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O gene do angiotensinogênio (M235T) e o infarto agudo do miocárdio

The angiotensinogen gene (M235T) and the acute myocardial infarction

Resumos

OBJETIVO: Estudar o efeito do polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio na doença arterial coronariana e na sua gravidade em pacientes com e sem infarto agudo do miocárdio. MÉTODOS: Estudo transversal com 305 indivíduos de raça branca que foram alocados em 2 grupos. O primeiro com 201 pacientes com doença arterial coronariana comprovada pela angiografia (lesão obstrutiva > 50%), sendo 110 com infarto agudo do miocárdio e 91 sem infarto. O segundo, 104 indivíduos controles com artérias coronárias normais. O polimorfismo M235T do angiotensinogênio foi analisado através da genotipagem pela reação em cadeia da polimerase seguida da digestão pela enzima de restrição. RESULTADOS: A freqüência dos genótipos TT, MT e MM do angiotensinogênio não foi estatisticamente diferente entre os pacientes com doença arterial coronariana e os controles (chi2 = 0,123; p = 0,939) bem como nos grupos de infartados e não infartados (chi2 = 2,171; p = 0,338). O risco relativo de desenvolver doença arterial coronariana e de apresentar infarto analisado entre os genótipos TT vs MM, MT vs MM e TT+MT vs MM não foi significante. A análise da gravidade da doença aterosclerótica no grupo de pacientes com doença arterial coronariana mostrou não haver correlação com os genótipos; resultado semelhante foi encontrado na comparação entre os grupos com e sem infarto. CONCLUSÕES: Não há associação entre o polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio com a doença arterial coronariana, com a sua gravidade e nem com o infarto agudo do miocárdio.

Doença arterial coronariana; Infarto agudo do miocárdio; Sistema renina-angiotensina; Polimorfismo M235T do angiotensinogênio


OBJECTIVE: To study the effect of the angiotensinogen gene M235T polymorphism on coronary artery disease and its severity in patients with and without acute myocardial infarction. METHODS: A cross sectional study was carried out with 305 Caucasians who were divided into two groups. One group with 201 patients with coronary artery disease proven by coronary angiography (obstructive lesion > 50%) was further divided into two subgroups; 110 patients with acute myocardial infarction and 91 without it. The control group consisted of 104 individuals with normal coronary arteries. Three angiographic criteria were evaluated to determine severity of the coronary artery disease: number of diseased vessels, morphology of the atherosclerosis plaque and jeopardy score. Risk factors were also analyzed. Gene polymorphism was evaluated by the polymerase chain reaction followed by restriction endonuclease digestion. RESULTS: The angiotensinogen gene TT, MT and MM genotypic frequencies were neither statistically different between coronary artery disease patients and controls (?2 = 0.123; p = 0.939) nor between the acute myocardial infarction subgroup (?2 = 2.171; p = 0.338). The coronary artery disease and acute myocardial infarction risk analyzed between TT vs. MM, MT vs. MM and TT+MT vs. MM genotypes were not significant. The severity of atherosclerotic disease analysis within the group of patients with coronary artery disease showed no correlation with the genotypes. Similar results were found between groups with and without acute myocardial infarction. CONCLUSIONS: No association was found between the angiotensinogen gene M235T polymorphism and coronary artery disease, neither with its severity nor with acute myocardial infarction.

Coronary artery disease; Acute myocardial infarction; Renin-angiotensin system; Angiotensinogen M235T gene polymorphism


ARTIGO ORIGINAL

O gene do angiotensinogênio (M235T) e o infarto agudo do miocárdio

The angiotensinogen gene (M235T) and the acute myocardial infarction

Messias Antônio Araújo* * Correspondência: Avenida Nicomedes Alves dos Santos, 280, Uberlândia, MG, Cep 38400-080, Tel-Fax: (0xx34) 3219-3311 - messiasaa@bol.com.br ; Bruno Soares Menezes; Clauber Lourenço; Elisângela Rosa Cordeiro; Renata Ríspoli Gatti; Luiz Ricardo Goulart

RESUMO

OBJETIVO: Estudar o efeito do polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio na doença arterial coronariana e na sua gravidade em pacientes com e sem infarto agudo do miocárdio.

