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Individualismo metodológico, racionalidade e ação instrumental: a proposta cognitiva de Raymond Boudon

L'individualisme methodologique, la rationalite et l'action instrumentale: la proposition cognitive de Raymond Boudon

Methodological individualism, rationality and instrumental action: Raymond Boudon's cognitive proposal

Resumos

O artigo analisa as proposições teóricas do individualismo metodológico de Raymond Boudon, que procura desvincular-se de perspectivas que ressaltam a concepção de racionalidade instrumental, como o entendimento da escolha racional. As diferenças entre a conduta instrumental e a idéia de racionalidade cognitiva propostas pelo sociólogo envolvem temas centrais da reflexão social atual, principalmente possíveis vínculos problemáticos entre a tradição sociológica e certa ontologia econômica. Para mostrar a particularidade do individualismo metodológico de Boudon e sua noção de racionalidade cognitiva, exponho, primeiramente, as suas principais críticas ao paradigma instrumental. Posteriormente, debato as alternativas sugeridas por Boudon, principalmente a idéia de que os agentes incorporam crenças ou teorias simplesmente porque têm "boas razões" e a sua noção de uma "racionalização difusa". Finalmente, procuro analisar de que forma a teoria do autor francês aponta falhas da visão economicista de racionalidade, embora apresente algumas proposições imprecisas. Assim, ao mesmo tempo em que assinala importante falta de conexão entre a agência individual e o contexto social na teoria da escolha racional, Boudon elabora uma concepção universalista de racionalidade que parece não observar fundamentos circunstanciais e delimitados da realidade social.

teoria social; individualismo metodológico; racionalidade; ação instrumental


L'article analyse les propositions théoriques de l'individualisme méthodologique de Raymond Boudon, qui cherche à s'extirper des perspectives qui mettent l'accent sur la conception de "rationalité instrumentale", comme la compréhension du choix rationnel. Les différences entre la conduite instrumentale et l'idée de rationalité cognitive proposées par le sociologue, impliquent des thèmes centraux de la réflexion sociale actuelle, principalement des possibles liaisons problématiques entre la tradition sociologique et certaine ontologie économique. Pour montrer la particularité de l'individualisme méthodologique de Boudon et sa notion de rationalité cognitive, j'expose premièrement ses principales critiques au paradigme instrumental. Ultérieurement, je discute les alternatives suggérées par Boudon, principalement l'idée que les agents intègrent des croyances ou des théories simplement parce qu'ils ont "des bonnes raisons", et leur notion d'une "rationalisation diffuse". Finalement, je cherche analyser de quelle façon la théorie de l'auteur français pointe des failles de la vision économiste de rationalité, bien qu'il présente quelques propositions inexactes. Ainsi, au même temps qu'il signale un manque important de connexion entre l'agence individuelle et le contexte social dans la théorie du choix rationnel, Boudon élabore une conception universaliste de rationalité qui ne semble pas observer les fondements de circonstance et aussi délimités de la réalité sociale.

Théorie Sociale; individualisme méthodologique; rationalité; action instrumentale


This article analyzes the theoretical propositions of Raymond Boudon's methodological individualism, which seeks to disassociate itself from perspectives that emphasize the notion of instrumental rationality such as understandings of rational choice. Differences between instrumental conduct and the idea of cognitive rationality proposed by this sociologist hark back to central themes of contemporary social reflection, most specifically the possibly problematic ties between the sociological tradition and a certain economic ontology. To reveal the particularities of Boudon's methodological individualism as well as his notion of cognitive rationality, I first expound on his major critiques of the instrumental paradigm. I then go on to debate the alternatives he suggests, particularly the notion that agents incorporate beliefs or theories simply because they have "good reasons" to do so, as well as his notion of "diffuse rationalization". Finally I seek to analyze the way in which this French author's theory points to flaws in the economistic view of rationality, although presenting some propositions that are lacking in precision. Thus, while he signals the important lack of connection between individual agency and social context that inheres within rational choice theory, Boudon elaborates a universalist conception of rationality that seems to overlook the circumstantial and defined bases of social reality.

Social Theory; methodological individualism; rationality; instrumental action


ARTIGOS

Individualismo metodológico, racionalidade e ação instrumental: a proposta cognitiva de Raymond Boudon

Methodological individualism, rationality and instrumental action: Raymond Boudon's cognitive proposal

L'individualisme methodologique, la rationalite et l'action instrumentale: la proposition cognitive de Raymond Boudon

Bruno Sciberras de Carvalho

RESUMO

O artigo analisa as proposições teóricas do individualismo metodológico de Raymond Boudon, que procura desvincular-se de perspectivas que ressaltam a concepção de racionalidade instrumental, como o entendimento da escolha racional. As diferenças entre a conduta instrumental e a idéia de racionalidade cognitiva propostas pelo sociólogo envolvem temas centrais da reflexão social atual, principalmente possíveis vínculos problemáticos entre a tradição sociológica e certa ontologia econômica. Para mostrar a particularidade do individualismo metodológico de Boudon e sua noção de racionalidade cognitiva, exponho, primeiramente, as suas principais críticas ao paradigma instrumental. Posteriormente, debato as alternativas sugeridas por Boudon, principalmente a idéia de que os agentes incorporam crenças ou teorias simplesmente porque têm "boas razões" e a sua noção de uma "racionalização difusa". Finalmente, procuro analisar de que forma a teoria do autor francês aponta falhas da visão economicista de racionalidade, embora apresente algumas proposições imprecisas. Assim, ao mesmo tempo em que assinala importante falta de conexão entre a agência individual e o contexto social na teoria da escolha racional, Boudon elabora uma concepção universalista de racionalidade que parece não observar fundamentos circunstanciais e delimitados da realidade social.

Palavras-chave: teoria social; individualismo metodológico; racionalidade; ação instrumental.

ABSTRACT

This article analyzes the theoretical propositions of Raymond Boudon's methodological individualism, which seeks to disassociate itself from perspectives that emphasize the notion of instrumental rationality such as understandings of rational choice. Differences between instrumental conduct and the idea of cognitive rationality proposed by this sociologist hark back to central themes of contemporary social reflection, most specifically the possibly problematic ties between the sociological tradition and a certain economic ontology. To reveal the particularities of Boudon's methodological individualism as well as his notion of cognitive rationality, I first expound on his major critiques of the instrumental paradigm. I then go on to debate the alternatives he suggests, particularly the notion that agents incorporate beliefs or theories simply because they have "good reasons" to do so, as well as his notion of "diffuse rationalization". Finally I seek to analyze the way in which this French author's theory points to flaws in the economistic view of rationality, although presenting some propositions that are lacking in precision. Thus, while he signals the important lack of connection between individual agency and social context that inheres within rational choice theory, Boudon elaborates a universalist conception of rationality that seems to overlook the circumstantial and defined bases of social reality.

Keywords: Social Theory; methodological individualism; rationality; instrumental action.

