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Deliberação online em consultas públicas? O caso da assembleia legislativa de Minas Gerais

Resumos

Este artigo busca analisar uma consulta pública online sobre reforma política promovida em 2011 pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Embasado pela teoria deliberacionista, o estudo de 752 posts guiou-se pela discussão de seis tópicos: (1) inclusividade; (2) provimento de razões; (3) reciprocidade; (4) respeito mútuo; (5) orientação para o bem comum; e (6) articulação entre arenas. Os resultados indicam: (1) uma sobrerepresentação de participantes masculinos e oriundos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, embora não tenha havido concentração de posts em alguns comentadores; (2) o predomínio de posts on topic e que apresentam justificativas para as posições advogadas; (3) índices muito baixos de reciprocidade entre posts e de uso de marcadores de interatividade; (4) graus muito elevados de respeito; (5) diferentes formas de ligação das justificativas a ideias de bem comum; (6) o baixo impacto decisório e a conexão com outras arenas da esfera pública, destacando-se a relação com uma matéria publicada em jornal de grande circulação. Os achados são ambivalentes para os defensores da deliberação, indicando baixa probabilidade de deliberação interna ao fórum, mas algum potencial deliberativo quando se adotam lentes mais amplas. Os cruzamentos entre variáveis sugerem que as pessoas tendem a prover mais justificativas em discussões mais controversas, embora tendam a dialogar menos nesses casos. Assim, a hipótese da preferência por conversas entre like-minded encontra respaldo nos dados analisados.

Deliberação; Consulta pública online; Legislativo; Reforma Política; Internet


This paper utilizes deliberative democratic theory to analyze an online public consultation forum about political reform implemented by Minas Gerais State Legislature (ALMG), Brazil. Six topics guided the discussion of the 752 posts from this forum: (1) inclusiveness; (2) provisions of reasons; (3) reciprocity; (4) mutual respect; (5) orientation as it relates to the common good; and (6) articulation between arenas. The results point to (1) an over-representation of male participants and of dwellers of the Metropolitan Region of Belo Horizonte, although no participant monopolized the discussion; (2) the prevalence of on topic posts that present some form of justification for positions advocated; (3) very low levels of reciprocity between posts and of interactivity markers; (4) extremely high levels of respect; (5) different forms of articulating the common good; and (6) low impact in decision-making but interesting connections with the broader public sphere, specially through a story published by a newspaper.The findings of this study indicate a low probability of internal dialogue, which is contrary to the outcome desired by the supporters of deliberation. However, the potential for deliberative debates still exist if broader lenses are adopted. Tabulations between variables suggest that people tend to provide more reasons when commenting on more controversial discussions, although they tend to be less reciprocal in these situations. Thus, the hypothesis that suggests a preference for participation in conversations among like-minded discussants is supported by the analyzed data.

Deliberation; Online Public Consultation; Legislative Power; Political Reform; Internet


I(ricardofabrino@hotmail.com) é doutor em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor do Departamento de Ciência Política da mesma instituição

II(eflamaral@gmail.com) é doutor em Sociologia/Demografia pela Universidade do Texas em Austin e professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

RESUMO

Este artigo busca analisar uma consulta pública online sobre reforma política promovida em 2011 pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Embasado pela teoria deliberacionista, o estudo de 752 posts guiou-se pela discussão de seis tópicos: (1) inclusividade; (2) provimento de razões; (3) reciprocidade; (4) respeito mútuo; (5) orientação para o bem comum; e (6) articulação entre arenas. Os resultados indicam: (1) uma sobrerepresentação de participantes masculinos e oriundos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, embora não tenha havido concentração de posts em alguns comentadores; (2) o predomínio de posts on topic e que apresentam justificativas para as posições advogadas; (3) índices muito baixos de reciprocidade entre posts e de uso de marcadores de interatividade; (4) graus muito elevados de respeito; (5) diferentes formas de ligação das justificativas a ideias de bem comum; (6) o baixo impacto decisório e a conexão com outras arenas da esfera pública, destacando-se a relação com uma matéria publicada em jornal de grande circulação. Os achados são ambivalentes para os defensores da deliberação, indicando baixa probabilidade de deliberação interna ao fórum, mas algum potencial deliberativo quando se adotam lentes mais amplas. Os cruzamentos entre variáveis sugerem que as pessoas tendem a prover mais justificativas em discussões mais controversas, embora tendam a dialogar menos nesses casos. Assim, a hipótese da preferência por conversas entre like-minded encontra respaldo nos dados analisados.

Palavras-chave: Deliberação; Consulta pública online; Legislativo; Reforma Política; Internet

ABSTRACT

This paper utilizes deliberative democratic theory to analyze an online public consultation forum about political reform implemented by Minas Gerais State Legislature (ALMG), Brazil. Six topics guided the discussion of the 752 posts from this forum: (1) inclusiveness; (2) provisions of reasons; (3) reciprocity; (4) mutual respect; (5) orientation as it relates to the common good; and (6) articulation between arenas. The results point to (1) an over-representation of male participants and of dwellers of the Metropolitan Region of Belo Horizonte, although no participant monopolized the discussion; (2) the prevalence of on topic posts that present some form of justification for positions advocated; (3) very low levels of reciprocity between posts and of interactivity markers; (4) extremely high levels of respect; (5) different forms of articulating the common good; and (6) low impact in decision-making but interesting connections with the broader public sphere, specially through a story published by a newspaper.The findings of this study indicate a low probability of internal dialogue, which is contrary to the outcome desired by the supporters of deliberation. However, the potential for deliberative debates still exist if broader lenses are adopted. Tabulations between variables suggest that people tend to provide more reasons when commenting on more controversial discussions, although they tend to be less reciprocal in these situations. Thus, the hypothesis that suggests a preference for participation in conversations among like-minded discussants is supported by the analyzed data.

Keywords: Deliberation; Online Public Consultation; Legislative Power; Political Reform; Internet

I. Introdução1 1 O presente artigo foi produzido no âmbito do projeto Deliberação online?, que conta com financiamento da FAPEMIG (Edital 01/2011 / Processo: SHA - APQ-00544-11 e Edital 03/2013, Processo CSA - PPM-00211-13) e da Pró-reitoria de pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (Edital PRPq 12/2011). O projeto também contou com apoio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A estas instituições somos muito gratos. Também temos dívida de gratidão com Eleonora Schettini Cunha e Lucas Maroca de Castro pela enorme ajuda para a viabilização deste artigo. Somos gratos, ainda a Stéfany Sidô, Fernando Vieira de Freitas e Wesley Mateus de Oliveira pelo apoio na finalização do banco de dados que alimenta este estudo. Por fim, registramos nossos agradecimentos aos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e Política.

É cada vez maior o número de iniciativas digitais voltadas a gerar algum tipo de aproximação entre cidadãos e representantes políticos. As experiências nessa direção são impulsionadas não apenas pelo próprio Estado, mas também por organizações civis, partidos, empresas e indivíduos. Tais experiências incluem práticas tão diversas como consultas públicas, plataformas de produção colaborativa de conhecimento, dispositivos de acompanhamento de políticas públicas e execução orçamentária, chats com autoridades, transmissão de reuniões de comissões parlamentares e de audiências públicas, blogs e microblogs de candidatos, além de grupos de discussão em redes sociais, para citar apenas alguns exemplos.

Nessa ampla gama de iniciativas, chamam atenção as várias dimensões que podem contribuir para aproximar cidadãos de representantes: informação, partilha de poder, relacionamento afetivo, discussão, entre outros. Sem negar o potencial das demais dimensões para o aprofundamento da experiência democrática, e acreditando que todas elas atravessam-se de maneiras complexas, a teoria deliberacionista de democracia ressalta o papel da discussão pública na construção de uma relação de alimentação recíproca entre Estado e sociedade.

Há, entretanto, muitas dúvidas sobre a capacidade de iniciativas digitais de fomentar processos de discussão online. Quando se fala, especificamente, sobre iniciativas institucionais, as dúvidas ficam ainda maiores. Teriam elas capacidade de alimentar amplos debates públicos? Conseguiriam motivar cidadãos a discutir temas de interesse público junto a seus concidadãos? Ou o próprio ceticismo em relação a tais instituições se encarregaria por bloquear as possibilidades de debate?

O presente artigo busca refletir sobre tais questões ao propor uma análise sobre uma experiência específica: a consulta pública virtual sobre reforma política promovida pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em 2011. O objetivo é discutir tal iniciativa à luz de alguns operadores derivados da teoria deliberacionista. Espera-se, assim, contribuir não apenas para a compreensão dessa iniciativa singular, mas também, para o avanço da literatura empírica dentro dos quadros da matriz deliberativa.

O texto está estruturado em quatro seções. Na primeira delas, discutimos, brevemente, alguns estudos na área de deliberação online para situar o campo conceitual em que se inscreve o presente estudo. Na segunda, apresentamos e contextualizamos as consultas públicas da ALMG no bojo de um processo mais amplo de mudança institucional em curso há duas décadas. Na terceira seção, abordamos a metodologia empregada. Finalmente, na quarta seção, apresentam-se os resultados da análise.

