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Desafios simbólicos da universidade: a perspectiva de estudantes sobre a permanência1 1 Esse artigo é oriundo de uma pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Processo nº 17/24909-9)

RESUMO

Este artigo se insere nas discussões sobre a inclusão social nas universidades públicas, especificamente sobre a permanência universitária. Com as contribuições da teoria sociológica de Pierre Bourdieu, analisamos as percepções de estudantes sobre as suas experiências relacionadas à permanência universitária, aprofundando os mecanismos simbólicos presentes nos percursos estudantis em uma universidade pública federal. A metodologia empregada para a pesquisa utilizou questionários e entrevistas semiestruturadas com estudantes universitários, matriculados em diferentes períodos e cursos na graduação. Os resultados da investigação indicam que há o reconhecimento da relevância de auxílio financeiro para possibilitar a frequência no curso, porém os estudantes levantam desafios que são simbólicos e que interferem na permanência universitária. A dimensão simbólica está presente na responsabilização do aluno pelo seu desempenho, relacionado às dificuldades acadêmicas com o conteúdo cultural exigido e às práticas dos professores que pouco auxiliam os estudantes com maiores defasagens de capital cultural academicamente rentável. Consideramos que os dados oriundos das entrevistas, bem como as sugestões indicadas pelos estudantes para melhorar a permanência, revelam disputas presentes no campo universitário. Portanto, a presença de novos agentes possibilita alterações nas disputas do campo, o qual apresenta limites simbólicos para efetivar a proposta de inclusão social em uma instituição que tende à consagração das relações de força na sociedade.

Palavras-chave:
Educação superior; permanência universitária; campo universitário; inclusão social

ABSTRACT

This article is part of the discussions about social inclusion in public universities, specifically about university permanence. With the contributions of Pierre Bourdieu’s sociological theory, we analyze the perceptions of students about their experiences related to university permanence, delving into the symbolic mechanisms present in student journeys at a federal public university. The methodology employed for the research used questionnaires and semi-structured interviews with undergraduate students enrolled in different periods and courses. The research results indicate that there is recognition of the relevance of financial aid to enable attendance, but students raise symbolic challenges that interfere with staying in the university. The symbolic dimension is present in the students’ accountability for their performance, related to the academic difficulties with the required cultural content and the teachers’ practices that little help students with greater gaps in academically profitable cultural capital. We consider that the data from the interviews, as well as the suggestions indicated by the students to improve permanence, reveal arguments present in the university field. Therefore, the presence of new agents enables changes in the disputes of the field, which presents symbolic limits conducting the proposal of social inclusion in an institution that tends to consecrate the relations of force in society.

Keywords:
Higher education; university permanence; university field; social inclusion

Introdução

A educação superior no Brasil foi desenvolvida para formar a classe dirigente na sociedade, contribuindo para a reprodução da estrutura social. Cunha (1980CUNHA, Luiz Antônio. A universidade temporã: o ensino superior da Colônia à Era Vargas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.) indica que mesmo antes de haver universidades conhecidas em sua atual estrutura de funcionamento, os cursos superiores no Brasil estavam destinados à formação cultural da elite brasileira e ao provimento de cargos de prestígio nas relações de trabalho. Em um contexto de desigualdade de acesso à escola e à cultura legitimada, esse resquício histórico se desdobrou no século XX com um público universitário constituído de brancos, filhos de famílias com mais de dez salários mínimos, oriundos de pais com escolaridade superior e egressos de escola privada (RISTOFF, 2016RISTOFF, Dilvo. Democratização do campus: impacto dos programas de inclusão sobre o perfil da graduação. Cadernos do GEA, Rio de Janeiro: FLACSO, GEA, UERJ, v. 9, p. 9-62, 2016. Disponível em: http://flacso.org.br/files/2017/03/Caderno_GEA_N9_Democratiza%C3%A7%C3%A3o-do-campus.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
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). Nesse cenário, a formação produzida na educação superior se voltava para a inculcação de valores e referências de um grupo minoritário na sociedade, mas dominante na posse de bens materiais e culturais que possibilitam a sua posição de dominação.

As principais alterações nas configurações de ingresso e diversificação do perfil social universitário brasileiro ocorreram no início do século XXI. A princípio, essas alterações foram sendo realizadas de forma isolada em cada instituição, mas foram as políticas de expansão e inclusão social na rede federal de educação superior que ampliaram o acesso de estudantes oriundos de camadas historicamente excluídos da universidade pública (PORTES, 2014PORTES, Écio Antônio. A vida universitária de estudantes pobres na UFMG: possibilidades e limites. In: PIOTTO, Débora Cristina. Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares. São Carlos: Pedro & João Editores, 2014. p. 167-237.; RISTOFF, 2016RISTOFF, Dilvo. Democratização do campus: impacto dos programas de inclusão sobre o perfil da graduação. Cadernos do GEA, Rio de Janeiro: FLACSO, GEA, UERJ, v. 9, p. 9-62, 2016. Disponível em: http://flacso.org.br/files/2017/03/Caderno_GEA_N9_Democratiza%C3%A7%C3%A3o-do-campus.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
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). A Lei 12.711/2012 (BRASIL, 2012), conhecida como Lei de Cotas, foi essencial para a regulamentação do ingresso de estudantes com vulnerabilidade social, o que fortaleceu a preocupação com a permanência universitária (DIAS; SAMPAIO, 2020DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; SAMPAIO, Helena. Serviços de apoio a estudantes em universidades federais no contexto da expansão do ensino superior no Brasil. In: DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; et al.. Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. p. 27-60.; HERINGER, 2020HERINGER, Rosana. Políticas de ação afirmativa e os desafios da permanência no ensino superior. In: DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; et al. Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. p. 61-78.; NUNES; VELOSO, 2016NUNES, Roseli Souza dos Reis; VELOSO, Tereza Christina Mertens Aguiar. A assistência estudantil na Universidade Federal de Mato Grosso: aspectos socioeconômicos de estudantes beneficiados. In: SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE UNIVERSITAS/Br, XXIV, 2016, Maringá, PR. Anais... 2016. p. 969-984.).

Apesar da comum associação com as ações de assuntos comunitários e oferta de auxílio econômico (DIAS; SAMPAIO, 2020DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; SAMPAIO, Helena. Serviços de apoio a estudantes em universidades federais no contexto da expansão do ensino superior no Brasil. In: DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; et al.. Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. p. 27-60.), compreendemos que a permanência universitária se refere ao apoio estudantil em diferentes âmbitos da vida acadêmica para propiciar um ambiente apropriado para o êxito dos estudos até a conclusão do curso (NUNES; VELOSO, 2016NUNES, Roseli Souza dos Reis; VELOSO, Tereza Christina Mertens Aguiar. A assistência estudantil na Universidade Federal de Mato Grosso: aspectos socioeconômicos de estudantes beneficiados. In: SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE UNIVERSITAS/Br, XXIV, 2016, Maringá, PR. Anais... 2016. p. 969-984.). Um programa de permanência universitária deve ser destinado a todos os estudantes, não apenas aos que têm vulnerabilidade social, pois é uma questão que complementa o apoio assistencial e a dimensão material (HERINGER, 2020HERINGER, Rosana. Políticas de ação afirmativa e os desafios da permanência no ensino superior. In: DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; et al. Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. p. 61-78.).

Em tal contexto universitário, as contribuições da teoria de Pierre Bourdieu possibilitam a compreensão de que o espaço social é permeado por trocas simbólicas, as quais são sustentadas por esquemas classificatórios incorporados que estruturam o mesmo espaço social. E, de maneira mais específica, consideramos que a teoria bourdieusiana nos auxilia a compreender outras dimensões para além das condições materiais de subsistência dos estudantes.

O ingresso na universidade posiciona os estudantes em um espaço simbólico com classificações sobre as condutas, desenvolturas, linguagens, regras e elementos que estão em disputa nesse nível escolar. A instituição universitária pertence a um sistema de ensino que tem condições para a inculcação e reprodução de um arbitrário cultural contribuinte para as relações entre os grupos ou classes que originou o próprio sistema de ensino. A inculcação do arbitrário cultural é realizada na produção de definições, modos de visão e referências culturais que devem ser o mais próximo possível da sociedade que se busca reproduzir (BOURDIEU; PASSERON, 1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.). Nesse sentido, é uma proposta sociológica que investiga as estruturas mais profundamente enterradas que constituem o universo social, assim como os mecanismos que tendem a assegurar sua reprodução ou transformação (WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.).

