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A laparoscopia no diagnóstico das doenças intra-abdominais. Análise de 168 casos

The laparoscopy in the diagnoses of intraabdominal diseases. Analysys of 168 cases

Resumos

A laparoscopia tem sido mais freqüentemente indicada nos últimos anos na complementação diagnóstica de afecções abdominais e na identificação de repercussões abdominais de doenças sistêmicas. Modernos equipamentos incluindo video-laparoscopia e o uso de agulhas de biópsias e outros instrumentais permitem elevada segurança e significante capacidade diagnóstica. OBJETIVO: Empregar a laparoscopia no diagnóstico de doenças abdominais e sistêmicas. MÉTODOS: Durante os últimos 9 anos, 168 doentes foram submetidos a laparoscopia e as principais indicações foram: ascites (43 casos - 25,5%); doenças hepáticas (42 casos - 25%); câncer gástrico (37 casos - 22%); linfomas (17 casos - 10,1%); tumores abdominais (9 casos - 5,4%); tuberculose peritoneal (8 casos - 4,8%); tumores hepáticos (6 casos - 3,6%); cisto mesentérico (1 caso - 0,6%) e outras doenças (5 casos - 3,0%). Noventa e nove pacientes eram masculinos (58,9%), com idade variando de 9 a 78 anos (47,6 anos). Biópsias hepáticas foram realizadas em 92 casos (54,7%) e outras biópsias tumorais em 26 casos (15,4%). RESULTADOS: O diagnóstico da doença foi estabelecido ou confirmado em 145 casos (86,3%). Em 25 casos de câncer gástrico (67,5%), a laparoscopia contra-indicou a laparotomia em função de detecção de doença avançada. Dois pacientes apresentaram hemorragia (1,2%) após biópsias hepáticas e a laparotomia foi imediatamente indicada. Um doente, cujo diagnóstico era de lupus sistêmico, apresentou abscesso abdominal, broncopneumonia e faleceu (0,6%). CONCLUSÃO: O procedimento tem pequeno número de complicações e quando empregado como método diagnóstico complementar, evita a laparotomia e agiliza medidas terapêuticas.

Laparoscopia; Doenças intra-abdominais; Estadiamento


The laparoscopy has been more and more frequently indicated in the last years, for the complementary diagnosis of intraabdominal diseases and abdominal repercussion of systemic diseases. Modern equipaments including videolaparoscopy and the use of either forceps or biopsy needle permit higher safety and significant diagnostic capacity. PURPOSE: To perform laparoscopy for the diagnosis of intraabdominal and sistemic diseases. METHODS: During the last 9 years 168 patients were submitted to laparoscopy and the main indications were: ascites - 43 cases (25,5%); liver diseases - 42 cases (25%); gastric cancer - 37 cases (22%); lymphoma - 17 cases (10,1%); abdominal tumour - 9 cases (5,4%); peritoneal tuberculosis - 8 cases (4,8%); liver tumour - 6 cases (3,6%); mesenteric cyst - 1 case (0,6%) and other diseases - 5 cases (3,0%). Ninety nine patients were male (58,9%) aging from 9 to 78 years old (median 47,6 years). Liver biopsies were performed in 92 cases (54,7%) and other tumour biopsies in 26 cases (15,4%). RESULTS: The diagnosis of the diseases were established or confirmed by laparoscopy in 145 patients (86,3%). In 25 cases of gastric cancer (67,5%) laparoscopy contraindicated the laparotomy, owing to advanced disease. Two patients presented bleeding (1,2%) after liver biopsies and laparotomy was immediately indicated. One of them, whose diagnosis was systemic lupus, presented abdominal abscess, bronchopneumony and died (0,6%). CONCLUSION: Laparoscopy has small number of complications, and when employed as a diagnostic complementary method therapeutic procedures, avoids laparotomies and accelerate therapeutic procedures.

Laparoscopy; Intraabdominal diseases; Staging


Comunicação

A laparoscopia no diagnóstico das doenças intra-abdominais. Análise de 168 casos.

