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Anencefalia, trombose e anticorpos anticardiolipina

CORRESPONDÊNCIAS

Anencefalia, trombose e anticorpos anticardiolipina

A síndrome antifosfolipídica (SAF) é uma trombofilia comum em adultos jovens1. Uma eventual associação de anticorpos antifosfolípides (AAF) com anomalias fetais é matéria polêmica. É de interesse o caso de uma gestante anticorpo anticardiolipina (AAC)-positiva na qual uma trombose venosa profunda (TVP) sucedeu um aborto terapêutico por anencefalia.

A paciente, de 24 anos de idade, foi submetida a uma ecografia obstétrica de rotina com 12 semanas de gravidez. O exame revelou anencefalia. Um aborto terapêutico foi autorizado pelo Juizado local. Os achados macroscópicos incluíram anencefalia e spina bifida. Três dias após a interrupção, a paciente desenvolveu TVP de membro inferior esquerdo. Tratamento com heparina subcutânea foi efetivo. Níveis baixos de IgG AAC (18,4 GPL) e moderados de IgM AAC (36,2 MPL) foram detectados1. Seis meses depois, o teste para AAC foi negativo. A paciente, sob anticoagulação oral desde o episódio de TVP, encontra-se bem no momento.

Embora a paciente não preencha os critérios atuais para SAF1, uma forma provável e transitória da doença pode ser admitida. Uma relação causa-efeito de AAC maternos com anencefalia é de difícil confirmação, entretanto. A presença de AAC pode, potencialmente, ter decorrido do estado de pós-interrupção gestacional.

A associação de AAF com anomalias fetais é polêmica. Em estudo controlado de 40 mães AAC-positivas, a ocorrência do anticorpo se associou a abortos prévios e também a defeitos ventriculares septais2. Uma paciente AAF-positiva apresentou histórico de abortos recorrentes e recém-natos com atresia renal e hipogenesia oromandibular3. Em outro relato, uma paciente lúpica AAC-positiva, tratada com ácido acetil-salicílico durante a gestação, gerou um menino com deformidades de vértebras torácicas4.

Digno de nota, trombose associada à AAC não foi, até o momento, reportada em pacientes cuja interrupção da gravidez tenha decorrido por anencefalia. No entanto, a escassez de relatos ainda não permite definir uma associação de AAF com malformações congênitas. As implicações clínicas e bioéticas da eventual presença de AAF em gestantes de fetos anencéfalos constitui assunto aberto a debate.

Felix Trentin Filho

Henrique Luiz Staub

Porto Alegre - RS

Referências

1. Wilson WA, Gharavi AE, Koike T, Lockshin MD, Branch DW, Piette JC, et al. International consensus statement on preliminary classification criteria for definite antiphospholipid syndrome. Arthritis Rheum 1999;42:1309-11.

2. Kowal-Vern A, Fisher SG, Muraskas J, Jandreski MA, Gianopoulos JG, Husain A. Placental pathological conditions in anticardiolipin antibody positive women whose infants had congenital heart defects. Perinatology 1996;16:268-71.

3. Coulam CB. Hypothesis: antiphospholipid antibodies associated with congenital abnormalities? Early Pegnancy 1997;3:109-12.

4. Chakravarty K, Merry P. Anticardiolipin syndrome, aspirin therapy and fetal malformation. Lupus 1993;2:61-2.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jun 2006
  • Data do Fascículo
    Abr 2006
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