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Fatores preditores de recidiva hemorrágica em cirróticos submetidos à cirurgia de Warren

Predictive factors of rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery

Resumos

OBJETIVO: Estabelecer os fatores preditores determinados no pré-operatório envolvidos na recidiva hemorrágica dos cirróticos submetidos à cirurgia de Warren. MÉTODOS: Cinqüenta e sete cirróticos com boa reserva funcional hepática e antecedente de hemorragia digestiva alta que não responderam ao tratamento clínico-endoscópico, foram submetidos à cirurgia de Teixeira-Warren (derivação espleno-renal distal). Eles foram divididos em dois grupos: 1 = 31 (apresentaram recidiva hemorrágica no pós-operatório) e 2 = 26 (não apresentaram novo sangramento). O grupo 1 foi novamente dividido em dois grupos, segundo a época de recidiva: grupo 1.A = 12 com recidiva hemorrágica até a alta hospitalar e 1.B = 19 com recidiva hemorrágica após a alta. Onze doentes faleceram no período perioperatório e os 46 restantes foram seguidos ambulatorialmente por um período de 3,2 anos em média, sendo analisados os aspectos clínicos, laboratoriais como a dosagem de albumina e bilirrubinas séricas, ultra-sonográficos como o fluxo e calibre portais, e endoscópicos no pré e pós-operatório, bem como dados do intra-operatório como o volume de cristalóides infundido durante a cirurgia. RESULTADOS: As dosagens de albumina sérica e bilirrubinas totais foram em média de 3,33 mg% e 1,7 mg% no grupo 1, e 3,56 mg% e 1,16 mg% no grupo 2. O fluxo e o calibre portais foram em média 0,24 cm/s e 1,34 cm no grupo 1, e 0,18 cm/s e 1,21 cm no grupo 2, respectivamente. No grupo 1.A, o volume de cristalóide infundido durante a cirurgia foi em média de 3,692 ml contra 2,166 ml no grupo 1.B. CONCLUSÃO: A dosagem pré-operatória de albumina, bilirrubinas totais, valor do fluxo e calibre portais foram fatores preditores para recidiva hemorrágica em pacientes cirróticos submetidos à cirurgia de Warren. O volume de cristalóide infundido no intra-operatório foi fator preditor para ressangramento precoce.

Cirrose; Hemorragia digestiva alta; Warren; Recidiva hemorrágica; Fatores preditores


BACKGROUND: Establish the predictive factors of rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery. METHODS: 57 cirrhotic patients with good hepatic functional reserve and previous variceal bleeding that had not responded to clinical, endoscopic treatment were submitted to the Warren's surgery (distal splenorenal shunt). They were divided in two groups: I (31 had presented rebleeding at postoperative care) and II (26 had not presented new bleeding). Group I was again divided into 2 groups according to time of rebleeding: Group I.A (12 that presented rebleeding until hospital discharge) and Group I.B (19 that presented rebleeding after hospital discharge). We analyzed the clinical, endoscopic, laboratorial and Doppler-ultrasound information at the pre- and postoperative moments and also intrasurgery data that were compared between the established groups. RESULTS: Serum albumin and bilirubins were 3.33 mg% and 1.7 mg% in group I, 3.56 mg% and 1.16 mg% in group II. Portal flow and diameter were 0.24 cm/s and 1.34 cm in group I, and 0.18 cm/s and 1.21 cm in group II, respectively. In group I.A the volume of crystalloid given during surgery was 3.692 ml against 2.166 ml in group I.B. CONCLUSION: Albumin and total bilirubins dosages in the preoperative period, added to the value of the flow and portal diameter were predictive factors for rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery. The volume of crystalloid given during the surgery was a predictive factor for early rebleeding.

Cirrhosis; Variceal bleeding; Warren; Rebleeding; Predictive factors


ARTIGO ORIGINAL

Fatores preditores de recidiva hemorrágica em cirróticos submetidos à cirurgia de Warren

Predictive factors of rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery

Fabio Gonçalves Ferreira; Fernando Tavares Saliture Neto; Maria de Fátima Santos; José Cesar Assef; Luiz Arnaldo Szutan; Armando De Capua Junior* * Correspondência: Av. Comendador Adibo Ares, 944, São Paulo, SP, Cep 05613-001, Fone: (11) 3226-7270.