A partir da perspectiva estrutural construtivista, Bourdieu (2004aBOURDIEU, Pierre. Espaço social e poder simbólico. In: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004a. p. 149-168.) considera que o mundo social contém estruturas objetivas capazes de orientar e coagir as práticas e as representações das pessoas. O desenvolvimento dessas estruturas contém duas dimensões: os esquemas de percepção, pensamento e ação; e a estrutura social, composta por disputas de diferentes grupos sociais (BOURDIEU, 2004aBOURDIEU, Pierre. Espaço social e poder simbólico. In: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004a. p. 149-168.). A praxeologia, portanto, se refere a uma sociologia relacional, articulando elementos materiais e simbólicos para a compreensão do objeto de estudo. O materialismo simbólico bourdieusiano requer um duplo olhar, o qual analisa as condições objetivas, mas sem desconsiderar as propriedades subjetivas. É a partir da correspondência entre estruturas sociais e mentais que se possibilita a eficácia da dominação (WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.).

A correspondência entre essas estruturas é compreendida por meio do habitus, campo e capital. Os conceitos-chave na sociologia bourdieusiana são utilizados relacionalmente, pois cada conceito adquire sentido na relação com o outro. O habitus é um princípio gerador de práticas que contém esquemas de classificação e de julgamentos que estruturam tanto a ação quanto a percepção dos agentes. Ou seja, o habitus é uma disposição do agente para agir, porém essa disposição não é consciente e racional, mas é fruto da incorporação de experiências e referências sociais. O habitus é um conceito referente ao ajuste das aspirações dos agentes às chances objetivas de sucesso. A incorporação das chances objetivas leva às disposições que engendram ações e condutas espontâneas ajustadas, novamente, às próprias condições objetivas. Além disso, o habitus é um esquema de apreciação das práticas, o que favorece para compreender e aceitar o mundo (BOURDIEU, 2004aBOURDIEU, Pierre. Espaço social e poder simbólico. In: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004a. p. 149-168.; 2021).

As experiências que estruturam o habitus são fundamentadas nos campos em que os agentes atuam. O mundo social está organizado em variados microcosmos, com princípios de valorização, regras e condutas próprias, mantendo uma autonomia relativa uns com os outros. O campo é estruturado de forma desigual por meio da distribuição do capital valorizado e disputado no jogo simbólico. Cada agente ocupa uma posição específica de acordo com o volume e o peso de capital que detém e que está em disputa para alcançar posições dominantes. A dinâmica do campo é uma dinâmica de forças para conservar ou transformar a sua própria estrutura (BOURDIEU, 2004bBOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004b.).

O capital é uma propriedade adquirida que confere certa distinção a um agente no campo em que se situa. Essa propriedade pode ser material, como no caso do capital econômico, ou relativo à cultura, aos relacionamentos sociais, à autoridade para impor as regras, entre outros. Cada campo estabelece a propriedade que será valorizada e, principalmente, utilizada como trunfo para obtenção de vantagens. Nesse sentido, toda forma de capital é também um capital simbólico, pois parte do reconhecimento do valor da propriedade que está em jogo, distinguindo o agente dos demais (BOURDIEU, 2001BOURDIEU, Pierre. Capital simbólico. In: Meditações pascalianas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 293-300.).

Com base em tais aportes da teoria bourdieusiana compreendemos que a inclusão social pode trazer desafios simbólicos tão importantes quanto os entraves da dimensão material para os estudantes universitários de diferentes origens sociais, especialmente em uma instituição historicamente elitista e excludente. Dessa forma, este artigo se propõe a analisar as percepções de estudantes sobre as suas experiências relacionadas à permanência universitária, aprofundando os mecanismos simbólicos presentes nos percursos estudantis em uma universidade pública federal.

Os dados discutidos neste artigo são oriundos de uma pesquisa mais ampla, financiada pela FAPESP (Processo nº 17/24909-9), que investigou a permanência universitária na Universidade Federal de São Carlos. Os participantes que contribuíram com a pesquisa são estudantes matriculados em variados períodos e em diferentes cursos de graduação. O elemento em comum entre eles é que frequentavam o Programa de Tutoria de Acompanhamento Acadêmico ao Estudante de Graduação (PAAEG), uma ação institucional que oferta apoio acadêmico e pedagógico em disciplinas com alto índice de evasão e reprovações.

Os 41 estudantes que participaram da pesquisa responderam um questionário online com perguntas sobre as origens familiares, sociais e escolares, bem como sobre as suas impressões pontuais em relação à permanência universitária. Após esse questionário, doze estudantes aceitaram o convite para participarem de entrevistas semiestruturadas, visando descreverem as suas experiências e percepções sobre a trajetória acadêmica. Neste artigo, apresentamos um recorte dos resultados obtidos nas entrevistas que nos auxiliam a compreender a dimensão simbólica da universidade que desafia os estudantes a concluírem seus estudos.

Os estudantes entrevistados receberam nomes fictícios para preservarmos as suas identidades. Os doze estudantes entrevistados (calouros, veteranos e formandos), estavam matriculados nos cursos de Ciências Biológicas, Engenharia de Materiais, Engenharia Elétrica, Engenharia Química, Estatística, Física, Fisioterapia, Pedagogia e Química.

Em relação às principais características sociais2 2 As características sociais específicas de cada estudante estão descritas na pesquisa das autoras, que pode ser visualizada em Mattos (2020). , o grupo de estudantes entrevistados é composto por 50% de jovens que se autodeclaram como pretos e pardos, 50% são filhos de pais com baixa escolaridade e que não ingressaram na educação superior, 75% são oriundos de escola pública, 75% ingressaram na universidade por meio de políticas de cotas e 50% têm renda familiar inferior ou igual a 1,5 salário-mínimo. Essas informações nos mostram como o perfil do estudante universitário nas instituições públicas tem se alterado em relação ao seu percurso histórico, o que traz maior visibilidade para a importância de políticas de regulamentação no ingresso (RISTOFF, 2016RISTOFF, Dilvo. Democratização do campus: impacto dos programas de inclusão sobre o perfil da graduação. Cadernos do GEA, Rio de Janeiro: FLACSO, GEA, UERJ, v. 9, p. 9-62, 2016. Disponível em: http://flacso.org.br/files/2017/03/Caderno_GEA_N9_Democratiza%C3%A7%C3%A3o-do-campus.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
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) e estudos que investiguem o cenário atual da universidade que tem alterado sua natureza de instituição específica para a formação da elite brasileira.

As características sociais também são relevantes para a compreensão das entrevistas. Segundo Bourdieu (2004aBOURDIEU, Pierre. Espaço social e poder simbólico. In: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004a. p. 149-168.), os pontos de vista são visões de uma determinada posição social, ou seja, a visão que cada agente tem do espaço social depende de sua posição nesse próprio espaço. Estudos sobre as categorias de percepção e apreciação também devem considerar uma leitura objetivista em relação às posições dos participantes (WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.), o que possibilita compreender quais informações são levantadas e a razão de serem ditas por esses agentes.

As transcrições das entrevistas foram sistematizadas e categorizadas a partir da Análise de Conteúdo de Bardin (1977BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1977.). Com essa abordagem metodológica, os dados contidos nas entrevistas transcritas foram organizados a partir da identificação sobre o que e quais unidades temáticas foram levantadas pelos entrevistados. Segundo Bardin (1977), esse é um método de organização de dados empíricos, sendo que a sua aplicação na entrevista é dependente da fala dos participantes da pesquisa e da interpretação do pesquisador a partir do objetivo estabelecido. Para isso, o conteúdo das entrevistas foi separado em elementos (etapa inventário), classificando-os de acordo com o que há de comum entre eles para a obtenção de certa representação dos dados. Por se tratar de entrevistas semiestruturadas, a análise de conteúdo empregada considerou tanto categorias à priori, estabelecidas no roteiro do instrumento de coleta de dados, quanto categorias à posteriori, a partir do nível de profundidade e variedade nas respostas dos entrevistados.