II. Deliberação online

No interior da teoria deliberativa de democracia, iniciativas e experiências digitais têm ganhado cada vez mais atenção (Davies 2009). Sem a euforia dos estudos da década de 1990, que buscavam, na internet, a configuração de uma nova esfera pública, diversos autores têm se dedicado a ler práticas online sob as lentes da abordagem deliberacionista2 2 Para alguns exemplos, ver: Pedrini (2012), Kies (2010), Wales, Cotterill e Smith (2010), Davies e Grangadharan (2009), Bächtiger et alii (2009), Mutz (2006), Wojcieszak e Mutz (2009), Graham e Witschge (2003), Janssen e Kies (2005), Marques, F. (2006), Marques, A. (2011), Sampaio, Maia e Marques (2010) e Mendonça e Pereira (2012). . Esses estudos podem elucidar tanto caminhos como obstáculos para o fortalecimento de processos democráticos contemporâneos.

De forma muito sucinta, entende-se, por deliberação, o intercâmbio público de razões marcado pela igualdade entre os sujeitos nele envolvidos. A deliberação é uma prática social dialógica em que atores buscam convencer seu interlocutor por meio da troca discursiva. Essa concepção, de base habermasiana, viu-se teoricamente desenvolvida nos anos 1990 em uma série de trabalhos fundamentais3 3 Merecem destaque Dryzek (1990), Bohman (1996), Gutmann e Thompson (1996) e Benhabib (1996), além do próprio Habermas (1992; 1995; 1997). Não é objetivo do presente artigo discutir as múltiplas abordagens no interior do guarda-chuva mais amplo de perspectivas deliberacionistas. Reconhece-se, todavia, que os autores, aqui, mencionados têm leituras diferentes da noção de deliberação. . Desde então, houve uma proliferação de estudos voltados: (i) à organização da literatura sobre a abordagem e à discussão de críticas a ela4 4 Bohman (1998), Chambers (2003), Fraser (1999), Sanders (1997), Mouffe (2005), Macedo (1999), Hibbing e Theiss-Morse (2002), Elster (1998), Young (1996), Gutmann e Thompson (2004), Dryzek (2000), Habermas (2005) e Thompson (2008). ; (ii) ao estudo de experiências democráticas e minipúblicos pautados pela teoria5 5 Fishkin (2009), Hendriks (2011), Hendriks e Carson (2008), Warren (2007), Gastil e Levine (2005), Fung (2004), Coelho e Nobre (2004), Fung e Wright (2003), Ackerman e Fishkin (2003), Fishkin e Luskin (2000; 2006), Wampler e Avritzer (2004), Avritzer (2002; 2006), Baiocchi (2005), Abers e Keck (2006), Coelho, Pozzoni e Montoya (2005) e Cornwall e Coelho (2009). ; (iii) à construção de operadores analíticos para investigações empíricas6 6 Steenbergen et alii (2003), Bächtiger et alii (2009), Black et alii (2009), Stromer-Galley (2007), Kies (2010), Wales, Cotterill e Smith (2010), Graham e Witschge (2003), Wessler (2008), Maia (2008), Marques (2011), Sampaio, Maia e Marques (2010) e Mendonça e Pereira (2012). e (iv) à expansão da abordagem deliberacionista7 7 Habermas (2006), Dryzek (2010), Chambers (2009), Mansbridge (1999), Young (2000), Hendriks (2006), Parkinson (2006), Goodin (2008), Mansbridge et alii (2010), Parkinson e Mansbridge (2012), Maia (2008) e Mendonça (2010; 2011). .

A literatura mais contemporânea nessa área faz questão de ressaltar que a deliberação precisa ser compreendida como um processo que se constrói no cruzamento de várias arenas e de muitos momentos (Mansbridge 1999; Hendriks 2006; Parkinson 2006; Mendonça & Santos 2009). Trata-se, pois, de um processo que deve ser pensado por uma lógica sistêmica, que não busca encontrar todas as características do processo em cada enunciado ou enunciador (Goodin 2008; Bächtiger et al. 2009). Nesse sistema deliberativo, as razões podem manifestar-se de várias formas e não implicam um apagamento de emoções ou uma frieza de fala. A deliberação tampouco requer que participantes abram mão de interesses privados ou que cheguem a um consenso substantivo sobre seus valores e preferências. O que é necessário é um processo de choque público de discursos que induza à reflexão e promova a conexão entre experiências singulares e princípios gerais (Dryzek 2000).

É dentro dessa visão ampliada que os estudos sobre deliberação online se multiplicaram. Fóruns online podem funcionar como arenas em meio a processos discursivos mais amplos, contribuindo para alimentar processos deliberativos. "Longe de comprometer os benefícios dos encontros face-a-face, a comunicação mediada por computador pode provar-se especialmente útil ao trabalho deliberativo" (Price 2009, p. 37)8 8 As traduções de língua estrangeira são de responsabilidade dos autores. . Kies (2010) também enfatiza que não há contradição entre internet e deliberação, ainda que muitos julguem que aquela apenas induz interações frívolas e descompromissadas. Embora crítico de muitos estudos sobre deliberação online, Lupia (2009, p. 60) é outro a vislumbrar seu potencial.

O interesse por esse potencial tem impulsionado diversas investigações sobre experiências digitais. Alguns trabalhos precursores a serem citados são as pesquisas de Wilhelm (2000) sobre a Usenet e fóruns de discussão nos Estados Unidos da América (EUA), a comparação feita por Jensen (2003) envolvendo um grupo de Usenet (dk.politik) e um fórum patrocinado pelo governo (Nordpol.dk), na Dinamarca, e os estudos de Dahlberg (2001) sobre a célebre experiência norte-americana do Minessota E-Democracy. Também é bastante citada a investigação de Graham e Witschge (2003) sobre um site governamental britânico (o UK Online) que, à época, possuía cerca de 20 mil postagens.

Investigações mais recentes evidenciam a riqueza desse campo de estudos com uma profusão de objetos investigados. Stromer-Galley (2007), em artigo já clássico para pesquisadores de deliberação online, voltou-se ao desenvolvimento de uma grade analítica que foi aplicada a um processo deliberativo digital (The Virtual Agora Project), envolvendo 568 residentes de Pittsburgh,sobre o futuro de escolas públicas subutilizadas. Kies (2010), por sua vez, debruçou-se sobre o fórum de um partido italiano (o Radicali Italiani) e sobre uma experiência eleitoral francesa, bem como sobre dados de diversos surveys europeus e americanos.

Sæbø e seus colaboradores (2009) enfocam um fórum norueguês (o D:mo), abordando a importância do design de iniciativas digitais. Algumas das falhas da experiência são atribuídas à negligência de aspectos da cultura política local. Wright e Street (2007) também evidenciam a papel do desenho das experiências online na promoção ou na restrição de processos deliberativos. Os autores realizam um estudo de caso sobre o Futurum (um fórum virtual da União Europeia) e chamam a atenção para o modo como o tipo de moderação, o contexto institucional e a vinculação com a feitura de políticas públicas contribuíram para que os debates fossem levados mais a sério.

Gerhards e Schäfer (2010) realizam uma interessante distinção entre tipos de fóruns virtuais, contribuindo para a compreensão de que a deliberação online não pode ser pensada de maneira única. Os processos que ocorrem por meio de trocas de e-mails, os que se inserem em grupos de discussão e aqueles que emergem dos motores de busca são inteiramente distintos. Com base nessa ideia, eles comparam debates na internet e na mídia massiva sobre o genoma humano na Alemanha e nos EUA, em um corpus composto por 1 900 artigos de jornal e 144 websites.

O trabalho de Wojcieszak e Mutz (2009), por sua vez, apresenta avanços interessantes ao evidenciar que debates políticos na internet tendem a ocorrer em espaços que não foram inicialmente desenhados para discutir política. As autoras realizaram um survey junto a 1 028 pessoas, demonstrando que os grupos sobre hobbies e lazer tendem a suscitar controvérsias sobre questões públicas. Lev-On e Manin (2009) também argumentam que espaços não centralmente voltados à discussão política podem fomentar acidentes felizes, em que visões conflitantes se chocam publicamente.

Importante citar, ainda, um veio de estudos preocupado com a compreensão da adaptação de alguns formatos de minipúblicos à internet. Freschi e Mete (2009) estudam dois "Town Meetings" digitais realizados na Toscana em 2006 e 2007, indicando que as experiências teriam acabado por gerar certa domesticação dos movimentos participativos da região (idem, p. 42). Visões mais positivas sobre o potencial de minipúblicos online aparecem no estudo de Hamlett (2002) sobre uma consensus conference realizada nos EUA e na leitura de Fishkin (2009) sobre os síncronos e Voice-Based Online Deliberative Polls. Outra experiência a apresentar alguns resultados frutíferos é desenvolvida por Wales, Cotterill e Smith (2010), em que dois grupos virtuais selecionados aleatoriamente discutiram questões polêmicas no Reino Unido.

