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Pré-eclâmpsia: "estado hipovolêmico" ou "conteúdo ajustado ao continente?"

À BEIRA DO LEITO

OBSTETRÍCIA

Pré-eclâmpsia: "estado hipovolêmico" ou "conteúdo ajustado ao continente?"

Apesar de a etiologia da pré-eclâmpsia permanecer desconhecida, as alterações fisiopatológicas que ocorrem no sistema cardiovascular foram descritas, de forma convincente, há muito tempo1. Mesmo assim, inverdades e falsos conceitos vêm sendo divulgados por muitos profissionais e especialistas, devido à má interpretação ou desconhecimento desses processos fisiopatológicos. Vários autores acreditam, ainda, que a pré-eclâmpsia grave induz à redução do volume plasmático, impondo sua correção pela reposição de fluidos. Chega-se até a considerá-la um "estado de choque hipovolêmico crônico".

Portanto, o conceito de "corrigir a hipovolemia" na pré-eclâmpsia com o intuito de aumentar o fluxo sangüíneo útero-placentário é totalmente errado e iatrogênico, pois a redução do volume plasmático circulante se deve à vasoconstrição arterial e não à diminuição do volume de fluidos. Ademais, ao promover a expansão volêmica em situação de vasoconstrição seria prejudicial ao sistema cardiovascular devido à sobrecarga iatrogênica de volume a um coração não preparado para recebê-la. Como agravante, devido à lesão endotelial sistêmica, a infusão desnecessária de fluidos, acarretaria piora do edema generalizado e, como complicação grave, levaria ao edema pulmonar. Contrariamente, o tratamento para aumentar o fluxo sangüíneo aos órgãos-alvos consiste em controlar a pressão arterial por meio de terapêutica para promover vasodilatação3.

Em algumas situações de extrema gravidade, em que ocorre oligúria e insuficiência renal, a reposição volêmica criteriosa associada ao controle pressórico parece ser o tratamento ideal, porém a pressão venosa capilar pulmonar deve ser monitorizada, em que pese ser procedimento de complexidade maior. Essa conduta é essencial, pois a monitorização da pressão venosa central, um procedimento mais simples, não se mostrou efetiva como preditor clínico da pressão venosa capilar pulmonar2.

Na literatura há poucos estudos recentes abordando o estado hemodinâmico materno nessas situações mais graves4, o que torna o assunto de interesse, motivando o desenvolvimento de novas linhas de pesquisa nessa importante complicação gestacional.

Rodrigo Ruano

Marcelo Zugaib

Referências

1. Assali NS, Vaughn DL. Blood volume in pre-eclampsia: fantasy and reality. Am J Obstet Gynecol 1977;129(4):355-9.

2. Cotton DB, Gonik B, Dorman K, Harrist R. Cardiovascular alterations in severe pregnancy-induced hypertension: relationship of central venous pressure to pulmonary capillary wedge pressure. Am J Obstet Gynecol 1985; 151(6): 762-4.

3. Zugaib M. Doença hipertensiva específica da gravidez. Femina 1985;13(2):120-4.

4. Ganzevoort W, Rep A, Bonsel GJ, De Vries JI, Wolf H, PETRA investigators. A randomized trial of plasma volume expansion in hypertensive disorders of pregnancy: influence on the pulsatility indices of the fetal umbilical artery and middle cerebral artery. Am J Obstet Gynecol 2005;192(1):233-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Ago 2006
  • Data do Fascículo
    Ago 2006
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