N. A. Andreollo, J. de S. Coelho Neto, L. R. Lopes, N. A. Brandalise, L. S. Leonardi

Disciplina de Moléstias do Aparelho Digestivo do Departamento de Cirurgia e no Gastrocentro, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Campinas, SP.

RESUMO

A laparoscopia tem sido mais freqüentemente indicada nos últimos anos na complementação diagnóstica de afecções abdominais e na identificação de repercussões abdominais de doenças sistêmicas. Modernos equipamentos incluindo video-laparoscopia e o uso de agulhas de biópsias e outros instrumentais permitem elevada segurança e significante capacidade diagnóstica.

OBJETIVO. Empregar a laparoscopia no diagnóstico de doenças abdominais e sistêmicas.

MÉTODOS. Durante os últimos 9 anos, 168 doentes foram submetidos a laparoscopia e as principais indicações foram: ascites (43 casos - 25,5%); doenças hepáticas (42 casos - 25%); câncer gástrico (37 casos - 22%); linfomas (17 casos - 10,1%); tumores abdominais (9 casos - 5,4%); tuberculose peritoneal (8 casos - 4,8%); tumores hepáticos (6 casos - 3,6%); cisto mesentérico (1 caso - 0,6%) e outras doenças (5 casos - 3,0%). Noventa e nove pacientes eram masculinos (58,9%), com idade variando de 9 a 78 anos (47,6 anos). Biópsias hepáticas foram realizadas em 92 casos (54,7%) e outras biópsias tumorais em 26 casos (15,4%).

RESULTADOS. O diagnóstico da doença foi estabelecido ou confirmado em 145 casos (86,3%). Em 25 casos de câncer gástrico (67,5%), a laparoscopia contra-indicou a laparotomia em função de detecção de doença avançada. Dois pacientes apresentaram hemorragia (1,2%) após biópsias hepáticas e a laparotomia foi imediatamente indicada. Um doente, cujo diagnóstico era de lupus sistêmico, apresentou abscesso abdominal, broncopneumonia e faleceu (0,6%).

CONCLUSÃO. O procedimento tem pequeno número de complicações e quando empregado como método diagnóstico complementar, evita a laparotomia e agiliza medidas terapêuticas.

UNITERMOS: Laparoscopia. Doenças intra-abdominais. Estadiamento.

INTRODUÇÃO

A primeira laparoscopia diagnóstica foi realizada em 1902 simultaneamente em dois centros: em Dresden, por Kelling1 que visibilizou os órgãos intra-abdominais de um cão com auxílio de um cistoscópio e, em Petrogrado, por Ott2 que introduziu um espéculo no interior do abdomem e levando a iluminação com auxílio de um espelho frontal visualizou os órgãos intracavitários.

Em 1923, Jacobeus3 publicou sua experiência com aproximadamente 100 doentes, sendo que o primeiro deles era portador de ascite e foi examinado em 1910. A seguir, outros autores contribuíram para o desenvolvimento da laparoscopia. Assim, Fervers4, em 1933, introduziu o uso do gás carbônico como agente insuflante seguro para a cavidade abdominal. Veress5, em 1938, desenvolveu a agulha com obturador rombo, a qual é utilizada até hoje para criar o pneumoperitoneo e inclusive leva o seu nome, tornando o procedimento muito seguro. Kalk hepatologista de renome, em 1951, introduz o uso de trocartes e outros instrumentos úteis na laparoscopia6.

Nas décadas de 70 e 80 surgiram técnicas radiológicas não-invasivas de imagem (ultrassonografia, tomografia etc.) e o método não foi muito difundido entre os gastrenterologistas e cirurgiões gerais, sendo mais utilizado pelos ginecologistas. Llanio et al7 foram pioneiros em divulgar o método como eficaz em avaliar urgências abdominais. Foi pouco valorizado durante alguns anos e na década de 90 novamente passou a ser muito empregado, desta vez no diagnóstico do abdômem agudo, traumatismos e ferimentos abdominais8. A partir de 1986, após Cuschieri ter comunicado a realização de colecistectomia através de vídeo-laparoscopia, a laparoscopia deixou de ser simplesmente diagnóstica para ser intervencional nas doenças intra-abdominais e do aparelho digestivo6,9-11.

