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Efeito da suplementação com vitamina A sobre a concentração de retinol no colostro de mulheres atendidas em uma maternidade pública

The effect of vitamin A supplementation upon retinol concentration in the colostrum of women in a public maternity hospital

Resumos

OBJETIVOS: Avaliar o efeito da suplementação com vitamina A sobre os níveis de retinol no colostro de puérperas atendidas em maternidade pública de Natal-RN, analisando a influência do estado nutricional materno e retinol no colostro na resposta a esta suplementação. MÉTODOS: Foram coletados 5 ml de sangue em jejum para análise do retinol sérico, e duas amostras de leite, antes e 24h após suplementação. O consumo de vitamina A foi obtido pelo questionário de frequência de consumo. O retinol foi analisado por cromatografia líquida de alta eficiência. RESULTADOS: O consumo de vitamina A foi 1492,4 ± 1264 µgRAE/dia e 23% tinha consumo provavelmente inadequado. No início (0h) e após 24h da suplementação, os grupos comparativo e suplementado apresentaram concentrações séricas de retinol de 1,3 ± 0,4 e 1,4 ± 0,4 µmol/L (7% de deficiência) e 3,5 ± 1,7 µmol/L e 3,3 ± 1,8 µmol/L (p>0,05) no colostro 0h, respectivamente. No grupo suplementado o retinol aumentou no colostro 24h, com valores de 3,6 ± 1,9 e 6,8 ± 2,6 µmol/L (p<0,0001), respectivamente. Mulheres com níveis deficientes de retinol no colostro 0h (<2,04 µmol/L) transferiram mais retinol ao colostro 24h do que as com níveis adequados (326,1% e 86,5% de aumento, respectivamente). CONCLUSÃO: A megadose foi eficaz nas primeiras 24h após a suplementação. Os níveis basais de retinol no colostro influenciaram a resposta à suplementação. As parturientes que apresentaram valores baixos de retinol transferiram mais retinol oriundo da megadose ao leite do que as lactantes com níveis suficientes, possivelmente ressaltando a atuação dos mecanismos de transferência de vitamina A propostos na glândula mamária.

Vitamina A; Colostro; Suplementação


OBJECTIVE: The aim was to evaluate the effect of supplementary vitamin A upon the colostrum retinol levels in puerperal women cared for at a public maternity hospital in Natal, RN, Brazil. Analysis was conducted on the influence of the colostrum retinol and the maternal nutritional condition as response to supplementation. METHODS: For analysis of serum retinol 5ml of fasting blood and two samples of milk were collected before and 24 hours after supplementation. A questionnaire was used to define the frequency of previous vitamin A intake. High Efficiency Liquid Chromatography was used to analyze the retinol. RESULTS: Vitamin A intake was 1492.4 ± 1264 µgRAE/day and 23% probably had an inadequate intale. At the beginning of supplementation, 0 hour, and at 24 hours, the control and supplemented groups presented serum retinol concentrations of 1.3 ± 0.4 and 1.4 ± 0.4 µmol/L (7% deficiency) and 3.5 ± 1.7 µmol/L and 3.3 ± 1.8 µmol/L (p>0.05) at 0 hour colostrum, respectively. Retinol in the 24 hours milk of the supplemented group increased from of 3.6 ± 1.9 and 6.8 ± 2.6 µmol/L (p<0.0001), respectively. Women with deficient levels of retinol in the colostrum at 0 hour(<2.04 mol/L) transferred more retinol to the colostrum at24 hours milk than those with adequate levels (an increase of 326.1% and 86.5%, respectively). CONCLUSION: The megadose of vitamin A was efficient in the first 24 hours after supplementation. The supplementation response was influenced by the basal levels of retinol in the colostrum. Parturient women with low initial levels of retinol transferred more retinol to the milk, after the megadose, than nursing women with sufficient levels. This possibly confirms the action of the Vitamin A transfer mechanisms proposed by the mammary gland.