No Brasil, o número de estudos sobre deliberação online também tem crescido significativamente. Sampaio, Maia e Marques (2010) conduziram uma rica pesquisa sobre o orçamento participativo digital de Belo Horizonte, analisando 375 mensagens. Miola (2009) analisa um fórum do Portal da Câmara dos Deputados sobre participação popular, explorando 90 mensagens. Mendonça e Pereira (2012) investigam 118 comentários de usuários em torno dos projetos de lei mais polêmicos disponíveis na plataforma do votenaweb. Marques (2011), Maia (2008) e Francisco Marques (2006) apresentam discussões de caráter mais teórico sobre deliberação online, e Sampaio, Barros e Moraes (2011) fazem um levantamento bibliográfico sobre os indicadores empíricos mais adotados.

Essa ampla gama de estudos, tanto no Brasil como no exterior, explicita a diversidade de métodos, de enfoques e de objetos investigados. Deliberação Online é um fenômeno por demais amplo, podendo adquirir estruturas e características muito diferentes em redes sociais, blogs, sites de notícias, listas de discussão, fóruns de naturezas diversas, chats, comunidades virtuais, vídeos do YouTube e fluxos do Twitter. Nessa seara de possibilidades, nota-se um grande interesse por consultas públicas, como a que será aqui enfocada.

De acordo com Fishkin (2009, p. 23), "para consultar o público, precisamos comunicar com ele de algum modo, ou permitir que ele comunique entre si. Como isso é feito pode afetar tanto quem é consultado como os tipos de opiniões que são solicitadas". O pesquisador demonstra preocupação com as consultas que nem promovem a troca de razão entre os participantes, nem são representativas da população consultada: "consultas com pessoas auto-selecionadas que expressam o que vem à mente não provêm um microcosmo do público nem representam julgamentos considerados" (idem, p. 31).

Kies (2010) analisa diversas pesquisas sobre consultas online, argumentando que iniciativas organizadas por governos tendem a fortalecer a reciprocidade entre os participantes, os níveis de respeito e a "deliberatividade" de uma forma mais geral, visto aumentarem o potencial de impacto externo dos participantes. Schlosberg, Zavestovski e Shulman (2009), por sua vez, buscaram comparar, por meio de um survey com 1 553 participantes, se consultas eletrônicas sobre leis ambientais fomentariam práticas mais deliberativas. Os dados analisados não indicam, contudo, uma postura muito deliberativa dos participantes. Shane (2009) é outro a discutir consultas públicas governamentais, advogando que práticas deliberativas poderiam contribuir para a superação de relações de poder que minam muitas experiências participativas.

Essas discussões sobre o potencial e os dilemas deliberativos de consultas online conduzem-nos ao objeto do presente artigo: uma consulta sobre reforma política produzida pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Para melhor compreendê-la, faz-se agora preciso contextualizar a experiência e delinear suas características gerais.

III. A assembleia legislativa de Minas Gerais e as consultas públicas online

O poder Legislativo mineiro tem experimentado uma profunda transformação desde meados da década de 1980, quando a redemocratização do país e um diagnóstico negativo sobre a imagem da Assembleia impulsionaram várias inovações institucionais (Anastasia 2001; Mangue 2008; Oliveira 2009; Rocha 2011; Mendonça & Cunha 2012). Nesse processo, foram criados diversos mecanismos de interlocução entre a instituição e a sociedade, no intuito de fomentar a aproximação entre elas. Passados mais de 20 anos do início de tal processo, as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) têm ganhando crescente centralidade.

Isso não significa que a valorização das TICs na ALMG seja recente. Ele remonta ao final da década de 1970, momento em que tem início o processo de informatização da instituição (Anastasia 2001, p. 28). No entanto, é em meados dos anos 1990, com o primeiro boom da internet, que as TICs começam a ser pensadas pela Casa com o intuito de intensificar o contato da ALMG com o corpo de cidadãos mineiros. Em 1995, a Casa cria seu primeiro portal, tornando-se o segundo legislativo "estadual a estrear o seu canal de comunicação pela internet"9 9 Disponível em: http://www.almg.gov.br/sobre/sobre-o-portal.html. Acesso em: 26.jan.2014. .

Desde então, a Assembleia tem feito esforços significativos para ampliar sua inserção online. Tais esforços mostram-se particularmente incisivos no final da primeira década de 2000, quando a Casa conclui um Direcionamento Estratégico para o período 2010-2020. Nota-se, em primeiro lugar, a instituição do Comitê Gestor do Portal da Assembleia, por meio da Deliberação n. 2 496, de 6 de dezembro de 2010. O órgão tem "o objetivo de planejar e coordenar a estruturação e o funcionamento do portal da Assembleia Legislativa na web"10 10 Sítio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O endereço não está mais disponível. (Nota do Revisor). . Cabe ao Comitê estabelecer diretrizes para a arquitetura informacional do portal, bem como políticas sobre serviços e atualizações. A partir de seu trabalho, nota-se uma profunda reformulação do portal da Casa, com a defesa de estruturas mais acessíveis ao cidadão e interativas. O Comitê também tem discutido políticas de uso de mídias digitais que ultrapassam a arena do portal.

É no bojo dessas transformações que se fortalece o uso pela ALMG das Consultas Públicas Online. Trata-se de um "recurso em que o internauta é convidado a apresentar contribuições sobre temas relacionados a eventos institucionais ou a proposições legislativas"11 11 Sítio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O endereço não está mais disponível. (N. T.). . Coleman (2009) e Peixoto e Ribeiro (2009) revelam que muitas casas legislativas (em diversos níveis) têm procurado criar canais de interação entre parlamentos e cidadãos12 12 Experiências como a do portal E-Democracia da Câmara dos Deputados do Brasil, as consultas públicas do Parlamento Britânico, os fóruns online do Bundestag alemão e a Ágora do Parlamento Europeu tornaram-se célebres. . Essas iniciativas apontam possibilidades de uma maior conexão entre o poder Legislativo e os cidadãos, o que pode ter consequências positivas para o fortalecimento democrático, para a educação cívica e para a imagem pública das instituições e dos parlamentares. No entanto, a implementação de tais experiências não é destituída de riscos. O processo pode frustrar os cidadãos, acirrar conflitos internos na instituição, promover a fragmentação de discussões e, mesmo, enfraquecer a participação cidadã em outros espaços.

Apesar dos riscos, no âmbito da ALMG as consultas são vistas como importantes para atrair a presença de cidadãos geralmente distantes da instituição. Por tratar-se de uma modalidade diferente de participação, elas podem aumentar a "presença" de pessoas do interior do estado nas discussões da Casa, além de facilitar o engajamento de cidadãos que não estão vinculados a entidades da sociedade civil organizada. Ademais, acredita-se que o uso de dispositivos digitais tenda a fomentar a participação de públicos jovens, afastados frequentemente de processos de participação política.

Consultas Públicas Online começaram a ser empregadas pela ALMG em 2009, por ocasião do Fórum Técnico sobre o Plano Decenal de Educação. Depois, o recurso foi empregado três outras vezes, tratando das seguintes temáticas: reforma política, agenda da ALMG (Fórum Democrático para o Desenvolvimento de Minas Gerais) e pobreza e desigualdade (Seminário Legislativo Pobreza e Desigualdade). A Tabela 1, a seguir, mostra o número total de comentários observados em cada uma dessas iniciativas.

As consultas públicas já realizadas tiveram duração variada: de 20 a 32 dias. O início da consulta é precedido por uma campanha de divulgação, que envolve a mídia de massa, os canais institucionais e o envio de correspondências e e-mails a entidades cadastradas nos bancos de dados da ALMG. Na página, o internauta encontra informações básicas sobre o tema em discussão e um convite para participar.

Atualmente, tal participação dá-se por meio da postagem de comentários em subseções temáticas. Essa subdivisão visa a organizar o processo, evitando sua dispersão. Mensagens postadas permanecem disponíveis para que outros participantes possam lê-las e, eventualmente, responder a elas. Importante mencionar, ainda, a existência de um "Termo de Uso e Política de Privacidade", que rege a participação dos usuários. Com a finalidade de manter a ordem no sítio, há uma equipe responsável pela filtragem prévia das postagens (posts) dos cidadãos.

Para enviar contribuições, os cidadãos interessados precisam preencher um cadastro. Na primeira vez em que a consulta foi realizado, em 2009, o cadastro era extenso, com diversos campos. A partir de 2011, ele dá lugar a uma versão mais dinâmica. O participante só precisa informar nome, e-mail, município e estado. As contribuições são feitas em um espaço livre, organizado por subtemas.

As Consultas Públicas Online, geralmente, subsidiam outros processos participativos da própria ALMG, como Fóruns Técnicos e Seminários Legislativos. Em alguns casos, contudo, elas visam a alimentar debates mais amplos, não voltados para um impacto direto na produção legislativa estadual. Esse foi o caso de uma consulta realizada pela ALMG entre os dias 1º e 27 de junho de 2011, sobre reforma política; um tema controverso e relevante, ainda que fora do escopo da produção legislativa estadual.

