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CORRESPONDÊNCIAS

Evolução da Ramb

Prof. Saul Goldenberg

Editor Responsável Acta Cirúrgica Brasileira

O editorial "Evolução e perspectiva da nossa revista", publicado em outubro/dezembro de 2002, mostrou os resultados alcançados em seu mandato. Como integrante do Conselho Editorial da RAMB na sessão de Clínica Cirúrgica, sou testemunha do seu trabalho nos dois últimos anos junto com um grupo de profissionais de elevado nível que vem desempenhando as árduas e importantes tarefas da divulgação da produção científica nacional. Posso entender perfeitamente o ato heróico que é ser editor de um periódico científico brasileiro, pois sou o editor da Revista Acta Cirúrgica Brasileira no seu 18° ano de existência. Observei a evolução da RAMB nos dois últimos anos e pude confirmar a visibilidade que um editor dedicado e competente imprimiu a uma revista brasileira. Em vários estudos realizados pelo nosso Núcleo de Comunicação Científica em Cirurgia (NCCC)¹ tem-se destacado as características dos editores de revistas científicas responsáveis pela difusão do conhecimento produzido por autores nacionais. Uma das bandeiras que deve ser empunhada por editores corajosos, reflete-se na luta para conscientizar a comunidade científica nacional que o "fator de impacto" é um dos indicadores que tem de ser alcançado e é determinado dividindo-se o número de vezes que artigos da revista são citados, pelo número de artigos publicados por ano. Torna-se imperioso valorizar as publicações nacionais de qualidade e enfrentar o mito do "que é produzido com qualidade é publicado em revistas do primeiro mundo". Com o objetivo de diagnosticar as estruturas disponíveis em revistas científicas brasileiras, o NCCC, vinculado à Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia-SOBRADPEC e publicado na Revista Acta Cirúrgica Brasileira [Qualis "A" da CAPES e Prioridade 1 do CNPq], está desenvolvendo projetos de pesquisa dentro da linha de Produção Científica. O atual projeto inclui 23 revistas brasileiras entre as quais encontra-se a RAMB². A avaliação de indicadores de qualidade mostram que a RAMB tem um editor capaz de atingir as metas propostas para se manter no SciELO e no Programa QUALIS de periódicos científicos da CAPES. Mas, permanece a preocupação: "os trabalhos científicos brasileiros são preferencialmente enviados para revistas internacionais ou de especialidades médicas e não para a RAMB". "Por que o recebimento de artigos ainda é menor do que o esperado?" Os programas de pós-graduação estrito senso [mestrado e doutorado] são clientes importantes. As teses defendidas e aprovadas constituem contribuição científica efetiva. Sabe-se que um grande número delas não estão publicadas. Vão para as prateleiras e lá morrem. Verdadeiros "cadáveres" em papel. CONHECIMENTO NÃO PUBLICADO É NENHUM CONHECIMENTO. Já existem programas que exigem para a marcação da defesa da tese que o artigo a ela referente tenha sido aceito para publicação em periódico de qualidade. Torna-se imperioso oferecer "revistas de excelente qualidade, com personalidade e muito bem divulgadas." Da nossa parte oferecemos a visibilidade e acessibilidade da produção científica na área da cirurgia experimental³ e os novos rumos adotados4.

Nosso parabéns ao editor e ao grupo editorial pelo excelente trabalho realizado e estamos certos da continuidade dessa linha de atuação.

Referências

1. Goldenberg S. Núcleo de comunicação científica em cirurgia [NCCC] da SOBRADPEC. Acta Cir Bras 2002;17(2):87-8. Disponível em: URL: http://www.scielo.br/acb.

2. Población DA, Goldenberg S, Montero EFS, Moreira MB, Pellison RF. Revistas brasileiras publicadoras de artigos científicos em cirurgia. I-Características estruturais e administrativas das revistas. Acta Cir Bras 2002; 17(6):359-69. Disponível em:URL: http://www.scielo.br/acb.

3. Población DA, Goldenberg S. Visibilidade e acessibilidade da produção científica na área da cirurgia experimental. Acta Cir Bras 2001; 16(3):115-21. Disponível em: URL:http://www.scielo.br/acb.

4. Figueiredo LFP. Acta Cirúrgica Brasileira. Novos rumos. Acta Cir Bras 2002;17(4):207. Disponível em: URL:http://www.scielo.br/acb.

Comentário do Editor

Caro Professor Goldenberg,

Obrigado pela sua correspondência. A sua colaboração, assim como de toda a equipe, tem permitido a evolução da nossa revista. Espero que o esforço das revistas nacionais, como o da Acta Cirúrgica Brasileira, sob sua direção, frutifique e diminua os problemas apresentados no editorial citado.