RESUME

L'article analyse les propositions théoriques de l'individualisme méthodologique de Raymond Boudon, qui cherche à s'extirper des perspectives qui mettent l'accent sur la conception de "rationalité instrumentale", comme la compréhension du choix rationnel. Les différences entre la conduite instrumentale et l'idée de rationalité cognitive proposées par le sociologue, impliquent des thèmes centraux de la réflexion sociale actuelle, principalement des possibles liaisons problématiques entre la tradition sociologique et certaine ontologie économique. Pour montrer la particularité de l'individualisme méthodologique de Boudon et sa notion de rationalité cognitive, j'expose premièrement ses principales critiques au paradigme instrumental. Ultérieurement, je discute les alternatives suggérées par Boudon, principalement l'idée que les agents intègrent des croyances ou des théories simplement parce qu'ils ont "des bonnes raisons", et leur notion d'une "rationalisation diffuse". Finalement, je cherche analyser de quelle façon la théorie de l'auteur français pointe des failles de la vision économiste de rationalité, bien qu'il présente quelques propositions inexactes. Ainsi, au même temps qu'il signale un manque important de connexion entre l'agence individuelle et le contexte social dans la théorie du choix rationnel, Boudon élabore une conception universaliste de rationalité qui ne semble pas observer les fondements de circonstance et aussi délimités de la réalité sociale.

Mots-cles: Théorie Sociale; individualisme méthodologique; rationalité; action instrumentale.

INTRODUÇÃO

Muitas vezes, o individualismo metodológico e os entendimentos utilitaristas são tomados como pertencendo a um mesmo campo teórico. Entretanto, tais vertentes podem ser diferenciadas tanto em relação a seus axiomas quanto a seus entendimentos normativos, sobretudo se levamos em conta algumas considerações do sociólogo francês Raymond Boudon, pensador fundamental na configuração da primeira vertente. Essa diferenciação é importante para uma reflexão sobre certas direções da teoria social e política contemporânea, pois implica pensar a interação de pressupostos importantes das Ciências Sociais - que procuram problematizar relações singulares entre a agência e uma estrutura social circunstancial - com uma ontologia proveniente da tradição econômica que especifica uma teoria da ação de pretensões universalistas. Mais particularmente, a diferenciação parece importante por gerar uma compreensão mais abrangente do conceito de racionalidade, freqüentemente enquadrado em parâmetros instrumentais.

Nesse sentido, a proposta metodológica e teórica de Boudon permite uma melhor compreensão das particularidades de um entendimento de viés econômico que tem encontrado atualmente importante recepção nas Ciências Sociais. Dentre as perspectivas utilitaristas contemporâneas que têm ganhado destaque, a teoria da escolha racional destaca-se como a mais evidente. Essa teoria parte das questões assinaladas por seus precursores Kenneth Arrow, Anthony Downs, William Riker, James Buchanan, Gordon Tullock e Mancur Olson1 1 Há vasta literatura que trata da teoria da escolha racional. Para uma exposição abrangente de diversas concepções e vertentes da teoria, sobretudo do entendimento político, cf. William Mitchell e Randy Simmons (1994). Dentre os autores que fundamentaram os parâmetros centrais da escolha racional, o trabalho de Mancur Olson (1971) ainda é o mais amplo para uma discussão tanto sociológica quanto política de suas concepções centrais. Para debates críticos, ver Donald Green e Ian Shapiro (1994) e Bruno Carvalho (2008). , entre outros, que buscam ressaltar, sobretudo, as falhas das análises sociais e políticas que desconsideram as atividades voltadas para a satisfação de interesses próprios. Para esses autores, a ação social normal deve ser tida como resultado do raciocínio pessoal que relaciona de modo eficiente meios escassos e fins construídos autonomamente. Dois pontos destacam-se em tal concepção. O primeiro é a noção de uma reflexão pessoal constante dos custos e benefícios de todas as conseqüências das atividades ordinárias. O segundo ponto é a idéia de que os indivíduos percebem seus pares como meios para a obtenção de seus fins pessoais. A noção de racionalidade é vinculada, então, à idéia de consumidor da teoria econômica, sendo referida geralmente à conduta que busca três elementos básicos: riqueza, prestígio e poder. Metodologicamente, aponta-se a possibilidade de previsão das escolhas de sujeitos racionais, o que caracterizaria um método "positivo", não normativo, que separa os fatores essenciais das ações de dados secundários. As atividades seriam descritas em um imaginado estado puro, no qual poderiam ser removidas características sem importância do processo social que são notadas em uma observação direta e não controlada2 2 Os fundamentos centrais dessa perspectiva metodológica encontram-se no célebre artigo de Milton Friedman (1953). . A meta da teoria da escolha racional é explicar muito por meio de conceitos simples, criticando entendimentos pautados por concepções generalizantes e tidas por inconsistentes, como "estrutura", "vontade geral" ou "socialização". O estabelecimento de padrões predeterminados de ação conduz ao abandono de postulados que abrangem valores ou crenças abstratas3 3 Há uma grande discussão no campo da escolha racional a respeito da metodologia adequada para predizer-se as ações. Em geral, pode-se perceber dois entendimentos: o que adota uma concepção "fraca" de racionalidade, que não predetermina os valores dos indivíduos, e outro "forte", que especifica a priori os objetos e bens valorizados pelos agentes. Entretanto, pode-se notar o predomínio da noção "forte", dada sua maior capacidade teórica de antecipar os cursos de ação. Ver Hechter (1997, p. 193-195). .

Na perspectiva da escolha racional as relações sociais podem ser concebidas como jogos estratégicos, tendo a idéia de equilíbrio grande destaque. As características fundamentais do tecido social seriam a escassez de bens e a necessidade imperativa de estabelecimento de interações estratégicas. Dado que os indivíduos não têm controle sobre todos os bens e recursos que almejam, devem necessariamente estabelecer trocas. O equilíbrio resultante das interações instrumentais representa a forma pela qual os jogadores ajustam reciprocamente os seus comportamentos para a criação de um regime caracterizado pela satisfação geral de interesses. Portanto, interações racionais demandam a reflexão sobre as intenções dos outros, considerando-se o fato fundamental de que qualquer ambiente é feito de outros agentes que também são racionais.

A proposição sociológica fundamental da teoria da escolha racional é que uma estrutura nada mais pode ser do que uma mera soma de ações individuais. Por conseguinte, tal estrutura é apenas um resultado de trocas pautadas por interesses pessoais, e só toma alguma forma exclusivamente pelo fato de os agentes não terem controle direto sobre os bens que almejam. Se todos obtivessem suas metas e objetos de modo automático, e controlassem todas as atividades que pudessem satisfazer seus desejos, nem mesmo haveria o que se pode denominar como sistema social (COLEMAN, 1990, p. 29). A teoria da ação definida pela escolha racional não enfoca a perspectiva de as crenças ou fatos sociais resultarem de processos históricos ou estruturais, preferindo ressaltar a relação de desejos pessoais com os limites do ambiente externo, o que leva o indivíduo a determinar uma escala de preferências frente ao contexto de transações que se apresenta-lhe. Quando as análises examinam de fato as normas sociais, tendem a expressar ou um entendimento universalizador, não vinculado a condições histórico-sociais específicas, ou teses que tratam as crenças e normas como fatores de um bom ou mau funcionamento das condições do mercado social4 4 Algumas concepções expostas em parte da obra de Elster (1994, p. 137-148) são exemplares da primeira vertente. Pode-se notar que o autor relaciona as normas sociais com valores universais que poderiam ser encontrados em qualquer tipo de sociedade e momento histórico, como a eqüidade, o altruísmo e o que denomina "conduta kantiana". Para um debate sobre o caráter funcionalmente adequado ao desempenho do mercado na teoria social da escolha racional, expresso na noção de capital social e nas tentativas de limitar as conseqüências de externalidades negativas a partir de normas sociais, ver Carvalho (2008, p. 129-178). . De forma geral, os trabalhos da escolha racional tendem a conceber funcionalmente as normas sociais, que aparecem como mecanismo para controlar um sistema social baseado em relações imprevisíveis de competição. A confiança interpessoal surge, então, como parâmetro teórico central, pois indica a possibilidade de certos ambientes resolverem problemas de ação coletiva, permitindo intercâmbios previsíveis em contextos egoístas.