Vitamin A; Colostrum; Supplementation


ARTIGO ORIGINAL

Efeito da suplementação com vitamina A sobre a concentração de retinol no colostro de mulheres atendidas em uma maternidade pública

The effect of vitamin A supplementation upon retinol concentration in the colostrum of women in a public maternity hospital

Karla Danielly da Silva RibeiroI; Katherine Feitosa de AraújoII; Roberto DimensteinIII,* * Correspondência: Av. Senador Salgado Filho, n°3000 - Lagoa Nova, Natal – RN, CEP: 59072-970, Telefone: (84) 3215-3416, ext. 212 - Fax (84) 3211-9208 rdimen@uol.com.br

IMestre - professora do Departamento de Nutrição da Universidade Potiguar - UNP e nutricionista da Secretaria Municipal de Saúde de Natal, Natal, RN

IIGraduanda do curso de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Natal, RN

IIIMédico homeopata - professor adjunto IV da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Natal, RN

RESUMO

OBJETIVOS: Avaliar o efeito da suplementação com vitamina A sobre os níveis de retinol no colostro de puérperas atendidas em maternidade pública de Natal-RN, analisando a influência do estado nutricional materno e retinol no colostro na resposta a esta suplementação.

MÉTODOS: Foram coletados 5 ml de sangue em jejum para análise do retinol sérico, e duas amostras de leite, antes e 24h após suplementação. O consumo de vitamina A foi obtido pelo questionário de frequência de consumo. O retinol foi analisado por cromatografia líquida de alta eficiência.

RESULTADOS: O consumo de vitamina A foi 1492,4 ± 1264 µgRAE/dia e 23% tinha consumo provavelmente inadequado. No início (0h) e após 24h da suplementação, os grupos comparativo e suplementado apresentaram concentrações séricas de retinol de 1,3 ± 0,4 e 1,4 ± 0,4 µmol/L (7% de deficiência) e 3,5 ± 1,7 µmol/L e 3,3 ± 1,8 µmol/L (p>0,05) no colostro 0h, respectivamente. No grupo suplementado o retinol aumentou no colostro 24h, com valores de 3,6 ± 1,9 e 6,8 ± 2,6 µmol/L (p<0,0001), respectivamente. Mulheres com níveis deficientes de retinol no colostro 0h (<2,04 µmol/L) transferiram mais retinol ao colostro 24h do que as com níveis adequados (326,1% e 86,5% de aumento, respectivamente).

CONCLUSÃO: A megadose foi eficaz nas primeiras 24h após a suplementação. Os níveis basais de retinol no colostro influenciaram a resposta à suplementação. As parturientes que apresentaram valores baixos de retinol transferiram mais retinol oriundo da megadose ao leite do que as lactantes com níveis suficientes, possivelmente ressaltando a atuação dos mecanismos de transferência de vitamina A propostos na glândula mamária.

Unitermos: Vitamina A. Colostro. Suplementação.

SUMMARY

OBJECTIVE: The aim was to evaluate the effect of supplementary vitamin A upon the colostrum retinol levels in puerperal women cared for at a public maternity hospital in Natal, RN, Brazil. Analysis was conducted on the influence of the colostrum retinol and the maternal nutritional condition as response to supplementation.

METHODS: For analysis of serum retinol 5ml of fasting blood and two samples of milk were collected before and 24 hours after supplementation. A questionnaire was used to define the frequency of previous vitamin A intake. High Efficiency Liquid Chromatography was used to analyze the retinol.

RESULTS: Vitamin A intake was 1492.4 ± 1264 µgRAE/day and 23% probably had an inadequate intale. At the beginning of supplementation, 0 hour, and at 24 hours, the control and supplemented groups presented serum retinol concentrations of 1.3 ± 0.4 and 1.4 ± 0.4 µmol/L (7% deficiency) and 3.5 ± 1.7 µmol/L and 3.3 ± 1.8 µmol/L (p>0.05) at 0 hour colostrum, respectively. Retinol in the 24 hours milk of the supplemented group increased from of 3.6 ± 1.9 and 6.8 ± 2.6 µmol/L (p<0.0001), respectively. Women with deficient levels of retinol in the colostrum at 0 hour(<2.04 mol/L) transferred more retinol to the colostrum at24 hours milk than those with adequate levels (an increase of 326.1% and 86.5%, respectively).