MÉTODOS: Estudo transversal com 305 indivíduos de raça branca que foram alocados em 2 grupos. O primeiro com 201 pacientes com doença arterial coronariana comprovada pela angiografia (lesão obstrutiva > 50%), sendo 110 com infarto agudo do miocárdio e 91 sem infarto. O segundo, 104 indivíduos controles com artérias coronárias normais. O polimorfismo M235T do angiotensinogênio foi analisado através da genotipagem pela reação em cadeia da polimerase seguida da digestão pela enzima de restrição.

RESULTADOS: A freqüência dos genótipos TT, MT e MM do angiotensinogênio não foi estatisticamente diferente entre os pacientes com doença arterial coronariana e os controles (c2 = 0,123; p = 0,939) bem como nos grupos de infartados e não infartados (c2 = 2,171; p = 0,338). O risco relativo de desenvolver doença arterial coronariana e de apresentar infarto analisado entre os genótipos TT vs MM, MT vs MM e TT+MT vs MM não foi significante. A análise da gravidade da doença aterosclerótica no grupo de pacientes com doença arterial coronariana mostrou não haver correlação com os genótipos; resultado semelhante foi encontrado na comparação entre os grupos com e sem infarto.

CONCLUSÕES: Não há associação entre o polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio com a doença arterial coronariana, com a sua gravidade e nem com o infarto agudo do miocárdio.

Unitermos: Doença arterial coronariana. Infarto agudo do miocárdio. Sistema renina-angiotensina. Polimorfismo M235T do angiotensinogênio.

SUMMARY

OBJECTIVE: To study the effect of the angiotensinogen gene M235T polymorphism on coronary artery disease and its severity in patients with and without acute myocardial infarction.

METHODS: A cross sectional study was carried out with 305 Caucasians who were divided into two groups. One group with 201 patients with coronary artery disease proven by coronary angiography (obstructive lesion > 50%) was further divided into two subgroups; 110 patients with acute myocardial infarction and 91 without it. The control group consisted of 104 individuals with normal coronary arteries. Three angiographic criteria were evaluated to determine severity of the coronary artery disease: number of diseased vessels, morphology of the atherosclerosis plaque and jeopardy score. Risk factors were also analyzed. Gene polymorphism was evaluated by the polymerase chain reaction followed by restriction endonuclease digestion.

RESULTS: The angiotensinogen gene TT, MT and MM genotypic frequencies were neither statistically different between coronary artery disease patients and controls (?2 = 0.123; p = 0.939) nor between the acute myocardial infarction subgroup (?2 = 2.171; p = 0.338). The coronary artery disease and acute myocardial infarction risk analyzed between TT vs. MM, MT vs. MM and TT+MT vs. MM genotypes were not significant. The severity of atherosclerotic disease analysis within the group of patients with coronary artery disease showed no correlation with the genotypes. Similar results were found between groups with and without acute myocardial infarction.

CONCLUSIONS: No association was found between the angiotensinogen gene M235T polymorphism and coronary artery disease, neither with its severity nor with acute myocardial infarction.

Key words: Coronary artery disease. Acute myocardial infarction. Renin-angiotensin system. Angiotensinogen M235T gene polymorphism.

INTRODUÇÃO

O sistema renina-angiotensina tem fundamental importância na homeostasia cardiovascular. O angiotensinogênio é o peptídeo chave neste sistema que, sob a ação da renina, forma o decapeptídio angiotensina I. Ela é um pró-hormônio inativo que sob a ação da enzima conversora de angiotensina I será transformada, por meio da retirada de dois aminoácidos de sua extremidade C-terminal, no octapeptídio angiotensina II, que é um potente e multifuncional hormônio primariamente envolvido na manutenção do tônus vascular e na reabsorção do sódio pelos rins1. Entre as suas ações estão, também, a contração e proliferação de células do músculo liso vascular por fosforilação de tirosina quinase e conseqüente ativação de proteínas envolvidas na transcrição do DNA, com importante efeito mitógeno2. Portanto, o angiotensinogênio é um dos componentes que pode estar atuando na patogênese da doença arterial coronariana e suas diversas síndromes3.