Assim, aproximadamente um século após ter sido introduzida como recurso diagnóstico, o procedimento volta a ser muito utilizado e valorizado, agora com modernos e mais avançados instrumentos e equipamentos, contribuindo para o tratamento de várias doenças. O objetivo do presente trabalho é mostrar a experiência do emprego deste método no Hospital das Clínicas da UNICAMP.

CASUÍSTICA E METODOLOGIA

Durante os últimos nove anos, 168 doentes foram submetidos à laparoscopia na Disciplina de Moléstias do Aparelho Digestivo, Departamento de Cirurgia e Gastrocentro da FCM/UNICAMP, para diagnóstico de doenças intra-abdominais. Eram 99 masculinos (58,9%) e 69 femininos (41,1%) com idade variável de 9 a 78 anos (média 47,6 anos).

A laparoscopia foi indicada após terem sido realizados os principais exames relativos à doença em que estava sendo diagnosticada, tais como ultrassonografia, punção de ascite, tomografia e outros exames complementares. As indicações da laparoscopia estão discriminadas na tabela 1.

O tempo, a atividade de protrombina e a contagem de plaquetas no sangue periférico foram os exames laboratoriais sistematicamente solicitados. O procedimento foi realizado nos doentes com no mínimo 50% de atividade de protrombina e 80.000 plaquetas. Em 30 doentes (17,8%) a laparoscopia foi realizada mediante uso de anestésico local (xylocaína a 2%) para introdução do trocarte na parede abdominal, acompanhada de sedação endovenosa do doente. Todos os demais foram realizados com anestesia geral.

A técnica de laparoscopia empregada foi a convencional9. Incisão transversal supraumbelical de cerca de 1,5cm e introdução de agulha de Veress para realização de pneumoperitoneo com CO2. Para realização do pneumoperitoneo, foi utilizado insuflador a pressão da marca Wisap. Após distensão abdominal satisfatória, retirada da agulha de Veress e introdução com cuidado de trocarte de 10mm de diâmetro e a seguir colocação da ótica de 0º. Para iluminação foi empregada fonte de luz Olympus CLE-F10. Dispondo-se de equipamentos de video-laparoscopia, a conexão da microcâmera à ótica, permitirá visualização através de um monitor, ampliando e mostrando imagens mais detalhadas.

O procedimento inicia-se com o exame minucioso de todo o peritoneo parietal, de ambos os lobos hepáticos, do baço, grande epíplon e da superfície das alças intestinais e demais órgãos.

As biópsias hepáticas foram realizadas com agulha de Silverman e outros instrumentos tais como afastador de fígado, agulha para biópsia de peritoneo e outras pinças auxiliares, que foram introduzidas na cavidade abdominal quando necessárias. O local preferido para biópsia hepática foi o lobo esquerdo. Os doentes portadores de ascite volumosas foram drenados durante o procedimento, utilizando-se aspirador apropriado, para adequada visualização de toda a cavidade peritoneal.

A video-laparoscopia foi realizada em 25 casos desta casuística, utilizando-se equipamento convencional para cirurgia vídeo-laparoscópica11.

RESULTADOS

O diagnóstico da doença intra-abdominal foi estabelecido ou confirmado pela laparoscopia em 145 pacientes (86,3%). Nos portadores de câncer gástrico a laparoscopia demonstrou que 25 doentes (67,5%) eram portadores de carcinomatose peritoneal ou tinham tumores irressecáveis, contraindicando portanto a laparotomia exploradora.