Os dados obtidos foram interpretados por meio das contribuições teóricas de Pierre Bourdieu, auxiliando na compreensão da força dos mecanismos de reprodução social e de dominação simbólica. Também incluímos pesquisas nacionais sobre as experiências estudantis e a permanência universitária. Assim, as próximas seções do artigo abordam as percepções sobre a permanência universitária e, logo após, as contribuições, os limites e as sugestões de melhoria consideradas pelos estudantes em seus percursos universitários.

Permanência universitária: para além da subsistência

Iniciamos nossa investigação com a hipótese de que a permanência universitária tem outras dimensões além das condições materiais e do auxílio financeiro. Para levantar a discussão sobre as possíveis dimensões, indagamos, nas entrevistas, o que os estudantes entendem sobre a permanência universitária.

A principal resposta dos participantes se refere à dimensão econômica da permanência, como exemplifica Heitor, estudante de Engenharia de Materiais: “A questão econômica pesa bastante. Eu, por exemplo, não estaria aqui se não tivesse bolsa moradia, bolsa alimentação, esse tipo de coisa. Eu não teria condições de ficar” (Heitor, Engenharia de Materiais).

Na fala de Heitor, ressalta-se a necessidade do auxílio financeiro para possibilitar os estudos do participante na educação superior. Almeida (2014ALMEIDA, Wilson Mesquita. Estudantes com desvantagens sociais e os desafios da permanência na universidade pública. In: PIOTTO, Débora Cristina. Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares. São Carlos: Pedro & João Editores, 2014. p. 239-272.) defende a importância dessas instituições públicas para os estudantes com desvantagens financeiras. O estudo do autor evidenciou que a gratuidade incentiva muitos jovens de camadas populares a procurar as universidades públicas. Contudo, Neves e Anhaia (2014NEVES, Clarissa Eckert Baeta; ANHAIA, Bruna Cruz de. Políticas de inclusão social no ensino superior no Brasil: políticas de redistribuição de oportunidades? Reflexões a partir das experiências em IES do Rio Grande do Sul. In: BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira. Ensino Superior: expansão e democratização. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014. p. 371-401.) destacam que realizar os estudos no setor público não implica a inexistência de gastos para os estudantes, “[...] uma vez que estes precisam despender recursos para a aquisição de materiais didáticos, para o transporte ou para a alimentação” (NEVES; ANHAIA, 2014NEVES, Clarissa Eckert Baeta; ANHAIA, Bruna Cruz de. Políticas de inclusão social no ensino superior no Brasil: políticas de redistribuição de oportunidades? Reflexões a partir das experiências em IES do Rio Grande do Sul. In: BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira. Ensino Superior: expansão e democratização. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014. p. 371-401., p. 387).

A pesquisa das autoras demonstrou que 54,5% dos participantes que estudavam em uma universidade pública não conseguiam arcar com os custos, assim como se verifica na fala de Heitor que evidencia a situação vulnerável de muitos estudantes. Portanto, as ações de auxílio financeiro são fundamentais para uma proposta de permanência universitária para proporcionar o aproveitamento de oportunidades de estudo e a frequência no curso. Um programa de permanência universitária requer a oferta de bolsas ou auxílios que permitam a sobrevivência dos estudantes no curso, já que “A necessidade de trabalhar para prover o próprio sustento pode diminuir a participação na vida acadêmica” (CAVICHIOLO, 2019CAVICHIOLO, Katia Silene. Ações afirmativas: as políticas de permanência para alunos cotistas na Universidade Federal de São Carlos. 2019. 137 f. Dissertação (Mestrado em Gestão de Organizações e Sistemas Públicos) - Universidade Federal de São Carlos. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/11222/Diss_KSC.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 02 jan. 2022.
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, p. 73).

Apesar do grande peso da dimensão material, a percepção da permanência universitária vinculada às questões acadêmicas também se fez presente para os graduandos, como ressalta Tomás, estudante de Física: “Tem muita gente que desiste por causa de notas. Você não passa em duas, três matérias e aí acaba desistindo”. A fala do estudante Tomás demonstra o impacto das notas baixas e reprovações para a permanência universitária. Da mesma maneira, Lorena, estudante de Ciências Biológicas, menciona o desdobramento simbólico oriundo do baixo desempenho acadêmico:

O fato do ensino estar distante de algumas pessoas, estar mais longe para alcançar, é um dificultador da permanência, porque na minha sala eu vi três pessoas desistindo. Desistindo porque começaram a tirar nota baixa, porque nunca tinham tirado nota baixa na vida, começaram a pensar “o que que estou fazendo da minha vida? É isso que eu quero?” Quando na verdade podia ser aquilo que ela queria (Lorena, Ciências Biológicas).

Acreditamos que esse efeito simbólico causado pela dimensão acadêmica se refere à naturalização do arbitrário cultural, que legitima determinados conteúdos e cultura como a melhor, a correta e que deve ser aprendida. Bourdieu e Passeron (1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.) esclarecem que os conteúdos e o trabalho pedagógico não são neutros e universais, mas são produto de um grupo social. A função de uma instituição pertencente a um sistema de ensino é realizar um trabalho de inculcação que deve durar o bastante para produzir uma formação durável, ou seja, um determinado habitus em seus alunos.

O habitus produzido na instituição escolar se perpetua nas práticas dos agentes, manifestando os princípios do arbitrário cultural. É um habitus transferível, que engendra práticas com os princípios inculcados em diferentes campos sociais, e é um habitus exaustivo, pois reproduz nas diversas práticas o arbitrário cultural de um grupo ou de uma classe. Em outras palavras, o sistema de ensino inculca valores e referências culturais que orientam os modos de visão e divisão dos agentes nos mais variados campos. É um processo de integração intelectual e moral dos alunos a favor de um grupo, beneficiando e legitimando a cultura que os agentes dominantes usufruem e transmitem aos seus filhos de modo espontâneo, osmótico, com a aparência natural (BOURDIEU; PASSERON, 1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.).

Os processos de naturalização e legitimação de uma cultura se referem à violência simbólica analisada por Bourdieu e Passeron (1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.). Esse tipo de violência está na imposição de significações, impondo-as como legítimas. Essa imposição dissimula as relações de força que estão na base da ação pedagógica, ou seja, de produzir um habitus que privilegia um grupo social. A eficácia simbólica da ação e seleção escolar nas relações de força está no reconhecimento pelos dominados da legitimidade da dominação.

O desconhecimento do mecanismo escolar sobre a seleção dos agentes é essencial para que ele seja forte, pois é difícil combater o que não se vê. A violência simbólica só é exercida porque são inculcadas nos agentes as categorias de percepção que reconhecem a legitimidade do poder simbólico, ou seja, há uma cumplicidade entre a dominação e os dominados. Bourdieu (2021BOURDIEU, Pierre. Sociologia geral, vol. 2: habitus e campo: Curso no Collège de France (1982-1982). Petrópolis: Vozes, 2021.) esclarece que o termo cumplicidade não significa que os agentes desejam ser dominados, mas envolve o desconhecimento do caráter arbitrário e o reconhecimento do poder simbólico:

O termo ‘cumplicidade’ é perigoso porque comporta, como eu já disse várias vezes, o risco de sugerir a ideia de que a vítima aplica sua própria punição conscientemente, quando na verdade essa cumplicidade pode acontecer simplesmente através da forma de um desconhecimento, sob o efeito de não saber que o que se faz contra nós é feito contra nós. A forma mais absoluta da cumplicidade com uma violência é aquela que ocorre quando não sabemos que a sofremos: uma violência que é ignorada é uma violência simbólica - essa é a própria definição da violência simbólica (BOURDIEU, 2021BOURDIEU, Pierre. Sociologia geral, vol. 2: habitus e campo: Curso no Collège de France (1982-1982). Petrópolis: Vozes, 2021., p. 192).

Ao reproduzir o arbitrário cultural na produção do habitus, o sistema de ensino reproduz as relações de força que estão na base do poder escolar. Portanto, é uma instituição que corresponde aos interesses materiais e simbólicos de grupos dominantes, pois tende a reproduzir a estrutura desigual de distribuição de capital cultural entre os grupos, contribuindo para a reprodução da estrutura social (BOURDIEU; PASSERON, 1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.).

O papel da escola na teoria sociológica bourdieusiana é central, pois estabelece a relação da dimensão simbólica como um modo eficaz para a dominação e reprodução social. O controle sobre as formas de inculcação dos esquemas classificatórios e das definições do mundo social é uma ação estratégica para orientar as práticas dos agentes. Os dominados entram no jogo simbólico do campo, e contribuem com a dominação porque as suas próprias disposições já foram dominadas (BOURDIEU, 1996BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996.; WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.).