Essa inexistência de uma ligação direta com a produção legislativa poderia desmotivar potenciais participantes a se engajarem, como aponta Kies (2010). No entanto, observa-se que a consulta sobre a reforma política foi aquela que recebeu o maior número de contribuições entre as experiências já realizadas pela Assembleia, contabilizando 752 contribuições. Justamente por isso, optamos por investigá-la13 13 Poder-se ia argumentar que a consulta ainda é muito limitada, tendo em vista os 19,6 milhões de cidadãos do estado de Minas Gerais. Embora esse limite seja óbvio, é preciso lembrar que, comparativamente, essa consulta não se mostra menos exitosa do que a maioria das experiências realizadas. Basta lembrar, a título de ilustração, o caso investigado por Miola (2009) de um fórum no portal da Câmara dos Deputados que contou com apenas 90 comentários ao longo de 25 semanas. .

A consulta em questão foi dividida em dez temas (Tabela 2), que estruturaram processos independentes de discussão: (i) cláusula de barreira ou cláusula de desempenho; (ii) coligação eleitoral; (iii) data da posse dos chefes de poder executivo; (iv) fidelidade partidária; (v) filiação partidária e domicílio eleitoral; (vi) financiamento eleitoral e partidário; (vii) reeleição e duração dos mandatos; (viii) sistemas eleitorais; (ix) suplência de senador; (x) unificação das eleições. Cada uma das discussões era aberta por um pequeno texto explicativo sobre os pontos em debate no interior daquele tema, ao qual seguiam as contribuições dos cidadãos.

Cada contribuição publicada vinha acompanhada do nome do participante e de seu município de residência, da data e da hora da postagem e de ícones que permitiam que outros participantes avaliassem a postagem (positiva ou negativamente). Contextualizada a experiência em análise, passamos, agora, à apresentação dos procedimentos empregados.

IV. Metodologia

Para compreender a consulta em questão à luz da teoria deliberacionista, estruturou-se uma grade analítica em diálogo com diversos estudos que têm buscado construir operadores para a análise da deliberação online (Stromer-Galley 2007; Bächtiger et al. 2009; Kies 2010; Wales, Cotterill & Smith 2010; Marques 2011; Sampaio, Barros & Marques 2011; Mendonça & Pereira 2012). A grade foi, contudo, adaptada para o contexto específico das consultas online da ALMG e readaptada sucessivamente ao longo do processo de codificação.

A análise foi guiada por seis variáveis, inspiradas no trabalho de Wales, Cottertill e Smith (2010), pré-testadas em outro estudo (Mendonça & Pereira 2012) e novamente adaptadas no presente trabalho:

Inclusividade - avalia, quantitativamente, o grau de inclusão da consulta no que se refere a gênero e mesorregião de residência do(a) participante, bem como à presença de uma pluralidade de posições. Além disso, observa a dinâmica do fórum para mensurar se houve dominação da arena por alguns participantes.

Provimento de razões - avalia, quantitativamente, o grau de comentários on-topic e a presença ou ausência de justificativas (razões). Dentro dessa variável, também se observaram, qualitativamente, os argumentos e enquadramentos construídos pelos participantes e a utilização de experiências pessoais como fonte de justificação.

Reciprocidade - avalia o grau de interlocução no interior do fórum. A categoria envolve tanto uma interlocução direta entre postagens(por meiode menções explícitas a outros comentários ou por meio de uma interação clara, embora não explicitada), como pela adoção de marcadores frasais que permitem vislumbrar a disposição à interlocução: formulação de perguntas não retóricas e incorporação de contra-argumentos. Ainda como indicador de reciprocidade, contabilizou-se o número de one-timers de cada uma das dez discussões que conformaram a consulta e o número de comentários que foram "curtidos" ou "repudiados" por outros participantes. Nota-se, por fim, uma atenção de ordem qualitativa à reciprocidade discursiva (Mendonça & Pereira 2012), possibilitada pelo mapeamento de enquadramentos mobilizados.

Respeito mútuo - por meio da mensuração de expressões de desrespeito a comentários e a grupos, avalia o grau de respeito dos participantes.

Orientação para o bem comum - avalia, qualitativamente, se e como os participantes buscam vincular seus argumentos a alguma concepção de bem comum e as formas mais recorrentes como o fazem.

Articulação de arenas - analisa a relação da consulta com outras arenas discursivas formais e informais.

A unidade de análise empregada foi o comentário, totalizando-se 745 postagens analisadas. Isso porque foram descartadas sete postagens duplicadas. O processo de codificação foi realizado por quatro codificadores. Inicialmente, realizou-se um pré-teste em uma das discussões específicas. Dúvidas e alterações da matriz analítica foram coletivamente discutidas. Na sequência, os outros nove grupos de discussão foram divididos entre os codificadores, assegurando-se que 30% das postagens de cada um deles fossem analisadas por, pelo menos, dois codificadores. Dúvidas foram novamente debatidas e sanadas a partir da acareação de análises. O banco de dados foi, então, trabalhado com o auxílio do software Stata.

Algumas dificuldades do processo de codificação merecem menção. A principal delas refere-se à variável "reciprocidade", que passou por várias reformulações. No final, optou-se por uma estratificação da variável de modo a criar diferentes parâmetros de avaliação: (i) uma reciprocidade entre postagens; (ii) marcadores de interlocução; (iii) reciprocidade discursiva. Mesmo com essa estratificação, a primeira variável gerou dúvidas e discussões entre os codificadores, já que nem sempre é fácil captar referências implícitas a outras postagens. Optou-se, assim, por uma estratégia conservadora de somente codificar relações bastante claras entre comentários nessa primeira subvariável. A terceira subvariável é de natureza qualitativa e será avaliada a partir dos eixos de enquadramentos adotados.

Outra dificuldade ocorreu com uma tentativa de aplicação do operador sourcing no interior da variável "provimento de razões". Desenvolvido por Stromer-Galley (2007), tal operador busca avaliar as fontes mobilizadas por participantes na sustentação de seus argumentos. Como a grande maioria dos participantes não explicita suas fontes, o operador só poderia ser adotado com uma série de inferências que não julgamos confiáveis.

V. Análise e discussão dos dados

As próximas seções apresentam alguns dados iniciais da pesquisa. Por razões de espaço e escopo, no presente trabalho restringir-nos-emos à apresentação dos dados quantitativos e a breves menções a alguns achados qualitativos. Uma discussão de fôlego sobre os enquadramentos, a reciprocidade discursiva e a variável orientação para o bem comum será realizada em outro artigo.

V.1. Inclusividade

A troca pública de razões prescrita pelos deliberacionistas deve ser inclusiva. No caso das consultas online, havia uma expectativa de que a utilização de uma iniciativa digital expandisse a capacidade da instituição de abrir-se a um maior número de pessoas. Os dados analisados mostram, contudo, que a própria consulta é perpassada por certas formas de exclusão. Isso fica claro, por exemplo, se observa-se a distribuição dos comentários por sexo. Dos 745 comentários, 76% foram realizados por homens, 20% por mulheres e, em 4% deles, não foi possível identificar o sexo da pessoa. O fato de apenas 20% dos comentários serem enviados por mulheres mostra como a arena online reproduz padrões de exclusão que tendem a restringir a participação feminina em esferas de discussão pública (Pateman 1992). O achado corrobora diversas pesquisas que encontram fóruns com ampla sobrerrepresentação masculina (Kies 2010)14 14 Curiosamente, Kies (2010, p. 128) encontra exatos 76% de participantes masculinos em sua análise sobre o fórum do Partido Radical Italiano, embora ele declare-se não surpreso com esse resultado dada a sobrerrepresentação masculina na vida política e especialmente em fóruns online. . Tais estudos também revelam uma concentração da participação em pessoas jovens. No entanto, não tivemos acesso aos dados sobre a faixa etária dos participantes para averiguar tal hipótese.

Uma segunda forma de assimetria que mostra os limites de inclusividade da consulta é de ordem territorial. A ALMG esperava que o uso de iniciativas digitais ampliasse o contato da instituição com moradores de todas as regiões do estado. No entanto, a análise da distribuição geográfica das postagens evidencia a enorme concentração de mensagens na capital mineira (Tabela 3).

Como se nota, a representatividade geográfica dos comentários é muito pequena. A Região Metropolitana de Belo Horizonte é responsável por mais de 80% das postagens, embora tenha cerca de 30% dos cidadãos do estado. Essa concentração revela que o provimento de plataformas virtuais não é suficiente para assegurar a capilarização almejada.

Para além desses dados sociodemográficos, outro critério que ajuda a refletir sobre a questão da inclusividade é a observação da concentração de postagens enviadas por algumas pessoas. Consultas dominadas por um número reduzido de pessoas são menos inclusivas. Os dados da consulta pública sobre reforma política da ALMG revelam que não houve uma concentração das mensagens em poucas pessoas. Das 204 pessoas (e entidades coletivas) que enviaram mensagens, 51 postaram mais de cinco mensagens. Apenas 15 pessoas postaram dez ou mais vezes, sendo que esses 7% de participantes foram responsáveis por 7% das mensagens (Tabela 4).