Saudações,

Maurício Wajngarten

Editor da RAMB

Suicídio endógeno em cirurgia plástica

Evaldo A D'Assumpção

Belo Horizonte - MG

Durante longos anos a cirurgia plástica foi uma especialidade vista com grande respeito e admiração pelos médicos e pela população. Não só no Brasil como em todo o mundo.

Nascida do desejo de reconstruir pessoas mutiladas, seja por trauma, seja por doenças adquiridas, seja por malformações congênitas, a cirurgia plástica evoluiu para aquilo que hoje se chama impropriamente de cirurgia estética: um ramo da especialidade que seria voltada apenas para o embelezamento das pessoas.

Já tendo discutido esse assunto inúmeras vezes, nele não vamos nos deter. Apenas ressaltamos que NÃO existe uma cirurgia estética. Todas as cirurgias apresentadas sob essa denominação têm, no seu âmago, um componente reconstrutor. Se não do corpo, pelo menos da alma. Quem procura ficar com aparência mais jovem, ou ter seu nariz melhor delineado, ou levantar suas mamas caídas, ou ainda retirar nódulo acúmulos gordurosos localizados e inestéticos, não procura somente a beleza física, mas, sobretudo, uma restauração de seu interior, mutilado pela alteração de seu esquema corporal. Que pode ter acontecido pela ação do tempo, tanto quanto pelas condições ambientais, alimentares ou químicas (remédios, tabaco, álcool ou drogas).

Por outro lado, também as cirurgias chamadas de reparadoras ou reconstrutoras, têm sempre o seu lado estético. Não tratamos um queimado, nem um grave traumatismo de face, nem uma criança com fissura labial só pela reparação funcional. O verdadeiro cirurgião plástico cuida de tudo isso, mas sem perder de vista o aspecto estético que procurará restaurar da melhor maneira que lhe for possível.

Assim, poder-se-ia dizer: "cirurgia plástica com objetivos especialmente estéticos" e "cirurgia plástica com objetivos especialmente reparadores" onde um nunca exclui o outro.

Apesar de tudo, nos últimos tempos a cirurgia plástica tem abandonado a intimidade dos consultórios para se expor, quase sempre de modo ridículo e antiético, nas diversas formas da mídia, quase sempre num trabalho voraz de marketing, numa frenética garimpagem de novos clientes.

Com isso, o público leigo – e até a classe médica fora da especialidade – passa a ter, da cirurgia plástica, uma visão dessacralizada. Como se esse trabalho fosse apenas uma sucursal de salões de beleza. E, o que é muito pior, como alguma coisa sem maiores riscos ou limitações.

Em conseqüência, multiplicam-se os insucessos, as complicações, os maus resultados e os processos jurídicos contra cirurgiões plásticos. Alguns deles, sem dúvida bastante justos.

Contudo, uma das complicações mais desastrosas – a morte do paciente – por vezes nada tem a ver com a imperícia, imprudência ou a negligência do cirurgião. Mas, independentemente disso, seus efeitos negativos explodem com muito mais intensidade do que quando ocorre em outras especialidades.

Investigando outras áreas da literatura, especialmente a psicologia e a tanatologia, encontramos alguns dados que precisam ser melhor conhecidos e, especialmente estudados em nossa especialidade. Trata-se daquilo que denominamos de "suicídio endógeno".

Shekelle e colaboradores, em trabalho publicado na revista "Psichosomatic Medicine", de abril de 1981, afirmam que depressão e sentimento de desesperança estão fortemente relacionados com o aparecimento de câncer, através de uma depressão do sistema imunitário do paciente, em nível de consciente profundo (o "inconsciente", de Freud). James Paget, que descreveu uma das formas mais comuns de câncer de mama, afirmava a mesma coisa, já em 1870.

Everson, na mesma publicação, porém em 1996, confirmou as pesquisas de Shekelle, afirmando que a desesperança é muito mais forte do que a depressão na ocorrência de suicídios.

Stephanie Simonton, colaboradora de Carl Simonton em seu livro "Com a vida de novo", afirma que : "Cada um de nós tem a sua participação na saúde e na doença, a todo o momento, através de nossas convicções, nossos sentimentos e nossas atitudes em relação à nossa vida".

Levando em conta a afirmação de Erich Fromm que dizia: "A mente é a benção e a maldição do ser humano", podemos imaginar o que pode acontecer quando uma pessoa, trazendo dentro de si e sem qualquer manifestação exterior, um elevado grau de desesperança diante dos problemas que enfrenta, se propõe a fazer uma cirurgia plástica. Geralmente um procedimento que, espera-se, seja o desejo de quem ama a vida e quer estar melhor consigo mesma para usufruí-la.