Da mesma forma, os participantes de nossa pesquisa também se encontram nesse processo de dominação simbólica. Com os dados das entrevistas, verificamos que os estudantes não percebem o ensino superior como fruto de um arbitrário cultural definido por determinados grupos sociais. Oito dos doze participantes relataram que a escolha de cursar a educação superior está embasada na crença de que o diploma possibilita ascensão social, o que fomenta a illusio desses agentes.

A illusio é um conceito bourdieusiano relacionado à crença do agente na disputa do campo. A illusio é o que possibilita ao agente valorizar o jogo simbólico do campo, indicando que as suas dinâmicas são importantes e que merecem ser disputadas. É uma relação encantada com o jogo porque, em especial, não se percebe que é um jogo, uma vez que a estrutura mental do agente está compatibilizada com a estrutura social (BOURDIEU, 1996BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996.). Portanto, os participantes da pesquisa mantêm a illusio de que vale a pena jogar o jogo da universidade, de que ao passar por esse campo irão ampliar os seus conhecimentos e estarão aptos para funções mais valorizadas no mercado de trabalho. A illusio sobre a formação universitária é tão forte que não abre a possibilidade para o questionamento de como e em que essa formação está baseada, fazendo com que os participantes aceitem a sua importância para a ascensão social e se sintam responsabilizados por solucionar os seus desafios acadêmicos. De acordo com Bourdieu (1996BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996., p. 139): “Se [...] você tiver um espírito estruturado de acordo com as estruturas do mundo social no qual você está jogando, tudo lhe parecerá evidente e a própria questão de saber se o jogo vale a pena não é nem colocada”. Nesse sentido, os participantes não percebem a educação superior como uma violência, mas entendem que o mal-estar gerado no campo universitário pode afetar a permanência dos estudantes.

O mal-estar gerado por essa violência é debatido por Bourdieu e Champagne (1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216.) como a exclusão no interior das instituições. Os autores identificaram que há uma série de condições sociais que estão relacionadas tanto ao trabalho escolar quanto ao desempenho do estudante, o que possibilita um processo de autoeliminação contínua e no interior das instituições. Schubert (2018SCHUBERT, J. Daniel. Sofrimento / violência simbólica. In: GRENFELL, Michael. Pierre Bourdieu: conceitos fundamentais. Petrópolis: Vozes, 2018. p. 234-252.) esclarece que a ausência de encaixe do habitus das classes trabalhadoras com o campo educacional, que gera o mal-estar e a autoeliminação diluída, bem como a responsabilização desses indivíduos pelo mau desempenho é uma maneira de violência simbólica, pois reproduz e legitima a hierarquia das classes sociais.

A violência simbólica na responsabilização do estudante está na imposição de que ele deve ser apto o suficiente para compreender o que é transmitido, sendo que essa exigência é realizada por meio do paradoxo da instituição escolar. O paradoxo está na desvalorização das ações pedagógicas utilizadas para ensinar a cultura acadêmica, ações estas consideradas como “primárias” ou “escolares” demais para a universidade. Ou seja, como os valores e proezas intelectuais são reconhecidos como inatos, puros e corretos, a desenvoltura com a cultura livre frente ao conteúdo escolar se inclina a demonstrar dons e capacidades dos estudantes das classes privilegiadas, enquanto os estudantes oriundos de camadas populares (por sofrerem um lento processo de aculturação) atingem a cultura livre por meio de metódicos esforços. Nesse sentido, Bourdieu (1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216.) acrescenta que o desprezo pelo que é explícito e metodicamente escolar visa transmitir que as proezas intelectuais são dons e capacidades do aluno, o que justifica a sua aprovação.

Os estudantes que evadiram devido ao mau desempenho, como relatado por Tomás e Lorena, são aqueles que aceitaram a sanção escolar de que eles são os responsáveis pelos baixos resultados que tiveram, convencidos pela ideologia do dom que são incapazes de permanecerem e terem sucesso na universidade. Nesse aspecto, a universidade utiliza o reconhecimento de sua “neutralidade” para selecionar as aptidões socialmente condicionadas, mas mascaradas como dons ou mérito. Essa mistificação do social para o natural beneficia a reprodução das desigualdades sociais:

Além de permitir à elite se justificar de ser o que é, a ‘ideologia do dom’, chave do sistema escolar e do sistema social, contribui para encerrar os membros das classes desfavorecidas no destino que a sociedade lhes assinala, levando-os a perceberem como inaptidões naturais o que não é senão efeito de uma condição inferior, e persuadindo-os de que eles devem o seu destino social (cada vez mais estreitamente ligado ao seu destino escolar, à medida que a sociedade se racionaliza) - à sua natureza individual e à sua falta de dons (BOURDIEU, 1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216., p. 59).

Essa mistificação se manifesta nas práticas pedagógicas dos professores universitários, as quais também são associadas às condições de permanência, como relatado pelos estudantes Valentina, Pablo e Pedro:

Nossa, eu acho que primeiro é mudar a questão dos professores. Tem muito professor que você vê que estão aqui, mas não estão aqui para te ensinar. Você percebe que eles querem dar a matéria, mas, sabe, joga [o conteúdo] assim... (Valentina, Fisioterapia).

É falta de metodologia. Acho que, muitas vezes, a aula deles [dos professores] são boas, mas não corresponde na prova. Ou a prova é muito fácil e a aula deles não é boa. Aí você está perdendo, não está aprendendo. Tem que ser uma prova razoável, uma aula boa. Provas difíceis, notas ruins. Notas ruins é estresse e isso é uma dificuldade na permanência (Pablo, Física).

Então tem que melhorar a metodologia de ensino. [...] acho que não pode ficar só dizendo “ai, é difícil, difícil, vocês têm que estudar e estudar e estudar…”, isso aí eu já sei. Agora, me ajuda a gostar do que eu estou fazendo, me ajuda a amar, me ajuda a enxergar a beleza por trás do que eu estou fazendo (Pedro, Engenharia Elétrica).

Com essas falas, inferimos que a ideologia do dom perpassa a prática pedagógica nas experiências dos participantes. Os estudantes perceberam pouco apoio dos professores no processo de ensino e aprendizagem, se sentindo responsabilizados pelo próprio desempenho. Concordamos com Honorato (2015HONORATO, Gabriela de Souza. Investigando “permanência” no ensino superior: um estudo sobre cotistas do curso de pedagogia da UFRJ. In: HONORATO, Gabriela de Souza; HERINGER, Rosana. Acesso e sucesso no ensino superior: uma sociologia dos estudantes. Rio de Janeiro: 7Letras: FAPERJ, 2015. p. 96-132.) quando afirma que os professores precisam compreender que os aprendizados não são naturais e próprios para aqueles que estão capacitados. “Não sendo natural, o ‘trabalho acadêmico’ deve ser ensinado, mais do que visto e exigido como ‘talento’ e ‘aptidão’ inatos e/ou como um ‘problema da família e da educação básica’” (HONORATO, 2015HONORATO, Gabriela de Souza. Investigando “permanência” no ensino superior: um estudo sobre cotistas do curso de pedagogia da UFRJ. In: HONORATO, Gabriela de Souza; HERINGER, Rosana. Acesso e sucesso no ensino superior: uma sociologia dos estudantes. Rio de Janeiro: 7Letras: FAPERJ, 2015. p. 96-132., p. 112). Contudo, os dados apontados pelos estudantes afirmam que as práticas pedagógicas não estão sendo trabalhadas para auxiliar o estudante em suas dificuldades acadêmicas, o que interfere na permanência universitária.

Esses posicionamentos dos professores universitários em relação à formação e ao trabalho acadêmico fazem parte de um sistema escolar que tem um bom funcionamento quando seu público são seus herdeiros, aqueles com características sociais favorecidas. Quando há uma grande entrada de “novos” alunos com desvantagens sociais, ocorre uma crise nesse sistema, manifestada por meio da concepção de “queda de nível” ou perda da “excelência” da instituição (BOURDIEU, 1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216.). Dessa forma, a valorização do campo em que se atua é realizada ao se mascarar as explicitações de seu próprio funcionamento, camuflar o custo do investimento de cada agente e o jogo disputado nas relações (BOURDIEU, 1996), mistificando a formação e o trabalho acadêmico.

