicadores sociais e educacionais, ligados aos desafios particulares de cada municipalidade, corroborando os argumentos de Desrosières (2000DESROSIÈRES, A. La politique des grands nombres: Histoire de la raison statistique. Paris, La Découverte, 2000.) sobre o desenvolvimento dos sistemas estatísticos europeus, altamente ajustados aos problemas sociais reconhecidos em cada sociedade. Um exemplo disso é a maior disponibilidade de dados em Recife sobre as estruturas escolares encarregadas da alfabetização e escolarização de adultos, como as taxas de matrícula no EJA (Educação de Jovens e Adultos). Cada uma destas informações disponíveis são ferramentas de observação da realidade local, gestadas historicamente, atravessadas pela história e por hesitações sobre como transformar fatos sociais em “coisas” mensuráveis, o desemprego, o acesso à educação, o abandono do ensino, etc (DESROSIÈRES, 2000DESROSIÈRES, A. La politique des grands nombres: Histoire de la raison statistique. Paris, La Découverte, 2000., p. 9).

A Análise de Componentes Principais (ACP) standard, método utilizado para examinar a estrutura de correlações estatísticas de cada uma das cidades, foi realizada a partir de um conjunto de variáveis que incluiu indicadores de características da população, no que diz respeito ao volume e à composição do capital econômico e educacional. Acrescentamos ainda, variáveis indicativas das propriedades sociais das subprefeituras de São Paulo e dos bairros de Recife (ver Quadro 2). Para ambas as cidades, incluímos dados relativos ao nível de renda domiciliar mensal em salários-mínimos, o nível educacional da população, dados de infraestrutura pública disponíveis nas cidades, como por exemplo, “bibliotecas públicas” e “academias da cidade”, além de características sociodemográficas da população. Em seguida procedeu-se à escolha das “variáveis ilustrativas” que nos ajudam a refinar as correlações entre as condições de vida e os investimentos educacionais, pensados nesta pesquisa como “tomadas de posição”.

QUADRO 2
Variáveis ativas.

O universo de domicílios de São Paulo analisados é de 3.574.286, distribuído por 31 subprefeituras, enquanto o de Recife é de 470.754, distribuído por 33 aglomerados de bairros. No que diz respeito à distribuição de renda, em ambas as cidades os extremos são mais equilibrados, uma vez que 6% (São Paulo) e 4% (Recife) dos domicílios vivia em 2010 com uma renda nominal mensal de até ½ salário mínimo e 6% (São Paulo) e 5% (Recife) com mais de 20 salários mínimos, respectivamente. No entanto, há regiões nas duas cidades em que até 55% (São Paulo) e 54% (Recife) da população recebe mais de 10 salários-mínimos, enquanto em outras menos de 1% da população recebe tais rendimentos. Da mesma forma, a distribuição dos dados referentes às condições de domicílio revela as assimetrias estruturais presentes nas duas cidades.

QUADRO 3
Variáveis ilustrativas.

Na metrópole paulistana a taxa média de domicílios sem esgoto é de 9%, sendo que temos regiões em que 100% dos domicílios contam com este equipamento público, no extremo oposto do espaço social apenas 35% possuem esse recurso. Na capital pernambucana, por outro lado, a média de domicílios sem rede de esgoto é três vezes a de São Paulo e chega a 31%. Nos bairros mais pobres, essa é a realidade para quase 81% dos domicílios. Com o intuito de compreender de que forma os diferentes recursos socioeconômicos, culturais e as características de infraestrutura pública se correlacionam aos investimentos educacionais, comparativamente, apresentamos os resultados deste estudo sobre o espaço social em São Paulo e em Recife.