O gene do angiotensinogênio localiza-se no cromossomo 1q 42-43. Uma mutação denominada de variante M235T está localizada no exon dois do gene, correspondendo a uma transição de aminoácidos de metionina para treonina na posição 235 da proteína madura e é denominada de T235. Foi demonstrada uma importante associação entre a T235 e a variante molecular no promotor proximal do gene do angiotensinogênio, uma adenina no lugar da guanina seis nucleotídeos acima do local de iniciação da transcrição, A (-6). A substituição A/G no nucleotídeo seis afeta especificamente interações entre pelo menos um fator nuclear de transcrição e do promotor do angiotensinogênio, influenciando assim a velocidade basal de transcrição do gene4. Este achado muito provavelmente explica porque os homozigotos T235 possuem níveis plasmáticos de angiotensinogênio 10% a 20% maior que os homozigotos M235. A variante T235/T235 ocorre em freqüência elevada na população japonesa5 e na população ocidental está presente em aproximadamente 19%. Indivíduos portadores do genótipo homozigoto M235/M235 apresentam médias menores de nível de angiotensinogênio plasmático; os heterozigotos M235/T235 têm níveis intermediários e os homozigotos T235/T235 possuem as médias maiores6.

A relação observada entre o polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio (TT, MT e TT), os seus produtos protéicos e os fenótipos da doença arterial coronariana sugerem a evidência de um possível papel dos níveis elevados do angiotensinogênio circulante na sua patogênese. Este estudo tem como objetivo analisar o papel da variante M235T na doença arterial coronariana, na gravidade da lesão aterosclerótica coronária e a sua participação no desenvolvimento do infarto agudo do miocárdio.

MÉTODOS

Estudo prospectivo de delineamento transversal com processo de amostragem consecutiva realizada nos serviços de hemodinâmica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia e do Instituto do Coração do Triângulo Mineiro e análises moleculares no Instituto de Genética e Bioquímica com 305 indivíduos de raça branca.

Os critérios de inclusão foram determinados para 201 pacientes elegíveis com o diagnóstico de doença arterial coronariana comprovado pela angiografia coronária (lesão obstrutiva > 50%), sendo 110 pacientes portadores de doença arterial coronariana com IAM e diagnóstico baseado em dados clínicos, eletrocardiográficos e enzimáticos segundo os critérios da Organização Mundial de Saúde7 e 91 pacientes com doença arterial coronariana sem IAM. Os 104 controles foram indivíduos com diagnósticos de doença cardíaca valvular, dor torácica atípica e doadores para transplante renal, com angiografia coronária normal. Os pacientes infartados foram submetidos à cinecoronariografia em até duas semanas após o IAM; os não infartados e o grupo controle, logo após a realização do diagnóstico clínico. A cineangiocardiografia avaliou a gravidade da doença arterial coronariana com os seguintes critérios: número de vasos acometidos (uniarterial ou multiarterial)8; característica morfológica da placa aterosclerótica (A, B1, B2, C), conforme descrito por Ellis et al.9; escore de risco coronariano, que é um método simples para estimar a quantidade de músculo cardíaco em risco baseado na localização proximal, média, distal e grau de estenose da lesão obstrutiva, sendo que os escores mais elevados estão associados com uma baixa fração de ejeção do ventrículo esquerdo propiciando uma maior informação prognóstica segundo Califf et al.10 .

Foram realizadas em todos os indivíduos histórias clínicas, avaliação dos fatores de risco coronariano convencionais como antecedente familiar de coronariopatia (primeiro grau), níveis de colesterol total, LDL, HDL e triglicérides, antecedentes de tabagismo, hipertensão arterial sistêmica, diabetes melito, sedentarismo, obesidade (índice de massa corpórea – IMC > 25 Kg/m2).