Quando não há essa preocupação em ensinar o “trabalho acadêmico”, o professor manifesta que o seu papel é de transmitir o conteúdo e que o aprendizado é responsabilidade do estudante, fortalecendo a perspectiva meritocrática que tem sido a base do campo universitário. Entretanto, a meritocracia e a ideologia do dom colaboram com a reprodução das desigualdades sociais ao privilegiar aqueles que já detém o habitus de estudante e recursos econômicos e culturais que respaldam a permanência na universidade. Nesse sentido, não basta ter políticas de inclusão e ampliação do acesso à universidade sem considerar mudanças no funcionamento institucional, como ressaltado por Valle (2015VALLE, Ione Ribeiro. Da meritocracia escolar financiada pela família à meritocracia escolar promovida pelo estado: a igualdade de oportunidades progride a passo. Revista Tempos e Espaços em Educação, Sergipe. v. 8, n. 15, p. 121-132, 2015. Disponível em: https://seer.ufs.br/index.php/revtee/article/view/3696/3147. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://seer.ufs.br/index.php/revtee/art...
, p. 129), “É preciso se preparar para enfrentar as armadilhas de um sistema que proclama a igualdade formal, mas põe em prática dispositivos - legítimos porque naturalizados - de seleção e eliminação”.

A intenção deste artigo não é de culpabilizar os professores, principalmente porque os agentes não são completamente conscientes em suas práticas. O estudo praxeológico considera que as ações dos agentes são guiadas por uma conduta razoável sem ter razão, uma intencionalidade sem intenção, uma sensibilidade social sobre o que os agentes são e o que devem fazer em relação à posição ocupada (BOURDIEU, 2021BOURDIEU, Pierre. Sociologia geral, vol. 2: habitus e campo: Curso no Collège de France (1982-1982). Petrópolis: Vozes, 2021.). Ressaltamos que o processo de consagração em um campo também é um objeto de disputa e tensões constantes, o que serve de orientações e constrangimentos para determinadas condutas.

Na teoria bourdieusiana, as regras e as definições de valorização não são fixas, especialmente em um campo que se mantém a partir das representações que os agentes têm sobre si. Em sua obra sobre o campo universitário, Bourdieu (2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Tradução de Ione Ribeiro Valle, Nilton Valle. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011.) analisa a luta pelas classificações e fundamentos utilizados para valorizar determinados capitais nas relações entre os agentes, mostrando as estratégias utilizadas na composição do poder simbólico no meio acadêmico. Assim como os demais campos, os professores universitários se encontram em um lugar de luta simbólica para determinar as condições e os critérios de pertencimento e de hierarquia legítimos para adquirir os benefícios específicos assegurados pelo campo. Nesse sentido, Bourdieu (2011) indica diferentes tipos de capitais que se articulam no campo universitário, envolvendo tanto as atuações em setores de pesquisa, incluindo a notoriedade intelectual, quanto o pertencimento a âmbitos político-institucionais, como cargos de reitoria e pró-reitorias.

A atuação no campo universitário está envolvida por essas disputas simbólicas, nas quais os variados conjuntos de indivíduos (mais ou menos constituídos em grupos), definidos por esses diferentes critérios de valorização, reivindicam e se esforçam pelo reconhecimento de suas classificações e modos de agir. Tal embate se baseia na pretensão de construir as suas propriedades como legítimas, tornando-as capital específico. Ou seja, é uma disputa sobre as leis de formação dos preços característicos do mercado universitário e para aumentar assim suas chances de lucro (BOURDIEU, 2011BOURDIEU, Pierre. Homo Academicus. Tradução de Ione Ribeiro Valle, Nilton Valle. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011.). Como dominantes no campo universitário, os professores acreditam e confiam em sua estrutura de funcionamento, consagrando as suas próprias posições e impondo as suas definições e propriedades no jogo simbólico. Portanto, os docentes também não enxergam que o trabalho acadêmico é um processo de aprendizagem, pois os seus habitus estão tão ajustados com o campo que o “básico” é visto como evidente, sem a necessidade de discussão (BOURDIEU, 1996). Essa situação é mais intensificada em uma instituição caracterizada pela sua inércia particular em conservar e transmitir a cultura legitimada de uma sociedade (BOURDIEU; PASSERON, 2019).

Outra questão importante é que o trabalho do professor não é o único responsável pela violência simbólica presente no campo universitário. Lembramos que a imposição, a delimitação e o modo como o sistema de ensino lidam com a ação pedagógica corresponde aos interesses dos grupos e/ou classes dominantes na sociedade (BOURDIEU; PASSERON, 1975BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1975.). Contudo, acreditamos que a prática docente pode amenizar o mal-estar gerado pela violência simbólica do campo e favorecer a inclusão dos estudantes, em especial para aqueles que se sentem incapazes para a graduação. Dessa maneira, concordamos também com a concepção de Pedro sobre a permanência universitária: “Para mim, a permanência na universidade não é só você ficar, é você querer continuar tendo o desejo de ficar” (Pedro, Engenharia Elétrica). Esse desejo de ficar, como observamos nos dados coletados, é influenciado pelas condições materiais e simbólicas para permanecer na universidade.

Contribuições, limites e possibilidades de ações institucionais

Apesar de ser comumente conhecida como parte das “Teorias da Reprodução”, a proposta de Pierre Bourdieu é de uma sociologia de probabilidades. Os seus estudos procuravam desvelar as tendências, as chances sociologicamente possíveis para os acontecimentos dos fenômenos sociais. A sua sociologia não é uma previsão exata do que irá acontecer, pois, devido às constantes dinâmicas das disputas nos campos, há sempre uma indeterminação que possibilita a mudança (WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.). Como agentes ingressantes no campo universitário, os estudantes, especialmente os “não-herdeiros”, trazem novas possibilidades para a universidade, resistindo às imposições do campo e entrando na disputa para configurá-lo mais próximo de seus habitus (BOURDIEU, 2004bBOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004b.).

A partir dessa compreensão, indagamos aos estudantes se a universidade contribui para a permanência. Nos questionários previamente aplicados, 53,7% dos participantes reconhecem que a universidade traz contribuições para a permanência dos estudantes, sendo que 26,8% não acreditam que a universidade contribua para a permanência estudantil e 19,5% não souberam responder. Nas entrevistas, o principal reconhecimento dos estudantes está nas ações da universidade em auxílio econômico, a partir da contribuição das bolsas: “Sim, porque a UFSCar tem coisas, aqui, que eu acho que não são todas as universidades que têm. A questão da bolsa moradia, bolsa espécie, todas as coisas” (Laura, Pedagogia).

Da mesma maneira, 46,3% dos participantes do questionário afirmaram que possuíam alguma modalidade de bolsa assistência, sendo que a bolsa alimentação é o principal recurso fornecido aos estudantes (88,2% dos participantes recebem alguma modalidade de bolsa assistencial). Tal auxílio é fundamental para respaldar as condições de permanência dos estudantes, uma vez que a maior parte dos cursos da UFSCar são de períodos integrais. Além disso, Honorato (2015HONORATO, Gabriela de Souza. Investigando “permanência” no ensino superior: um estudo sobre cotistas do curso de pedagogia da UFRJ. In: HONORATO, Gabriela de Souza; HERINGER, Rosana. Acesso e sucesso no ensino superior: uma sociologia dos estudantes. Rio de Janeiro: 7Letras: FAPERJ, 2015. p. 96-132.) apresentou as dificuldades de estudantes de baixa renda em prover a alimentação, pois na universidade investigada pela autora não havia um restaurante universitário ou outra forma de auxílio alimentação.

Por outro lado, a universidade também tem limites para a permanência estudantil, os quais foram apontados pelos participantes das entrevistas. O principal se refere, novamente, à ausência de apoio dos professores:

Acho que a UFSCar oferece bastante bolsas, acho que eles têm bastante incentivo, tanto em questão de alimentação, como aquela bolsa atividade. Acho que tem bastante coisas assim, mas é algo que a universidade oferece, os professores nela não ajudam muito (Diana, Engenharia Química).