Operacionalizar uma análise multidimensional

A Análise de Componentes Principais (ACP) permite operacionalizar uma análise multidimensional nas duas cidades, ao possibilitar a inclusão de um grande número de fenômenos, em geral tratados separadamente, oferecendo a oportunidade de identificar convergências e divergências entre elas. O resultado é um quadro composto de 64 indivíduos (as 31 subprefeituras de São Paulo e os 33 bairros de Recife) (Figura 1) e outro de 11 variáveis ativas (Figura 2) que permitem construir uma nuvem de pontos multidimensionais, descrevendo as características das unidades territoriais das duas cidades. Para favorecer a compreensão das configurações urbanas nas duas cidades simultaneamente, nós usamos o vermelho para os bairros de Recife e o azul para as subprefeituras de São Paulo. Descrevemos aqui os (3) eixos que resumem 85,22% da variância total do espaço. Começaremos pela interpretação do eixo 1, o eixo horizontal que estrutura as Figuras 1 e 2. Esse eixo corresponde a 56,33% da variância estatística e, em seguida, temos o eixo 2, vertical, que contribui com 16,58% do espaço. O eixo 3 é responsável por 12,31% da variância.

FIGURA 1
O espaço social das subprefeituras e bairros de São Paulo e Recife.

Como esperado nestes contextos urbanos, o nível de escolarização, a longevidade e a renda da população aparecem fortemente correlacionados. O eixo 1 opõe tanto as subprefeituras de São Paulo quanto os bairros mais ricos de Recife e com maior percentual da população com Ensino Superior às subprefeituras e bairros em que a população vive em situação de pobreza, muitas vezes em condições indignas, com alto número de domicílios sem esgoto. Parelheiros, M’Boi Mirim, Cidade Tiradentes, em São Paulo e Linha do Tiro, Água Fria, Dois Unidos em Recife opõem-se à Pinheiros e Vila Mariana, em São Paulo, e os bairros Aflitos, Boa Viagem, Jaqueira, em Recife.

FIGURA 2
Círculo das correlações das variáveis ativas (São paulo e Recife).

FIGURA 3
Círculo de variáveis ilustrativas em São Paulo e Recife.

Se Parelheiros, em São Paulo, corresponde ao extremo da pobreza e da precariedade habitacional, Recife, por sua vez, possui uma nuvem muito mais densa de bairros com estas mesmas características. Contudo, as regiões que correspondem ao extremo da precariedade em Recife não encontram equivalentes em São Paulo. Brejo da Guabiraba, Nova Descoberta e Ilha Joana Bezerra são regiões ainda mais precárias do que representa Parelheiros em São Paulo (PEROSA; LEBARON; LEITE, 2015PEROSA, Graziela. S.; LEBARON, Frédéric.; LEITE, Cristiane. K. S. O espaço das desigualdades educativas no município de São Paulo. Pro-posições (UNICAMP. ONLINE), v. 26, p. 99-118, 2015.). Conforme podemos observar no quadrante superior direito da Figura 1, essas nuvens de regiões (Brejo da Guabiraba, Nova Descoberta, Ilha Joana Bezerra) e logo abaixo, Parelheiros, Linha do Tiro, etc, são as regiões nas quais encontramos as maiores concentrações de domicílios cujo rendimento mensal varia entre 1⁄2 até 2 salários mínimos e maiores proporções de domicílios sem rede de esgoto. Além disso, a maior parte da população residente nessas regiões das cidades não concluiu o Ensino Fundamental II.