Boudon, sobretudo em seus últimos trabalhos, critica a predeterminação da ação humana nesse paradigma economicista, elaborando uma peculiar teoria sobre a racionalidade e a ação individual. Ainda que reitere (BOUDON, 2002a) a relevância da teoria da escolha racional em explicar parte dos fenômenos da modernidade, sustenta a necessidade de conceber a racionalidade dos indivíduos de um ponto de vista mais complexo. A princípio, Boudon destaca a importância da escolha racional em apontar certas inconsistências de entendimentos "culturalistas" e "psicologistas". A relativa influência dessa teoria resultaria do fato de procurar indicar mecanismos e origens na explicação das ações sem recorrer a noções que as inscrevem em uma esfera misteriosa e intangível. O que parece positivo na escolha racional é o fato de dar importância a aspectos subjetivos e reflexivos que não implicam a imposição direta de certa estrutura social sobre as condutas humanas. Contudo, Boudon sustenta que a teoria da escolha racional falha em explicar um vasto conjunto de fenômenos, já que a noção de racionalidade instrumental expressaria apenas ações triviais da conduta econômica. O autor salienta que o conceito de racionalidade deve ser polissêmico, o que pressupõe a necessidade de reconstruir as motivações dos agentes e examinar os fatos sociais como resultados de ações que não incorporam sempre fatores utilitaristas (BOUDON, 2003b, p. 70).

É exatamente esse entendimento mais complexo da ação que parece relevante para o debate contemporâneo sobre a concepção de racionalidade. Para mostrar a particularidade do individualismo metodológico de Boudon e sua noção de racionalidade cognitiva, exponho, primeiramente, as suas principais críticas ao paradigma instrumental. Posteriormente, debato as alternativas sugeridas por Boudon, principalmente a idéia de que os agentes incorporam crenças ou teorias simplesmente porque têm "boas razões" e a sua noção de uma "racionalização difusa". Finalmente, procuro analisar de que forma a teoria do autor francês aponta falhas da visão economicista de racionalidade, embora apresente algumas proposições imprecisas. Assim, ao mesmo tempo em que assinala importante falta de conexão entre a agência individual e o contexto social na teoria da escolha racional, Boudon elabora uma concepção universalista de racionalidade que parece não observar fundamentos circunstanciais e delimitados da realidade social.

II. COGNIÇÃO E AÇÃO RACIONAL: A CRÍTICA DE BOUDON AO PARADIGMA INSTRUMENTAL

Boudon indica a necessidade de as teorias serem desprovidas de "caixas pretas", ou seja, de não dependerem de princípios externos a si mesmas ou de noções vagas para explicar os fenômenos sociais. Demarcando o caráter racionalista de seu entendimento das ações, o autor questiona as perspectivas teóricas que evocam causas irracionais, como processos inculcadores (presentes, no seu entender, em certos entendimentos durkheimianos e marxistas) ou afetivos (como seria exposto na tradição freudiana ou nietzschiana) (BOUDON, 1999b, p. 20). Boudon acredita que sua perspectiva cognitivista permite vantagens teóricas sobre os entendimentos que supõem irracionalidade. Em primeiro lugar, a teoria cognitivista explicaria as ações dos sujeitos não por meio de algum pressuposto de interiorização, constrangimento ou falsa consciência, mas a partir de sentimentos de convicção. Em segundo lugar, a teoria não incorporaria as dificuldades dos entendimentos que não apontam causas plausíveis para as ações. Em terceiro lugar, a própria característica social das crenças e comportamentos - o fato de que outros agentes comportam-se crêem de forma similar - seria facilmente explicada por uma teoria cognitivista. Para Boudon (idem, p. 23), o fato de os indivíduos defenderem e justificarem suas crenças em um ambiente social sugere que toda convicção apóia-se em um sistema interativo de razões percebido como consistente. Assim, "se admitimos que uma crença coletiva [...] instala-se porque faz sentido para os indivíduos, ou seja, se admitimos que ela se implanta porque eles possuem razões de adotá-la, essas razões não são por definição nem objetivas nem puramente subjetivas no sentido de serem efeito de idiossincrasias. É por isso que proponho qualificá-las de 'trans-subjetivas'" (ibidem).

Questionadas as propostas teóricas que sugerem irracionalidade nos comportamentos, Boudon chama atenção para duas direções essenciais de seu individualismo metodológico. Por um lado, critica o tipo de análise holista que não observa a relação necessária dos fenômenos coletivos com as razões individuais e que trata certas instituições, como um partido ou uma organização religiosa, como dotadas de consciência e vontade própria (BOUDON, 1991, p. 50). O fundamental, nesse caso, é questionar os trabalhos que descrevem os agentes como portadores passivos de idéias e fatos coletivos, de modo que suas atitudes aparecem inteiramente determinadas pelo meio social. Boudon critica, sobretudo, a capacidade explicativa de teorias estruturalistas que se baseiam em entendimentos tautológicos, em que a própria evocação de estruturas sociais coercitivas explicaria comportamentos ou atitudes que, por sua vez, são a única prova de existência dessas mesmas estruturas.

Por outro lado, e o mais importante para se distanciar de paradigmas utilitaristas e para especificar a singularidade de sua concepção de racionalidade, Boudon (idem, p. 46) desvincula sua metodologia de uma apreciação normativa sobre o individualismo moderno5 5 Para uma análise da trajetória teórica de Boudon, que mostra sua preocupação constante em aliar seu método individualista a uma peculiar percepção estrutural, ver Cynthia Hamlin (1999). . Sustenta que a noção de individualismo possui um significado inteiramente diferente se ela aparece no contexto da Sociologia, da ética ou naquele da teoria do conhecimento. O autor ressalta que a teoria da racionalidade que propõe não se constitui a partir de um caráter atomista6 6 Sobre outras vertentes do individualismo metodológico, inclusive as que enfatizam uma apreciação explicitamente normativa e moral do individualismo, ver Lars Udehn (2002). (BOUDON, 1999a, p. 135). Somente a metodologia focaliza os indivíduos, dado que as justificativas racionais possuem valor devido ao fato de alcançarem reconhecimento generalizado em uma sociedade. Pode-se dizer que se trata, portanto, de um argumento epistemológico que não fundamenta um posicionamento ontológico. Essa é uma importante característica que singulariza a teoria do autor francês em relação a outras vertentes do individualismo metodológico, que, por vezes, unem proposições epistemológicas a argumentos normativos sobre o papel dos indivíduos na configuração das sociedades (UDEHN, 2002, p. 501). A metodologia de Boudon apenas prescreveria a necessidade de reconstruir as motivações subjetivas e refletir o fato social em questão como resultante da agregação de comportamentos individuais. O plano meramente metodológico não pressupõe, então, que se analise a sociedade como um conjunto de átomos, mas que se perceba a relação entre as ações e o contexto social, sendo tal contexto o ambiente em que uma ação pode ser identificada e legitimada como racional.