Foram excluídos os pacientes com doença maligna sistêmica, enfermidade crônica terminal, antecedentes de infarto do miocárdio, angioplastia coronariana e cirurgia de revascularização do miocárdio.

Todos os procedimentos, riscos e benefícios potenciais foram informados aos pacientes por meio de formulário próprio para seu consentimento formal. O protocolo foi submetido à apreciação e liberação pelo conselho de ética da Universidade Federal de Uberlândia.

Análise do polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio

A análise do polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio foi realizada pela técnica da reação em cadeia da polimerase (polymerase chain reaction - PCR). As extrações de DNA foram feitas segundo Sambrook et al11. O fragmento do gene do angiotensinogênio, com 332 pb, contido no exon dois, códon 235, foi amplificado por meio da PCR, utilizando os seguintes primers12:

+1-5'-GGA AGG ACA AGA ACTGCA CCT C-3'

2-5'-CAG GGT GCT GTC CAC ACT GGA CCC C-3'

Dez microlitros do produto de PCR foram digeridos com a enzima Tth 111-1 (Amersham Pharmacia) segundo especificações do fabricante. As reações foram incubadas por 3 h a 65 ºC que reconhece o seguinte sítio de restrição:

5'-GACN NNGTC-3'

3'-CTGNN NCAG-5'

O produto da restrição foi visualizado em gel de agarose 3% e corado com brometo de etídeo, após eletroforese a 140 volts por 1 hora.

Análise estatística

O programa Statistica 5.5 Statsoft, Inc.13 foi utilizado para fazer as análises. Para indicar o nível de significância estatística foi considerado o erro a menor que 5% (p< 0,05). O teste de c2 de Pearson foi utilizado para analisar as diferenças das freqüências dos genótipos entre casos e controles e entre fatores de risco coronarianos convencionais com os genótipos. As variáveis foram transformadas em numéricas, atribuindo-se o valor zero para ausência e um para a presença. As variáveis contínuas foram expressas como média - desvio-padrão e as diferenças entre os grupos foram comparadas usando o teste t de Student.

O risco relativo foi avaliado pelo cálculo da razão de chances (Odds Ratio – OR) e seus intervalos de confiança (IC). As diferenças entre as freqüências de pacientes, quanto aos fatores de risco convencionais, em relação às classes genotípicas foram avaliadas via modelos lineares generalizados tendo a distribuição da variável resposta binomial, adotando como função de ligação a função logística.

RESULTADOS

Genotipagem

Os resultados obtidos pela restrição enzimática demonstram que a variante M235T apresenta ou não sítio de restrição para a enzima Tth111-1; na presença de C (citosina) na posição 704, códon 235, o produto amplificado é clivado, resultando em três fragmentos de 332 pb, 308 pb e 24 pb, correspondendo ao genótipo MT e na presença de T (timina) na mesma posição o fragmento não sofre clivagem, resultando em um fragmento de 332 pb correspondendo ao genótipo MM. Indivíduos homozigotos para o alelo T235 apresentam dois fragmentos de 308 pb e 24 bp correspondendo ao genótipo TT.

Análise dos pacientes com doença arterial coronariana e dos controles

As características principais da população de pacientes com doença arterial coronariana e dos indivíduos controles estão descritas na Tabela 1. Nos 201 pacientes com doença arterial coronariana houve predominância de homens (55,72% masculino e 44,28% feminino) e nos 104 indivíduos controles a prevalência foi das mulheres (42,3% masculino e 57,7% feminino). A média de idade dos pacientes com doença arterial coronariana foi de 61,58 ±10,85 anos sendo esta estatisticamente diferente dos controles; 56,69 ±11,52 anos (p < 0,05). O hábito do tabagismo, a hipertensão arterial sistêmica, o diabetes melito, os níveis elevados de colesterol total e LDL foram os fatores de risco coronarianos convencionais significativamente mais freqüentes nos pacientes com doença arterial coronariana. A história familiar de coronariopatia, a obesidade (IMC > 25 Kg/m2), o sedentarismo e os níveis altos de triglicérides não mostraram diferença significativa.