Outra dimensão extremamente correlacionada ao Eixo 1, é a raça/cor autodeclarada pela população. Nos aglomerados urbanos mais pobres, com baixa renda, baixa escolaridade e menor disponibilidade de infraestrutura pública, encontramos a maior concentração da população autodeclarada negra (parda e preta). Corroborando a literatura nacional sobre as desigualdades sociais brasileiras, na qual a dimensão racial se constitui num princípio de diferenciação da maior importância no Brasil (LIMA; RAMOS, 2017LIMA, Marcia; RAMOS, Paula. Educação e políticas de promoção da igualdade racial no Brasil de 2003 a 2014. Análise, v. 31, 2017. Disponível em: https://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/13615.pdf. Acesso em: 20 Set. 2021.
https://library.fes.de/pdf-files/bueros/...
;VARGAS, 2015VARGAS, Hustana Maria. Cor e curso na interiorização de uma universidade federal. Cadernos do Gea, v.7, n.42, 2015. Disponível em: https://flacso.org.br/?publication=opiniao-n22-cor-e-curso-na-interiorizacao-de-uma-universidade-federal. Acesso em: 08 Out. 2021.
https://flacso.org.br/?publication=opini...
; TEIXEIRA, 2015TEIXEIRA, Eliana de Oliveira; VARGAS, Hustana Maria. Tensionando os números: o Ensino Fundamental está mesmo universalizado para crianças e adolescentes negros?Anais do 37º Congresso Nacional da ANPED, Florianópolis, 2015. Disponível em: https://www.anped.org.br/sites/default/files/trabalho-gt21-3981.pdf. Acesso em: 20 Fev. 2022.
https://www.anped.org.br/sites/default/f...
;HASENBALG; SILVA, 2003HASENBALG, Carlos; SILVA, Nelson do Valle. Origens e destinos: desigualdades sociais ao longo da vida. Topbooks. Rio de Janeiro, 2003.).

A distribuição do grau de escolarização e da renda nas duas metrópoles está associada também à longevidade. Nas regiões menos providas de infraestrutura pública, com domicílios de menor renda e menor nível de escolaridade, encontramos a presença mais forte da população jovem e menor longevidade, com percentuais mais baixos da população com 70 anos ou mais se comparado às regiões mais ricas nas duas cidades. Como evidencia a literatura sociológica e epidemiológica, os impactos cumulativos entre condições materiais e escolaridade afetam o estado de saúde das pessoas de forma não negligenciável: seja porque possibilitam condições de adquirir maiores informações sobre comportamentos saudáveis, seja em função do acesso diferenciado aos serviços especializados de saúde (ALVES COIMBRA, 2017ALVES COIMBRA, Renan Marcelo. Classe social, condições de vida, nível de instrução e desigualdade de saúde no Brasil. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2017. Disponível em: .https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstream/ufjf/4024/1/renanmarceloalvescoimbra.pdf. Acesso em: 19 maio. 2021.
https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstr...
;SANTOS, 2011SANTOS, José Alcides Figueiredo. Classe social e desigualdade de saúde no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.26, p. 27-55, 2011.; ATTIAS-DONFUT, 1983ATTIAS-DONFUT, Claudine. La vieillesse inégale. Communications, v. 37, n. 1, p. 125-136, 1983.). Attias-Donfut já argumentava, em “A velhice desigual” (1983), que a longevidade se explica ainda pela natureza do trabalho ao longo da vida, sendo o nível de esforço físico exigido uma das variáveis importantes, razões pelas quais, a longevidade não poderia ser considerada um benefício universal e bem distribuído socialmente.

De uma maneira geral, os resultados apontados pela leitura do eixo 1 não se diferenciam da maioria dos estudos sobre disparidades educacionais, ao evidenciar a correlação positiva entre melhores condições socioeconômicas, maiores níveis de escolaridade, menor precariedade habitacional e maior longevidade. Pela Tabela 1, os coeficientes de correlação permitem observar a contribuição de cada variável ativa para a definição de cada eixo e também a intensidade das correlações. Nota-se, por exemplo, que a modalidade “População autodeclarada negra” está associada ao eixo 1 que opõe os extremos da desigualdade social nas duas metrópoles. Percebe-se, ainda, o quanto a posse do diploma do ensino superior é negativamente correlacionada à autodeclaração “negro”. Nunca é demais lembrar que a correlação não significa causalidade e sim relações entre variáveis.

