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Estratificação de risco coronário em assintomáticos

PANORAMA INTERNACIONAL

CLÍNICA MÉDICA

Estratificação de risco coronário em assintomáticos

Fernanda Coutinho Storti

O teste ergométrico é amplamente utilizado com fim diagnóstico, prognóstico e na avaliação terapêutica de pacientes com presença ou suspeita de doença coronária. No entanto, sua utilidade clínica em assintomáticos permanece controversa, mesmo em pacientes com fatores de risco. Contudo, o teste de esforço pode ser útil na orientação da intensidade da correção dos fatores de risco e no embasamento da prescrição de exercícios.

O presente estudo1 é o primeiro realizado em homens utilizando o escore de Framingham, e avaliou em que situação particular o teste ergométrico possui maior valor em assintomáticos em relação à sua previsão de eventos. Estudou-se 3.043 pacientes (47% homens) derivados do estudo de Framingham2,3, com idade média de 45 ± 9 anos, avaliados por história clínica, exame físico, dosagem de colesterol total, glicemia e submetidos a teste ergométrico, sendo acompanhados por 20 anos. Adotou-se o protocolo de Bruce e o teste foi considerado positivo pela presença de infradesnível do segmento ST> 1mm horizontal ou descendente. O risco de desenvolver coronariopatia foi avaliado em relação a três variáveis do teste de esforço: 1) infradesnível do segmento ST>1mm, 2) incompetência cronotrópica (incapacidade de atingir 85% da freqüência cardíaca máxima) e 3) capacidade funcional. O escore de Framingham foi calculado para previsão de risco de coronariopatia em 10 anos.

Os eventos cardiovasculares considerados foram: 1) início de angina típica, 2) insuficiência coronária, definida por precordialgia isquêmica prolongada acompanhada de alterações eletrocardiográficas e enzimas séricas normais, 3) infarto do miocárdio ou 4) óbito cardiovascular. Em homens, o risco de desenvolver coronariopatia em 10 anos foi dividido em três grupos: < 10% (grupo 1), 10% a 19% (grupo 2) e > 20% (grupo 3) por meio do escore de Framingham. Em mulheres, essa categorização foi limitada devido ao número reduzido de eventos cardiovasculares e ao baixo número de indivíduos com risco pelo menos intermediário em 10 anos.

A previsão de um evento cardiovascular em 10 anos utilizando o escore de Framingham foi de 9,6% para homens (variando de 2% a 53%) e de 3,9% para mulheres (variando de 1% a 27%). O infradesnível do segmento ST durante o teste de esforço ocorreu em 4,8% dos homens e 3,8% das mulheres.

O infradesnível do segmento ST e não atingir a frequência cardíaca submáxima foram associados com um maior risco em homens, mas não em mulheres. Para cada incremento de 1 MET na capacidade funcional, menor o risco cardiovascular em homens. Nestes, quando o infradesnível do segmento ST e a incapacidade de atingir a freqüência cardíaca submáxima foram avaliados conjuntamente num modelo graduado com ajuste para a idade e para a pontuação, seus efeitos foram levemente atenuados.

A razão de risco das variáveis do teste de esforço foram significantes apenas nos homens dos grupos 2 e 3. Nos homens do grupo 2, o infradesnível do segmento ST dobrou o risco de um evento (RR= 2,01). Nos do grupo 3, a falência em atingir a freqüência cardíaca submáxima e o infradesnível do segmento ST mais do que dobrou o risco de um evento (RR=2,66 e RR=2,11, respectivamente), enquanto que para cada MET adicional, o risco fica reduzido em 13% (RR=0,87).

Comentário

A diretriz americana atual de ergometria4 estimula a avaliação do risco cardiovascular global para adoção mais consistente de medidas preventivas. Em homens assintomáticos, a ocorrência de infradesnível do segmento ST, e a incompetência cronotrópica ou de menor capacidade funcional durante o teste ergométrico fornecem informações prognósticas adicionais em modelos ajustados para idade e pontuação no escore de Framingham. Os efeitos foram maiores no grupo de alto risco. A relação de risco relatada para cada variável permaneceu semelhante durante todo o período de seguimento. Nos pacientes de baixo risco (risco < 10% em 10 anos), nenhuma das variáveis do teste forneceu informação prognóstica adicional.

A grande variedade dos resultados obtidos nos diversos estudos em assintomáticos é determinada pelos diversos parâmetros do ergométrico estudados, pela grande diversidade da casuística analisada e pelos diferentes desfechos avaliados. Assim, mesmo entre os assintomáticos existe uma grande diversidade de indivíduos quando se considera dados básicos como: as diferentes faixas etárias, sexo, número e tipo de fatores de risco. Ao considerá-los, o valor preditivo das alterações no teste ergométrico é superior, obtendo-se um risco de eventos até 30 vezes maior no grupo de mais alto risco. Em indivíduos de baixo risco, a incapacidade de detectar associações das variáveis do teste a eventos é correlacionada à baixa morbi-mortalidade.

Referências

1. Balady GJ, Larson MG, Vasan RS, Leipi EP, O'Donnell CJ, Levy D, et al. Usefulness of exercise testing in the prediction of coronary disease risk among asymptomatic persons as a function of the Framingham risk score. Circulation. 2004;110(14):1920-5.

2. Cupples LA, D'Agostino RB. Survival following initial cardiovascular events: 30 year follow-up Framingham Heart Study, section 35. In: Kannel WB, Wolf PA, Garrison RJ, editors. The Framingham Study: an epidemiological investigation of cardiovascular disease [publication no. 88-2969]. Bethesda: National Heart, Lung, and Blood Institute, Maliard Institutes of Health; 1988.

3. Wilson PW, D'Agostino RB, Levy D, Ramage MC. Prediction of coronary heart disease using risk factor categories. Circulation. 1998;97(18):1837-47.

4. ACC/AHA 2002 guideline update for exercise testing: summary article: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines (Committee to Update the 1997 Exercise Testing Guidelines). Circulation 2002;106(14):1883-92.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jan 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2005
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