Mesmo sugerindo que a escolha racional propõe argumentos válidos em certos casos, Boudon indica, a partir dos pressupostos de seu individualismo metodológico, que teorias fundamentadas na concepção de ação instrumental podem examinar apenas fenômenos específicos e circunscritos, em que os indivíduos adotam comportamentos conseqüencialistas que têm em vista benefícios e resultados pessoais. Todavia, existiriam outros tipos de ação que expressam uma outra racionalidade, com princípios e características diferentes do instrumentalismo. A escolha racional não compreenderia, sobretudo, situações em que os atores raciocinam a partir de princípios ou opiniões. De modo geral, Boudon questiona o tipo de proposta que incorpora, além da tese de que toda ação parte de indivíduos, o pressuposto de que as consequências das condutas e os interesses pessoais são sempre analisados pelos agentes em suas interações. Cabe notar que este último pressuposto é um pilar central da concepção social da escolha racional, que assume uma correlação direta entre um conjunto externos de oportunidades, manipulável pelos agentes, e uma escolha racionalizada pautada pelos resultados (cf. ELSTER, 1994, p. 29-37).

Boudon (2002a) identifica classes de fenômenos e tipos de ação que escapam às explicações vinculadas aos pressupostos da racionalidade econômica inscrita em um ambiente escasso de oportunidades. Em primeiro lugar, salienta que há atitudes que expressam crenças não triviais, muito distanciadas da conduta de maximização de benefícios. Embora vários atos, como o de atravessar a rua com cuidado a fim de aumentar as próprias chances de vida, possam ser explicados por intermédio da teoria da escolha racional, existiriam outras situações determinadas por crenças, ou mais particularmente por teorias, que expressam apenas as tentativas de os indivíduos compreenderem a realidade de um contexto ou agirem de forma satisfatória. O exemplo banal de um motorista em um cruzamento pode ilustrar a importância de tais crenças (cf. LANNOY, 2000, p. 942-944). Enquanto a ação de parar o carro em um cruzamento movimentado seguindo as regras de trânsito pode ser explicada pelo medo de uma multa, prisão, desejo de integridade corporal, preservação dos bens materiais ou quaisquer fins pessoais ou egoístas, a mesma conduta em um cruzamento vazio, em que não há riscos de acidente ou sanção do poder público, não pode ser examinada a partir de entendimentos instrumentais. Nesses casos, em que o respeito a certas regras sociais parece inquestionável, os agentes pautar-se-iam por valores fundamentados em crenças e teorias validadas de forma compartilhada.

Os sujeitos acreditariam nessas crenças ou teorias simplesmente porque lhes parecem verdadeiras para entender e dar sentido a situações definidas espacial e temporalmente, o que implica o fato de a racionalidade gerada nesses momentos ser de tipo cognitivo e não instrumental. Deve-se notar que quando Boudon denomina essas crenças ou teorias de satisfatórias, não se aproxima da tese clássica de Herbert Simon (1967), muito debatida no campo da escolha racional, acerca de uma racionalidade limitada (bounded rationality), relacionada com a situação de um conjunto sempre reduzido de informações disponíveis nas situações sociais. O autor lembra que o agente pode tanto deparar-se com um déficit de informação quanto estar vinculado a um problema que requeira os recursos cognitivos de que dispõe (BOUDON, 1999a, p. 93). Assim, os indivíduos buscam um sistema de boas razões para a resolução dos problemas que a realidade cotidiana impõe, de modo que "a racionalidade do ator ordinário lembra mais, portanto, a racionalidade que evocam os filósofos da ciência do que aquela da economia neoclássica. O que se trata de maximizar ou otimizar aqui não é uma diferença entre custos e benefícios, mas sim a força de um sistema de argumentos" (idem, p. 93-94).

A conseqüência é que os argumentos admitidos e defendidos pelos agentes resultam do sistema de razões que predomina em um contexto cognitivo específico, de modo que a maioria das pessoas tende a possuir as mesmas respostas para as mesmas questões. Ao contrário da qualificação da escolha racional de certas atitudes sociais como irracionais, Boudon indica a necessidade de uma teoria mais abrangente da racionalidade. Tal entendimento requer negar as tentativas de compreender comportamentos que não cabem nos axiomas instrumentais como provenientes de simples enquadramentos mentais (frames) que seriam externos aos indivíduos e, portanto, inexplicáveis ou irracionais (BOUDON, 2003a, p. 44-45). Seria a partir das proposições de racionalidade cognitiva e axiológica que se pode construir entendimentos sociológicos que não pedem novos dados sem explicação ou suposições não pressupostas.

Boudon também ressalta a impotência da teoria da escolha racional e dos entendimentos utilitaristas em entender os comportamentos que se apóiam em crenças prescritivas e não "conseqüencialistas". O fato de que os agentes geralmente votam, mesmo sabendo da insignificância de seu ato para o resultado final, ou que dividem somas de dinheiro que acham, agindo contra seus interesses próprios, seriam representações de atitudes que expressam pouca importância para as suas conseqüências (BOUDON, 2002a, p. 762). Por outro lado, Boudon chama atenção para várias situações que os indivíduos consideram relevantes e essenciais, de modo que se tornam moralmente inquestionáveis, pressupondo de antemão uma resolução aceita por todos. A questão do roubo, por exemplo, indicaria que certos fenômenos tornam-se incompreensíveis se restritos ao quadro analítico da escolha racional. Há uma certeza de que o roubo é ruim, mesmo que ele gere malefícios efetivos apenas para um contingente pequeno de uma comunidade. Para Boudon, as explicações que definem a avaliação negativa em relação ao roubo como resultante de um sentimento pessoal de medo seriam inconsistentes, pois a opinião comum condiz antes com uma indignação que surge mesmo se a ocorrência estiver relacionada a indivíduos desconhecidos e distantes (BOUDON, 1999a, p. 122; 1999c, p. 111-112). Além disso, a indignação geralmente não se refere aos dados quantitativos do prejuízo acarretado, mas aos danos sofridos pela vítima. Não seria possível, portanto, entender o fenômeno normativo somente por suas conseqüências, mas sim pelas razões que criam um julgamento de valor baseado em princípios essenciais a partir dos quais as sociedades constituem-se. Assim, "a ordem social se baseia no fato de que toda retribuição social consentida a um indivíduo deve, em princípio, corresponder a uma certa contribuição de sua parte. Senão o principio mesmo da relação social encontra-se em questão. Ora, o roubo é uma retribuição positiva que o ladrão se atribui às expensas de sua vítima, tendo recorrido a um constrangimento ilegítimo. Assim fazendo, ele contradiz uma regra essencial que está na base de todo sistema social [...]. Portanto, o roubo é tão condenado porque existem razões fortes para o condenar" (BOUDON, 1999a, p. 121).

