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Apresentação

DOSSIÊ EMPRESARIADO, ECONOMIA E POLÍTICA

Apresentação

Paulo Roberto Neves Costa

Em 1995, a RSP publicou o Dossiê Burguesia e Política. Na oportunidade, ouvimos um comentário informal, mas incisivo, dizendo que se tratava de duas coisas que não mais existiam. O que haveria de agudo no comentário é que as formas concretas que "burguesia" e "política" haviam assumido, em especial no Brasil, não permitiriam mais análises sociológicas contundentes, a não ser que se remetessem ao passado. O dossiê "Empresariado, política e economia", que agora apresentamos, não pretende refutar a idéia de que ambos os fenômenos passaram por profundas alterações nas sociedades contemporâneas, mas exatamente indicar, a partir do conteúdo dos textos que o compõem, que não apenas estamos diante de coisas que existem, mas que merecem cada vez mais a atenção dos cientistas sociais e daqueles que pensam a realidade brasileira e seu futuro. Quando recorremos aos textos que compõem este dossiê, observamos que nomes já consolidados na análise sobre os processos que marcam a nossa história estão ao lado de jovens pesquisadores, articulando importantes questões de natureza teórica e, ao mesmo tempo, se reportando a processos conjunturais candentes. Enfim, trata-se de tema muito vivo, na análise sociológica e na política brasileira de nossos dias.

No âmbito teórico, são trabalhados temas que remetem à relação entre burocracia, política e democracia, às classes e frações de classe dominantes, à ação coletiva de classe, ao papel do Estado na economia, à questão da representação política e às relações entre Estado e Sociedade nas democracias, que é, de resto, a mesma agenda de pesquisa que supostamente teria desaparecido.

No que tange ao contexto político brasileiro, entre as questões presentes estão o governo Lula, o papel dos agentes burocráticos e dos grupos sociais na definição da política econômica e das instituições democráticas, a situação do país na política e no mercado internacional e as implicações da relação entre empresariado e política na atual conjuntura. Certamente, há diversos outros trabalhos, autores e temas que poderiam constar deste dossiê e esperamos que ele sirva também como um convite ao debate, neste ou em outro espaço editorial.

Seguindo a linha editorial da RSP, os artigos que compõem este dossiê têm em comum, na sua diversidade, a contribuição para que este assunto permaneça vivo na agenda da pesquisa sociológica e nos principais espaços e eventos acadêmicos e, também, para a reflexão sobre o processo político contemporâneo no Brasil, indicando a importância da mobilização de variáveis societais na análise da política, para além das variáveis estritamente institucionais. Os trabalhos aqui apresentados valem também para que se considere que a consolidação desta agenda exige a realização de novas pesquisas — por exemplo, faltam ainda estudos sociológicos sobre a ação das empreiteiras, das empresas de comunicação, das empresas de transporte etc. —, a continuidade da preocupação com as questões candentes do momento atual de nossa história, mas, sobretudo, o tratamento em profundidade dos problemas teóricos subjacentes, de forma articulada às grandes questões fundamentais do pensamento sociológico.

Apenas para aguçar o interesse do leitor, em relação ao conteúdo dos textos que compõem este dossiê, podemos dizer o seguinte: Luiz Carlos Bresser-Pereira analisa o papel da "burocracia pública", enquanto parte da "classe dirigente", indicando a presença importante da burguesia industrial nos acordos que sustentaram o desenvolvimento econômico industrializante, a volta do prestígio da burocracia pública como agente fundamental do processo político, o fracasso da "ortodoxia convencional", a presença dos empresários industriais na construção um "novo desenvolvimentismo" e o avanço de uma forma mais participativa de democracia. Ary Minella analisa o sistema financeiro de uma perspectiva sociopolítica, voltada para a organização e a atuação corporativa das entidades de representação deste setor na América Latina. Utilizando a análise de redes sociais, Minella conclui que grande parte da estrutura de representação do empresariado financeiro encontra-se "transnacionalizada". Armando Boito se propõe a recuperar uma tradição da Sociologia e da Ciência Política no Brasil no estudo dos interesses das frações da burguesia brasileira, defendendo que a ocorrência de uma nova onda de internacionalização do capitalismo dependente no país não impediu que um setor da grande burguesia consolidasse sua posição no bloco no poder ao longo da década de 2000. Wagner Iglécias se destaca por tratar de setor da agricultura, ainda pouco estudado, em especial nas suas formas modernas, o agronegócio, e suas implicações nos processos que marcam o capitalismo no Brasil de nossos dias, o qual, em articulação com as ações do Governo, estão relacionadas à expansão da participação do comércio mundial e a redefinição das formas de regulação. Paulo Roberto Neves Costa apresenta os resultados de pesquisa que procurou aferir as percepções e avaliações dos presidentes de algumas entidades de representação do empresariado brasileiro acerca da democracia e das instituições democráticas, e da reforma política, propondo a busca de ganhos analíticos a partir da consideração da relação entre empresariado e as instituições do regime democrático. Álvaro Bianchi cumpre um importante papel ao debater sobre a questão teórica da ação coletiva do empresariado, o que é fundamental tanto para o aprofundamento das pesquisas empíricas sobre o empresariado, quanto para o diálogo acima mencionado com as grandes questões da análise sociológica. Por fim, o artigo de Wagner Mancuso foi deliberadamente colocado como encerramento do dossiê por três motivos: faz um balanço crítico da literatura sobre a questão do empresariado enquanto ator político e da sua força nos processos de definição dos rumos da economia, propõe novas frentes para a pesquisa sobre o assunto, enfatizando a importância deste campo de estudo e da continuidade de seu desenvolvimento e, responde de outra forma à provocação citada no início desta apresentação, em relação ao tema tratado aqui: "nosso campo de estudos possui uma história respeitável, e hoje continua bem vivo, em expansão!".

Recebido em 15 de março de 2007

Aprovado em 1º de junho de 2007

Paulo Roberto Neves Costa (paulocosta@ufpr.br) é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Professor de Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR), coordenador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira da mesma instituição e Editor-Chefe da Revista de Sociologia e Política.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Maio 2008
  • Data do Fascículo
    Jun 2007
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