Um último critério empregado para a discussão da inclusividade diz respeito à presença de uma "pluralidade de vozes" (Kies, 2010). Para tanto, cada um dos grupos de discussão teve seus comentários categorizados em torno de algumas posições. Interessava-nos observar se diversas posições encontravam-se representadas ou se a arena em questão era dominada por uma única posição. Cada grupo teve sua própria categorização de posições, sendo que, em alguns deles, três posições foram suficientes para mapear as postagens, enquanto em outras, quatro posições fizeram-se necessárias. Para estimar o índice de dominância de cada um dos grupos, calculou-se a diferença relativa entre a posição dominante e a posição secundária (Tabela 5). Mais adiante, serão apresentadas diferentes categorizações do índice de dominância, com o objetivo de investigar sua correlação com as variáveis analisadas.

Os dados indicam uma grande variação entre os grupos. Alguns deles são relativamente equilibrados, como os que tratam de: data da posse dos chefes do Executivo, financiamento eleitoral, reeleição e duração dos mandatos. Em outras, as assimetrias são significativas e mostram a existência de uma arena amplamente dominada por uma única posição. É o caso do grupo que versa sobre a suplência dos senadores (em que 80% dos comentadores defendem a abolição da suplência), do que trata de filiação partidária e domicílio eleitoral (em que 82% advogam o fortalecimento dos vínculos entre candidatos e cidadãos), aquele que trata da unificação das eleições (em que 69% mostram-se favoráveis a essa proposta) e o sobre sistemas eleitorais (77% a favor do voto majoritário).

V.2. Provimento de razões

A deliberação implica um intercâmbio de razões, no sentido de que os atores precisam justificar seus atos. Argumentar não significa fazer uso de um tipo especial de comunicação, epistemicamente complexo. O importante é apenas que a posição de um dado ator expresse alguma forma de justificativa.

O primeiro operador empregado para avaliar a racionalidade dos comentários diz respeito à quantidade de postagensque versavam sobre os temas em foco em cada grupo de discussão. Os exemplos abaixo ilustram postagens codificadas, respectivamente, como On Topic e Off Topic.

Postagem On Topic, grupo Cláusula de Barreira: "Essa clausula de barreira deveria ser de 10%, acho que deveriamos ter no maximo 2 partidos politicos, um de situaçao e outro de oposicao, evitaria este franksteim de coligacoes, como pode o PT e PMDB ser coligados?"15 15 Todas os postagens apresentados no artigo foram reproduzidos exatamente como aparecem na página da ALMG, sem correções ortográficas, gramaticais e de forma (caixa alta e baixa, por exemplo).

Postagem On Topic, grupo Cláusula de Barreira: "Chega dos nossos políticos agirem como se fossem os nossos colonizadores, que nos exploram, tiram todas as nossas riquezas em benefício próprio. É hora deles pensarem no bem e na grandeza do nosso país.Sejam homens honrados e respeitem o povo".

A análise mostra que 95% dos 745 comentários da consulta foram On Topic. A Tabela 6, a seguir, apresenta os altos índices de comentários focados em cada um dos grupos analisados.

O fato de o primeiro grupo apresentar um percentual maior de postagens Off Topic é compreensível, já que algumas pessoas entram no primeiro fórum listado pelo sítio para falar sobre outros assuntos. Ainda assim, o percentual de postagens On Topic é bastante alto. Isso indica que o tratamento discursivo dado às questões não foi disperso, o que é importante para a discussão.

Quando se atenta para a presença de justificativas nas mensagens, também encontram-se condições favoráveis à existência de um debate dentro da consulta. Os exemplos abaixo ilustram postagens codificadas, respectivamente, como com e sem justificativa:

Postagem com justificativa, grupo "Sistemas Eleitorais": "Sou a favor do sistema majoritário uninominal por entender que nesse sistema todas as regiões teriam uma representatividade na câmara de forma igualitária".

Postagem sem justificativa, grupo "Sistemas Eleitorais": "Sou a favor do sistema majoritário para eleição de vereadores e deputados no qual é eleito o candidato com maior número de votos. Adotado no Brasil para escolha de senadores, prefeitos, governadores e presidente da República".

No total, 63% dos comentários apresentam razões sobre a posição que advogam. Entretanto, há diferenças muito significativas entre os grupos de discussão (Tabela 7).

Chamam a atenção os grupos sobre Data de Posse do Executivo e Suplência de Senador, em que o número de mensagens sem justificativas superou o de mensagens com justificativa. Uma possível explicação para este fato é a relativa simplicidade dos temas, que acabam convocando posições mais imediatas do que em outros casos.

Poder-se-ia cogitar que um grupo fortemente dominado por uma posição teria menos justificativas, dada a não necessidade de convencimento dos outros. Essa explicação poderia ser desafiada pelo fato de um dos exemplos mencionados com baixo índice de justificativa apresentar grande equilíbrio de posições ("Data de Posse do Executivo"). No entanto, o cruzamento das variáveis revela significância estatística, corroborando a hipótese. Após vários testes, verificou-se que, em grupos cuja posição dominante é superior a 70%, houve maior propensão a dar justificativas do que em grupos com índice de dominância menor (Tabela 8).

Quando se testa o cruzamento entre o índice de dominância, obtido a partir da diferença entre a posição dominante e a posição secundária, também encontra-se significância estatística (Tabela 9).

Ainda que alguns estudos sobre deliberação apregoem a importância de uma mensuração do grau de complexidade das justificativas (Steenbergenet al. 2003; Bächtiger et al. 2009), não se julga interessante essa estratégia, tanto porque tal mensuração mostra-se bastante subjetiva, como porque a complexidade do silogismo elaborado não implica necessariamente melhor deliberação. Argumentos extremamente complexos podem até obstruir o fluxo comunicativo entre os participantes. Vale mencionar que há quem defenda que a contabilização dos números de palavras das mensagens indica a profundidade do debate (Bächtiger et al. 2009; Stromer-Galley 2007). Não partilhamos dessa visão, visto haver postagens longas que sequer apresentam argumentos. Outros preferem contar o número de argumentos por postagem (Fuchs 2006). Também não julgamos tratar-se de estratégia frutífera, pois discursos mais estruturados não são necessariamente aqueles que apresentam um número maior de argumentos.

Ainda no que concerne ao provimento de razões, julgamos interessante mapear, mínima e qualitativamente, o teor dos argumentos proferidos no interior da consulta. Embora não possamos explorar, neste artigo, o quadro mais detalhados das justificativas oferecidas pelos participantes, faz-se interessante mencionar alguns grandes eixos que as pautaram. Para tanto, recorremos ao conceito de enquadramento como desenvolvido por Goffman (1986) e aplicado em diversos estudos (Gamson & Modigliani 1989; Ferree et al. 2002; Porto 2004; Levin 2005; Reese 2007; Mendonça & Santos 2009; Mendonça & Simões 2012). Por enquadramento, entende-se a moldura de sentido que pauta a definição da situação e o engajamento dos sujeitos nela envolvidos. Intersubjetivamente edificado e culturalmente baseado, um quadro permite a leitura e a compreensão de um dado contexto.

Em nossa análise, encontramos oito grandes quadros que perpassam as mensagens dos dez grupos em questão. São eles: (i) partido vs indivíduo; (ii) proximidade entre representantes e representados (incluindo discussões sobre prestação de contas de diversas naturezas); (iii) custos e logística das eleições; (iv) equilíbrio de forças políticas; (v) cultura política brasileira; (vi) mudança vs permanência; (vii) público vs privado; (viii) outros.

Codificaram-se enquadramentos apenas em postagens que apresentavam justificativas. Não se estabeleceram limites sobre o número de enquadramentos que cada comentário poderia conter. Os dados revelam o predomínio dos seguintes enquadramentos ao longo da consulta: proximidade entre representantes e representados (21,4%); partido vs indivíduo (19,7%); custos e logística (17,4%); público vs privado (16,25%) no conjunto da consulta (Tabela 10).

Os dados sugerem que algumas formas de enquadrar a questão da reforma política perpassam as discussões de diversos grupos da consulta. Na próxima seção, veremos que há alguns grupos mais concentrados em torno de um quadro e grupos mais dispersos, com usos equilibrados de vários quadros.

V.2. Reciprocidade

"Processos deliberativos" dependem do engajamento efetivo entre interlocutores. Isso porque a deliberação não é uma simples apresentação isolada de opiniões. É preciso que haja mutualidade e reciprocidade, de modo a que os participantes do processo considerem a existência uns dos outros. Se os envolvidos ignoram-se e não operam em conjunto, há uma expressão de suas visões, mas não um processo discursivo como o prescrito pelos deliberacionistas (Price 2009; Kies 2010).

A análise da reciprocidade é, contudo, bastante complexa. Há diferentes níveis de reciprocidade (Graham & Witschge 2003) e formas variadas de buscar apreender a mutualidade. Com os dados disponíveis sobre a consulta pública online, adotamos três procedimentos para aproximarmo-nos da discussão sobre reciprocidade. O primeiro deles, de natureza mais simples, envolve o mapeamento da responsividade entre comentários. A categoria inclui tanto menções explícitas a postagens como aquilo que foi codificado como interação clara sem menção explícita. A postagem abaixo ilustra um dos casos codificados como evidência de responsividade com menção explícita.