CONCLUSION: The megadose of vitamin A was efficient in the first 24 hours after supplementation. The supplementation response was influenced by the basal levels of retinol in the colostrum. Parturient women with low initial levels of retinol transferred more retinol to the milk, after the megadose, than nursing women with sufficient levels. This possibly confirms the action of the Vitamin A transfer mechanisms proposed by the mammary gland.

Keywords: Vitamin A. Colostrum. Supplementation.

INTRODUÇÃO

A deficiência de vitamina A é um problema de saúde pública que acomete cerca de 127 milhões de crianças em idade pré-escolar e 7 milhões de gestantes1. Como forma de superar os fatores responsáveis por esta deficiência materna e infantil, diversos países em desenvolvimento têm efetuado medidas de intervenção visando à eliminação da carência.

A suplementação materna de vitamina A no pós-parto imediato vem sendo uma intervenção bastante utilizada em áreas de risco para deficiência de vitamina A e vários estudos indicam que essa medida resulta no aumento de retinol no leite materno2-6.

Por desempenhar importantes funções nos períodos de grande proliferação celular, a vitamina A é essencial na gravidez e primeira infância, sendo transferida de dois modos da mãe para o filho: pela placenta durante a gestação e via glândula mamária (leite materno) durante a lactação, sendo esta última altamente benéfica devido aos altos níveis de retinol. Dentro dessas duas rotas, a transferência de vitamina A durante a lactação é cerca de 60 vezes maior durante os seis primeiros meses de vida do que durante toda a gestação7 , uma vez que no infante as reservas hepáticas da vitamina A estão muito limitadas ao nascimento, decorrente de uma tendência à diminuição dos níveis de retinol sérico das gestantes, especialmente no último trimestre da gestação, além da existência de uma barreira seletiva placentária, a qual impede a passagem dessa vitamina para o feto8,9. Assim, em condições ideais de aleitamento, o leite materno é considerado a mais importante fonte de vitamina A para multiplicar as reservas hepáticas do recém-nascido e o grande fator protetor da deficiência de vitamina A até os dois anos de idade, fase de maior vulnerabilidade10.

Por ser o leite materno a principal fonte de vitamina A para o lactente totalmente alimentado ao seio, esta suplementação fornece o micronutriente em quantidades suficientes para formação de reserva hepática nos primeiros meses de vida11. O mecanismo que garante esta transferência de vitamina A materna à glândula mamária é pouco entendido em humanos.

Estudos com modelos animais afirmam que a vitamina A é transferida ao leite tanto ligada a proteína transportadora de retinol (RBP) quanto aos quilomícrons12,13.

Em condições de ingestão basal, cerca de 70% do retinol presente no leite é transferido à glândula mamária via RBP 12. Por outro lado, a contribuição dos quilomícrons aumenta em condições de alta ingestão de vitamina A dietética ou pela suplementação, uma vez que o excesso da vitamina resulta em acréscimo de ésteres de retinil aos quilomícrons, podendo ser transferidos ao leite durante a lipólise dos triacilgliceróis nos tecidos mamários12,14-16.

Os estudos sobre suplementação de vitamina A avaliaram o impacto desta medida no estado nutricional de vitamina A materno e infantil e a influência na morbidade e mortalidade infantil, fazendo pouca referência à variação existente entre os níveis de retinol no leite das mulheres após a megadose. Sabe-se que ocorre um aumento após a suplementação, porém não foi avaliado se este aumento é semelhante em todos os casos ou se existe uma resposta diferenciada.

