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Carcinomas mamários de tipo basal: perfil clínico-patológico e evolutivo

Resumos

OBJETIVO: Investigar a frequência de carcinomas mamários de fenótipo basal em uma série de tumores triplo-negativos (TTN), definidos pela negatividade para receptores de estrógeno (RE), de progesterona (RP) e HER2. MÉTODOS: Selecionamos 140 TTN, obtendo-se características clínico-patológicas e sobrevida. Microarranjo de tecido (2 cilindros de cada tumor) foi construído e submetido à imunoistoquímica para RE, RP, HER2, citoqueratinas (Cks) 5 e 14, EGFR, p63 e p53. Consideramos carcinomas de fenótipo basal os tumores negativos para RE, RP e HER2, e positivos para CK5. RESULTADOS: Encontramos 105 carcinomas de fenótipo basal entre 140 TTN (frequência=75%). A idade média das pacientes foi de 54,8 anos, sendo que 34,3% estavam na pré-menopausa. A maioria dos tumores foi classificada como carcinoma ductal invasor de alto grau. Os TTN exibiram positividade para CK5 (75,0%), CK14 (29%), EGFR (36,4%), p63 (28,6%) e p53 (67,1%). Estadiamento avançado da doença foi observado em 52 pacientes (50%), com diâmetro tumoral maior que 5 cm em 41 casos (39%) e metástases axilares em 61 casos (59,2%). Seguimento clínico foi obtido em 89 pacientes (média=51 meses). Destas, 45 pacientes (50,5%) evoluíram sem doença; 6 (6,7%) estavam vivas com doença e 38 (42,6%) morreram pelo câncer. Recidiva sistêmica ocorreu em 42 pacientes (47,1%), sendo pulmões, cérebro e ossos os principais sítios de metástases. As médias das sobrevidas global e livre de doença foram de 36 e 28 meses, respectivamente. CONCLUSÕES: Nosso estudo confirma comportamento clínico agressivo e elevada frequência dos carcinomas de fenótipo basal entre os TTN, semelhante ao descrito em casuísticas norte-americanas e europeias.

Neoplasias da mama; Tumores triplo-negativos; Fenótipo basal; Imunoistoquímica; Sobrevida


OBJECTIVE: The aim of our study was to investigate basal phenotype in a series of triple-negative (estrogen and progesterone receptors-negative and HER2-negative) invasive mammary carcinomas. METHODS: We selected 140 previously tested triple-negative tumors. Clinical, histopathological and survival data were obtained. A tissue microarray containing 2 cylinders from each tumor was constructed and immunohistochemistry for estrogen receptor (ER), progesterone receptor (PR), HER2, cytokeratins (CK) 5 and 14, EGFR, p63, and p53 was performed. We considered basal like-cancers (BLC) those tumors that were ER/PR/HER2-negative and CK5-positive. RESULTS: We found 105 cases of BLC from 140 triple-negative tumors (frequency=75.0%). The mean age at diagnosis was 54.8 years-old and 34.3% were premenopausal women. The majority of tumors were high grade (83.7%) and of ductal/no-special-type (80.8%). Triple-negative tumors showed immunoreactivity for CK5 (75.0%), CK14 (29.0%), EGFR (28.6%), p63 (28.6%), and p53 (67.1%). Tumor size larger than 5cm was observed in 41 cases (39.0%) and axillary metastases were detected in 61 patients (59.2%). Follow-up was recorded for 89 patients (mean=51 months): 45 patients (50.5%) with no evidence of disease; 6 patients (6.7%) were alive with disease; and 38 patients (42.6%) died of the disease. Relapse was detected in 42 women (47.1%), lungs, brain, and bones being the most common sites of metastasis. The mean overall survival was 36 months and the mean disease-free interval was 28 months. CONCLUSION: Our findings confirmed that BLC are poor prognosis and highly-frequent carcinomas among triple-negative tumors, similar to data previously reported in North American and European patients.