Estratificação dos genótipos do angiotensinogênio entre pacientes com doença arterial coronariana e controles

Os pacientes com doença arterial coronariana foram estratificados pelos genótipos do angiotensinogênio, realizado-se cruzamentos com os fatores de risco cardiovascular convencional, em que foi observado que nenhum deles apresentou diferença estatística significativa (Tabela 2). O mesmo fato foi constatado nestes cruzamentos nos indivíduos controles (Tabela 3).

A freqüência dos genótipos do angiotensinogênio foi testada e estava em equilíbrio de Hardy-Weinberg (c2 = 3,9708; p = 0,1373). A distribuição dos genótipos do angiotensinogênio nos pacientes com doença arterial coronariana foi de 41,2% no MM, 50,2% no MT e 8,5% no TT; nos controles foi de 41,3%, 49,0% e 9,6%, respectivamente (c2 = 0,123; p = 0,939) (Tabela 4). As estimativas de risco (OR) de desenvolver doença arterial coronariana associadas aos genótipos do angiotensinogênio com os respectivos intervalos de confiança foram de 0,88 (0,37 – 2,09) para os genótipos TT em relação aos MM; de 1,03 (0,62 – 1,69) dos MT em relação aos MM e de 1,00 (0,62 – 1,62) dos TT+MM em relação aos MM (Figura 1).


Análises dos pacientes infartados e não infartados

Dos 201 pacientes portadores de doença arterial coronariana, 91 não apresentavam infarto e 110 tinham infarto. No grupo com infarto houve predominância do sexo masculino sobre o feminino (63,6% vs 36,4%) e do sexo feminino no grupo de sem infarto (46,2% vs 53,8%). O hábito do tabagismo, o sedentarismo, a hipertensão arterial sistêmica, a história familiar de coronariopatia, o diabetes melito, a obesidade, os baixos níveis de colesterol HDL, os níveis elevados de colesterol total, LDL e triglicérides não mostraram diferença estatística significativa entre os dois grupos.

A distribuição dos genótipos do angiotensinogênio no grupo de DAC sem infarto foi de 37 pacientes MM (40,7%), 49 MT (53,8%) e 5 TT (5,5%). No grupo com infarto foi de 46 (41,8%), 52 (47,3%) e 12 (10,9%), respectivamente. As diferenças entre as freqüências genotípicas nestes dois grupos não foram significativas (c2 = 2,17; p=0,338). Não houve diferença estatística de sexo e nem de idade entre os três genótipos (p < 0,05). A análise entre os grupos de sem infarto e com infarto mostrou que o risco (OR) de apresentar infarto para os indivíduos portadores dos genótipos TT em relação ao MM foi baixo (OR = 1,93; IC-95% = 0,62 – 5,97), do MT em relação ao MM foi baixo (OR = 0,91; IC-95% = 0,50 – 1,63) e do alelo T (TT+MM) em relação ao MM foi baixo também (OR 0,95; IC-95% = 0,54 – 1,68).

Análise da gravidade da doença arterial coronária em relação aos genótipos

A gravidade da doença arterial coronariana em relação aos genótipos do angiotensinogênio, avaliada com os critérios de número de vasos acometidos (uniarterial ou multiarterial), característica morfológica da placa aterosclerótica (A, B1, B2, C) e o escore de risco coronário apresentados na Tabela 5, demonstrou não haver diferença estatística entre os genótipos. Esta mesma análise realizada entre os grupos com infarto e sem infarto também não mostrou diferença estatística.

DISCUSSÃO

Os principais fatores de risco coronário comprovados pela literatura14-24 foram avaliados nos casos e nos controles. Este estudo, a exemplo de diversas publicações15-17, mostra que o tabagismo, a hipertensão arterial sistêmica, os níveis altos de colesterol total e do colesterol LDL e o diabetes melito são importantes fatores de risco. Pacientes com antecedentes familiares de coronariopatia, obesos, níveis elevados de triglicérides e sedentários neste estudo não tiveram importância no risco cardíaco. Está demonstrado que os fatores de risco coronarianos clássicos podem explicar apenas cerca de 50% da etiopatogenia da aterosclerose coronária. Os fatores genéticos podem vir a ser um poderoso fator de risco coronariano e explicar os outros 50%25,26.