RESUMO

OBJETIVO: Estabelecer os fatores preditores determinados no pré-operatório envolvidos na recidiva hemorrágica dos cirróticos submetidos à cirurgia de Warren.

MÉTODOS: Cinqüenta e sete cirróticos com boa reserva funcional hepática e antecedente de hemorragia digestiva alta que não responderam ao tratamento clínico-endoscópico, foram submetidos à cirurgia de Teixeira-Warren (derivação espleno-renal distal). Eles foram divididos em dois grupos: 1 = 31 (apresentaram recidiva hemorrágica no pós-operatório) e 2 = 26 (não apresentaram novo sangramento). O grupo 1 foi novamente dividido em dois grupos, segundo a época de recidiva: grupo 1.A = 12 com recidiva hemorrágica até a alta hospitalar e 1.B = 19 com recidiva hemorrágica após a alta. Onze doentes faleceram no período perioperatório e os 46 restantes foram seguidos ambulatorialmente por um período de 3,2 anos em média, sendo analisados os aspectos clínicos, laboratoriais como a dosagem de albumina e bilirrubinas séricas, ultra-sonográficos como o fluxo e calibre portais, e endoscópicos no pré e pós-operatório, bem como dados do intra-operatório como o volume de cristalóides infundido durante a cirurgia.

RESULTADOS: As dosagens de albumina sérica e bilirrubinas totais foram em média de 3,33 mg% e 1,7 mg% no grupo 1, e 3,56 mg% e 1,16 mg% no grupo 2. O fluxo e o calibre portais foram em média 0,24 cm/s e 1,34 cm no grupo 1, e 0,18 cm/s e 1,21 cm no grupo 2, respectivamente. No grupo 1.A, o volume de cristalóide infundido durante a cirurgia foi em média de 3,692 ml contra 2,166 ml no grupo 1.B.

CONCLUSÃO: A dosagem pré-operatória de albumina, bilirrubinas totais, valor do fluxo e calibre portais foram fatores preditores para recidiva hemorrágica em pacientes cirróticos submetidos à cirurgia de Warren. O volume de cristalóide infundido no intra-operatório foi fator preditor para ressangramento precoce.

Unitermos: Cirrose. Hemorragia digestiva alta. Warren. Recidiva hemorrágica. Fatores preditores.

SUMMARY

BACKGROUND: Establish the predictive factors of rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery.

METHODS: 57 cirrhotic patients with good hepatic functional reserve and previous variceal bleeding that had not responded to clinical, endoscopic treatment were submitted to the Warren's surgery (distal splenorenal shunt). They were divided in two groups: I (31 had presented rebleeding at postoperative care) and II (26 had not presented new bleeding). Group I was again divided into 2 groups according to time of rebleeding: Group I.A (12 that presented rebleeding until hospital discharge) and Group I.B (19 that presented rebleeding after hospital discharge). We analyzed the clinical, endoscopic, laboratorial and Doppler-ultrasound information at the pre- and postoperative moments and also intrasurgery data that were compared between the established groups.

RESULTS: Serum albumin and bilirubins were 3.33 mg% and 1.7 mg% in group I, 3.56 mg% and 1.16 mg% in group II. Portal flow and diameter were 0.24 cm/s and 1.34 cm in group I, and 0.18 cm/s and 1.21 cm in group II, respectively. In group I.A the volume of crystalloid given during surgery was 3.692 ml against 2.166 ml in group I.B.

CONCLUSION: Albumin and total bilirubins dosages in the preoperative period, added to the value of the flow and portal diameter were predictive factors for rebleeding in cirrhotic patients submitted to the Warren's surgery. The volume of crystalloid given during the surgery was a predictive factor for early rebleeding.

Key words: Cirrhosis. Variceal bleeding. Warren. Rebleeding. Predictive factors.

INTRODUÇÃO

A hemorragia digestiva alta (HDA) é a principal causa de mortalidade em doentes cirróticos com hipertensão porta e varizes esofágicas1. Acredita-se que cerca de 35% dos pacientes cirróticos com varizes esofágicas ou gástricas sangrarão no futuro e mais de 20% deles morrerão no primeiro episódio. Há muito tempo são estudadas alternativas terapêuticas visando diminuir os episódios de HDA e ao mesmo tempo preservar uma boa perfusão e função hepática.