Finalmente, Boudon chama atenção para a falha das análises utilitaristas em entender fenômenos distantes de qualquer característica egoísta, como o fato de que todo espectador de Antígona condena Creonte e aprova a protagonista, ainda que tal ato não obedeça a critérios de ganhos ou desejos individuais. Esse caso exemplificaria um conjunto de situações em que os agentes devem avaliar conjunturas desconectadas de exclusivismos e de referências pessoais. Mesmo que os custos a nível pessoal sejam irrisórios ou gerem conseqüências negligenciáveis, atos oportunistas de governantes também sempre resultam em indignação social, até em países com possibilidades remotas de serem atingidos por níveis elevados de tais comportamentos. Pode-se notar que governantes que não cuidam adequadamente das práticas de corrupção tendem a ter suas oportunidades políticas restringidas. A percepção ordinária demonstra que, independentemente do contexto, a corrupção ou tráfico de influência são assuntos graves para a maior parte os indivíduos, tratados de forma minuciosa, com despesa de tempo e informações para que tais ações não voltem a repetir-se. Na medida em que são fenômenos que ocasionam poucas perdas ou benefícios pessoais, a desaprovação somente poderia ser explicada pelo fato de contrariarem regras não exclusivistas do pacto social (BOUDON, 1999c, p. 112).

Segundo Boudon, o que uniria essas atitudes e fenômenos é o fato de envolverem reflexões que, longe de serem concebidas por um cálculo isolado e restrito ao interesse próprio, referem-se ao "sentido", mais ou menos consciente, que os atores dão a suas ações. Se existe maximização nas condutas, ela estaria relacionada com algo para além dos custos e benefícios pessoais. A tentativa exemplar de alguns trabalhos da escolha racional de resolver o "paradoxo do voto" - a contradição de haver um comparecimento massivo às urnas frente a impossibilidade de o voto único do eleitor influenciar o resultado final - chamando atenção para o fato de que a abstenção eleitoral provoca danos à reputação parece exatamente destacar esferas sociais externas aos cálculos individuais7 7 Para uma análise da questão do paradoxo do voto, ver Donald Green e Ian Shapiro (1994, p. 55). . Contudo, tratando a reputação como se fosse um custo a ser evitado, as análises acabariam construindo argumentos ad hoc e contraditórios, pois não há motivos consistentes para que a abstenção seja vista de forma negativa se pressupormos que os agentes são efetivamente racionais e sabem da inutilidade do voto (idem, p. 111).

Para Boudon, os indivíduos buscam geralmente razões adequadas às situações que enfrentam no cotidiano e apenas em certos casos a racionalidade implica atitudes de maximização de meios e fins pessoais. Na maior parte das vezes, a racionalidade relacionar-se-ia com dados cognitivos, em que as crenças e teorias que fundamentam as ações aparecem como verdadeiras, ou com qualidades axiológicas, de modo que as mesmas crenças e teorias são justificadas e legitimadas por peculiares argumentos normativos. Para a compreensão das características cognitivas e axiológicas da racionalidade, que na verdade possuem diferenças muito sutis, somente o individualismo metodológico que não pressupõe a ação instrumental em todas as esferas da vida poderia ser consistente. De acordo com Boudon, o fato de paradigmas utilitaristas limitarem-se a concepções "conseqüencialistas" e egoístas resulta na passagem de uma mera estratégia metodológica centrada no indivíduo para a idéia de um sujeito universal que não apreende fundamentos sociais centrais do comportamento humano.

III. AS BOAS RAZÕES E O PROCESSO EVOLUTIVO DAS NORMAS

A solução para o impasse apresentado por teorias utilitaristas na explicação de vários fenômenos estaria na análise das racionalidades cognitiva e axiológica que fundamentam as ações dos sujeitos. Na medida em que procura dar certa dignidade ao papel das razões individuais nas práticas cotidianas, Boudon critica as suposições de que apenas um observador controlado pode perceber adequadamente a realidade, enquanto os indivíduos ordinários a apreenderiam, por vezes, de forma ilusória (BOUDON, 1999a, p. 21-22). Por outro lado, o modelo cognitivo e axiológico expressa um questionamento aos argumentos relativistas que sustentam a impossibilidade de fundação de certezas ou verdades circunstanciais. Assim, para além de sua contraposição ao paradigma utilitarista, o individualismo metodológico de Boudon reflete também dois posicionamentos essenciais, ainda que em princípio possam parecer contraditórios: a sugestão de uma objetividade parcial que subverte a intenção de a ciência ou qualquer agente social definir leis objetivas eternas e outro que rejeita posicionamentos pluralistas, admitindo um processo geral de racionalização. É a junção original dessas duas diferentes suposições que compõe a proposição de um desenvolvimento evolutivo da razão.

A idéia de Boudon de uma objetividade parcial parte do pressuposto de que o processo de conhecimento é, ainda que parcial quanto aos seus princípios primários, objetivo quando relacionado às suas circunstâncias específicas. Nesse sentido, todo conhecimento ou teoria ordinária de qualquer agente partiria de um sistema circunstancial de "boas razões", dado que seus argumentos superam de maneira incontestável, em determinado momento e espaço, entendimentos concorrentes. Admitindo uma objetividade parcial das teorias ou crenças, Boudon sugere que o relativismo coloca um falso problema, pois ainda que o pensamento não possa ser deduzido de princípios primários inquestionáveis, ele reflete o fato de que alguns entendimentos tornam-se mais consistentes do que outros. Por conseguinte, o pensamento deve ser considerado como uma rede complexa de argumentações em que o princípio de um entendimento pode ser visto como uma conseqüência em outro raciocínio. Boudon argumenta que os princípios prescritivos ou normativos das teorias ou crenças podem ser racionalmente discutidos ou até mesmo negados quando comparados com a realidade. Ainda que não exista um conjunto de critérios que permita entender um grande sistema de razões como universalmente válido, determinadas teorias ou crenças poderiam ser percebidas como superiores em relação a outras. Isso a partir de avaliações específicas, variáveis de um caso a outro, dado que "há critérios que permitem emitir julgamentos avaliativos relativos (T1 é mais aceitável do que T2), mas não há critérios que permitem enunciar julgamentos avaliativos absolutos (T1 é verdadeiro)" (BOUDON, 2002a, p. 764).

O problema central de vários entendimentos sociais seria o não reconhecimento de que o indivíduo pode ter razões próprias para adotar valores ou crenças, não sendo um mero ente passivo de determinações causais. Para Boudon, tal problema poderia ser percebido nas teorias fideístas, que mostram os valores ou princípios como evidências intuitivas de nossos sentimentos; na perspectiva cética, que indica a impossibilidade de os valores e crenças serem fundados na razão; e também em teorias "causalistas" que consideram as normas como manifestações de processos biológicos ou psicológicos inscritos de maneira espontânea nos agentes, sendo quase incompreensíveis. Muitas vezes, essas correntes unir-se-iam em torno de pressupostos que qualificam algumas atitudes dos agentes como irracionais. Boudon (1999b, p. 38-39) exemplifica sua crítica a esses modos de explicação recorrendo às reflexões de Tocqueville acerca das novas idéias que questionavam o Antigo Regime na França de sua época. Mesmo achando incorretos os argumentos então elaborados, Tocqueville demonstra como os agentes tinham razões particulares para suas crenças, constituindo uma lógica de acordo com o contexto social do momento. Assim, a ênfase nos poderes da razão, por um lado, e a desqualificação da tradição, por outro, refletiam um sentido que dava coerência às práticas. O que importa a Boudon, especificamente, é que esse tipo de procedimento analítico não enfoca fatores intangíveis tais como "imitação", "fanatismo", "cegueira", "tradicionalismo" etc., preferindo examinar as boas razões que a maior parte dos agentes tinha para adotar e legitimar as crenças dos filósofos iluministas.