Contudo, desesperançada e, quem sabe deprimida, procura a cirurgia plástica para nela, durante ou após a cirurgia, bloquear internamente seus mecanismos de defesa e, com isso alcançar a morte de forma socialmente aceita e sem os traumas psicológicos e religiosos que poderia enfrentar ou deixar, numa tentativa de suicídio exógeno, clássico.

Por se tratar de mecanismos internos, não conscientes, esse comportamento pode passar despercebido à maioria dos cirurgiões plásticos, quase sempre mais preocupados com os aspectos estéticos, quem sabe com as condições físicas do paciente, e às vezes até mesmo com os bons resultados financeiros que poderão advir de seu trabalho.

Quantas mortes – e já acompanhamos algumas, ocorridas com pacientes de colegas – que ficaram sem uma explicação adequada, mas que trouxeram sofrimentos e grande aborrecimentos para a família e especialmente para a equipe cirúrgica.

A essas mortes damos o nome de "suicídio endógeno". Que poderiam ser evitadas se o cirurgião plástico, em sua consulta inicial, procurasse investigar o estado emocional do seu paciente, em busca de razões para uma depressão ou, o que é pior, um estado de total desesperança, mascarado pelo desejo tão justo de querer melhorar seu aspecto físico.

Todo cirurgião plástico deve procurar ter uma boa formação em psicologia. Fica o alerta.

Leituras sugeridas:

1. D'Assumpção EA. Os que partem, os que ficam. 7ª ed. Petrópolis: Vozes; 2001.

2. D'Assumpção EA. Arquivos de tanatologia e bioética. Belo Horizonte: Fumarc; 2002.

3. Lown B. A arte perdida de curar. 2ª ed. São Paulo: Ed. Fundação Peirópolis; 1997.

4. Siegel BS. Amor, medicina e milagres. 7ª ed. São Paulo: Best Seller; 1989.

5. Simonton OC. Com a vida de novo. 6ª ed. São Paulo: Summus Editorial; 1987.

O compromisso ético das escolas médicas com seus alunos

Prof. Dr. Antonio Carlos Lopes

Professor Titular da Disciplina de Clínica Médica da UNIFESP – EPM, Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, Fellow of the American College of Physicians

A criação indiscriminada de escolas médicas, com freqüência interessadas muito mais na obtenção de lucro do que no cumprimento de suas responsabilidades pedagógicas, produz um efeito colateral altamente preocupante: muitas dessas escolas mantêm um compromisso pouco ético com seus alunos, reduzindo uma convivência que deveria se fundamentar pelo desejo comum de uma formação adequada a uma simples relação comercial entre clientes (alunos) e fornecedores (a instituição).

Não se trata de uma regra geral, mas essa distorção ocorre com uma freqüência que pode comprometer o processo de formação de uma parte considerável de médicos egressos dessas escolas e, conseqüentemente, produzir um forte impacto negativo na prestação de um serviço fundamental para a sociedade.

Há notícias, por exemplo, de faculdades que menosprezam a importância da titulação universitária tanto para seu corpo diretivo quanto para os docentes, o que compromete a qualidade e atualização do conhecimento transmitido aos alunos. Também é comum nessas escolas que estudantes dedicados, que procuram obter numa escola médica a qualificação a que têm direito, sejam tratados como potenciais ameaças. Por conta dessa interpretação distorcida, os alunos mais interessados costumam ser desmotivados, discriminados e, até mesmo, perseguidos como se fossem inimigos declarados. Essas instituições não têm interesse de manter estudantes competentes, pois temem que eles desmascarem a sua própria incompetência. Em contrapartida, alunos passivos e especialmente familiares dos dirigentes são tratados de maneira diferenciada, desde o ingresso por meio de vestibulares duvidosos até a realização de provas com questões previamente conhecidas.

A ausência de um compromisso ético também leva à construção de uma barreira entre a direção da instituição e seus alunos. O diálogo, o espírito crítico e o questionamento, consagrados pressupostos que alimentam a transmissão do saber e fazem parte da boa universidade, simplesmente inexistem, numa atitude típica dos que praticam o abuso de poder. E os alunos indesejáveis acabam vítimas de punições motivadas por razões vagas, são "condenados" sem direito à defesa e têm seus nomes expostos publicamente, como se fossem perigosos criminosos. Ou seja, essas instituições, erroneamente denominadas escolas médicas, agem pautadas pelo autoritarismo, em sua versão mais abominável e perversa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Abr 2003
  • Data do Fascículo
    Jan 2003
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