Breast neoplasms; Triple-negative tumors; Basal-like breast cancers; Immunohistochemistry; Survival


ARTIGO ORIGINAL

Carcinomas mamários de tipo basal: perfil clínico-patológico e evolutivo

Marina De BrotI; Fernando Augusto SoaresII; Mônica Maria Ágata StiepcichIII; Vinícius S. CúrcioIV; Helenice GobbiV, * * Correspondência: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Departamento de Anatomia Patológica e Medicina Legal. Av. Alfredo Balena, 190 - sala 305 - Belo Horizonte - MG - 30130-100. Telefone: (31)34099118 - Fax: (31)34099664. hgobbi@medicina.ufmg.br; helenicegobbi@gmail.com

IProfessora de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG e Patologista do Laboratório de Anatomia Patológica e Citopatologia Pittella & Andrade, Belo Horizonte, MG

IIProfessor titular da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo - FMUSP e Diretor do Departamento de Anatomia Patológica do Hospital do Câncer A.C. Camargo, São Paulo, SP

IIIPatologista do Instituto Fleury, São Paulo, SP

IVBolsista do Programa de Iniciação Científica do CNPq e aluno do curso de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Belo Horizonte, MG

VProfessora Associada da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Belo Horizonte, MG

RESUMO

OBJETIVO: Investigar a frequência de carcinomas mamários de fenótipo basal em uma série de tumores triplo-negativos (TTN), definidos pela negatividade para receptores de estrógeno (RE), de progesterona (RP) e HER2.

MÉTODOS: Selecionamos 140 TTN, obtendo-se características clínico-patológicas e sobrevida. Microarranjo de tecido (2 cilindros de cada tumor) foi construído e submetido à imunoistoquímica para RE, RP, HER2, citoqueratinas (Cks) 5 e 14, EGFR, p63 e p53. Consideramos carcinomas de fenótipo basal os tumores negativos para RE, RP e HER2, e positivos para CK5.

RESULTADOS: Encontramos 105 carcinomas de fenótipo basal entre 140 TTN (frequência=75%). A idade média das pacientes foi de 54,8 anos, sendo que 34,3% estavam na pré-menopausa. A maioria dos tumores foi classificada como carcinoma ductal invasor de alto grau. Os TTN exibiram positividade para CK5 (75,0%), CK14 (29%), EGFR (36,4%), p63 (28,6%) e p53 (67,1%). Estadiamento avançado da doença foi observado em 52 pacientes (50%), com diâmetro tumoral maior que 5 cm em 41 casos (39%) e metástases axilares em 61 casos (59,2%). Seguimento clínico foi obtido em 89 pacientes (média=51 meses). Destas, 45 pacientes (50,5%) evoluíram sem doença; 6 (6,7%) estavam vivas com doença e 38 (42,6%) morreram pelo câncer. Recidiva sistêmica ocorreu em 42 pacientes (47,1%), sendo pulmões, cérebro e ossos os principais sítios de metástases. As médias das sobrevidas global e livre de doença foram de 36 e 28 meses, respectivamente.

CONCLUSÕES: Nosso estudo confirma comportamento clínico agressivo e elevada frequência dos carcinomas de fenótipo basal entre os TTN, semelhante ao descrito em casuísticas norte-americanas e europeias.

Unitermos: Neoplasias da mama. Tumores triplo-negativos. Fenótipo basal. Imunoistoquímica. Sobrevida.

INTRODUÇÃO

Os carcinomas mamários representam um grupo heterogêneo de tumores que diferem no comportamento, evolução e resposta ao tratamento1. Tumores com a mesma classificação histológica podem ter aspectos moleculares e evolução biológica variados. A heterogeneidade molecular dos tumores mamários, não avaliável morfologicamente, é um importante desafio ao estudo e tratamento do câncer de mama2. Pesquisas recentes utilizando perfis de expressão gênica, com o emprego de microarranjos de DNA e, posteriormente, perfis imunoistoquímicos empregando microarranjos de tecido, permitiram identificar novas categorias de tumores e desenvolver novo esquema de classificação molecular dos carcinomas mamários associados a diferentes cursos clínicos3,5: luminal A (positivos para receptores de estrógeno, RE, e para receptores de progesterona, RP; e negativos para HER2); luminal B (RE+; PR+; HER2+); tumores com superexpressão de HER2 (RE-; RP-; HER2+); tipo basal (triplo-negativos; RE-, RP-, HER2-; e positivos para citoqueratinas basais); não classificável (tumores com negatividade para todos estes marcadores).