Todos os coeficientes acima de 0,40 podem ser considerados correlações fortes (LEBARON, 2006LEBARON, Frédéric. L’enquête quantitative en sciences sociales. Paris: Dunod, 2006.). Os resultados da ACP permitem assim identificar uma hierarquia dos fatores que diferenciam os territórios nas duas cidades. Como se vê na Tabela 1, para o eixo 2, a variável que mais contribui são os domicílios com renda entre 2 e 10 salários-mínimos, em seguida a infraestrutura pública e depois o diploma do ensino secundário.

Para além dos extremos da desigualdade social expressos no eixo 1, o eixo 2 é o eixo das posições intermediárias. Ele nos permite notar diferenças entre as regiões das periferias, mas também das classes médias e altas nas duas cidades. Podemos afirmar que o eixo 2 distingue, em Recife, os bairros (Casa Amarela e Campo Grande) com predominância de domicílios de 2 a 10 SM daqueles com renda mensal acima de 10 SM (Aflitos, Graças, Derby, Boa Viagem, Jaqueira). No caso de São Paulo, o eixo 2 separa as subprefeituras de Santana, Mooca daquelas de Vila Mariana e Pinheiros, respectivamente. Nota-se aqui uma diferenciação do espaço social que corrobora o princípio proposto por Bourdieu: o espaço social se diferencia, em uma primeira dimensão de acordo com o volume de capital e em uma segunda dimensão, de acordo com a composição da estrutura de capital (BOURDIEU, 2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Trad. Ione Ribeiro Valle; Nilton Valle, Rev. Téc. Maria Tereza de Queiroz Piacentini. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011.).

TABELA 1
Coeficientes de correlação das variáveis e contribuição para os eixos.

O eixo 2 distingue os bairros das periferias em Recife e em São Paulo, distanciando os bairros de Brejo da Guabiraba, Nova Descoberta da Ilha Joana Bezerra, Linha do Tiro, em Recife (Figura 1) e em São Paulo opondo periferias mais precárias, como Parelheiros e Cidade Tiradentes, às periferias mais estabelecidas como Ermelino Matarazzo ou Pirituba. O eixo 3 reafirma a importância da aquisição do diploma de ensino médio na formação das posições intermediárias.

Em síntese, vê-se pela Figura 1, a extensão da miséria em Recife, muito maior do que aquela encontrada em São Paulo. Quanto às regiões mais ricas, em capital econômico e cultural, Recife e São Paulo apresentam o mesmo número de regiões nestas condições. As duas cidades se diferenciam ainda pela proporção de regiões e bairros em situações intermediárias, que se fazem muito mais presentes em São Paulo.

Passamos, a seguir, ao exame das variáveis ilustrativas que enriquecem a compreensão do espaço social. Elas dizem respeito ao universo das “tomadas de posição” e a algumas propriedades da população ou dos territórios. Assim, a noção de espaço social e a análise de dados geométricos nos permite interrogar em que medida as condições de vida estão associadas ao tipo de investimento ou desinvestimento escolar. Para falar como Bourdieu, o espaço social é também um espaço de possíveis, o que se pode verificar mediante o uso da análise geométrica dos dados.

Como podemos perceber, as variáveis mais correlacionadas ao Eixo 1 foram as taxas de analfabetismo, taxa de disfunção de idade/série no ensino médio, taxa de abandono do ensino médio, além da taxa de homicídios e óbitos de jovens de 15 a 24 anos de idade. A taxa de matrícula no ensino privado está negativamente relacionada ao eixo 1, seguida da taxa de investimento no ensino superior (matrícula no ensino superior público e privado). O eixo 1 pode ser compreendido assim como o eixo das diferenças em termos de investimento escolar. O eixo 2 é definido pela variável matrícula no ensino superior e, com menos intensidade, a variável emprego formal feminino, reafirmando a relação já constatada em demais pesquisas entre maiores investimentos educativos mulheres com emprego formal.

O conjunto das variáveis correlacionadas ao eixo 3, revelam ainda mais a importância do emprego formal feminino nos investimentos educacionais. Estão fortemente correlacionados ao eixo 3, além do emprego formal feminino, o domicílio chefiado por mulheres, depois, a taxa de matrícula no ensino superior e, em seguida, a taxa de matrícula no sistema de ensino privado.