Na emergência, a melhor forma de controlar o sangramento digestivo alto proveniente das varizes de esôfago é pelo procedimento endoscópico, com escleroterapia ou ligadura elástica das veias sangrantes quando possível ou empregando o balão esofágico de Sengstaken-Blakemore2,3.

A análise do tratamento eletivo do sangramento de varizes esofágicas comparando o uso de beta-bloqueador (propranolol), escleroterapia e derivações cirúrgicas mostrou no grupo operado uma taxa significativamente menor de recidiva hemorrágica que a dos outros dois. Esse dado foi muito mais significativo quando o paciente operado era de baixo risco com função hepática preservada (Child A)4.

Dois tipos de cirurgia são aceitas para o tratamento do sangramento digestivo causado pela hipertensão porta: as desconectivas e as derivativas, com inúmeras técnicas em cada uma delas.

A desconexão ázigo-porta5 não é bem tolerada pelos cirróticos, devido ao baixo fluxo na veia porta que estes doentes costumam apresentar no pré-operatório em virtude da neovascularização colateral na região porta6. Leva ainda à piora da função hepatocelular por diminuição do fluxo sangüíneo da veia porta, decorrente da supressão do fluxo da veia esplênica.

As derivações centrais porto-cava ou mesentérico-cava1,5 promovem descompressão imediata do sistema porta. Todavia possuem alta morbi-mortalidade, pois a instalação de um fluxo sangüíneo hepatofugal a curto e médio prazo é freqüente, piorando ainda mais a função hepática com altos índices de encefalopatia hepática.

A cirurgia proposta por Warren1 constitui-se numa derivação venosa seletiva do sistema porta pela anastomose da veia esplênica à veia renal esquerda, complementada pela ligadura da veia gástrica esquerda e desconexão espleno-pancreática. Seu objetivo, além de baixar a pressão no território das veias do plexo esôfago-cárdio-tuberositário, é diminuir a fuga de fluxo sangüíneo da veia porta preservando parcialmente a perfusão hepática graças à manutenção da hipertensão venosa no território intestinal e com isso reduzir a incidência de encefalopatia hepática1,2,5,7.

A derivação espleno-renal distal é boa opção terapêutica para os doentes cirróticos com função hepática preservada que já apresentaram um episódio de hemorragia digestiva alta. É indicada em nosso serviço para os pacientes com ressangramento após o tratamento eletivo clínico-endoscópico como primeira opção terapêutica. Nesta cirurgia, não há manipulação da região hepática, e assim, diferentemente das desconexões que provocam inúmeras aderências pós-operatórias, não dificultará um futuro transplante hepático que surge como novo tratamento para os cirróticos com função hepática alterada.

Objetivamos neste estudo determinar, no pré-operatório, os fatores preditores de recidiva hemorrágica nos doentes submetidos à cirurgia de Warren pelo Grupo de Fígado e Hipertensão Portal da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

MÉTODOS

Analisamos retrospectivamente os prontuários de 57 cirróticos submetidos à cirurgia de Warren pelo Grupo de Fígado e Hipertensão Portal do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo entre janeiro de 1983 e junho de 2002. Os doentes foram divididos em dois grupos, o grupo 1 composto por aqueles que apresentaram recidiva hemorrágica (n=31) e o grupo 2 por aqueles que não ressangraram (n=26).

Onze doentes faleceram no período perioperatório e os 46 restantes foram seguidos em nosso ambulatório por um período que variou entre dois meses e dez anos (média de 3,2 anos).

Dividimos os doentes do grupo 1 em dois subgrupos:

A - recidiva precoce: HDA até a alta hospitalar (n=12).

B - recidiva tardia: HDA após a alta (n=19).

Registramos os seguintes dados do pré-operatório: etiologia da cirrose hepática, número de internações prévias por HDA, exames laboratoriais (dosagens de bilirrubinas totais e albumina, número de plaquetas e o tempo de protrombina); exames endoscópicos (número de cordões varicosos esofágicos) e ultra-som com doppler (calibres das veias porta e esplênica e o fluxo porta). Anotamos o tempo operatório, o volume de concentrado de hemácias transfundido e o volume de colóides e cristalóides infundidos durante a cirurgia.