Os carcinomas de tipo ou fenótipo basal, como descrito acima, são neoplasias que não expressam receptores hormonais e a proteína do oncogene HER2 (receptor do fator de crescimento epidérmico tipo 2), sendo por isto referidos como tumores triplo-negativos (TTN) 6,7. Por outro lado, expressam citoqueratinas (CKs) basais (CK5/6, CK14 e CK17), de forma semelhante ao que se observa nas células mioepiteliais da mama normal. Outros marcadores mioepiteliais, como p63 e P-caderina, também foram demonstrados nos tumores de fenótipo basal, permitindo a sua identificação por meio de um perfil imunoistoquímico definido8,9,10,11. Além da expressão de CKs basais, também foi descrita nos tumores de tipo basal positividade para o receptor do fator de crescimento epidérmico tipo 1 (HER1 ou EGFR)9, BRCA111 e caveolina12. A expressão de HER1 foi identificada em 54% dos casos CK5/6-positivos (e em 11% dos casos CK5/6-negativos)9, representando um potencial alvo para o tratamento destes carcinomas de mama, por meio de fármacos antagonistas, como o cetuximab, gefitinib, erlotinib, e mais recentemente o lapatinib13. Por outro lado, a positividade para BRCA1 em carcinomas de tipo basal, além de estar associada a pior prognóstico pela sua função no reparo de alterações no DNA, é fator preditivo de resposta à quimioterapia11,14.

Atualmente não há consenso internacional determinando quais marcadores imunoistoquímicos devem ser empregados para melhor identificar os tumores de tipo basal. Entretanto, a maioria dos autores define carcinomas de fenótipo basal como tumores negativos para RE, RP e HER2 que expressam pelo menos uma das Cks basais (CK5, CK14 ou CK17) 27 .

Morfologicamente, carcinomas de fenótipo basal apresentam predominantemente alto grau histológico, elevada atividade proliferativa e mais frequentemente exibem elementos medulares e metaplásicos15,16,17. Além disso, afetam preferencialmente mulheres jovens afro-americanas18 e estão associados a pior prognóstico, com maior incidência de metástases hematogênicas para pulmões e cérebro4,7,19,20,21. A frequência de carcinomas de tipo basal, identificados através de estudos de perfis de expressão gênica e imunoistoquímica em grandes séries de pacientes, varia de 7 a 19% dos tumores de mama3,5,9.

Há raros estudos com casuísticas brasileiras avaliando a frequência de carcinomas mamários de tipo basal, assim como a expressão de diferentes marcadores nestes tumores e a evolução clínica das pacientes8.

Este trabalho objetiva analisar a frequência de carcinomas de fenótipo basal em uma série de casos de tumores triplo-negativos, estudando as características clínicas, anatomopatológicas, imunofenotípicas e evolutivas.

MÉTODOS

Selecionamos para este estudo 140 casos de pacientes submetidas a tratamento cirúrgico (mastectomia; quadrantectomia; setorectomia ou tumorectomia) no período de 1985 a 2006, e cujos laudos imunoistoquímicos revelaram negatividade para receptores hormonais (RE e RP) e HER2 (tumores triplo-negativos). Para inclusão neste trabalho, os casos preencheram os seguintes requisitos: ter diagnóstico histológico original de carcinoma mamário invasor; ter testes imunoistoquímicos prévios revelando negatividade para RE, RP e HER2; ter disponibilidade de lâminas e blocos do tumor para reavaliação histológica e novo estudo imunoistoquímico.

Estudos clínico e anatomopatológico

Os dados clínicos e histopatológicos dos laudos originais foram obtidos a partir de arquivos médicos. A avaliação incluiu: idade ao diagnóstico inicial; raça informada; período reprodutivo (pré ou pós-menopausa); história familiar para câncer de mama; tratamentos complementares; tempo de seguimento clínico; ocorrência de recidivas; tipo e grau histológicos do tumor primário; tamanho do tumor; status linfonodal e estadiamento anatomopatológico.

As lâminas originais coradas pelos métodos da hematoxilina-eosina (HE) foram revistas pelo mesmo patologista (MDBA), reavaliando-se tipo e grau histológicos dos tumores. Para a classificação histológica dos tumores, foram empregadas as recomendações de PAGE et al.(1998) e do Colégio Americano de Patologistas (2000)22. Para a avaliação do grau tumoral, utilizamos o Sistema de Nottinghan23.

Estudo imunoistoquímico

Microarranjo de tecido ("tissue microarray" - TMA) foi construído retirando-se cilindros (1mm de diâmetro) a partir de blocos de parafina dos casos selecionados , após marcação, nas lâminas originais, de uma ou duas áreas mais representativas e mais preservadas de cada tumor, de forma que o TMA obtido contivesse duas amostras de cada neoplasia. Para a montagem do TMA utilizou-se um equipamento manual da marca Beecher Instruments®.