Ou seja, enquanto a universidade tem avançado no atendimento de recursos financeiros para os estudantes, ainda tem encontrado limites no ensino, na graduação. O trabalho do professor já foi apontado como fundamental para a permanência universitária por outros pesquisadores (FERNANDES; OLIVEIRA, 2019FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; OLIVEIRA, João Ferreira de. Políticas de expansão e inclusão na educação superior: ações institucionais, prática docente e evasão dos estudantes. Currículo Sem Fronteiras, Goiânia. v. 19, n. 2, p. 707-735, 2019. Disponível em: https://www.curriculosemfronteiras.org/vol19iss2articles/fernandes-oliveira.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.curriculosemfronteiras.org/v...
; PORTES, 2014PORTES, Écio Antônio. A vida universitária de estudantes pobres na UFMG: possibilidades e limites. In: PIOTTO, Débora Cristina. Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares. São Carlos: Pedro & João Editores, 2014. p. 167-237.; VAZ, 2018VAZ, Telma Romilda Duarte. Para além dos nascidos em berço esplêndido - narrativas docentes sobre o trabalho dos professores no campo das políticas de ações afirmativas na UFMS. Presidente Prudente, 2018, 328f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista (UNESP). Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/180294/vaz_trd_dr_prud.pdf?sequence=3&isAllowed=y. Acesso: 02 jul. 2022.
https://repositorio.unesp.br/bitstream/h...
). Na investigação de Portes (2014PORTES, Écio Antônio. A vida universitária de estudantes pobres na UFMG: possibilidades e limites. In: PIOTTO, Débora Cristina. Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares. São Carlos: Pedro & João Editores, 2014. p. 167-237.), foi levantado que, durante as trajetórias acadêmicas, os estudantes pesquisados encontraram professores que pouco ou nada contribuíram para a experiência universitária e que não sabiam lidar com os estudantes que não eram considerados “aluno-padrão”. Diante disso, o autor constata que o professor é essencial não apenas para a formação, mas para a construção de saberes necessários à afiliação e para abrir o horizonte de possibilidades acadêmicas dos estudantes.

A docência universitária, contudo, também enfrenta desafios formativos. Já no final da década de 1990, Masetto (1998MASETTO, Marcos Tarciso. Professor universitário: um profissional da educação na atividade docente. In: . Docência na universidade. 6.ed (Edição). Campinas: Papirus, 1998. p. 9-26.) alertava para a tradicional ausência de formação pedagógica entre os professores universitários no Brasil, pois a prioridade era contratar os profissionais com formação europeia e com destaque em suas atuações científicas. Segundo o autor, essa falta de exigência formativa para a docência promoveu a crença de que “quem sabe, automaticamente, sabe ensinar” (MASETTO, 1998MASETTO, Marcos Tarciso. Professor universitário: um profissional da educação na atividade docente. In: . Docência na universidade. 6.ed (Edição). Campinas: Papirus, 1998. p. 9-26., p. 11), portanto não havia uma percepção de que a aprendizagem dos alunos era o objetivo central dos cursos de graduação. Essa situação tem pouca diferenciação nos tempos atuais.

As pesquisas de Oliveira e Vasconcellos (2011OLIVEIRA, Cláudia Chueire; VASCONCELLOS, Maura Maria Morita. A formação pedagógica institucional para a docência na Educação Superior. Interface, Comunicação, Saúde, Educação, v.15, n.39, p.1011-24, 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/icse/a/CNb4MJKTj3fy4yxtn5FjsKt/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.scielo.br/j/icse/a/CNb4MJKTj...
) e de Pryjma e Oliveira (2016PRYJMA, Marielda Ferreira; OLIVEIRA, Oséias Santos de. O desenvolvimento profissional dos professores da educação superior: reflexões sobre a aprendizagem para a docência. Educação & Sociedade, Campinas. v. 37, n. 136, p.841-857, 2016. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/HGfthfLDgvjrfBKRSYLLnmz/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.scielo.br/j/es/a/HGfthfLDgvj...
) apontam para o amadorismo nas práticas pedagógicas de professores universitários, os quais têm sólida formação acadêmica, mas pouca formação para a atuação docente. O ensino na graduação tem sido baseado em tentativas e erros nas soluções dos conflitos de forma individualizada, sem uma reflexão aprofundada para a ressignificação ou qualificação dessas práticas. Essa problemática requer propostas formativas das instituições de educação superior para fundamentar e alterar as dimensões de ensino e de aprendizagem. A ausência da formação pedagógica sinaliza a complexidade da atuação docente, pois a experiência enquanto aluno de graduação se torna a base da docência para muitos professores universitários. Base esta que, como alertado por Masetto (1998MASETTO, Marcos Tarciso. Professor universitário: um profissional da educação na atividade docente. In: . Docência na universidade. 6.ed (Edição). Campinas: Papirus, 1998. p. 9-26.), está pautada em profissionais que também não tinham formação docente.

Além disso, entendemos que a complexidade da docência universitária pode ser considerada em relação aos diferentes cursos e áreas de conhecimento que ocupam diferentes posições em disputa no campo universitário. Uma vez que há pouca formação pedagógica e ausência de respaldo institucional para as práticas docentes, os professores universitários são limitados às formações iniciais na universidade. Mesmo com a presença de elementos em comum, as dificuldades da docência também têm as suas especificidades em cada curso de graduação, indicando que esse desafio não pode ser tratado de forma homogênea. Um professor da área de engenharia pode ter uma dificuldade diferenciada de um professor do âmbito educacional, pois as suas formações, compreensões e estratégias sobre a docência são diversificadas na área de conhecimento em que atuam.

Devido aos limites de nossa pesquisa, não avançamos na análise sobre as complexas e heterogêneas dificuldades pedagógicas entre os professores universitários das diferentes áreas de conhecimento3 3 Essa pode ser uma interessante temática a ser estudada com mais afinco em investigações futuras. . O que ressaltamos é a relação acentuada que a atuação docente evidencia com a permanência universitária, principalmente em sua dimensão simbólica, pois “[...] a responsabilidade pelo fracasso e sucesso profissional está mais atrelada ao perfil dos estudantes do que propriamente ao fazer pedagógico e às reflexões decorrentes das práticas” (PRYJMA; OLIVEIRA, 2016PRYJMA, Marielda Ferreira; OLIVEIRA, Oséias Santos de. O desenvolvimento profissional dos professores da educação superior: reflexões sobre a aprendizagem para a docência. Educação & Sociedade, Campinas. v. 37, n. 136, p.841-857, 2016. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/HGfthfLDgvjrfBKRSYLLnmz/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.scielo.br/j/es/a/HGfthfLDgvj...
, p. 855).

Apesar da importância da atuação docente, Vaz (2018VAZ, Telma Romilda Duarte. Para além dos nascidos em berço esplêndido - narrativas docentes sobre o trabalho dos professores no campo das políticas de ações afirmativas na UFMS. Presidente Prudente, 2018, 328f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista (UNESP). Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/180294/vaz_trd_dr_prud.pdf?sequence=3&isAllowed=y. Acesso: 02 jul. 2022.
https://repositorio.unesp.br/bitstream/h...
) afirma que ainda há um silenciamento nas pesquisas científicas sobre o trabalho do professor universitário em relação às políticas de ações afirmativas. A investigação de Vaz (2018) indicou que o trabalho docente na universidade mantém práticas lineares e hierarquizadas, não trazendo um conhecimento sobre a realidade social. Portanto, a autora defende que a democratização do ensino superior só será efetivada quando aliarem o trabalho docente às políticas de ações afirmativas. É a partir desse trabalho comprometido que a universidade poderá cumprir o seu papel social, principalmente em tempos com ideais fascistas rondando a sociedade brasileira (VAZ, 2018VAZ, Telma Romilda Duarte. Para além dos nascidos em berço esplêndido - narrativas docentes sobre o trabalho dos professores no campo das políticas de ações afirmativas na UFMS. Presidente Prudente, 2018, 328f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista (UNESP). Disponível em: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/180294/vaz_trd_dr_prud.pdf?sequence=3&isAllowed=y. Acesso: 02 jul. 2022.
https://repositorio.unesp.br/bitstream/h...
).