Portanto, este estudo avaliou o efeito da suplementação com vitamina A sobre os níveis de retinol no colostro de puérperas atendidas em maternidade pública de Natal-RN e se o estado nutricional em vitamina A e características maternas são fatores interferentes na transferência da megadose de vitamina A ao leite, uma vez que esta informação é pouco explorada na literatura.

MÉTODOS

O estudo foi do tipo transversal composto por parturientes voluntárias atendidas na Maternidade Escola Januário Cicco (Natal-RN, Brasil). Entre os meses de novembro de 2005 e julho de 2006, foram recrutadas 91 participantes para o estudo, sendo divididas em grupo comparativo (sem suplementação) e grupo suplementado (com 200.000 UI de vitamina A) para verificar o efeito da suplementação da megadose de vitamina A no leite. O tamanho da amostra foi calculado usando o software Statcalc (Epi-Info version 3.4.3). Considerando uma média de 200 partos por mês, para um nível de confiança de 95%, estimou-se um tamanho de amostra de 47 sujeitos para o grupo teste.

Foram incluídas no estudo apenas mulheres com até 16 horas pós-parto, sem sinais de patologias, com parto a termo, concepto único sem malformação, e ausência de suplementos vitamínicos contendo vitamina A durante a gestação e no pós-parto imediato.

Após assinarem o consentimento livre e esclarecido em consonância com o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (71433 SISNEP), as parturientes foram submetidas a formulário para coleta de dados sobre o pré-natal, parto e história clínica. Algumas informações foram transcritas do cartão de acompanhamento do pré-natal e prontuário hospitalar.

Alguns dados maternos foram obtidos para estudar sua influência na transferência de vitamina A oriunda da megadose para o leite materno. Entre eles a história reprodutiva (número de gestações anteriores), estado nutricional antropométrico materno durante o último trimestre gestacional e estado nutricional materno em vitamina A (retinol no leite colostro, retinol sérico e consumo de vitamina A).

A avaliação do estado nutricional antropométrico baseou-se na coleta de medidas durante a gestação, obtendo-se o Índice de Massa Corporal (IMC) gestacional, por meio da relação de peso e altura com a idade gestacional (IG). Essas medidas foram retiradas do cartão de pré-natal, sendo consideradas as referentes a 36ª semana gestacional. A classificação da adequação de IMC/ IG foi obtida através do gráfico proposto por Atalah et al.17 e as mulheres foram classificadas em baixo peso, eutrofia, sobrepeso e obesidade.

Para diagnosticar o estado nutricional em vitamina A, foram utilizados os indicadores de consumo dietético, níveis de retinol no leite e no soro das participantes.

A informação sobre o consumo dietético de vitamina A foi obtida utilizando o questionário de frequência de consumo alimentar quantitativo (QFCA) correspondente ao último trimestre gestacional, previamente validado com a mesma população 18. A adequação do provável consumo alimentar de vitamina A foi baseada na EAR (Estimated Average Requeriment) para gestantes adultas (550 µgRAE/dia)19.

No período da manhã e após jejum noturno foram coletados 5mL de sangue e leite materno (ordenha manual de única mama, não sugada previamente - leite 0h). A primeira ejeção do leite foi desprezada para evitar flutuações na concentração de retinol. As amostras continham entre 1 mL e 3 mL de leite. Posteriormente foi fornecida uma cápsula de retinol palmitato (200 000 UI) para o grupo suplementado. Passadas 24 horas da suplementação, uma nova coleta de leite colostro foi obtida nos dois grupos (leite 24h). No grupo comparativo, a megadose de vitamina A foi administrada após a coleta do leite 24h.

Para diminuir as variações de retinol em amostras casuais de leite materno, o teor de gordura do colostro foi determinado imediatamente pelo método do crematócrito descrito por Lucas et al20. As amostras foram armazenadas a -20°C para posterior extração do retinol.

As alíquotas de sangue foram centrifugadas por cinco minutos (500xg) e extraídas segundo método descrito por Mayne et al21. A concentração de retinol no soro foi expressa em µmol/L. A deficiência de vitamina A materna foi definida quando encontrada concentrações no soro < 0,7 µmol/L (< 20 µg/dL)22.