Boudon (idem, p. 50) sugere a hipótese de que a influência das teorias que recorrem a aspectos irracionais deve-se à simplicidade de seus modelos. Alguns autores contentam-se em simplesmente nomear eventos que se impõem aos indivíduos, deixando de lado a tentativa de identificar suas particularidades e seus conteúdos. Isso poderia ser notado na idéia de que os indivíduos não conseguem perceber o mundo como ele é, como em certas concepções de "alienação" e "falsa consciência", ou na noção de fatores emocionais concorrerem com a lógica instrumental. Boudon também chama atenção para o fato de que se o conceito de "interiorização", largamente usado na Sociologia, deve ter relevância é porque deve ser visto como um efeito e não uma causa das ações e razões individuais. Além disso, outro problema essencial é que o procedimento analítico voltado para fatores irracionais tende, por vezes, a expor um conteúdo positivista que demarca uma clara separação entre o procedimento científico e a reflexão ordinária, pensando "que somente as crenças científicas, ou de modo geral aquelas que podemos tratar como conclusões de raciocínios persuasores, podem ser explicadas pelas razões que as fundam. As outras, na medida em que não se baseiam em razões sólidas, podem ser apenas ilusões [...] O positivismo conduz os autores, portanto, a uma visão dual do espírito. Ele conteria crenças baseadas em razões (cujas crenças científicas representariam o paragon) e crenças produzidas por causas (que não possuem o estatuto de razões) ilusoriamente percebidas pelos sujeitos como baseadas em razões" (BOUDON, 1999a, p. 52).

Segundo Boudon (1999b, p. 48), ainda que a qualificação de positivista tenha adquirido um viés reconhecidamente negativo na teoria contemporânea, há vários trabalhos que continuam a pautar-se por princípios de pureza. Essa direção legitima-se por uma teoria causal primária que define, assim como os entendimentos mecanicistas da Física, uma gênese comum para todos fenômenos sociais. Contrariando tal perspectiva, o autor sugere que as explicações científicas obedecem à mesma ordem axiológica das descrições dos agentes ordinários. Crenças fortes, verdadeiras ou falsas, encontram-se tanto na história cultural das sociedades quanto na evolução científica. Assim, a antiga crença científica de que a Terra é quadrada é tão falsa quanto a crença dos alemães da república de Weimar que votaram no partido nacional-socialista como forma de alcançarem o progresso social (idem, p. 65). Os fatores que tornam uma teoria exitosa, por outro lado, seriam os mesmos nas crenças do campo "intelectual-teórico" e nas crenças da esfera "prática-ética". Contra suposições positivistas e procurando incorporar o que constitui no seu entender o maior legado da metodologia weberiana, Boudon enfatiza a necessidade de uma epistemologia que observe as razões dos agentes em suas relações sociais. Para o individualismo metodológico ser consistente, as crenças científicas ou ordinárias devem ser compreendidas a partir do sentido que possuem para os agentes. Da mesma forma, o autor critica as teorias da racionalidade utilitarista, derivadas da ciência econômica, que admitem princípios últimos de ação e tratam a realidade das normas e valores como dados prontos, sem a necessidade de serem devidamente explicados e analisados em seu sentido social (BOUDON, 1999a, p. 55). Isso não quer dizer que o agente tenha controle total sobre suas crenças, que podem ser mais ou menos confusas ou encontrarem-se em um nível mais ou menos consciente, mas que elas devem estar fundadas em razões sólidas e coerentes, diretamente articuladas com o ambiente social.

Por outro lado, ao mesmo tempo em que Boudon sugere a noção de uma objetividade parcial e condicionada socialmente, sustenta um processo cognitivo de evolução das normas. Salientando o desenvolvimento moderno dos sistemas educacionais, e tornando sua proposta teórica mais complexa, Boudon supõe uma tendência universal de racionalização que pautaria as teorias e crenças ordinárias. Segundo o autor, a racionalidade implica, ao lado da dimensão compreensiva e socialmente contingente, um processo paulatino de evolução que condiz com a prescrição de determinadas crenças como sendo irreversíveis, no sentido de serem reconhecidamente mais legítimas e melhor justificadas em qualquer contexto - ainda que não possam apresentar uma fundação em princípios últimos (idem, p. 185-188). Esse processo é descrito por Boudon como uma "racionalização difusa" em que certos sistemas de razões desqualificam outros ao longo da história. Assim, "muitas idéias, proposições, valores, Stellungnahmen, resultantes da dimensão axiológica nos parecem hoje evidentes porque são resultantes de processos de inovação e de seleção social que obedecem aos mesmos princípios daqueles que guiam a produção e a seleção das idéias em matéria 'intelectual-teórica', e notadamente em matéria científica" (idem, p. 186).

Um exemplo do processo de racionalização difusa seria o desenvolvimento da idéia de cidadania no mundo ocidental, que se tornou para Boudon uma manifestação irreversível "com a mesma força do princípio de inércia na esfera 'intelectual-teórica'" (idem, p. 186-187). Do mesmo modo, a idéia de "pessoa" e, posteriormente, de indivíduo, alcançaria ao longo dos séculos a mesma relevância e irrefutabilidade. Conseqüentemente, na maior parte das sociedades, as instituições só são aceitas e legitimadas se o indivíduo tem o sentimento de que sua dignidade está sendo respeitada. Tais idéias seriam adotadas porque seus argumentos têm força e coerência maiores que as teorias que apoiavam ordens hierárquicas. No mesmo sentido, Boudon (idem, p. 189) cita a noção de separação dos poderes e a idéia de que os conflitos, quando regulamentados, são bons para o funcionamento de um sistema político. Uma das questões essenciais que envolvem todas essas idéias na evolução moral e política seria a realização de um programa difuso definido pelo respeito às particularidades pessoais e pelo sentido de complexidade do mundo, o que caracterizaria as noções modernas de individualismo e autonomia (BOUDON, 2002b, p. 43; 2003b, p. 212).

O fundamental é que a racionalidade torna-se uma instância que pressupõe algo singular e universal, mesmo com a diversidade cultural. Uma das principais preocupações de Boudon refere-se ao relativismo que predominaria não só no campo científico, mas também no comportamento e nas justificativas do cidadão ordinário, de modo que "qualquer que seja o conteúdo da opinião de outrem, é necessário acolhê-la de modo positivo" (BOUDON, 1999a, p. 309). Contra tal perspectiva, o autor propõe, por exemplo, o desafio de saber se os relativistas ou multiculturalistas aceitariam de forma inquestionável fatos tais como a excisão; a definição das mulheres em um estatuto inferior; que a magia valha a mesma coisa que a ciência ou que certos setores de produção utilizem métodos escravistas nas relações de trabalho (idem, p. 190). Mesmo não partindo de princípios demonstráveis e objetivos, no sentido forte da palavra, tais idéias ou mecanismos envolveriam raciocínios socialmente indiscutíveis e o fato de ainda aparecerem em sociedades contemporâneas dever-se-ia apenas à presença de "forças históricas" que contrariam as diretivas racionais. De modo sucinto, Boudon argumenta, que "estaríamos mal em aceitar a idéia de que os mitos devem ser tidos por representações do mundo tão válidas quanto as teorias científicas" (idem, p. 25).