Postagem com menção explícita, grupo "Reeleição e Duração de Mandatos": "Acredito que o limite de reeleições deve ser ampliado de Presidente, Governadores e Prefeitos, para atingir Deputados, Senadores e Vereadores, evitando o continuísmo político, bem como a possibilidade de formação de cartéis e lobies. Assim, acabariamos de vez o coronelismo no país. Firmo minha concordãncia com o sr. Pedro Calixto Alves de Lima".

Apenas 6% dos 745 comentários analisados apresentam essa forma de reciprocidade mais evidente. Dentre esses 6% (equivalentes a 45 postagens), 91% dos comentários (41 em números absolutos) configuram-se como interações claras, embora não explícitas. Ou seja, apenas quatro (!) dos 745 comentários fazem referência explícita a outro participante.

Interessante observar que, quando se cruzam esses dados de reciprocidade com aqueles referentes às posições defendidas pelos comentadores, um padrão interessante emerge. Participantes tendem a ter comportamento mais recíproco em grupos que apresentam maior Índice de Dominância (Tabela 11). Ou seja, quando uma ampla maioria de participantes defende a mesma posição, o grau de reciprocidade tende a ser maior do que quando há maior divergência. Esse achado corrobora a literatura que aponta que as pessoas tendem a sentir-se mais à vontade para conversar com aqueles que pensam de maneira semelhante (Mutz 2006; Lev-On & Manin 2009).

Quando se testa o cruzamento do Índice de Dominância (diferença entre posição dominante e secundária) com a reciprocidade, também se identifica essa tendência, embora com fraca significância estatística. Ainda assim, o nível de confiança é próximo a 90% (Tabela 12).

O segundo procedimento para a discussão da reciprocidade envolve a identificação de dois elementos que indicam abertura à interação: (i) a elaboração de perguntas não retóricas e (ii) o uso de contra-argumentos à posição defendida na própria mensagem. Os comentários abaixo ilustram a codificação dessas variáveis:

Postagem com pergunta não retórica, grupo "Unificação das Eleições": "[...] A divisão das eleições, proporciona ao povo maior clareza sobre o voto e uma nova oportunidade de participação política. Se o poder emana do povo, este só poderá ser realizado com qualidade. A pergunta é, qual o impacto financeiro da unificação, em detrimento do imapacto qualitativo político?"

Postagem com uso de contra-argumento, grupo "Unificação das Eleições": "atual sistema tem suas vantagens e desvantagens, a pior delas é que de dois em dois anos o pais para durante alguns meses por causa das eleições, mas na minha opinião a grande vantagem do atual sistema de eleições a cada dois anos é a quantidade de temas que podem ser discutidos a cada eleição , a meu ver se houver apenas uma eleição vai ficar muito difícil para o eleitor acompanhar todas as propostas dos candidatos, serão muitos cargos em disputa e a quantidade de informação para o eleitor será gigantesca, o atual modelo facilita o debate e a exposição de propostas".

Apenas 8 das 745 mensagens (1,1%) colocam questões efetivas para outros participantes; e somente 27 (3,6%) mobilizam argumentos contrários à proposta que defendem.

Um terceiro procedimento empregado foi a observação de alguns comportamentos dos usuários da plataforma. Como já revelado anteriormente, 33% dos 204 participantes foram one-timers e enviaram uma única mensagem à consulta. Se se considera aqueles que postaram entre uma e três mensagens, o valor sobe para 61,3%. Os dados não são animadores e esse valor aumentaria muito se se contabilizasse os one-timers dentro de cada grupo de discussão, em vez da consulta como um todo. Havendo tantas pessoas que postam um único comentário no grupo, fica difícil imaginar a possibilidade de uma interlocução efetiva entre os participantes dentro de cada arena. Como lembra Stromer-Galley (2007, p. 12), "é concebível, especialmente em ambientes virtuais, que participantes na discussão se ignorem, em vez de engajarem-se uns com os outros".

Outro fator interessante do comportamento dos participantes diz respeito à expressão de avaliações (curtir ou não curtir) sobre os comentários uns dos outros. Em 21,6% das 745 postagens há alguma forma de avaliação. Curiosamente, a ferramenta é mais utilizada para a expressão de avaliações positivas. Do total de 709 avaliações expressas em relação às 161 postagens avaliadas, 476 (67,1%) são positivos. A postagem com maior número de avaliações positivas recebeu 23 posicionamentos favoráveis, enquanto a postagem com maior número de avaliações negativas teve oito posicionamentos contrários. Se consideradas apenas as postagens avaliadas, a média é de 4,4 posicionamentos por postagem, embora haja variações significativas entre elas.

Os dados apresentados indicam que a apropriação feita pelos usuários da consulta pública sobre reforma política é muito mais voltada à expressão de pontos de vista do que ao estabelecimento de diálogo. Pelo menos no que diz respeito a uma interatividade mais imediata e direta entre os participantes, não se notam marcas muito evidentes de consideração recíproca. Obviamente, esse aspecto não retira a relevância da experiência. Ele mostra, contudo, que sua estrutura é mais pensada como um dispositivo de participação do que uma arena de deliberação.

É preciso considerar, todavia, que a reciprocidade de que depende a deliberação não precisa restringir-se a uma interatividade direta entre participantes (Dryzek 2000). É possível imaginar outro tipo de reciprocidade, de natureza discursiva, que não se realiza por meio das intenções dos sujeitos, mas concretiza-se no choque público de discursos (Mendonça & Santos 2009). Se pensada dessa maneira, a mutualidade configura-se na estruturação mais ampla de um debate que permite pensar em eixos discursivos que balizam um debate coerente.

O já mencionado conceito de enquadramento pode mostrar-se particularmente útil, nesse sentido. O enfeixamento de comentários em torno de alguns quadros dentro de cada um dos grupos de discussão pode elucidar a estruturação de um processo discursivo coerente em torno de algumas questões. Tal enfeixamento permitiria, acreditamos, inferir a existência desse outro tipo de mutualidade não centrada nos indivíduos. Quando se observam os dados da consulta sob análise, tem-se o resultado exposto na Tabela 13, a seguir.

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Os números sugerem a existência de um choque enfeixado de discursos em alguns grupos de discussão. Em cinco das dez temáticas discutidas, um dos enquadramentos representa mais de 50% dos quadros mobilizados nas justificativas. Em três outros, o enquadramento predominante representa mais de 40%. Apenas em dois grupos (Cláusula de Barreira e Financiamento de Campanha), nota-se um equilíbrio entre os três quadros mais usados.

Nota-se, pois, de uma maneira geral, um enfeixamento interpretativo que indica a existência de reciprocidade discursiva. As postagens não abordam as questões por enfoques inteiramente distintos. Há certa convergência de padrões interpretativos, que sugerem a possibilidade de uma discussão. Mesmo que não se interpelem de maneira explícita, os comentadores fazem parte de um processo discursivo balizado por molduras semelhantes. Molduras essas que não implicam a defesa de uma mesma posição, já que se podem defender argumentos contrários dentro de um mesmo enquadramento (Ferree et al. 2002).

Importante salientar, por fim, que uma análise mais apurada sobre reciprocidade discursiva e o efetivo choque de argumentos requereria uma abordagem qualitativa que não poderá ser desenvolvida aqui.

V.3. Respeito mútuo

Há certo consenso de que processos deliberativos exigem certo grau de respeito. Discordamos, contudo, daqueles que igualam o respeito necessário à deliberação a alguma forma de empatia (Kies 2010) ou daqueles que tendem a valorizar a expressão explícita de elogios a outros comentários (Steenbergen et al. 2003). Basta que os participantes não se ofendam para que a deliberação seja possível, embora nem toda comunicação desprovida de desrespeito possa ser caracterizada como deliberativa.

Nesse sentido, codificamos os comentários da consulta pública de acordo com dois tipos de desrespeito: desrespeito a argumentos e desrespeito a grupos e pessoas. As postagens abaixo ilustram casos codificados desses dois tipos de desrespeito:

Postagem com desrespeito a argumento, grupo "Cláusula de Barreira": "Mais uma vez o menino mimado, que não concorda com a decisão do Supremo Tribunal Federal tenta modificar a constituição e fazer vale a sua vontade...".

Postagem com desrespeito a grupos e/ou pessoas, grupo "Fidelidade Partidária": "[...] Grandes nações vivem muito bem com apenas dois partidos, onde os candidatos são eleitos pela vontade dos eleitores e não de aspirantes e veteranos partidários que brigam como hienas por uma carona que os levará ao picadeiro acompanhando o palhaço".

A Tabela 14, a seguir, revela os baixíssimos índices de desrespeito diagnosticados.