As biópsias hepáticas foram realizadas em 92 casos (54,7%) e biópsias de outros tumores em 26 casos (15,4%). Dois doentes que tinham atividade de protrombina aproximadamente 60% apresentaram hemorragia após a realização de biópsias hepáticas e a laparotomia foi imediatamente indicada (1,2%). Um destes pacientes apresentou evolução satisfatória após a hemostasia do local de sangramento e o outro, o qual era portador de lupus sistêmico grave, evoluiu com abscessos intra-abdominais, broncopneumonia e sepses, falecendo (0,6%) cerca de 10 dias após a laparoscopia.

Como complicação tardia, um dos doentes que apresentava ascite evoluiu com perda continuada e crônica deste líquido pelo local de introdução do trocarte, sendo necessário uma exploração cirúrgica para ressutura da parede abdominal.

DISCUSSÃO

A laparoscopia é um procedimento invasivo de diagnóstico, bem tolerado e seguro em mãos experientes. As principais indicações eletivas do método são em oncologia, nas biópsias hepáticas, nas ascites, em febre de origem indeterminadas e outras12. Em oncologia as indicações são no estadiamento, na avaliação da extensão, operabilidade e ressecabilidade dos tumores, na avaliação de metástases e na realização de biópsias com agulhas ou pinças apropriadas11,13. A biópsia hepática, através da laparoscopia é dirigida e muito mais segura que a biópsia percutânea, visto que é realizada sob visão direta e com controle da intensidade da hemorragia.

Em portadores de ascite cuja etiologia não foi estabelecida com os exames habituais, a laparoscopia está indicada. Cuidados especiais devem ser tomados nestes doentes, tais como: reposição volêmica após aspiração do líquido ascítico, introdução cuidadosa da agulha de Veress e trocartes devido risco de lesão e hemorragia de veias colaterais, pneumoperitoneo lento para evitar a formação de bolhas gasosas e fechamento cuidadoso dos orifícios na parede abdominal para que não ocorra fístula e vazamento de líquido ascítico14.

Nos doentes com febre de origem indeterminada em que não foi possível chegar ao diagnóstico final, a laparoscopia está indicada com o objetivo de diagnosticar linfomas ou outras doenças6,13.

Em situações de emergência, a laparoscopia poderá ser empregada nos ferimentos penetrantes abdominais, nos traumas abdominais fechados, na suspeita de isquemia intestinal e no abdomem agudo inflamatório sem causa definida, sempre no sentido de evitar laparotomias desnecessárias7,8.

A laparoscopia sendo método invasivo, está sujeita à complicações que o cirurgião ou o gastrenterologista devem conhecer e saber tratá-las. São incluídas nas complicações comuns a todos os procedimentos cirúrgicos, tais como: anestésicas, sangramento e infecção pós-operatória. Além disso, existem as complicações específicas do método, decorrentes do pneumoperitoneo, da agulha de Veress e trocartes e de outros procedimentos diagnósticos9,15.

As complicações anestésicas são raras, porém o anestesista deve estar sempre atento, pois o aumento da pressão intra-abdominal secundário ao pneumoperitoneo, a posição de Trendelenburg, cardiopatias e pneumopatias pré-existentes, contribuem para favorecer o surgimento de arritmias cardíacas, hipoventilação, hipóxia, acidose e outros efeitos colaterais. O procedimento pode ser também realizado com anestesia local e sedativos endovenosos, preferencialmente na presença de um anestesista. Assim mesmo, a cabeça do doente deve ser mantida mais elevada para prevenir aspirações pulmonares secundárias às náuseas e vômitos que são freqüentes, quando o exame é feito com este tipo de anestesia6,15.

As complicações significantes do pneumoperitoneo também são raras, ocorrendo em menos que 1% dos casos. É importante saber que a insuflação intra-abdominal de gás causa certas mudanças fisiológicas na hemodinâmica e função pulmonar de todos os pacientes. O aumento da pressão intra-abdominal resulta em aumento da pressão venosa central dos batimentos e do débito cardíaco e da pressão arterial média. O gás carbônico (CO2), o gás mais freqüentemente utilizado, pode causar aumento do pCO2 e diminuição do pH arterial, resultando em acidose metabólica e respiratória. A embolização pelo CO2, a complicação mais grave e fatal, felizmente é muito rara. O pneumotórax e o enfizema subcutâneo são outras complicações que podem ocorrer15.