Portanto, para questionar raciocínios relativistas ou abordagens limitadas da ação, como as expressas pelos paradigmas utilitaristas, Boudon aponta a emergência de razões com características distintivas de reflexividade e universalidade. O problema é que a análise do autor parece não exprimir de forma clara qual seria o fundamento efetivo da racionalidade, se o reino das opiniões e das reflexões circunstanciais ou se a dimensão de crenças irreversíveis, impossíveis de serem criticadas. Ainda que o autor sugira que a racionalidade relaciona-se com ambas as direções, não há argumentos que explicitem como as esferas das práticas ordinárias e de uma razão formada historicamente articulam-se. Nesse sentido, Boudon (idem, p. 323), em um mesmo parágrafo que trata do relativismo como fenômeno social e político, revela tanto uma posição contextual e parcial dos agentes que não aceitam um arranjo relativista, quanto uma atitude normativa que depende de um postulado inquestionável, já que "evidentemente, as opiniões são opiniões e as verdades, verdades, e importa ver que essa distinção é real".

IV. CONCLUSÕES: ENTRE O UNIVERSALISMO E OS PARÂMETROS CONTEXTUAIS: ALGUNS IMPASSES DA PROPOSTA DE BOUDON

Um dos pontos relevantes dos últimos trabalhos de Boudon é assinalar alguns limites do paradigma instrumental, como o da escolha racional, na explicação de fenômenos sociais que não abarcam atitudes egoístas ou voltadas exclusivamente para as conseqüências. A partir desses questionamentos, pode-se refletir algumas diferenças entre uma epistemologia que envolve certa tradição das Ciências Sociais e um entendimento baseado em uma perspectiva econômica estrita. Mesmo sendo uma vertente que parte de um método centrado no agente, o individualismo metodológico de Boudon considera a importância de observar teoricamente uma esfera que se impõe, de maneira mais ou menos efetiva e mais ou menos consciente, sobre os indivíduos. Em vários momentos, Boudon sugere a importância dos processos de socialização, ainda que sempre saliente a necessidade imperativa de estudá-los a partir de seus microfundamentos e não concebê-los a priori por intermédio de concepções holistas. Sua teoria destaca os modos pelos quais os sujeitos incorporam efeitos sociais, procurando estabelecer relações entre as dimensões da agência e da estrutura social.

Cabe notar, fundamentalmente, que essa articulação entre agência e estrutura parece distante das preocupações centrais das teorias utilitaristas, que pressupõem os sistemas sociais como resultantes da agregação de interesses antagônicos. Enquanto a concepção de racionalidade cognitiva de Boudon aponta mecanismos que condicionam efetivamente as ações individuais, a teoria da escolha racional, por exemplo, não indica o intercâmbio entre agência e estrutura como questão essencial, o que implica ora a objetivação do ambiente circunstancial pautado pelas práticas instrumentais ora a defesa do equilíbrio econômico constituído no mercado. Mais especificamente, quando há uma concepção - implícita ou explícita - de estrutura nas análises, esta aparece apenas como um "limite" que contextualiza, de modo fraco, as ações individuais (HECHTER, 1997, p. 193). Tal idéia exprime-se na noção de um conjunto de oportunidades que, com seus respectivos custos, representa os limites e restrições que os agentes, com as informações presentes, têm para alcançar os fins desejados (ELSTER, p. 29-30).

Diferentemente dessa perspectiva, Boudon aponta a necessidade de incorporar-se conceitualmente aspectos desligados das situações estratégicas e de interesse pessoal. Fatores articulados a dimensões sociais que estão, de certa forma, para além do controle efetivo dos agentes. Apesar de ressaltar um voluntarismo e capacidade reflexiva de todas as ações, o que singulariza seu individualismo metodológico, Boudon sugere que as crenças, teorias e idéias dos indivíduos situam-se em um contexto espacial e histórico específico, além de refletirem, de um modo mais ou menos efetivo, determinada posição em um ambiente estruturado socialmente. Ou seja, ainda que a ação esteja longe de ser um mero reflexo de algo fixo e intangível que se impõe de forma inconsciente e direta sobre os agentes - como nas teorias holistas de determinação social -, há situações sociais que, necessariamente, envolvem-na.

Todavia, cabe apontar algumas questões que parecem imprecisas na proposição alternativa de Boudon a modelos utilitaristas. Ao mesmo tempo em que o autor sugere a relevância de categorias como "parâmetros contextuais", que indicam as influências que os agentes recebem dos ambientes em que estão inscritos, supõe, principalmente a partir da idéia de "racionalização difusa", um movimento que se coloca acima dos próprios sujeitos, como exposto na idéia de um "espectador imparcial" (BOUDON, 2001)8 8 Boudon faz referência ao conceito desenvolvido pela filosofia política inglesa do século XVIII, presente, sobretudo, no trabalho de Adam Smith. . No caso da racionalização difusa, as crenças sociais passam a ter uma base universal, refletindo certa objetividade da reflexão humana que seria validada de modo geral, independentemente do contexto particular dos indivíduos. Portanto, a teoria incorpora tanto um entendimento particularista quanto um universalista, o que gera dificuldades para entender os mecanismos efetivos da ação. Por um lado, as crenças e teorias, principalmente as noções de bem e de justiça, aparecem diretamente articuladas aos ambientes em que surgem, sendo efetivamente incomensuráveis, já que os indivíduos têm razões fortes e boas que são construídas socialmente. Mais especificamente, pertencendo a contextos diferentes, uns não devem aceitar as crenças dos outros, já que vinculados a realidades sociais diferentes (BOUDON, 2003a, p. 62; p. 100-101). Por outro lado, Boudon indica que algumas crenças e teorias podem ser avaliadas comparativamente a partir de certo olhar racional e imparcial, de modo que alguns entendimentos - como o de que o Estado representa uma instância privilegiada de regulação socioeconômica - tornam-se necessariamente frágeis e falsos, independentemente das peculiares posições dos agentes sociais sobre tais questões (BOUDON, 2001, p. 106-107; 2003a, p. 92).

Nesse sentido, não fica claro, por exemplo, quais mecanismos engendram o processo de racionalização difusa, e o que este representa em relação à possibilidade de uma objetividade ou evolução dos valores. Além disso, a questão de se a teoria porta alguma noção de progresso não é devidamente esclarecida. Por vezes, Boudon parece acreditar em algo como uma direção a crenças objetivas e a um sistema composto de razões verdadeiramente consistentes, em que umas seriam efetivamente mais coerentes que outras. Outras vezes, o autor sustenta um argumento não universalista, em que afirma que um tipo de verdade, científica ou moral, só faz sentido se examinada sua inscrição em tempo e espaços específicos (BOUDON, 1999b, p. 54). Devido à conjunção de postulados diversos, alguns fatos sociais podem ficar sem resposta no modelo teórico. Sugiro, a título de exemplo, algumas questões: se a racionalidade é pressuposta da mesma forma em todos os indivíduos, por que não acabam tendo as mesmas crenças e teorias? Por outro lado, se os contextos dos quais os agentes participam são tão importantes, por que se pressupõe algo como um acordo inquestionável? Nesse caso, quais são os mecanismos que geram a evolução e institucionalização de idéias irreversíveis? Será que a definição de "forças históricas", que impediriam o desenvolvimento e evolução de certas idéias não constituiria uma "caixa preta" que não explica certos mecanismos sociais, algo que Boudon critica fortemente em algumas teorias? Por que, mesmo com os processos reflexivos da contemporaneidade que deveriam estimular o processo de racionalização difusa, um relativismo moral e conceitual ainda vigora com tanta força? Como explicar o ressurgimento de crenças místicas relacionadas com certo encantamento e fatores não racionais?