TABELA 2
Coeficientes de correlação das variáveis ilustrativas e contribuição para os eixos.

A relação entre as “tomadas de posição” e a posição no espaço social não é mecânica. Para Bourdieu, a relação entre as posições objetivas e as tomadas de posição seriam mediadas muito mais pelo habitus do que resultado da “tomada de consciência” na terminologia da tradição marxista. Ou seja, elas são guiadas por disposições que são o produto da incorporação das estruturas sociais, sem que haja uma passagem explícita pela consciência (BOURDIEU, 2015BOURDIEU, Pierre, Sociologie générale: cours au Collège de France (1981-1983), v. 1, Raison d’Agir, Seuil, 2015., p. 105). Assim, ao interpretarmos o abandono da escola antes da conclusão do ensino médio como tomada de posição, não estamos afirmando que se trata de uma decisão livre. Longe disso, trata-se de uma “decisão” que só pode ser considerada levando em conta a posição no espaço social, o que em si mesmo, define um universo de “escolhas” possíveis. Não por acaso, em seus cursos, Bourdieu chegou a afirmar que o espaço social é também um espaço de possíveis (BOURDIEU, 2016). Se as tomadas de posição só podem ser compreendidas em relação ao espaço social, elas igualmente nos remetem à noção de habitus (BOURDIEU, 2011; 2016). Portanto, a noção de espaço social é integrativa de vários conceitos bourdieusianos. Permite aos pesquisadores identificar onde se localiza nas cidades, por exemplo, o campo das escolas de elite. Apesar das limitações dos dados comparáveis entre as duas cidades relativas às tomadas de posição, podemos interpretar a correlação entre a matrícula no ensino privado e o acesso ao ensino superior, como uma disposição (se preferirmos, um habitus) voltado ao hiper investimento educacional que a matrícula na educação privada representa.

No contexto brasileiro, o acesso à educação superior, em 2010, possivelmente, deve-se não apenas à educação privada, mas também a outras políticas de expansão do acesso à universidade, como o Reuni (2003) e o Prouni (2004). Certamente, a disponibilidade de números sobre estas duas políticas para o conjunto da população das duas cidades poderia contribuir para mapear melhor as estratégias educativas que se escondem nas taxas de acesso ao ensino superior. No outro extremo das cidades, chama a atenção a “tomada de posição”, ensino médio incompleto, ou seja, a decisão de interromper a conclusão do ensino secundário, jamais independente das condições objetivas de vida, insere-se, como esperado, nas regiões onde as condições de vida são mais precárias, revelando, uma vez mais, o quanto o espaço social pode ser considerado um espaço de possíveis (BOURDIEU, 2015BOURDIEU, Pierre, Sociologie générale: cours au Collège de France (1981-1983), v. 1, Raison d’Agir, Seuil, 2015.; SAPIRO, 2020).

Em artigos precedentes, analisamos separadamente, para São Paulo e Recife, a correlação entre abandono escolar e a taxa de homicídio, interpretando-a o quanto o estigma escolar pode predispor os jovens das periferias mais precárias ao mercado ilícito e à consequentemente, um número maior de confrontos com a polícia, brigas de facções etc. (FERREIRA, 2019FERREIRA, Daniela Maria. Schooling and living conditions in the city of Recife. Psihologia Socialà 103, v. 2, p. 29-47, 2019.; PEROSA, LEBARON e LEITE, 2018PEROSA, Graziela S.; LEBARON, Frédéric; LEITE, Cristiane. K. S. The space of socioeducational inequalities. Psihologia Social, v. 2, p. 93-111. São Paulo, 2018. Disponível em: https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-03179010. Acesso em: 08 jul. 2022.
https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-031...
). Da mesma forma que a correlação entre chefia familiar feminina e distorção série idade no ensino fundamental e no ensino médio, a ACP permite a elaboração de novas hipóteses que demandam outras pesquisas, de natureza qualitativa possivelmente, para que possamos restituir a lógica destas correlações. Vemos assim, outra vantagem da Análise Geométrica de Dados. A descrição do conjunto do espaço social permite a escolha de estudos de casos particulares socialmente situados (bairros, escolas etc.) ou de determinados campos do espaço social, como o campo das escolas de elite.