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Os dados mostram que os comentários postados na consulta da ALMG são extremamente respeitosos. Por um lado, e contra os temores de que discussões na internet seriam marcadas pelo desrespeito possibilitado pelo distanciamento físico, nota-se que há possibilidade de debates respeitosos na rede. Aliás, essa é uma tendência diagnosticada em vários estudos (Kies 2010; Wales, Cotterill & Smith 2010; Mendonça & Pereira 2012). Por outro lado, tais índices também podem indicar a baixa reciprocidade entre comentários. Na medida em que as mensagens tendem a ignorar-se, o desrespeito a argumentos mostra-se raro. Além disso, desrespeitos a grupos frequentemente desencadeiam reações de outros participantes, o que também pode elevar os índices de reciprocidade (Wales, Cotterill & Smith 2010, p. 28).

Interessante observar que buscamos cruzar os dados sobre respeito com aqueles de reciprocidade. Isso porque almejávamos testar uma hipótese de que essas variáveis tendem a seguir rumos opostos. Supomos que a redução do Índice de Respeito implicaria aumento da reciprocidade, na medida em que comentadores se interpelam para se desrespeitar. O cruzamento dessas variáveis, de fato sugere algo nessa direção (Tabela 15). Porém, os baixíssimos números absolutos inviabilizam qualquer inferência minimamente confiável. Trata-se, todavia, de uma hipótese que estamos testando em outro estudo em fase de desenvolvimento.

V.4. Orientação para o bem comum

A orientação para o bem comum é um critério importante para os deliberacionistas, embora ela não possa ser confundida com alguma espécie de altruísmo ou de desistência dos próprios interesses (Mansbridge et al. 2010; Mendonça 2011). Frequentemente, a busca por alguma espécie de bem comum revela interesses próprios e vice-versa. Não há, pois, uma dicotomia entre a persecução do autointeresse e a do bem comum, embora essa oposição possa manifestar-se em alguns casos. Optamos, portanto, na trilha de Wales, Cotterill e Smith (2010), por uma abordagem qualitativa que busca ler o material empírico em busca da forma como os próprios participantes entendem a ideia de bem comum.

A análise revela que praticamente todas as postagens com justificativas defendem suas posições invocando alguma concepção de interesse público. Embora, no presente artigo, não possamos desenvolver essa análise qualitativa, notamos que há algumas maneiras recorrentes de conceber o bem comum.

A primeira delas é o repúdio à corrupção e ao uso indevido de recursos e cargos públicos. A crítica sistemática aos "políticos" que usariam seus mandatos em benefício próprio evidencia uma preocupação com o que deveria pertencer à coletividade e ser usado em prol dela. O foco da reforma seria, pois, uma espécie de moralização da política. Inserem-se, aqui, muitas mensagens sobre financiamento de campanha, suplência de senadores e reeleição. Também situam-se aqui as várias demandas para que os representantes políticos trabalhem mais e façam jus aos proventos que recebem.

Uma segunda maneira de conceber o bem comum revela-se na preocupação com o fortalecimento das instituições democráticas, o que é visto como um benefício à sociedade. Tal preocupação manifesta-se: (i) nos diversos comentários que sugerem o estreitamento da relação entre instituições representativas e cidadãos; (ii) nas postagensque abordam a importância do equilíbrio de forças na competição política e (iii) nos comentários que discutem formas de aprimoramento das relações entre os poderes. Muitas das discussões sobre sistemas eleitorais, coligações e unificação das eleições poderiam ser localizadas nesse conjunto.

Uma terceira forma de expressão do bem comum mostra uma preocupação com diversidade e a pluralidade constitutiva da sociedade. Para ser justa, uma comunidade política deveria assegurar que grupos mais fracos eleitoralmente possam sobreviver, de maneira a evitar-se uma espécie de ditadura da maioria. Tal posição aparece em algumas discussões sobre cláusulas de barreira, coligações eleitorais e sistemas eleitorais.

Por fim, nota-se uma quarta maneira de conceber o bem comum guiada pelas ideias de direitos e liberdades. Alguns argumentos revelam um anseio por garantir que os cidadãos tenham direitos e liberdades garantidas. Essa visão emerge, por exemplo, em alguns posicionamentos contrários ao financiamento público de campanhas que frisam a necessidade de investimentos em serviços públicos essenciais. Ela também se manifesta em postagens focadas em liberdades para problematizar seja a questão do voto obrigatório, seja a questão do domicílio eleitoral ou da fidelidade partidária.

As quatro concepções aqui apresentadas não são exaustivas. A análise qualitativa dos argumentos revela nuances no interior de cada uma delas e relações entre elas que não podemos explorar aqui. O que se nota, contudo, é uma preocupação bastante forte com argumentos que evidenciam preocupações com o bem comum.

V.5. Articulação entre arenas

A microanálise das postagens da consulta pública da ALMG sobre a reforma política ajuda a compreender algumas características da experiência. Os dados revelam que os participantes apresentam graus elevados de respeito e uma tendência a discorrer sobre o tema e a prover razões sobre suas posições. Eles mostram, ainda, os baixos índices de reciprocidade entre os comentários e os problemas significativos de inclusividade (no tocante a gênero e dispersão geográfica). Pela análise dos comentários, avaliou-se, ainda, algumas formas de apresentação de argumentos e de expressão do bem comum.

Embora a microanálise seja reveladora, não se deve, entretanto, deduzir dela, de uma vez por todas, que uma arena seja ou não deliberativa. Cada vez mais, pesquisadores deliberacionistas reconhecem que o debate deve ser pensado como um processo disperso no tempo e no espaço, sendo que suas características não se manifestam de maneira unificada, harmônica e simultânea (Hendriks 2006; Parkinson 2006; Goodin 2008; Warren 2007; Bächtiger 2009; Mendonça 2009; Pakinson & Mansbridge 2012). É a conexão de diferentes arenas, cada uma com seus limites e suas contribuições, que permite delinear-se um choque público de discursos. Por isso, é importante refletir sobre a maneira como uma arena discursiva se articula (ou não se articula) a outras.

Dois tipos de articulação são especialmente importantes para que se reflita sobre um fenômeno à luz da abordagem deliberacionista. O primeiro deles é em relação a instâncias de tomada de decisão. Ainda que processos deliberativos não precisem desaguar em decisões políticas, essa é uma dimensão importante a ser considerada. O fato de a consulta pública sob análise ter sido realizada dentro de uma Assembleia Legislativa estadual, que dedicou recursos para sua viabilização, pode gerar a sensação de que ela foi umbilicalmente ligada a instâncias de tomada de decisão. Mesmo que a experiência seja, por definição, consultiva, poder-se-ia inferir que ela seria bastante influente. No entanto, é preciso lembrar que a questão da reforma política é de competência federal. A consulta não buscou subsidiar os parlamentares em uma tomada de decisão, mas alimentar um debate público sobre tema considerado relevante. Mesmo que um relatório sobre a consulta tenha sido enviado para a Comissão da Reforma Política da Câmara dos Deputados e que os deputados estaduais da Comissão Extraordinária de Acompanhamento da Reforma Política do Legislativo mineiro tenham analisado o material, sua capacidade de afetar tomadas de decisão é muito pequena. A consulta serve mais para a ALMG mostrar-se antenada a agendas relevantes do que para aumentar a porosidade de instituições decisórias.

O segundo tipo de articulação a ser debatida é aquela que se estabelece com outras arenas discursivas da esfera pública. Se o processo deliberativo não foi voltado a uma tomada de decisão, pode-se discutir o modo como ele nutre outras arenas ou é nutrido por elas. No que concerne à forma como a consulta em questão pode abastecer outras instâncias interativas, é bom lembrar a carga informativa das consultas. Para além dos textos iniciais sintéticos sobre os pontos da reforma política, as próprias postagens contêm informações, posições e argumentos que podem subsidiar cidadãos em outros espaços de interação. Vale destacar, ainda que a página da consulta continha um link para o Facebook, permitindo que os participantes dessem capilaridade ao conteúdo da consulta. Seria muito interessante seguir a trajetória de algumas dessas conexões em redes sociais, embora isso não tenha sido possível nesse caso específico16 16 Temos trabalhado nessa direção em outras análises de deliberação online. .

No que concerne à forma como a consulta é abastecida por outras arenas, é importante citar, aqui, um episódio que marcou esse processo. Pouco antes do encerramento da consulta pública, um artigo do Jornal Estado de Minas, em 18 de junho de 2011, chamou a atenção para sua existência e para a possibilidade de participação negligenciada pelos cidadãos (Maakaroun 2011). O artigo, assinado por Bertha Maakaroun, afirmava que, durante os 20 primeiros dias da consulta, apenas 62 pessoas haviam enviado comentários. A conclusão era a de que "o cidadão mineiro mediano est[aria] desmobilizado, desatento e reticente diante da temática da reforma política" (idem). O artigo estimulou um grande fluxo de postagens, como indica o Gráfico 1.


Os dados são inequívocos. Sozinho, o dia 18 de junho, data de publicação do artigo, é responsável por 46,6% dos comentários de toda a consulta (i.e., 347 postagens). Se contabilizados os três dias subsequentes à publicação (19, 20 e 21 de junho), o volume chega a impressionantes 92,5% (689 postagens).