As complicações decorrentes da inserção dos trocartes são a hemorragia e perfuração de vísceras. A hemorragia, decorrente de lesão de veias da parede abdominal, especialmente as periumbelicais que estão dilatadas e com abundante circulação colateral secundária à hipertensão portal em portadores de cirrose hepática e outras hepatopatias. Na maioria das publicações sua incidência é estimada em 0,2%. As perfurações intestinais envolvem principalmente o cólon transverso e menos comumente o intestino delgado. Ocorrem em incidência maior em doentes com cirurgia abdominal anterior e doentes com aderências intestinais secundárias à peritonite e tuberculose intestinal. É importante diagnosticar a perfuração e tratá-la adequadamente em tempo, evitando graves complicações14,15.

Outras complicações durante a laparoscopia incluem perfurações intestinais e traumatismos de outras vísceras como fígado, baço, bexiga, mesentério, etc, causadas principalmente pela própria ótica, outras pinças ou instrumentos introduzidos na cavidade peritoneal14,15.

As complicações mais freqüentes decorrentes da biópsia hepática são a hemorragia e a peritonite biliar14,15. Brhul16 em 1966 revisou 63.845 laparoscopias e relata ocorrência de peritonite biliar em 0,05%, resultando em 0,013% de mortalidade. Entretanto, a hemorragia, registrada na frequência entre 0,02 a 0,2%, na maioria das séries publicadas. A hemorragia raramente ocorre se for respeitado o limite de 50% de atividade de protrombina e contagem de plaquetas sanguíneas >80.000/mm3. O lobo esquerdo é mais apropriado para biopsiar, pois no caso de hemorragia, é facilmente atingido e passível de compressão externa na parede abdominal9,15.

As complicações tardias pós-laparoscopias também são descritas e incluem implantes metastáticos nos locais de inserção de trocartes e agulhas de biópsias, hérnias nos locais de incisão e infecção intra-abdominal. Apesar disso, é um método seguro, com incidência global muito baixa de complicações. Revisões extensas incluindo mais de 200.000 laparoscopias registram 0,05% de morbidade e mortalidade, não elevando o tempo de hospitalização15.

Marti-Vicenti et al.17 em recente revisão de 8.915 laparoscopias referem 0,60% de acidentes, sendo metade delas decorrentes de instrumentação e biópsias hepáticas. A mortalidade global foi de 0,11% como sequela de hemorragia incontrolável, sendo a metade delas secundárias à biópsias hepáticas. Entretanto, Kane & Krejs18 revisaram 603 laparoscopias de 17 centros americanos e referem mortalidade de 0,49%.

O valor, a eficácia e a segurança da laparoscopia é notório quando se está diante de doente que não apresenta condições clínicas satisfatórias para ser submetido à laparotomia exploradora. Além disso, estudos prospectivos já demonstraram que em muitos casos a tomografia computadorizada, a ultrassonografia e a cintilografia são exames limitados, não contribuindo para o diagnóstico definitivo10,11.

A laparoscopia, segundo Nord & Boyd10 e Puccio et al.19, pode contribuir para o diagnóstico definitivo em até 90% dos casos, sendo que os demais 10% mostram resultados normais ou inespecíficos. Na presente casuística o diagnóstico foi estabelecido em 86,3%.

Nas doenças hepáticas o diagnóstico é estabelecido em praticamente 100% dos casos, pois permite a realização de biópsias com segurança14. Nos tumores hepáticos, Nord & Boyd11 relatam experiência de TJ Babineau et al. (1993), em que a laparoscopia revelou irressecabilidade dos tumores em 45% dos casos, evitando laparotomias desnecessárias. Lightdale13 demonstra a eficácia da laparoscopia no estadiamento de tumores gastrintestinais, como carcinoma pancreático, carcinoma gástrico, linfomas e outros em comparação com os métodos radiológicos de imagem.

