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Pleurodese no derrame neoplásico: toracoscopia ou toracostomia à beira do leito?

À BEIRA DO LEITO

MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS

Pleurodese no derrame neoplásico: toracoscopia ou toracostomia à beira do leito?

Wanderley Marques Bernardo; Fábio Biscegli Jatene; Moacir R. Cucce Nobre

O derrame pleural neoplásico é uma complicação comum em neoplasias avançadas, sendo, na maioria das vezes, conseqüente a metástases de câncer de pulmão ou mama. O prognóstico desses pacientes é geralmente reservado, a maioria dos derrames não responde a terapêutica sistêmica e a qualidade de vida está afetada pelos sintomas de tosse e dispnéia. A drenagem do derrame produz alívio dos sintomas, mas a rápida recorrência requer punções pleurais de repetição, aumentando o risco de complicações1. A pleurodese é uma forma de tratamento, que procura produzir fibrose pleural por meios químicos (agente esclerosante) ou mecânicos (abrasão ou pleurectomia), obliterando o espaço pleural, e prevenindo as recorrências e os sintomas adversos. Este procedimento é usualmente paliativo e seu uso tem sido influenciado pelos sintomas do paciente, condições clínicas associadas, extensão da doença, performance status e prognóstico2. Existe uma variação importante em como a pleurodese é realizada em todo o mundo, havendo preferência pelo uso do talco, apesar de referências a efeitos adversos, como febre, dor e náusea, incluindo a falência respiratória. Nos últimos anos, diferentes métodos cirúrgicos têm sido utilizados, sendo mais comumente empregada a instilação do agente esclerosante, após drenagem do derrame, por toracoscopia realizada em centro cirúrgico, ou toracostomia com o emprego de dreno à beira do leito. A pleurodese à beira do leito pode ser feita por apenas um médico, sem necessidade de sedação, sendo então mais rápida, simples e de menor custo, podendo ainda ser aplicada a pacientes com um performance status pobre. No entanto, comparada à pleurodese realizada por toracoscopia, esta pode ser menos eficaz para o adequado esvaziamento do derrame pleural e para uma adequada distribuição do agente esclerosante. Essa variação de agente ou técnica de pleurodese empregados é conseqüente à disponibilidade de um número limitado de ensaios clínicos consistentes, com adequado número de pacientes estudados, determinando, então, que uma série de diretrizes internacionais fossem baseadas principalmente em consenso de especialistas3. No entanto, esses mesmos estudos clínicos (n=36) selecionados em uma revisão sistemática e incluídos em uma meta-análise, totalizando um número de 1499 pacientes4, têm força, então, de responder a algumas questões como: É necessário o uso de agente esclerosante para a obtenção de uma pleurodese eficaz? Qual o melhor agente ? A pleurodese por toracoscopia é melhor que a realizada por toracostomia com drenagem à beira do leito ? A medida mais comumente utilizada nos ensaios clínicos para avaliar eficácia da pleurodese foi a presença ou ausência de derrame pleural, na radiografia de tórax, entre um e três meses, ou a necessidade de se repetir a toracocentese4. Em relação a desfechos como efeitos adversos, mortalidade e custos, os dados reportados são limitados, dificultando a comparação entre procedimentos e agentes. Então: 1. É necessário o uso de agente esclerosante para a obtenção de uma pleurodese eficaz? O uso de agentes esclerosantes resulta em maior sucesso da pleurodese quando comparado à drenagem pleural com instilação de placebo apenas4. Para que um paciente seja beneficiado com o uso de esclerosante em relação ao placebo, é necessário serem tratados oito pacientes (NNT:8; IC 95%: 4.26 a 49.83)4; 2. Qual o melhor agente esclerosante? Os principais agentes utilizados na prática clínica são o talco, a tetraciclina e a bleomicina. A tetraciclina e a bleomicina têm eficácia equivalente, no entanto, são inferiores ao talco, com redução de risco relativo de 21%, favorecendo significativamente o talco4. A freqüência de eventos adversos foi semelhante entre os três agentes e, apesar de relatos na literatura de ocorrência da Síndrome de Angústia Respiratória do Adulto em pleurodese com talco 2, esta complicação não foi relatada em nenhum dos ensaios clínicos com talco, incluídos4. Finalmente, a principal questão a ser respondida é: 3. Qual o método de procedimento cirúrgico mais eficaz? A comparação entre os dois procedimentos (toracoscopia versus toracostomia) quando o agente instilado é o talco define uma redução de risco relativo significativa de 16%, favorável à toracoscopia4. Não há evidências de maior mortalidade nos pacientes tratados por toracoscopia4. No entanto, algumas questões necessitam ainda ser respondidas, como: Após a pleurodese ter sido realizada, a drenagem torácica de longa duração é melhor que a de curta duração? Os drenos de maior diâmetro proporcionam melhores resultados? Qual o melhor momento para a realização da pleurodese, na recidiva do derrame após a toracocentese ou em sua primeira manifestação?

Referências

1. Diacon AH, Wyser C, Bolliger CT, Tamm M, Pless M, Perruchoud AP, et al. Prospective randomized comparison of thoracoscopic talc poudrage under local anesthesia versus bleomycin instillation for pleurodesis in malignant pleural effusions. Am J Respir Crit Care Med 2000; 162:1445-9.

2. Bernard A, de Dompsure RB, Hagry O, Favre JP. Early and late mortality after pleurodesis for malignant pleural effusion. Ann Thorac Surg 2002; 74:213-7.

3. Lee YC, Baumann MH, Maskell NA, Waterer GW, Eaton TE, Davies RJ, et al. Pleurodesis practice for malignant pleural effusions in five English-speaking countries: survey of pulmonologists. Chest 2003; 124: 2229-38.

4. Shaw P, Agarwal R. Pleurodesis for malignant pleural effusions. Cochrane Database Syst Rev 2004; (1):CD002916.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2005
  • Data do Fascículo
    Fev 2005
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