Uma homologia estrutural

A comparação destas cidades tão distintas como Recife e São Paulo evidencia uma homologia estrutural, constituída de regularidades estatísticas, a partir de variáveis disponíveis e pertinentes para a construção dos espaços sociais, considerando-se os dois princípios enunciados por Bourdieu. O primeiro princípio seria o volume de capital, captado neste estudo pelo eixo 1 que opõe pelo capital econômico e cultural, altamente correlacionados no Brasil, as regiões mais pobres às regiões mais ricas. O segundo princípio, de acordo com Bourdieu, diz respeito à composição do capital, o que se verificou com o eixo 2, na medida em que ele nos permite enxergar a diferença na estrutura de capitais entre as classes sociais. Notamos no espaço social, uma primeira oposição. Nas regiões das classes médias e altas, o maior capital econômico e cultural e as regiões das cidades com menor volume destas capitais. Contudo, o eixo 2 permite notar frações dos grupos sociais. Notamos, o menor capital econômico e cultural das classes médias em relação àqueles que residem nos bairros situados no topo da estrutura social das duas cidades, possibilitando identificar ao menos duas grandes frações das camadas dominantes. Todavia, em Recife, esse segundo eixo concerne a alguns poucos bairros da cidade, enquanto, em São Paulo observa-se a mesma correlação com a particularidade de representar um conjunto bem maior de subprefeituras com posições intermediárias.

Da mesma forma, é possível verificar uma diferença importante na composição de capitais da população residente em regiões “periféricas”, as mais precárias, com capital econômico quase nulo e pouco capital cultural, materializado nas taxas de reprovação e abandono escolar. Em outro tipo de periferia, com renda mais alta, em torno de 5 salários-mínimos e maior capital cultural, o que poderíamos pensar como uma fração superior dos grupos populares. Com ensino médio e as disposições necessárias, mais atentas às oportunidades de ingresso no ensino superior, nos cursos noturnos das faculdades privadas, nos cursinhos preparatórios populares, ou mesmo, recorrendo ao ensino à distância. Ou ainda, antenados nas possibilidades abertas pelas políticas de ações afirmativas dos últimos anos. Ou seja, podemos identificar os traços de uma illusio, de uma disposição para investir no jogo escolar. Ao mesmo tempo, a noção do espaço social não nos deixa esquecer das condições objetivas, nas regiões mais precárias das cidades, que podem induzir o abandono precoce do sistema de ensino e até mesmo à uma rebeldia em relação ao sistema escolar, como constatou Paul Willis (1991WILLIS, Paul. Aprendendo a ser trabalhador: Escola, Resistência e Reprodução Social. Porto Alegre: Artes Médicas. p.241, 1991.) e cuja taxa de reprovação escolar pode ser considerada um indício. Vemos assim, como trabalhar com a noção de espaço social significa poder mobilizar diversas noções chaves da sociologia bourdieusiana tais como capital, campo, habitus, tomadas de posição, dentre outras.