A pesquisa de Fernandes e Oliveira (2019FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; OLIVEIRA, João Ferreira de. Políticas de expansão e inclusão na educação superior: ações institucionais, prática docente e evasão dos estudantes. Currículo Sem Fronteiras, Goiânia. v. 19, n. 2, p. 707-735, 2019. Disponível em: https://www.curriculosemfronteiras.org/vol19iss2articles/fernandes-oliveira.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.curriculosemfronteiras.org/v...
) evidenciou que ainda há resistência por parte dos professores em modificarem as suas práticas para auxiliar o estudante que não se enquadra no modelo ideal (ou seja, o estudante que já detém capital cultural e um habitus para a universidade). Os professores, por já ocuparem uma posição de destaque no campo universitário, valorizam suas práticas e acreditam que é o estudante (cotista ou não cotista) que deve estudar e se esforçar, de acordo com as orientações transmitidas. Os autores consideram que tais percepções encontradas entre os docentes podem confirmar o processo reprodutivo do ensino ao tratarem igualmente os estudantes que são socialmente desiguais, fortalecendo a ideologia do dom desmistificada pela teoria bourdieusiana.

É importante considerar que as ações dos professores também são orientadas por um habitus, detalhado por Silva (2005SILVA, Marilda da. O habitus professoral: o objeto dos estudos sobre o ato de ensinar na sala de aula. Revista Brasileira de Educação, São Paulo. n. 29, p. 152-164, 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbedu/a/LdBdvGQ66DwZBCTXx8qnRcd/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.scielo.br/j/rbedu/a/LdBdvGQ6...
) como habitus professoral. Os dispositivos de ações dos docentes são desenvolvidos com o exercício da profissão, porém também recebem influências da cultura escolar. Em nossa pesquisa, entendemos que o habitus professoral dos docentes universitários também é influenciado pela cultura do campo científico. Fernandes (2019FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; OLIVEIRA, João Ferreira de. Políticas de expansão e inclusão na educação superior: ações institucionais, prática docente e evasão dos estudantes. Currículo Sem Fronteiras, Goiânia. v. 19, n. 2, p. 707-735, 2019. Disponível em: https://www.curriculosemfronteiras.org/vol19iss2articles/fernandes-oliveira.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.curriculosemfronteiras.org/v...
) esclarece que o referido campo tem produzido o conhecimento a partir da lógica do mercado (conhecimento-mercadoria) por meio da ideologia meritocrática, reforçando o produtivismo acadêmico e a intensificação do trabalho docente. Essas configurações do campo científico afetam as práticas docentes, o que tende a levar os professores a desenvolverem maiores investimentos em atividades de pesquisa, que são mais rentáveis no campo, do que as práticas pedagógicas (FERNANDES; OLIVEIRA, 2019FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; OLIVEIRA, João Ferreira de. Políticas de expansão e inclusão na educação superior: ações institucionais, prática docente e evasão dos estudantes. Currículo Sem Fronteiras, Goiânia. v. 19, n. 2, p. 707-735, 2019. Disponível em: https://www.curriculosemfronteiras.org/vol19iss2articles/fernandes-oliveira.pdf. Acesso em: 02 jul. 2022.
https://www.curriculosemfronteiras.org/v...
).

Os estudantes também apontaram as suas sugestões de melhoria para a permanência. Novamente, a prática pedagógica foi o elemento mais citado, como observamos na fala da estudante: “[Se] os docentes entendessem que eles estão ali para nos ajudar, que é uma coisa de união e não de competição, eu acho que seria mais fácil” (Diana, Engenharia Química). Nunes e Veloso (2015) apontam as dificuldades que estudantes universitários podem sentir na relação professor e aluno, sempre muito importante para a adaptação do estudante aos novos desafios oriundos do ambiente acadêmico. Para as autoras, o professor pode motivar o estudante na opção pelo curso escolhido, além de criar um clima propício à construção da aprendizagem e motivar o aluno a usufruir com satisfação o curso que está fazendo.

Além disso, a dimensão simbólica da permanência universitária está relacionada com as classificações dos professores que exercem uma função de legitimação e reconhecimento dos estudantes que estão aptos para serem aprovados e se manterem na educação superior. O trabalho de Bourdieu e Saint-Martin (1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216.) indica que a percepção, apreciação e as práticas dos professores são organizadas por sistemas de classificação. Esses princípios classificatórios estão relacionados com a lógica do campo universitário e com a divisão da sociedade, convertendo classificações sociais em classificações escolares. As representações que os professores têm sobre si e sobre os estudantes carregam valores sociais, fundamentando taxionomias escolares que definem como excelência as qualidades dos agentes que são socialmente dominantes. Dessa forma, a homologia existente entre as estruturas do sistema de ensino e as estruturas mentais dos professores, as fronteiras simbólicas relacionadas com as fronteiras sociais, são o “[...] princípio da função de consagração da ordem social que o sistema de ensino preenche sob a aparência de neutralidade” (BOURDIEU; SAINT-MARTIN, 1998BOURDIEU, Pierre; SAINT-MARTIN, Monique de. As categorias do juízo professoral. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio . Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. p.185-216., p. 196).

Pensar um programa de permanência universitária que inclua a dimensão simbólica exige, portanto, um repensar sobre as classificações dos professores e os seus próprios princípios de visão que influenciam a crença sobre o seu papel e suas práticas na universidade. Ressaltamos que a experiência estudantil, especialmente dos não-herdeiros, enfrenta desafios simbólicos em relação ao desconhecimento sobre as regras, linguagem e simbolização das práticas que compõem o espaço e o desempenho acadêmico. Esses desafios evidenciam a contradição de um habitus institucional e da cultura universitária que buscam o aumento da diversidade, mas mantêm reproduções simbólicas que conservam fronteiras contrárias à inclusão social (LIMA, 2020LIMA, Mariana Martinelli de Barros. A experiência dos não-herdeiros: relações entre herança simbólica e a cultura acadêmica. Campinas, 2020. 241f. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas.).

Outra sugestão citada pelos estudantes para melhorar as ações institucionais de permanência estudantil se refere à importância do acolhimento ao longo do primeiro ano no curso universitário. Segundo Cavichiolo (2019CAVICHIOLO, Katia Silene. Ações afirmativas: as políticas de permanência para alunos cotistas na Universidade Federal de São Carlos. 2019. 137 f. Dissertação (Mestrado em Gestão de Organizações e Sistemas Públicos) - Universidade Federal de São Carlos. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/11222/Diss_KSC.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 02 jan. 2022.
https://repositorio.ufscar.br/bitstream/...
), o acolhimento bem elaborado pela instituição pode ser favorável para a permanência universitária, em especial para os estudantes ingressantes pela Lei de Cotas.

Ressalta-se, ainda, que estratégias de efetivo acolhimento aos alunos ingressantes são necessidades básicas para melhorar a inclusão social. A apresentação de todo espaço acadêmico, das regras e normas e, principalmente das oportunidades de bolsas, participação em projetos, estágios, além dos recursos de acompanhamento e reforço pedagógico possibilitariam melhoras no desempenho acadêmico, queda da evasão e retenção destes estudantes (CAVICHIOLO, 2019CAVICHIOLO, Katia Silene. Ações afirmativas: as políticas de permanência para alunos cotistas na Universidade Federal de São Carlos. 2019. 137 f. Dissertação (Mestrado em Gestão de Organizações e Sistemas Públicos) - Universidade Federal de São Carlos. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/11222/Diss_KSC.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 02 jan. 2022.
https://repositorio.ufscar.br/bitstream/...
, p. 121).

A relevância do acolhimento está em desvelar o funcionamento do espaço institucional, as normas, procedimentos e cultura universitária que regem as condutas dos agentes. Essa ação informacional inicial pode auxiliar a inserção do estudante, especialmente para aqueles que não conhecem o seu funcionamento. Além disso, o primeiro ano da graduação é o que tem o maior índice de evasão na universidade estudada (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, 2018), sendo um ano importante de ser trabalhado para que os estudantes possam compreender os novos processos de ensino e aprendizagem (ALMEIDA, 2014ALMEIDA, Wilson Mesquita. Estudantes com desvantagens sociais e os desafios da permanência na universidade pública. In: PIOTTO, Débora Cristina. Camadas populares e universidades públicas: trajetórias e experiências escolares. São Carlos: Pedro & João Editores, 2014. p. 239-272.). Portanto, planejar as ações de acolhimento para favorecer a fase de adaptação pode ser um elemento essencial para propiciar a permanência universitária (NUNES, 2016NUNES, Roseli Souza dos Reis; VELOSO, Tereza Christina Mertens Aguiar. A assistência estudantil na Universidade Federal de Mato Grosso: aspectos socioeconômicos de estudantes beneficiados. In: SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE UNIVERSITAS/Br, XXIV, 2016, Maringá, PR. Anais... 2016. p. 969-984.).