A concentração de retinol foi determinada por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) de acordo com adaptação do método utilizado por Giuliano et al23. Etanol 95° (Merck) e hidróxido de potássio a 50% v/v (Vetec) foram utilizados para saponificação, seguida por extração com Hexano (Merck) e evaporação do extrato sob atmosfera de nitrogênio, em banho-maria a 37°C. Em seguida, as amostras foram ressuspendidas em Etanol absoluto (Vetec) e 20µL foram aplicados no aparelho CLAE, em cromatógrafo LC-10 AD Shimadzu, acoplado a um detector SPD-10 A Shimadzu UV-VIS e integrador Chromatopac C-R6A Shimadzu com uma coluna Shim-pack CLC-ODS (M) 4,6mm x 25cm e looping de 20 µL. O cromatograma evolui em eluição isocrática com fase móvel metanol, tempo de retenção de 4,3 minutos em fluxo de 1 mL/min. O teste de recuperação foi realizado com a adição de retinol acetato (Sigma), numa concentração de 0,06 µmol/L diluído em etanol 95% (Vetec). Foi encontrada uma recuperação de 98% do padrão e coeficiente de variação 2,7%.

Os valores de retinolno colostro foram expressos em µmol/L e também em µmol/g de gordura. Valores menores que 2,1 µmol/L para leite colostro24 e < 0,3 µmol/g de gordura foram considerados indicativos de baixa concentração de retinol quando comparados ao leite maduro22.

Foi realizada a determinação quantitativa da Proteína C Reativa (PCR) para verificar se os casos positivos de inflamação influenciavam os níveis séricos de retinol. Utilizou-se o método imunoturbidimétrico com látex (kit comercial Turbitest, Wiener lab.).

Na avaliação estatística foi utilizado o software Statistica 6.0. Foram utilizados o teste T de Student em amostras dependentes e independentes, e Qui quadrado para variáveis categóricas. A relação entre os níveis séricos de retinol e PCR foi avaliada pela correlação de Pearson. As diferenças foram consideradas significativas quando p <0,05.

RESULTADOS

As características gerais das parturientes estudadas encontram-se na Tabela 1 e foram similares entre os grupos (p>0,05 em todos os casos). Pode-se observar que a maioria das mulheres é multípara (mais de dois filhos), teve parto cesárea e apresentou sobrepeso (44%) no último trimestre gestacional.

O consumo médio de vitamina A das parturientes durante a gestação foi 1492,4 ± 1264 µgRAE/dia e 23% tinham ingestão aquém da ideal para esta fase da vida (< EAR = 550 µg/dia). Não houve diferença na ingestão de vitamina A entre os grupos (p >0,05).

Os níveis séricos de retinol apresentaram valores de 1,34 ± 0,38 µmol/L (38,4 ± 10,9 µg/dL), com apenas 7% dos casos com indicação de deficiência (< 0,7 µmol/L). Os grupos comparativo e suplementado tiveram valores de retinol sérico de 1,3 ± 0,4 e 1,4 ± 0,4 µmol/L, respectivamente (35,9 ± 10,6 e 40,6 ± 10,9 µg/dL) (p>0,05). A PCR foi analisada em 62 mulheres (4,4 ± 3,8 mg/dL) e 90% estavam com valores sanguíneos altos, porém não houve influência nos níveis séricos de retinol (p=0,69).

As parturientes apresentaram níveis basais adequados de retinol no colostro 3,5 ± 1,8 µmol/L (100,6 ± 52,6 µg/dL) e 22% delas foram classificadas como deficientes em relação ao leite maduro. Os grupos suplementado e comparativo tinham valores médios de retinol semelhantes no colostro 0h (p=0,39) (Figura 1 A).