Na casuística apresentada, em 56% dos casos de carcinoma gástrico, a laparoscopia realizada pré-operatoriamente demonstrou inoperabilidade, evitando laparotomias desnecessárias. D'ugo et al.20 enfatizam que é um procedimento fundamental com eficácia de 68,6% na avaliação da ressecabilidade destas neoplasias. Molloy et al21 mostram resultados semelhantes.

O único óbito registrado na série apresentada (0,6%) decorreu do fato de que a hemorragia, após a biópsia hepática, em doente grave e portador de lupus, mesmo tendo sido prontamente atendido, apresentou outras complicações, vindo a falecer em curto período de tempo.

A elevada acuidade e eficácia da laparoscopia a tornam atrativa, no sentido de que sua utilização contribui para diminuir os gastos e custos hospitalares, não apenas na economia de exames radiológicos, mas encurtando o tempo de hospitalização do doente. O procedimento pode ser realizado com anestesia local e até mesmo em sala de endoscopia10,19.

A laparoscopia, nestes anos todos de evolução, sem dúvida trouxe subsídios importantes e fundamentais para o desenvolvimento da cirurgia por video-laparoscopia, cada vez mais difundida a partir de 1990. Por outro lado, aproveitando hoje a experiência e os equipamentos da cirurgia por video-laparoscopia, o emprego da video-laparoscopia diagnóstica tem contribuído ainda mais para ampliar os horizontes do método.

A video-laparoscopia diagnóstica permite uma visão ampliada da cavidade abdominal e, além disso, auxiliada por outros instrumentos e pinças introduzidas através de trocartes, permite a realização de biópsias, exérese de linfonodos, ressecções de pequenos fragmentos de tecidos para exames e cauterizações, aumentando a eficácia do exame e diminuindo a incidência de complicações9.

Assim, pode-se concluir, que a laparoscopia tem seu lugar bem definido no arsenal médico. É um método moderno, de baixo custo, seguro e eficaz, de fácil execução, contribuindo para o diagnóstico das doenças intra-abdominais e agilizando medidas terapêuticas.

SUMMARY

The laparoscopy in the diagnoses of intraabdominal diseases. Analysys of 168 cases.

The laparoscopy has been more and more frequently indicated in the last years, for the complementary diagnosis of intraabdominal diseases and abdominal repercussion of systemic diseases. Modern equipaments including videolaparoscopy and the use of either forceps or biopsy needle permit higher safety and significant diagnostic capacity.

PURPOSE. To perform laparoscopy for the diagnosis of intraabdominal and sistemic diseases.

METHODS. During the last 9 years 168 patients were submitted to laparoscopy and the main indications were: ascites - 43 cases (25,5%); liver diseases - 42 cases (25%); gastric cancer - 37 cases (22%); lymphoma - 17 cases (10,1%); abdominal tumour - 9 cases (5,4%); peritoneal tuberculosis - 8 cases (4,8%); liver tumour - 6 cases (3,6%); mesenteric cyst - 1 case (0,6%) and other diseases - 5 cases (3,0%). Ninety nine patients were male (58,9%) aging from 9 to 78 years old (median 47,6 years). Liver biopsies were performed in 92 cases (54,7%) and other tumour biopsies in 26 cases (15,4%).

RESULTS. The diagnosis of the diseases were established or confirmed by laparoscopy in 145 patients (86,3%). In 25 cases of gastric cancer (67,5%) laparoscopy contraindicated the laparotomy, owing to advanced disease. Two patients presented bleeding (1,2%) after liver biopsies and laparotomy was immediately indicated. One of them, whose diagnosis was systemic lupus, presented abdominal abscess, bronchopneumony and died (0,6%).

CONCLUSION. Laparoscopy has small number of complications, and when employed as a diagnostic complementary method therapeutic procedures, avoids laparotomies and accelerate therapeutic procedures. [Rev Ass Med Brasil 1999; 45(1): 34-8.]

KEY WORDS: Laparoscopy. Intraabdominal diseases. Staging.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2000
  • Data do Fascículo
    Mar 1999
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