Ouvir os estudantes é uma alternativa sugerida pela estudante Heloisa para que a universidade possa considerar suas necessidades quando for elaborar ações de acolhimento e permanência:

Fazer essas pesquisas para ver a opinião dos alunos, tentar identificar os principais problemas e propor soluções, que nem o que a gente está fazendo agora. Que isso chegue até eles. Por isso que eu acho que é muito importante a minha participação e a participação dos alunos. É um meio de chegar e proporcionar uma coisa melhor. Uma universidade melhor (Heloisa, Estatística).

A fala da estudante Heloisa demonstra que um entrevistado também tem os seus próprios objetivos ao participar de uma pesquisa, realizando a sua interpretação sobre a finalidade da investigação (BOURDIEU, 2008BOURDIEU, Pierre. Compreender. In:.A miséria do mundo. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 693-713.). Nesse caso, especialmente porque a entrevista foi realizada entre agentes com posições próximas4 4 No momento da entrevista, a entrevistadora era uma estudante de pós-graduação. , a participante sente que a produção científica é um meio legítimo no campo para trazer visibilidade para os desafios enfrentados na permanência universitária. Da mesma forma, Cordeiro e Cordeiro (2015CORDEIRO, Maria José de Jesus Alves; CORDEIRO, Ana Luisa Alves. Estratégias de permanência de estudantes na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). In: SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE UNIVERSITAS/Br, XXIII, 2015, Belém - PA. Anais... Belém: ICED/UFPA, 2015.) ressaltam a importância de investigações realizadas com estudantes para conhecer as dificuldades enfrentadas pelos mesmos, procurando solucionar e monitorar o desenvolvimento acadêmico. Ou seja, é o cotidiano acadêmico que possibilita a medição do que é preciso melhorar na permanência universitária. É necessário conhecer a diversidade presente nos perfis dos estudantes, que se torna presente nas universidades atuais pela Lei de Cotas, para propiciar a permanência universitária. Segundo as autoras:

A permanência como uma política institucional, um compromisso que a instituição assume para evitar/diminuir a evasão de estudantes, precisa ir além da mera preocupação com números e criar um espaço de relações na universidade que leve em conta a diversidade e a diferença que constituem o perfil dos/as estudantes, de modo que desempenhe sua função social de promoção e exercício da cidadania (CORDEIRO; CORDEIRO, 2015CORDEIRO, Maria José de Jesus Alves; CORDEIRO, Ana Luisa Alves. Estratégias de permanência de estudantes na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS). In: SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE UNIVERSITAS/Br, XXIII, 2015, Belém - PA. Anais... Belém: ICED/UFPA, 2015., p. 834).

Assim, compreendemos que a permanência universitária envolve outras dimensões para além das ações de auxílio econômico. Os estudantes compreendem e vivenciam fatores simbólicos que podem influenciar para que eles permaneçam ou se evadam da universidade. Entre tais fatores, percebemos como as dificuldades acadêmicas e a prática pedagógica apresentam um importante desdobramento, especialmente por serem fatores determinantes para a aprovação nas disciplinas e progressão nos cursos.

Considerações finais

Este artigo se propôs a analisar as percepções de estudantes sobre as suas experiências relacionadas à permanência universitária, buscando aprofundar os mecanismos simbólicos presentes nos percursos estudantis em uma universidade pública federal. Identificamos que os estudantes reconhecem a importância do auxílio econômico para as suas subsistências na universidade, sendo esse um elemento fundamental em um programa de permanência universitária. Contudo, os estudantes também levantaram questões simbólicas que influenciam o percurso estudantil.

A dimensão simbólica da permanência está presente na responsabilização do aluno pelo seu desempenho, relacionado às dificuldades acadêmicas com o conteúdo cultural exigido e às práticas dos professores que pouco auxiliam os estudantes com maiores defasagens culturais e educacionais. As sugestões apresentadas para a superação desses limites da universidade se referem ao engajamento dos professores no trabalho pedagógico, ao acolhimento para os estudantes ingressantes e a realização de pesquisas que considerem as percepções dos estudantes sobre os desafios da permanência universitária.

Reconhecemos que esses apontamentos foram feitos por estudantes com características sociais próximas ao que se considera como “novos estudantes” (HERINGER, 2020HERINGER, Rosana. Políticas de ação afirmativa e os desafios da permanência no ensino superior. In: DIAS, Carlos Eduardo Sampaio Burgos; et al. Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. p. 61-78.), pois são oriundos de camadas sociais que estavam historicamente excluídas das universidades públicas e com ausência de um habitus que irá favorecer a sua inserção nesse espaço de disputas (MATTOS; FERNANDES, 2022MATTOS, Hellen Cristina Xavier da Silva; FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan. A universidade no horizonte de estudantes oriundos de escola pública: um estudo qualitativo sobre a permanência. Horizontes, São Paulo, v. 40, n. 1, p.25, 2022 Disponível em: https://revistahorizontes.usf.edu.br/horizontes/article/view/1309/628. Acesso em:02 jul. 2022.
https://revistahorizontes.usf.edu.br/hor...
). Nesse sentido, são agentes que não possuem as disposições exigidas, ocasionando sentimentos e ações de inadequação, deslocados, na contramão, em colocações ruins, especialmente quando se trata de um campo que tende à consagração e reprodução das relações de força na sociedade. Ainda assim, são também esses agentes que podem lutar com as forças do campo, buscando a resistência e modificações na sua estrutura para conformar o campo às suas próprias disposições (BOURDIEU, 2004bBOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004b.).

As falas dos estudantes demonstram que novas disputas estão sendo levantadas no campo universitário, disputas que só ocorrem pela presença de novos agentes, o que indica a importância das regulamentações no ingresso às universidades públicas. Como já mencionado, nossa intenção não é a de culpabilizar os docentes e instituir rivalidades com os alunos. As contribuições da teoria sociológica de Pierre Bourdieu nos possibilitam compreender que os mecanismos de reprodução não se referem às práticas conscientes e individuais, mas sim às lutas simbólicas que envolvem as nossas categorias de percepção e apreciação, orientando-nos a valorizar e agir dentro dos limites do arbitrário cultural.

Os dados e sugestões dos estudantes contemplados neste estudo, bem como a análise bourdieusiana, nos mostram que há entraves simbólicos na inclusão social em universidades públicas. Acreditamos que a superação desses desafios e as alterações ainda necessárias se referem a um trabalho institucional para a inserção dos “novos estudantes”, contribuindo para a transformação que está ocorrendo na estrutura histórica elitista e excludente da educação superior brasileira. Para isso, é interessante aliar as ações simbólicas com o auxílio financeiro, pois alterar a distribuição e o peso relativo das formas de capital valorizado modificam a estrutura e as disputas do campo (WACQUANT, 2005WACQUANT, Loïc. Hacia uma praxeología social: la estrutura y la lógica de la sociologia de Bourdieu. In: BOUDIEU, Pierre; WACQUANT, Loïc. Una invitación a la sociologia reflexiva. Buenos Aires: Siglo XXI Editores Argentina, 2005. p. 15-59.). Por outro lado, há o desafio de estipular novas classificações sobre a definição e o funcionamento da universidade. São essas classificações que organizam a percepção sobre o que é e como deve funcionar essa instituição, organizando, assim, o próprio campo universitário. Portanto, a proposta de mudança também perpassa a dimensão simbólica, na disputa pela forma de visão sobre o campo e as operações práticas que produzem e reproduzem os grupos sociais (BOURDIEU, 2004aBOURDIEU, Pierre. Espaço social e poder simbólico. In: Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004a. p. 149-168.).

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  • 1
    Esse artigo é oriundo de uma pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Processo nº 17/24909-9)
  • 2
    As características sociais específicas de cada estudante estão descritas na pesquisa das autoras, que pode ser visualizada em Mattos (2020).
  • 3
    Essa pode ser uma interessante temática a ser estudada com mais afinco em investigações futuras.
  • 4
    No momento da entrevista, a entrevistadora era uma estudante de pós-graduação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    11 Maio 2022
  • Aceito
    24 Ago 2022
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