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Como assegurar benefício aos pacientes após sua participação em pesquisas clínicas?

À BEIRA DO LEITO

MEDICINA FARMACÊUTICA

Como assegurar benefício aos pacientes após sua participação em pesquisas clínicas?

Sonia Mansoldo Dainesi

O desejo de colaborar com o desenvolvimento da ciência muitas vezes move os indivíduos a se engajarem em pesquisas clínicas, embora raramente o façam por esse motivo exclusivamente. Geralmente, há associação de algum outro motivo que o impulsiona nesta direção e o acesso gratuito à medicação, por exemplo, pode ser um destes motivos; entretanto, o quanto ele de fato interfere nesta decisão não é, ainda, muito claro. O fornecimento da medicação durante o estudo é a regra, mas a sua continuidade após a conclusão da pesquisa clínica tem gerado importantes controvérsias. Até recentemente, o foco da discussão em pesquisa clínica vinha sendo a proteção aos direitos e bem-estar dos pacientes, o que seria assegurado através de um desenho apropriado do estudo, minimização dos riscos, revisão por um comitê independente e consentimento do paciente. Os códigos de ética e as legislações mantinham-se silenciosos quanto ao que aconteceria ao final do estudo1.

A Declaração de Helsinque, no parágrafo 30, menciona, por exemplo, que "ao final do estudo, todos os participantes devem ter assegurado o acesso aos melhores métodos comprovados profiláticos, diagnósticos e terapêuticos identificados pelo estudo"2. A posição do CIOMS (Council for International Ethical Guidelines) é de que o produto deve estar "razoavelmente disponível" para o país ou os habitantes da comunidade que hospedou o estudo, após sua conclusão. Exceções deveriam ser justificadas e acordadas por todos os envolvidos antes do início da pesquisa3.

Entretanto, ao tentar aplicar esses princípios, algumas questões emergem: quem seria responsável pelo acesso, quanto tempo deve durar este acesso pós-estudo, como seguir os pacientes fora de um contexto de estudo clínico, como assegurar que os potenciais eventos adversos serão adequadamente relatados, caso o medicamento/procedimento ainda não esteja disponível no mercado? Estas e outras questões não são, infelizmente, facilmente respondidas. Além disso, a própria definição do que é "razoavelmente disponível" (CIOMS) ou mesmo "os melhores métodos comprovados" (Declaração de Helsinque) não é muito simples. Com relação à primeira, "razoavelmente disponível" pode ser totalmente gratuito, subsidiado, disponível a preços de mercado ou disponível na rede pública. Já quanto ao termo utilizado na Declaração de Helsinque, dificilmente um único estudo prova definitivamente a eficiência de determinada intervenção.

A Conferência de Aspectos Éticos da Pesquisa em países em desenvolvimento (EARD), de 2001, já havia discutido o tema da "disponibilidade razoável", conforme consta do documento CIOMS. Este sugere que somente um tipo de benefício poderia justificar a participação dos pacientes em protocolos de pesquisa, quando existem várias outras opções de benefícios para a comunidade como, por exemplo: treinamento em cuidados de saúde, do pessoal da pesquisa, construção de dependências para cuidados de saúde e outras infra-estruturas relacionadas, provisão de medidas de saúde pública, fornecimento do tratamento "standard" disponível, etc.4. São todas alternativas que levam em consideração os vários modos que a comunidade pode se beneficiar com a pesquisa.

Avaliar quais são as percepções dos participantes de pesquisa e suas experiências com as pesquisas também é uma necessidade. A publicação destes dados poderia ajudar a encontrar soluções reais, plausíveis e definidas de acordo com o ponto de vista do próprio paciente. Enquanto isso, a decisão deve continuar sendo caso-a-caso e, obviamente, definida antes do início do estudo, para que o CEP possa revê-la e validá-la.

Referências

1. Grady C. The challenge of assuring continued post-trial access to beneficial treatment.

Yale J Health Policy Law and Ethics 2005, V:1, p. 425-35.

2. Workgroup report on the revision of paragraph 30 of the Declaration of Helsink. Disponível em: http://www.wma.net/e/ethicssunit/pdf wh_doh_ jan2004.pdf . Acesso em 09/12/2005.

3. International Ethical Guidelines for Biomedical Research Involving Human Subjects. Disponível em: http://www.cioms. ch guidelines_nov_2002_ blurb.htm. Acesso em 12/12/2005.

4. Moral Standards for Research in Developing Countries. From "Reasonable Availability to "Fair benefits". Hastings Center Report 2004, 34 (3):17-21.[* | incorporado.WMF *]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Abr 2006
  • Data do Fascículo
    Fev 2006
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