Avaliando o efeito imediato da suplementação de vitamina A no leite materno, constatou-se que houve um aumento de retinol no leite colostro após 24h da suplementação (p=0,0001). O mesmo não aconteceu para o grupo comparativo (p=0,29). Os resultados foram semelhantes quando o retinol no colostro foi expresso por grama de gordura (Figura 1 B).

No grupo suplementado, foi possível observar que as parturientes apresentaram diferentes respostas à suplementação e quando estudado os possíveis fatores que poderiam interferir nesta resposta (consumo de vitamina A, paridade, estado nutricional antropométrico, retinol soro e retinol colostro), foi visto que esta variação estava diretamente relacionada com os níveis basais de retinol no colostro (Tabela 2).

DISCUSSÃO

As características das mulheres estudadas foram semelhantes às populações estudadas em Bangladesh3, Tailândia 25, Espanha26, Rio de Janeiro27. Quase metade das entrevistadas teve sobrepeso durante o último trimestre gestacional, concordando com a tendência de aumento do sobrepeso na população brasileira, principalmente entre as mulheres28,29.

Até o final da gravidez, um adequado estado nutricional com relação à ingestão de vitamina A e a uma dieta balanceada são importantes para garantir a transferência de nutrientes para o feto, preparando-o para o nascimento e o período de amamentação. A vitamina A cumpre um papel essencial neste período, uma vez que está intimamente envolvida em processos de grande proliferação e crescimento celular como os da gravidez, lactação e primeira infância30. O consumo médio de vitamina A das parturientes durante a gestação foi adequado e cerca de 23% delas apresentaram provável inadequação dietética (< EAR = 550 µg/dia), refletindo alta prevalência de consumo deficiente.

Neste estudo, o retinol sérico foi um dos indicadores utilizados para diagnóstico do estado de vitamina A das parturientes, sendo encontrado valores de 1,34 ± 0,38 µmol/L (38,4 ± 10,9 µg/dL) com apenas 7% dos casos com indicação de deficiência (< 0,7 µmol/L). Apesar de 90% das mulheres apresentarem PCR positiva, não houve influência nos níveis séricos de retinol (p=0,69) provavelmente pela análise do soro ter sido realizada no pós-parto, situação de trauma cujo PCR eleva-se naturalmente mesmo na ausência de situações inflamatórias31.

A megadose de vitamina A aumentou os níveis de retinol no colostro após 24h da suplementação (p=0,0001). Essa situação é vantajosa, pois os níveis séricos de retinol tendem a declinar após um mês de lactação e o colostro tem papel fundamental na formação inicial dos estoques hepáticos da vitamina A do lactente30,32,33.

Green et al. 12especulam que, durante a lactação, uma grande proporção de vitamina A oriunda de suplementos é direcionada preferivelmente a glândula mamária do que ao fígado. Esta transferência ocorre via quilomícrons (cerca de 60%) e depende do sítio de ligação deles e da lipólise dos triacilglicerídios, por ação da lípase lipoprotéica (LPL) que é responsável pela hidrólise dos ésteres de retinil derivados dos quilomícrons.

O tecido mamário possui a enzima que esterifica o retinol (ACAT)34, sinalizando que a vitamina A transferida durante a lipólise dos lipídios dos quilomícrons pode ser reesterificada para secreção no leite ou ser estocada nas células epiteliais, fato que explica a manutenção de níveis aumentados de vitamina A no leite horas ou dias após a suplementação12,15. A confirmação desta via principal de transporte da vitamina A dietética ou de suplementos ao leite pode ser evidenciada quando concentrações de vitamina A mudam no leite após rápidas mudanças de ingestão, enquanto no sangue permanecem inalteradas12,13,16.

Observando em detalhes o percentual de aumento de retinol no colostro 24 horas após a suplementação, percebe-se uma grande variação interindividual (0 - 500%). Na literatura não existem estudos que avaliem a variação de resposta à suplementação. Na tentativa de elucidar os fatores que poderiam interferir na distinta atuação da suplementação neste grupo, foi investigada a influência de algumas variáveis na resposta à suplementação (Tabela 2).

