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Proteína C ativada humana recombinante na sepse: quando indicar?

EMERGÊNCIA E MEDICINA INTENSIVA

Proteína C ativada humana recombinante na sepse: quando indicar?

Idal Beer

Após duas décadas de imensos recursos gastos em pesquisa com aproximadamente 20 candidatos à terapêutica da sepse, finalmente uma droga alcançou o sucesso. Baseado nos resultados do Estudo PROWESS¹, a drotrecogina alfa (ativada), ou proteína C ativada humana recombinante (Xigris®, Eli Lilly), reduziu significantemente a mortalidade em 28 dias nos pacientes com sepse grave tratados com a medicação durante 96 horas em relação ao grupo placebo (24,7% vs. 30,8%, p=0.005).

Análises subseqüentes da eficácia e custo-efetividade² nos diversos subgrupos determinaram que, desde novembro de 2001, o FDA (Food and Drug Administration) aprovasse a utilização da drotrecogina alfa ativada para o tratamento de pacientes com sepse grave com alto risco de morte, discriminado pelo 'score' APACHE II > 25 antes do início da infusão.

Como o estudo mostrou que o tratamento é associado com aumento do risco de sangramentos (p=0.06), a indicação deve ser precisa, minimizando o risco dos efeitos adversos, algumas vezes fatais.

A indicação da droga deve preencher diversos critérios e muitas são as contra-indicações, já que diversas situações, aparentemente de alto risco, não foram avaliadas e, portanto, excluídas dos estudos com a drotrecogina alfa ativada.

O paciente tem que ter infecção conhecida ou suspeita, evidenciada por um ou mais dos sinais a seguir: cultura positiva; presença de leucócitos em fluído corporal normalmente estéril; víscera perfurada; evidência clínica (escarro purulento) ou radiológica de pneumonia e síndromes com alta probabilidade de infecção (ex: colangite ascendente). Pelo menos três critérios a seguir devem estar presentes: temperatura central > 38oC ou <36oC; freqüência cardíaca > 90 bpm; freqüência respiratória > 20 ipm ou PaCO2 mmhg ou necessidade de ventilação mecânica e leucócitos totais > 12000 células/mm3 ou < 4000/mm3 ou mais que 10% de formas imaturas.

Quanto à disfunção de órgão ou sistema, o paciente deve ter pelo menos uma: a) cardiovascular – PA sistólica < 90 mmhg ou PA média < 70 mmhg por pelo menos 1 hora, mesmo após ressuscitação volêmica ou necessidade de droga vasopressora para manter PA acima dos valores citados; b) respiratório – PaO2/FiO2 < 200 ou PaO2/FiO2 < 250 na presença de outra disfunção orgânica; c) renal – diurese < 0,5ml/kg/h por pelo menos uma hora, após ressuscitação volêmica; d) hematológico – plaquetas < 80000/mm3 ou com queda de 50% ou mais nos últimos três dias; e) Acidose metabólica: pH < 7,30 ou excesso de base (BE) < -5 mEq/L com lactato plasmático > 1,5 vezes o limite normal do laboratório local.

De acordo com o estudo, a primeira disfunção orgânica não pode existir há mais de 24 horas no momento da indicação e o início da infusão não pode ultrapassar 24 horas após preencher os critérios de inclusão, portanto o tratamento inicia-se com menos de 48 horas de estabelecimento da disfunção de órgão ou sistema.

O tratamento inicia-se apenas quando o paciente estiver internado na UTI, desde que não exista nenhuma contra-indicação ou situação que não foi avaliada nos estudos como listadas a seguir: idade < 18 anos; peso > 135kg; gestantes e em amamentação; sangramento interno ativo; trombocitopenia grave (< 30000 plaquetas/mm3); traumatismo craniano com necessidade de internação, neurocirurgia intracraniana ou medular recente (< 2 meses); AVC recente (< 3 meses); presença de cateter peridural; trauma com risco de sangramento grave; neoplasia intracraniana; malformação vascular ou aneurisma intracraniano; expectativa de vida < 28 dias (doença terminal ou neoplasia refratária a tratamento) ou decisão do paciente ou familiar de não instituir tratamentos invasivos; hipersensibilidade conhecida à droga ou componentes; hemorragia digestiva há menos de 6 semanas, exceto quando houve cirurgia corretiva; paciente submetido a trombólise há menos de três dias, exceto para desobstrução de cateteres; diátese hemorrágica ou doença de hipercoagulabilidade (deficiência de proteína C ou S, síndrome antifosfolípide) conhecida; pancreatite aguda sem suspeita de infecção associada; pós-transplante de medula óssea, pulmão, fígado, pâncreas ou intestino delgado; insuficiência renal crônica dialítica; HIV positivo com CD4 < 50 células/mm3; pacientes operados sob anestesia geral ou bloqueio raquimedular há menos de 12 horas, paciente com sangramento pós-operatório; doença hepática grave (hipertensão portal, cirrose, icterícia crônica); administração de AT III (> 10000U) há menos de 12 horas; AAS (> 650mg/dia) há menos de três dias, heparina não-fracionada para evento trombótico ativo há menos de 8 horas, heparina de baixo peso molecular em dose maior que a profilática recomendada há menos de 12 horas, warfarin e inibidor IIb/IIIa há menos de sete dias da infusão da droga; forte suspeita ou quadro documentado de trombose venosa profunda ou TEP há menos de três meses.

Estudos para avaliar a segurança e eficácia do tratamento com drotrecogina alfa ativada em pacientes com sepse e doença menos grave (APACHE II < 25) estão em andamento.

Referências

1. Bernard GR, Vincent JL, Laterre PF. Efficacy and safety of recombinant human activated protein c for severe sepsis. N Engl J Med 2001; 344:699-709.

2. Manns BJ, Lee H, Doig CJ. An economic evaluation of activated protein C treatment for severe sepsis. N Engl J Med 2002; 347:993-1000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Nov 2003
  • Data do Fascículo
    Set 2003
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