Fizemos o seguimento ambulatorial dos doentes e no Pronto-Socorro da Santa Casa de São Paulo, quando apresentaram episódios de HDA. Na recidiva hemorrágica pós-operatória foi realizada endoscopia digestiva e, sempre que possível, ultra-som com doppler abdominal para determinar a origem do sangramento e se a anastomose espleno-renal distal estava patente.

Para a análise estatística foi inicialmente verificada a normalidade de distribuição dos dados pelo teste de Kolgomorov. Como todos apresentaram distribuição normal, cumpriu-se o pressuposto do teste t-Student e o aplicamos a fim de averiguar a existência ou não de diferença estatisticamente significativa (p<0,05) para variáveis independentes.

RESULTADOS

O grupo 1 (54,4% da amostra), com média de idade de 44 anos (13-67), era composto por 70,9% de homens. O grupo 2 teve média de idade de 49,8 anos (19-77) e 80,7% de homens.

A Tabela 1 mostra a distribuição da etiologia da cirrose hepática nos grupos. Houve predomínio da cirrose alcoólica nos dois e a diferença das freqüências das etiologias entre ambos não foi estatisticamente significante.

Dos 57 doentes estudados, 35 foram operados na mesma internação após a compensação do quadro de HDA. Desses, 21 pertenciam ao grupo 1 e 14 ao grupo 2. Os outros 22 foram operados em caráter totalmente eletivo, ou seja, encaminhados do ambulatório e sem quadro de descompensação recente, dos quais 10 eram do grupo 1 e 12 do grupo 2.

Em relação às variáveis estudadas, a Tabela 2 mostra comparativamente os resultados obtidos nos grupos 1, 1.A, 1.B e 2. Encontramos diferença estatisticamente significativa na dosagem de albumina e bilirrubina total e no fluxo e calibre porta quando comparamos os doentes que apresentaram recidiva hemorrágica (grupo 1) e os que não sangraram no pós-operatório (grupo 2). Quando comparamos os doentes que apresentaram recidiva precoce (grupo 1.A) e os que não sangraram (grupo 2), não encontramos nenhum resultado estatisticamente significativo. Nos cirróticos que tiveram recidiva tardia (grupo 1.B), a dosagem de albumina e o valor do fluxo portal foram significativos na comparação com os que não tiveram recidiva. Finalmente, a comparação dos dois subgrupos que apresentaram recidiva precoce (1.A) e tardia (1.B) mostrou que o volume de cristalóides infundidos durante o ato cirúrgico foi significativamente menor no grupo 1.B.

Na readmissão hospitalar, os pacientes que apresentaram HDA no pós-operatório da cirurgia de Warren submeteram-se à endoscopia digestiva alta para diagnosticar a origem do sangramento. Em todos (n = 31), o sangramento era proveniente de varizes esofagianas.

O estudo da anastomose espleno-renal distal pelo ultra-som com doppler abdominal foi realizado durante o ressangramento em 19 doentes (61%). Nos outros 12 o exame não foi possível pela indisponibilidade na época da complicação (antes de 1989) ou pela gravidade do estado do doente internado na Unidade de Terapia Intensiva, impossibilitando seu transporte à unidade radiológica. Dos 19 doentes estudados, 15 (79%) apresentavam anastomose pérvia, 3 (15,7%) trombose da anastomose e em 1 (5,3%) não foi possível visualizar a anastomose por dificuldade técnica.

DISCUSSÃO

As complicações mais comuns da cirurgia de Warren são a encefalopatia portossistêmica, a trombose da anastomose espleno-renal distal, ascite e recidiva hemorrágica5. Nas cirurgias de derivação seletiva ainda pode ocorrer hepatite viral aguda pós-transfusional8. Algumas casuísticas consignam 11% de encefalopatia pós-operatória9.

Spina et al. relataram 9% de recidiva hemorrágica precoce e 58% de ascite pós-operatória10. He e Zang, numa grande casuística, observaram 10,1% de recidiva hemorrágica11 e Flamant et al. concluíram que os principais fatores preditores para ressangramento foram a idade e o número de episódios prévios de HDA12.

Analisando nossos resultados, observamos que os grupos são homogêneos nos diversos parâmetros estudados. O tempo cirúrgico foi elevado na maioria dos casos devido a dificuldade técnica principalmente na dissecção da veia esplênica durante a execução da desconexão espleno-pancreática, pois o pâncreas em muitos doentes apresentava-se também com um certo grau de comprometimento pelo álcool.