O problema é que Boudon parece indicar, por vezes, que o nível de nossa competência cognitiva depende de certa complexidade teórica, o que qualifica crenças ou teorias de alguns agentes e setores sociais como efetivamente melhores que outras (cf. BOUDON, 2003a, p. 92-93). Contudo, isso contraria as passagens em que o autor, para explicar seu entendimento sobre as boas razões e sobre a sua noção de racionalidade cognitiva, dá igual dignidade e valor a todas teorias, sejam elas provenientes de esferas ordinárias ou científicas. Por conseguinte, embora a teoria possa fazer sentido quando compreende crenças objetivas e estruturadas em alguns campos científicos, como nas Ciências Exatas, torna-se limitada para examinar as condutas e ações que envolvem a maior parte da população. Mesmo nas áreas científicas, porém, principalmente nas Humanidades, seria problemático supor algum movimento, e mais ainda uma seleção ou evolução, em direção ao acordo acerca de determinados temas. Em certo momento, as teorias tornam-se incomensuráveis, diferenciadas, por exemplo, quanto a suas noções individualistas, liberais ou de cunho estruturalista.

Ainda que Boudon examine questões fundamentais que escapam à escolha racional, e a modelos utilitaristas em geral, e assim exponha aspectos relevantes para a teoria social contemporânea, que incorpora de forma crescente a concepção de ação instrumental, o que parece faltar em sua análise são aspectos essencialmente políticos, relacionados com determinações sistêmicas que legitimam socialmente certas crenças e atitudes e descartam ou impedem a disseminação de outras. Deve-se notar que os indivíduos não expõem suas razões, boas ou fortes, em um ambiente desprovido de certa reprodução política do imaginário, de modo que idéias e crenças não são constituídas de forma livre e autônoma na sociedade. É preciso refletir também sobre o fato de que a capacidade de percepção dos agentes pode ser, muitas vezes, fundamentada pela habilidade de certos grupos ou indivíduos manipularem outros (HAMLIN, 1999, p. 85). Nesse caso, a suposição de uma autoridade legítima, revelada por um processo de evolução das normas e aceita voluntariamente por todo um conjunto de pessoas, perde consistência ou mesmo não observa fenômenos essenciais da realidade. Deve-se destacar, por exemplo, o fato de que a própria racionalidade instrumental está diretamente articulada a uma peculiar dimensão econômica - o mercado - que é objeto de disputas e conflitos na modernidade.

Além disso, cabe notar não somente a dimensão de um sistema estruturado na sociedade ou nas instâncias formais de poder, mas perceber também a capacidade de certas movimentações políticas definirem formas originais de crenças e atitudes que podem até mesmo desafiar um imaginário hegemônico. Como supor, então, certa linearidade como exposto na idéia de "racionalidade difusa"? Conceber uma racionalidade imparcial parece indicar uma direção histórica que define a priori os caminhos a serem traçados nas disputas políticas. Ainda que Boudon não trace tal direção explicitamente, dado que não focaliza o campo das lutas políticas, sua teoria da racionalidade sugere padrões cognitivos universais que tendem a definir algumas crenças e normas como inquestionáveis. Nesse sentido, há uma indefinição dos âmbitos específicos da ciência e da política, tendo-se o perigo de definir um pensamento técnico que reproduz certas concepções sobre o mundo social, e limita entender a abertura que a própria realidade ordinária dá aos agentes.

Quando a teoria de Boudon permanece indecisa entre a ênfase sobre os parâmetros contextuais ou a definição de uma razão universal, e atém-se a irreversibilidades de um processo de racionalização proveniente de uma concepção abstrata da mente e da cognição humana, perde referência de fatores circunstanciais, criativos e imaginários, que podem também definir e dirigir as ações. Mesmo estruturada social e historicamente, a realidade é, em parte, caracterizada por um caráter fluído e aberto, o que configura o espaço sociopolítico como um campo em constante construção. Dessa forma, as capacidades reflexivas dos agentes podem expressar algo além tanto da atividade instrumental quanto de um processo social linear de racionalização. A dimensão simbólica participa da razão, e assim possibilita uma capacidade de invenção que nega a possibilidade de uma racionalidade absoluta ou consciência pura. Novas representações sociais, ainda que envolvidas em contextos estruturais marcados por relações de poder, são capazes de engendrar criativamente, a partir da retórica e da persuasão, novos imaginários que se contrapõem a uma realidade hegemônica. Por conseguinte, a racionalidade não expressa apenas fatores cognitivos universais ou mecanismos de imposição da visão de um grupo social, mas também habilidades reflexivas ordinárias que podem redefinir as instituições de uma sociedade.

Recebido em 12 de novembro de 2008.

Aprovado em 31 de março de 2009.

Bruno Sciberras de Carvalho (brunosci@msn.com) é Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e Professor de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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  • 1
    Há vasta literatura que trata da teoria da escolha racional. Para uma exposição abrangente de diversas concepções e vertentes da teoria, sobretudo do entendimento político, cf. William Mitchell e Randy Simmons (1994). Dentre os autores que fundamentaram os parâmetros centrais da escolha racional, o trabalho de Mancur Olson (1971) ainda é o mais amplo para uma discussão tanto sociológica quanto política de suas concepções centrais. Para debates críticos, ver Donald Green e Ian Shapiro (1994) e Bruno Carvalho (2008).
  • 2
    Os fundamentos centrais dessa perspectiva metodológica encontram-se no célebre artigo de Milton Friedman (1953).
  • 3
    Há uma grande discussão no campo da escolha racional a respeito da metodologia adequada para predizer-se as ações. Em geral, pode-se perceber dois entendimentos: o que adota uma concepção "fraca" de racionalidade, que não predetermina os valores dos indivíduos, e outro "forte", que especifica
    a priori os objetos e bens valorizados pelos agentes. Entretanto, pode-se notar o predomínio da noção "forte", dada sua maior capacidade teórica de antecipar os cursos de ação. Ver Hechter (1997, p. 193-195).
  • 4
    Algumas concepções expostas em parte da obra de Elster (1994, p. 137-148) são exemplares da primeira vertente. Pode-se notar que o autor relaciona as normas sociais com valores universais que poderiam ser encontrados em qualquer tipo de sociedade e momento histórico, como a eqüidade, o altruísmo e o que denomina "conduta kantiana". Para um debate sobre o caráter funcionalmente adequado ao desempenho do mercado na teoria social da escolha racional, expresso na noção de capital social e nas tentativas de limitar as conseqüências de externalidades negativas a partir de normas sociais, ver Carvalho (2008, p. 129-178).
  • 5
    Para uma análise da trajetória teórica de Boudon, que mostra sua preocupação constante em aliar seu método individualista a uma peculiar percepção estrutural, ver Cynthia Hamlin (1999).
  • 6
    Sobre outras vertentes do individualismo metodológico, inclusive as que enfatizam uma apreciação explicitamente normativa e moral do individualismo, ver Lars Udehn (2002).
  • 7
    Para uma análise da questão do paradoxo do voto, ver Donald Green e Ian Shapiro (1994, p. 55).
  • 8
    Boudon faz referência ao conceito desenvolvido pela filosofia política inglesa do século XVIII, presente, sobretudo, no trabalho de Adam Smith.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      12 Nov 2008
    • Aceito
      31 Mar 2009
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