Observou-se neste estudo que, quando os pacientes com doença arterial coronariana foram estratificados pelos genótipos TT, MT e MM do angiotensinogênio em relação aos fatores de risco coronarianos clássicos, nenhum deles teve significância estatística. O mesmo fato foi constatado nos controles.

Verificou-se que a distribuição dos genótipos do angiotensinogênio não teve diferença significativa entre os grupos de pacientes com doença arterial coronariana e os controles; o risco relativo de desenvolver a doença analisado pelas comparações dos genótipos TT em relação aos MM, dos genótipos MT em relação aos MM e do alelo T (TT+MT) em relação aos MM não foi diferente entre eles, uma vez que os intervalos de confiança (95%) dos pacientes com doença em relação aos controles incluem o valor um, podendo-se afirmar que estes riscos não foram estatisticamente diferentes de um.

Existe uma controvérsia da associação do polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio com a doença isquêmica do coração27. Jeunemaitre et al.28 publicaram que o genótipo TT duplica o risco de infarto do miocárdio. Outros autores demonstraram ser negativa esta associação29. Katsuya et al.30 descreveram também uma forte evidência da associação do gene da variante M235T do angiotensinogênio com o risco de doença arterial coronariana e, especificamente, de infarto agudo do miocárdio. Quando foi realizada a análise do grupo de pacientes infartados em relação aos não infartados, os resultados corroboraram o que foi observado na análise anterior: a constatação de que os riscos de apresentar infarto do miocárdio para os indivíduos portadores dos genótipos TT em relação aos MM, dos genótipos MT em relação aos MM e do alelo T (TT+MT) em relação aos MM não foram estatisticamente diferentes de um.

Os resultados desta pesquisa indicam não haver associação significante entre a gravidade da doença arterial coronariana e os genótipos do angiotensinogênio, em concordância com as conclusões do estudo Corgene28.

Estudo recente, publicado por Sethi et al.31, com mais de 2800 pacientes demonstrou não haver associação dos genótipos da variante M235T do gene do angiotensinogênio com a doença arterial coronariana e o infarto do miocárdio. Resultados similares foram encontrados no presente estudo, cujos dados obtidos demonstram que este polimorfismo gênico não é um fator preditivo independente para o desenvolvimento da doença arterial coronariana e infarto agudo do miocárdio. Outros autores demonstraram ser negativa esta associação29. Os resultados indicam a possibilidade de haver outros componentes, além deste polimorfismo e dos fatores de risco coronariano clássicos, participando da gênese da doença arterial coronariana e do infarto agudo do miocárdio. Assim pode, também, estar ocorrendo uma interação entre vários fatores de risco ambientais e genéticos, dificultando a análise e a compreensão dos resultados.

As abordagens genéticas para doenças multigênicas e multifatoriais complexas têm limitações como tamanho da amostra, etnia, viés de publicação de resultados positivos, grupo controle, definição acurada dos fenótipos e ausência de estudos sobre interação gênica e interação ambiental.

CONCLUSÃO

O presente estudo demonstrou que, na população estudada e nas condições clínicas estabelecidas, não há associação entre o polimorfismo M235T do gene do angiotensinogênio e a doença arterial coronariana, com sua gravidade e tampouco com a presença ou não do infarto agudo do miocárdio.

Conflito de interesse: não há.

Artigo recebido: 12/03/04

Aceito para publicação: 05/07/04

Trabalho realizado no Instituto do Coração do Triângulo e Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, Minas Gerais.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jul 2005
    • Data do Fascículo
      Jun 2005

    Histórico

    • Aceito
      05 Jul 2004
    • Recebido
      12 Mar 2004
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