Lâminas contendo cortes histológicos sequenciais do TMA foram coradas para RE, RP e HER2 para confirmação do diagnóstico de triplo-negativo. Em lâminas sequenciais (duas lâminas para cada anticorpo, contendo cilindros em duplicata), foram ainda aplicados anticorpos dirigidos aos marcadores de diferenciação basal (CK5 e CK14), além de outros marcadores, como EGFR, p63 e p53 (Tabela 1). O sistema de visualização da reação foi o sistema de amplificação de polímero não biotinilado (Novolink®, Biosystems, UK). A análise dos marcadores moleculares seguiu critérios referidos na literatura7,24,25 e os valores de corte empregados encontram-se na Tabela 1.

Análise estatística

Para analisar a frequência do fenótipo basal e as variáveis clínicas e moleculares foram utilizados os programas Epi-Info® (versão 6.0) e MINITAB 14, aplicando-se os testes exato de Fisher ou o teste do Qui quadrado.

Para análise de sobrevida foi utilizado o método de Kaplan-Meier, construindo-se curvas de sobrevida que foram comparadas por meio dos testes de Log-rank e Wilcoxon. Para a análise univariada comparou-se cada variável com a sobrevida das pacientes, sendo incluídos idade, cor, história familiar, status menopausal, comprometimento de linfonodos axilares, estadiamento anatomopatológico (que inclui tamanho do tumor e metástases) e expressão de marcadores do fenótipo basal. Aquelas variáveis que mostraram diferença estatisticamente significativa foram incluídas na análise multivariada empregando-se o modelo de regressão de Cox (software R). Após todos os passos do processo de seleção, foi obtido o modelo final composto pelas covariáveis: estadiamento anatomopatológico e expressão do marcador CK5.

RESULTADOS

Foram identificados 140 casos de carcinomas mamários invasores triplo-negativos (negativos para RE, RP e HER2) dentre 2.235 tumores submetidos a imunoistoquímica no período analisado (6,3%). A frequência de carcinomas mamários de fenótipo basal foi de 105/140 tumores triplo-negativos (75%). A idade média das pacientes com carcinomas de fenótipo basal, ao diagnóstico inicial, foi de 54,8 anos (variação: 32-86 anos). Detectou-se história familiar positiva para câncer de mama em 27 de 103 pacientes (26,2%), com relato de doença em uma (20,4%) ou mais de uma (5,8%) parente de primeiro grau. A porcentagem de mulheres na pré-menopausa foi de 34,3% (35/102 pacientes), sendo que 7,8% (8/102) delas tinham idade abaixo de 35 anos. Quanto à cor da pele informada, 70/104 pacientes (67,3%) eram referidas como brancas, 5/104 pacientes (4,8%) como negras, 25/104 pacientes (24%) como pardas e 3/104 (2,9%) como de origem asiática.

Características clínico-patológicas e imunoistoquímicas dos casos de carcinomas de fenótipo basal

A maioria dos tumores foi classificada como carcinoma ductal invasor sem outra especificação (SOE), representando 80,8% dos casos (84/104 casos). Identificou-se extenso componente de carcinoma ductal in situ (mais de 25% do tumor) em 4/84 casos. Foram considerados carcinomas de tipo especial puro 7,7% (8/104) dos tumores, e tipo especial variante, 11,5% (12/104) dos casos. O tipo especial puro mais frequente foi o carcinoma metaplásico (5/104; 4,8%), seguido pelos carcinomas apócrino (2/104; 1,9%) e papilífero (2/104; 1,9%). Dentre os carcinomas de tipo especial variante, o mais comumente observado foi o carcinoma medular atípico (medular variante), representando 3,8% (4/104) dos tumores. Em relação ao grau histológico, foram considerados de alto grau (grau III) 87 de 104 tumores (83,7%) e de grau moderado (grau II) 14 de 104 tumores (13,5%). A maioria deles apresentou baixa formação tubular (97/104; 93,3%), alto grau nuclear (89/104; 85,6%) e índice mitótico moderado (52/104; 50%). Elevada taxa mitótica foi detectada em 42,3% (44/104) das neoplasias.

Os resultados do perfil imunoistoquímico dos tumores triplo-negativos estão resumidos na Tabela 2.

Os carcinomas de tipo basal exibiram positividade para CK14 em 41/105 (39,0%) e para EGFR em 43/105 (41,0%) tumores. Em todos os casos positivos para CK14 coexistiu positividade para CK5. Observou-se ainda imunomarcação para p63 em 34,3% (36/105 casos) e para p53 em 71,4% (75/105 casos) dos tumores positivos para CK5.