Apesar do consumo de vitamina A dietética estar relacionada aos níveis de retinol no leite, não foi encontrada esta associação. Akohoue, Green e Green16 afirmam que tal influência pode ser observada por meio de mudanças rápidas na ingestão de vitamina A, e não é detectada com consumo crônico deste nutriente.

O tecido adiposo é um excelente estoque de ésteres de retinil e durante a lactação existe um aumento da sua mobilização35. Meneses e Trugo27 sugerem que a paridade pode influenciar os níveis de retinol no leite quando a lactação prévia proporciona uma alta mobilização das reservas de retinol (influenciada também pela adiposidade materna em multíparas) e alta transferência à glândula mamária. O estado nutricional antropométrico (que reflete a adiposidade materna em casos de sobrepeso/obesidade) e a paridade não influenciaram na resposta à suplementação de vitamina A, provavelmente em virtude destes fatores exercerem influência no retinol do leite apenas em casos de ingestão basal de vitamina A, quando o organismo utiliza os estoques corporais.

Lourenço36 encontrou que mulheres que mantiveram ou reduziram seus níveis de retinol no leite após megadose apresentaram retinol no soro inferior ao das lactantes, que em tese se beneficiaram com a intervenção. Esse achado sugere que em casos de depleção hepática de vitamina A a megadose pode ser utilizada preferencialmente pelo fígado ou por outros tecidos extra-hepáticos. Neste estudo essa relação não foi encontrada, provavelmente pelo adequado nível sérico de retinol no grupo estudado (7% de deficiência).

Dividindo-se em dois grupos o conjunto de mães que tiveram sua resposta à suplementação avaliada, no qual o primeiro diz respeito às puérperas com retinol no colostro adequado (> 2,09 µmol/L) e o segundo representando as mães com níveis deficientes de retinol no colostro (< 2,09 µmol/L), segundo níveis adequados no leite maduro24 , foi possível verificar uma diferença significativa entre o percentual de resposta a suplementação. Mulheres com níveis deficientes de retinol no colostro transferiram mais retinol ao leite 24h do que o outro grupo, encontrando um percentual de resposta equivalente a 326,1% e 86,5% de aumento, respectivamente.

Penniston, Valentine e Tanumihardjo11 encontraram evidências da existência de um limite fisiológico para a quantidade de vitamina A que pode ser transferida ao leite. Tal evento pode ocorrer pela limitação existente da transferência de vitamina A à glândula mamária via quilomícrons, provavelmente pela saturação da atividade da LPL após suplementação com vitamina 37 . Hipotetizando o fato de que mulheres com bom aporte de vitamina A no leite possuem maior atuação da LPL, provavelmente por possuírem um melhor consumo de vitamina A (não diagnosticado por inquéritos alimentares que avaliam a ingestão crônica), após suplementação a transferência de ésteres de retinol para a glândula é limitada, enquanto que no grupo com baixos níveis de retinol no colostro a LPL tem um maior espectro de atuação em relação à situação anterior até determinados níveis de saturação.

CONCLUSÃO

O uso da megadose de vitamina A no pós-parto imediato como medida de intervenção para evitar o desenvolvimento da deficiência conseguiu aumentar os níveis de retinol nas primeiras 24h após a suplementação. Foi visto que esse aumento é mais efetivo em mulheres com níveis baixos de vitamina A no colostro, concordando com os mecanismos propostos para transferência da vitamina A ao leite materno12,13,15.

AGRADECIMENTOS

A Maternidade Escola Januário Cicco pelo suporte oferecido neste trabalho. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo financiamento desta pesquisa.

SUPORTE FINANCEIRO:

Edital MCT CNPq / MS-DAB/SAS - Nº 51/2005

Conflito de interesse: não há

Artigo recebido: 27/08/08

Aceito para publicação: 17/03/09

Trabalho realizado no Departamento de Bioquímica, Centro de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Set 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Recebido
      27 Ago 2008
    • Aceito
      17 Mar 2009
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