Ao identificar por meio da pesquisa empírica espaços com formações históricas particulares cujas estruturas sociais são homólogas, nosso estudo evidencia a pertinência e a atualidade dos conceitos bourdiesianos e sua aplicabilidade para o caso brasileiro. O espaço social, as tomadas de posição, a posição social, para não falar em campo e habitus, ganham forma, apesar das limitações das nossas estatísticas que nem sempre favorecem uma comparação cabal e definitiva. Lembrando que os ajustes entre a posição no espaço social e as tomadas de posição, em relação ao sistema de ensino, não são mecânicas e sim tendências probabilísticas. Os investimentos ou desinvestimentos educativos são pontos de vistas que o agente possui a partir de sua posição objetiva que se traduz em disposições incorporadas, o que faz com que o espaço social seja também um espaço de possíveis, de potencialidades objetivas, do “melhor a fazer” em determinadas situações, tanto em termos individuais e até mesmo, coletivos, como os movimentos sociais. Por fim, é preciso considerar que a nossa análise depende das medidas utilizadas para construir os indicadores de capital e espaço social, medidas estatísticas bastante gerais e limitadas que representam apenas a ponta do iceberg do estado das desigualdades educacionais no Brasil.

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  • ZANCHETTI, Silvio Mendes. O Estado e a Cidade do Recife (1836-1889). Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989.
  • 1
    Os estudos que buscam testar a pertinência da noção de espaço social em outras realidades nacionais revelam que a ambição de Bourdieu, de propor conceitos com potencial de serem aplicados universalmente, não foi em vão. Ver, por exemplo, Johs Hjellbrekke & Olav Korsnes (2013) para o caso da Noruega. Para as cidades latino-americanas, consultar os estudos da equipe de Alícia Gutierrez e Manuel Giovine (2017) sobre a cidade de Córdoba, na Argentina. Ver também, Perosa, Lebaron e Leite (2015), para o caso da cidade de São Paulo.
  • 2
    Esse processo ocorreu também em todo território nacional, em diferentes intensidades, quando a partir da década de 1960 o país tornou-se predominantemente urbano Fonte: IBGE, Censo demográfico 1940-2010. Disponível em https://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=POP122&t=taxa-urbanizacao, acesso em 20/09/2021.
  • 3
    Naturalmente, nós nos propomos a apresentar o estado do sistema de ensino nas duas capitais brasileiras, dentro dos limites das estatísticas nacionais e adicionalmente, com os dados de duas municipalidades distintas, a partir dos mesmos indicadores. Assim, se o estado das desigualdades educacionais apresentado neste texto é limitado isso se deve, em boa medida, à disponibilidade de estatísticas comparáveis para as duas cidades e agregadas por diferentes regiões intramunicipais.
  • 4
    De acordo com Sassen (2004), as “global cities”podem ser caracterizadas por uma dupla dinâmica de dispersão e concentração geográfica, própria do fenômeno da globalização, marcado pelo crescimento da presença de multinacionais, pela importância assumida pelo setor de serviços e pela exigência de profissionais altamente qualificados. Tais características são comuns a São Paulo e Recife que concentram, atualmente, fortes demandas por educação.
  • 5
    Os estudos sobre a escolarização dos grupos dominantes e das classes médias altas foram particularmente desenvolvidos no Brasil, na perspectiva sociológica bourdiesiana, por Maria Alice Nogueira e Ana Maria Almeida (2002) e Graziela Perosa (2009), dentre outros estudos mais recentes.
  • 6
    Como argumenta o economista Robert Boyer (2003), longe de se limitar à análise da reprodução, a perspectiva bourdieusiana fornece uma série de determinantes de mudança.
  • 7
    Foi utilizado, neste trabalho, o programa Spad em sua versão 7.1.
  • 8
    Uma vez extraídas as informações para as 40 áreas de ponderação que compõem a cidade de Recife, decidimos agrupá-las em conjuntos de bairros correspondentes, totalizando assim 33 áreas de bairros. Uma área de Ponderação contém em torno de 400 domicílios.
  • 9
    Em 2011 foi publicada a Lei de Acesso à Informação no Brasil (Lei 12.527) que obrigou os órgãos e as entidades do poder público a assegurar a gestão transparente da informação, tornando obrigatória a divulgação de dados de interesse da população em sites oficiais desses órgãos na internet. Em São Paulo essas informações foram reunidas nas plataformas do Infocidade e GeoSampa (http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br e http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2022
  • Aceito
    24 Ago 2022
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