Estadiamento anatomopatológico avançado da doença (3A, 3B, 3C e 4) foi observado em 50,0% das pacientes (52/104). A dimensão tumoral era maior que 5 cm em 39% (41/104) dos casos. Identificou-se status linfonodal positivo em 59,2% (61/103) das mulheres. Os principais tipos de tratamento adjuvante administrados foram: quimioterapia (8%), radioterapia (7%), ou ambos (52%).

Seguimento, evolução clínica e sítios de metástases

Seguimento clínico foi obtido em 89 de 105 pacientes (84,8%), com média de tempo de seguimento de 51 meses (variação de 12 a 148 meses). No grupo de pacientes com seguimento, 50,5% (45/89 casos) evoluíram sem evidência de doença até o término do acompanhamento, enquanto 6/89 pacientes (6,7%) estavam vivas, porém com manifestações do câncer. Dentre as 89 mulheres com seguimento clínico, 38 morreram em decorrência da doença (42,6%). Recidiva sistêmica foi documentada em 47,1% (42/89) das pacientes, sendo pulmões, cérebro e ossos os principais sítios de metástases hematogênicas, com taxas de 53,4%, 19,3% e 19,4%, respectivamente. Outros locais de metástases foram fígado (Três casos; 7,2%), pleura (Três casos; 7,2%) e mediastino (Dois casos; 4,7%). Observou-se recidiva local em oito casos (19,4%).

A sobrevida global (SG) das pacientes variou de 3 a 145 meses, com sobrevida mediana de 28 meses. Identificou-se pior sobrevida global nas pacientes com TTN basais, em comparação àquelas com tumores TTN não basais (Figura 1A). Após testes de Log-rank e Wilcoxson, verificou-se que a diferença nas curvas do tempo de sobrevida não foi estatisticamente significativa. Quanto à sobrevida livre de doença (SLD), foi observada sobevida mediana de 20 meses, sendo que em nove casos (15%) identificou-se doença disseminada no momento do diagnóstico inicial. O tempo máximo de SLD foi de 119 meses. Também não identificamos diferença estatisticamente significativa quanto à SLD entre o grupo de pacientes com TTN basais e não basais (Figura 1B).


Após análise multivariada, a qual incluiu as covariáveis estatisticamente significantes na análise univariada (estadiamento anatomopatológico e expressão de CK5), observou-se que a marcação para CK5 definidora do fenótipo basal, estava relacionada a risco de morte 2,4 vezes maior (p=0,06), ou seja, o risco de morte de pacientes com tumores positivos para CK5, foi aproximadamente 2,4 vezes o risco daquelas que apresentaram tumores negativos para CK5(RR=2,433; p=0,06; IC95% 0,157-1,070).

Características clínico-patológicas dos tumores de fenótipo basal nas pacientes pré-menopausa

No grupo das mulheres na pré-menopausa, notou-se maior frequência dos carcinomas com diferenciação basal entre os tumores triplo-negativos (79,5%; 35/44 casos). Houve relato de história familiar positiva em 32,4% (11/34) das pacientes. Carcinoma ductal invasor SOE também foi o tipo histológico predominante, representando 94,3% dos casos e exibindo alto grau histológico em 91,4% dos tumores. Identificou-se doença avançada (estadio maior que 3) em 52,9% (18/34) das pacientes, com status linfonodal positivo em 73,5% (25/34) dos casos. Seguimento clínico foi obtido para todas as pacientes do referido período reprodutivo, sendo que 45,7% (16/35) permaneciam vivas e sem evidência de doença até o término do seguimento; 8,6% (3/35 casos) estavam vivas com manifestações da doença e 45,7% (16/35 casos) morreram em decorrência do câncer. Documentou-se recidiva em 18/35 casos (51,4%), com mediana de SLD de 20 meses. A SG variou de 3 a 123 meses (mediana=23 meses).

DISCUSSÃO

Em nosso trabalho, observou-se frequência inferior dos tumores triplo-negativos (6,3%), em comparação com o relatado em casuísticas estrangeiras (26%;16,3%) 7,18. É possível que a menor frequência que encontramos seja devida ao critério de negatividade que adotamos para os tumores triplo-negativos (<ou= 1% de células neoplásicas marcadas), mais indicado atualmente24.