Como afirma Kies (2010, p. 36), "muitas experiências sugerem que a passividade cívica só pode ser superada por meio do aumento de incentivos [...] à participação". É fundamental, portanto, criar estratégias e investir na motivação dos cidadãos para que venham a engajar-se em iniciativas participativas. Os media parecem ter um papel nesse sentido, seja divulgando a existência de tais iniciativas, seja contribuindo para o fortalecimento de uma cultura cívica. Curiosamente, contudo, vale ressalvar que o efeito visibilidade parece dissipar-se rapidamente, visto que, no quarto dia após a veiculação do supramencionado artigo, já há uma redução significativa no número de comentários.

O exemplo ilustra o modo como o cruzamento de arenas pode fomentar processos discursivos ricos e capilarizados. Como assinalam Sæbø, Rose e Molka-Danielsen (2009, p. 421), o recrutamento possibilitado pela mobilização de outros veículos de comunicação é fundamental para o fortalecimento de arenas online.

VI. Conclusões

O presente artigo buscou investigar, à luz da teoria deliberativa, uma consulta pública online realizada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O estudo guiou-se pela discussão de seis variáveis que argumentamos serem essenciais para a compreensão de uma iniciativa digital a partir da teoria delibercionista: (i) inclusividade; (ii) provimento de razões; (iii) reciprocidade; (iv) respeito mútuo; (v) orientação para o bem comum e (vi) articulação entre arenas.

Os resultados indicam: (i) uma sobre-representação de participantes masculinos e oriundos da Região Metropolitana de Belo Horizonte, embora não tenha havido concentração de postagens por alguns comentadores; (ii) o predomínio de postagens on topic e que apresentam justificativas para as posições advogadas, além do mapeamento dos quadros empregados; (iii) índices muito baixos de reciprocidade entre postagens e de uso de marcadores de interatividade, apesar de elementos que permitem vislumbrar a edificação de reciprocidade discursiva; (iv) graus muito elevados de respeito; (v) diferentes formas de ligação das justificativas ao princípio geral do bem comum; (vi) o baixo impacto decisório e a conexão com outras arenas da esfera pública, destacando-se a relação com uma matéria publicada em jornal de grande circulação que afetou, muito significativamente a intensidade da participação em alguns dias.

Embora vários testes de cruzamentos de variáveis tenham sido realizados, poucos revelaram significância estatística. Entre eles, destacam-se a relação entre dominância de uma posição em um grupo de discussão e o grau de apresentação de justificativas. A análise revelou que grupos fortemente dominados tendem a ter índices menores de justificação, o que é compreensível já que não é preciso convencer quem defende a mesma posição. Curiosamente, contudo, nesses casos de ampla dominância, a reciprocidade entre participantes tende a ser maior, corroborando a hipótese recorrente na literatura de que as pessoas dialogam mais com aqueles que pensam de maneira semelhante. Outro cruzamento com significância estatística foi entre respeito e reciprocidade, sugerindo que os índices de respeito aumentam na medida em que a reciprocidade diminui. No entanto, os baixíssimos números absolutos inviabilizam qualquer inferência minimamente confiável de nossa parte, permanecendo a afirmação como hipótese a ser testada em outro estudo.

Importante salientar, por fim, que a análise aqui explorada não esgota as possibilidades de pensar a experiência em questão à luz da teoria deliberacionista. Convém mencionar que os autores já estão trabalhando em análises qualitativas que complementam os resultados aqui apresentados. Os dados discutidos no presente artigo dizem, contudo, sobre a natureza do processo estudado e permitem ver uma consulta que, se pouco interativa e inclusiva, pode alimentar processos mais amplos com argumentos respeitosos e voltados para o bem comum acerca de uma questão de interesse público.

Outras fontes

Recebido em 13 de Outubro de 2012

Aprovado em 25 de Dezembro de 2012

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  • Deliberação online em consultas públicas? O caso da assembleia legislativa de Minas Gerais

    Ricardo Fabrino MendonçaI; Ernesto Friedrich de Lima AmaralII
  • 1
    O presente artigo foi produzido no âmbito do projeto
    Deliberação online?, que conta com financiamento da FAPEMIG (Edital 01/2011 / Processo: SHA - APQ-00544-11 e Edital 03/2013, Processo CSA - PPM-00211-13) e da Pró-reitoria de pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (Edital PRPq 12/2011). O projeto também contou com apoio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A estas instituições somos muito gratos. Também temos dívida de gratidão com Eleonora Schettini Cunha e Lucas Maroca de Castro pela enorme ajuda para a viabilização deste artigo. Somos gratos, ainda a Stéfany Sidô, Fernando Vieira de Freitas e Wesley Mateus de Oliveira pelo apoio na finalização do banco de dados que alimenta este estudo. Por fim, registramos nossos agradecimentos aos pareceristas anônimos da
    Revista de Sociologia e Política.
  • 2
    Para alguns exemplos, ver: Pedrini (2012), Kies (2010), Wales, Cotterill e Smith (2010), Davies e Grangadharan (2009), Bächtiger
    et alii (2009), Mutz (2006), Wojcieszak e Mutz (2009), Graham e Witschge (2003), Janssen e Kies (2005), Marques, F. (2006), Marques, A. (2011), Sampaio, Maia e Marques (2010) e Mendonça e Pereira (2012).
  • 3
    Merecem destaque Dryzek (1990), Bohman (1996), Gutmann e Thompson (1996) e Benhabib (1996), além do próprio Habermas (1992; 1995; 1997). Não é objetivo do presente artigo discutir as múltiplas abordagens no interior do guarda-chuva mais amplo de perspectivas deliberacionistas. Reconhece-se, todavia, que os autores, aqui, mencionados têm leituras diferentes da noção de deliberação.
  • 4
    Bohman (1998), Chambers (2003), Fraser (1999), Sanders (1997), Mouffe (2005), Macedo (1999), Hibbing e Theiss-Morse (2002), Elster (1998), Young (1996), Gutmann e Thompson (2004), Dryzek (2000), Habermas (2005) e Thompson (2008).
  • 5
    Fishkin (2009), Hendriks (2011), Hendriks e Carson (2008), Warren (2007), Gastil e Levine (2005), Fung (2004), Coelho e Nobre (2004), Fung e Wright (2003), Ackerman e Fishkin (2003), Fishkin e Luskin (2000; 2006), Wampler e Avritzer (2004), Avritzer (2002; 2006), Baiocchi (2005), Abers e Keck (2006), Coelho, Pozzoni e Montoya (2005) e Cornwall e Coelho (2009).
  • 6
    Steenbergen
    et alii (2003), Bächtiger
    et alii (2009), Black
    et alii (2009), Stromer-Galley (2007), Kies (2010), Wales, Cotterill e Smith (2010), Graham e Witschge (2003), Wessler (2008), Maia (2008), Marques (2011), Sampaio, Maia e Marques (2010) e Mendonça e Pereira (2012).
  • 7
    Habermas (2006), Dryzek (2010), Chambers (2009), Mansbridge (1999), Young (2000), Hendriks (2006), Parkinson (2006), Goodin (2008), Mansbridge
    et alii (2010), Parkinson e Mansbridge (2012), Maia (2008) e Mendonça (2010; 2011).
  • 8
    As traduções de língua estrangeira são de responsabilidade dos autores.
  • 9
    Disponível em:
  • 10
    Sítio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O endereço não está mais disponível. (Nota do Revisor).
  • 11
    Sítio da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O endereço não está mais disponível. (N. T.).
  • 12
    Experiências como a do portal E-Democracia da Câmara dos Deputados do Brasil, as consultas públicas do Parlamento Britânico, os fóruns online do Bundestag alemão e a Ágora do Parlamento Europeu tornaram-se célebres.
  • 13
    Poder-se ia argumentar que a consulta ainda é muito limitada, tendo em vista os 19,6 milhões de cidadãos do estado de Minas Gerais. Embora esse limite seja óbvio, é preciso lembrar que, comparativamente, essa consulta não se mostra menos exitosa do que a maioria das experiências realizadas. Basta lembrar, a título de ilustração, o caso investigado por Miola (2009) de um fórum no portal da Câmara dos Deputados que contou com apenas 90 comentários ao longo de 25 semanas.
  • 14
    Curiosamente, Kies (2010, p. 128) encontra exatos 76% de participantes masculinos em sua análise sobre o fórum do Partido Radical Italiano, embora ele declare-se não surpreso com esse resultado dada a sobrerrepresentação masculina na vida política e especialmente em fóruns
    online.
  • 15
    Todas os postagens apresentados no artigo foram reproduzidos exatamente como aparecem na página da ALMG, sem correções ortográficas, gramaticais e de forma (caixa alta e baixa, por exemplo).
  • 16
    Temos trabalhado nessa direção em outras análises de deliberação
    online.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Jul 2014
    • Data do Fascículo
      Mar 2014

    Histórico

    • Recebido
      13 Out 2012
    • Aceito
      25 Dez 2012
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