Constatamos elevado índice de recidiva hemorrágica (54,4%) em comparação com os da literatura, e 21% dos ressangramentos ocorreram precocemente.

Esse fato pode ser atribuído ao grande número de pacientes Child B da nossa casuística (56%); à cirrose alcoólica como principal etiologia da hipertensão porta (61,4%), sabidamente muito mais agressiva ao parênquima hepático que a cirrose por vírus em geral; e ao fato de 61,4% dos pacientes terem sido operados após a compensação de um episódio hemorrágico, na mesma internação.

Quando comparamos o grupo 1 (que apresentou recidiva hemorrágica) com o grupo 2 (que não ressangrou), observamos que a diferença dos valores médios da dosagem de bilirrubinas totais e albumina, do fluxo porta e do calibre da veia porta no pré-operatório foram estatisticamente significativos. O valor maior do fluxo porta e do calibre da veia porta são indicativos de que a hipertensão porta no grupo 1 é mais grave, e o obstáculo imposto pelo parênquima hepático cirrótico é mais acentuado que no grupo 2. Este fato, confirmado também pelos valores aumentados das bilirrubinas totais e diminuídos da albumina neste grupo, justificaria o alto índice de recidiva hemorrágica observado.

Comparando o grupo que apresentou recidiva hemorrágica tardia (grupo 1.B) com o que não sangrou (grupo 2), observamos também que o valor pré-operatório da albumina e o do fluxo porta foram significativamente menores, mostrando que esses pacientes tinham um comprometimento maior da função hepática no momento da cirurgia, apesar de valores idênticos na classificação de Child-Pugh.

A análise exclusiva dos doentes que sangraram no pós-operatório (grupo 1.A e grupo 1.B) mostrou que o único fator estatisticamente significativo foi o volume de cristalóide infundido no intra-operatório. Isto sugere que o paciente "hipervolêmico" mantém um regime de hipertensão mais crítico na região das varizes esofagianas no pós-operatório. Numa análise mais ampla, observamos que o tempo operatório e a infusão de concentrados de hemácias durante o intra-operatório não apresentaram diferença estatisticamente significante nestes grupos. O maior volume de cristalóide infundido não foi por sangramento ou por extensão do tempo cirúrgico, e pode ser responsável pelo ressangramento precoce (grupo 1.A).

Na comparação entre o grupo que ressangrou precocemente (grupo 1.A) e o que não ressangrou (grupo 2) não houve diferença estatisticamente significativa entre as variáveis estudadas. Isso talvez seja explicado pelo fato do primeiro ser pequeno, muito menor que o último.

Eckhauser et al. constataram que a recidiva hemorrágica pós-cirúrgica foi de 6,5% em anastomoses pérvias e atribuíram-na à hipertensão venosa crônica na veia renal ou esplênica, não permitindo a rápida descompressão das varizes esofagianas13.

Na nossa casuística, 48% (15/31) das recidivas hemorrágicas comprovadamente ocorreram com anastomoses pérvias, corroborando que a baixa concentração sérica de albumina e elevados níveis de bilirrubinas totais que indicam deterioração mais acentuada do parênquima hepático foram preditores para o ressangramento. Essa deterioração causa maior pressão no sistema porta, expressa pelo maior fluxo na veia porta, que leva à hipertensão crônica das veias renal e esplênica, dificultando a descompressão venosa do território esofágico.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos no presente estudo de 57 cirróticos submetidos à cirurgia de Warren nos permitem concluir que a dosagem pré-operatória de albumina e bilirrubina total e o valor do fluxo e calibre porta são fatores preditores de recidiva hemorrágica. Já o volume de cristalóides infundidos no ato cirúrgico é fator preditor de ressangramento precoce.

Conflito de interesse: não há.

Artigo recebido: 02/06/04

Aceito para publicação: 24/08/04

Trabalho realizado pelo Grupo de Fígado e Hipertensão Portal do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP.

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  • *
    Correspondência: Av. Comendador Adibo Ares, 944, São Paulo, SP, Cep 05613-001, Fone: (11) 3226-7270.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Out 2005
    • Data do Fascículo
      Out 2005

    Histórico

    • Recebido
      02 Jun 2004
    • Aceito
      24 Ago 2004
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