A terminologia e definição (morfológica e imunofenotípica) dos carcinomas de tipo basal permanece controversa, tendo evoluído a partir dos trabalhos iniciais de Sorlie et al.4,5. Painel imunoistoquímico de quatro anticorpos (RE, HER2, HER1 e CK5/6) foi inicialmente proposto por Nielsen et al.9, porém ainda não há correlação exata com os perfis genéticos determinados através de microarranjos de DNA. Estudos europeus mais recentes propõem utilizar a expressão de citoqueratinas basais (CK5/6 e/ou CK14) como o elemento definidor do fenótipo basal10,19,26. Devido à atual ausência de consenso internacional27, optamos por empregar o critério recentemente proposto por Rakha et al. 10, que definiu a identificação dos carcinomas com diferenciação basal a partir da expressão de CK5/6 e/ou CK14. Encontramos alta frequência de carcinomas de fenótipo basal dentre os tumores triplo-negativos (105/140 tumores;75%), superior à encontrada por Rakha et al.7, que identificaram fenótipo basal em 157/282 tumores triplo-negativos (55,7%).

Em nossa série, a maioria dos tumores basais foi positiva para CK5, expressa em 75% (105/140) dos tumores triplo-negativos. A CK14, além de estar expressa em apenas 29,3% (41/140) dos casos, não identificou nenhum tumor que tenha sido negativo para CK5. Foi elevada a frequência de expressão de p53, identificada em 67,1% (94/140 casos) dos carcinomas triplo-negativos e em 71,4% (75/105 casos) dos tumores com diferenciação basal, semelhante ao já descrito na literatura7,9. A imunorreatividade para EGFR e p63 obtida em nossa casuística também foi semelhante à descrita em outros trabalhos, tendo sido observada em 36,4% (51/140 casos) e 28,6% (40/140) dos tumores triplo-negativos, respectivamente. Em apenas cinco casos houve positividade para p63 e negatividade para as citoqueratinas basais.

Nossos resultados confirmam que os carcinomas de fenótipo basal em mulheres brasileiras têm características morfológicas, clínicas e evolutivas semelhantes ao descrito em casuísticas europeias e norte-americanas. Estes tumores são predominantemente carcinomas ductais invasores de alto grau histológico e atividade proliferativa moderada a elevada, com doença avançada no momento do diagnóstico em grande proporção das pacientes (50%)9. Dentre os tipos especiais puros e variantes, nossos achados também estão de acordo com a literatura internacional, que relata associação dos carcinomas metaplásicos e medulares com o fenótipo basal15,16,17.

Observamos alto indíce de metástases sistêmicas (47,1%), com maior frequência para pulmões, cérebro e ossos, do que para fígado. Em contraposição ao achado de outras casuísticas18,19, detectamos também alta taxa de metástases axilares, identificada em 59,2% dos nossos casos.

Embora tenhamos detectado maior frequência dos carcinomas de fenótipo basal no grupo de mulheres na pré-menopausa (79,5%), esta diferença não foi estatisticamente significativa (p=0,49), assim como os demais parâmetros analisados.

Observamos ainda que o risco de morte para as pacientes com tumores basais foi 2,4 vezes maior que o daquelas com tumores não-basais (RR=2,43; p=0,06; IC95% 0,157-1,070). Embora a diferença não tenha sido estatisticamente significativa (p=0,06), este dado pode ter relevância particularmente no contexto de tumores triplo-negativos, já que em sua grande maioria correspondem a carcinomas ductais invasores de alto grau histológico. É então essencial a pesquisa de outros fatores prognósticos, além da classificação e graduação histológicas, neste grupo de tumores. Como adotamos a positividade para CK5 como elemento definidor do fenótipo basal, este resultado aponta o marcador como um possível indicador de pior prognóstico nas pacientes com tumores triplo-negativos, um grupo que ainda não dispõe de terapêutica específica e que apresenta pior resposta às alternativas convencionais de tratamento. Nossos resultados portanto corroboram estudos prévios, que ressaltam a importância de se identificar a diferenciação basal nos tumores triplo-negativos20,21.

CONCLUSÃO

Nosso estudo confirma que os carcinomas de tipo basal são muito frequentes entre os tumores triplo-negativos, têm alto grau histológico e comportamento clínico agressivo, semelhante ao descrito em séries de pacientes norte-americanas e europeias.

SUPORTE FINANCEIRO

CNPQ, CAPES, FAPEMIG

Conflito de interesse: não há

Artigo recebido: 22/04/08

Aceito para publicação: 04/06/09

Trabalho realizado no Laboratório de Patologia Mamária, Departamento de Anatomia Patológica e Medicina Legal, Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Belo Horizonte, MG

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Recebido
      22 Abr 2008
    • Aceito
      04 Jun 2009
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