Acessibilidade / Reportar erro

O impacto da diversificação na estratégia de operações de empresas de bens de capital

Resumo:

Considerando que a análise das áreas de especialização, tecnologia e mercado nos quais a empresa atua, é apontada na literatura como elemento principal no processo decisório da empresa que pretende diversificar suas atividades e que a estratégia de operações tem como desafio conciliar a base tecnológica com as necessidades do mercado de atuação, este trabalho analisa o impacto da diversificação na estratégia de operações em 3 empresas multinacionais líderes de bens de capital que atuam no Brasil. A principal contribuição do estudo diz respeito ao entendimento de que diferentes processos de diversificação podem ajudar a expansão da empresa no mesmo mercado por meio de novos produtos baseados em diferente base tecnológica ou podem ajudar a empresa a entrar em um novo mercado com produtos totalmente novos e de diferentes tecnologias. Portanto, os processos de diversificação das empresas devem ser analisados sob a ótica de uma estratégia de crescimento baseada no conhecimento, de tal modo que o gerenciamento desse recurso deve ocorrer em condições de máxima eficiência.

Palavras-chave:
Diversificação; Áreas de especialização; Base tecnológica; Base de mercado e estratégia de operações

Abstract:

Considering that the analysis of the specific areas technology and market is reported in the literature as the main elements in the decision making process of diversification and the operations strategy, these have to reconcile the technological base with the market demand. This paper examines the impact of diversification in operations strategy in 3 multinational leading capital goods companies. The main contribution of this study concerns the understanding that different processes of diversification can help to expand the share of the company in the same market with new products based on the same technology and can help the company to enter in a new market with new products, based on different technologies. Therefore, the process of diversification of firms should be analyzed from the perspective of a growth strategy based on knowledge, so that the management of this resource should occur in conditions of maximum efficiency.

Keywords:
Diversification; Specialization areas; Technological base; Operations strategy

1 Introdução

O acirramento da concorrência e o aumento e competência dos chamados competidores globais têm dificultado o crescimento das empresas que, com frequência, necessitam, para serem mais competitivas ou sobreviverem em um determinado mercado, reduzir margens ou empregar esforços em adequações estratégicas.

De acordo com Paiva et al. (2009)Paiva, E. L., Carvalho, J. M., Jr., & Fensterseifer, J. E. (2009). Estratégia de produção e de operações. Porto Alegre: Bookman., uma opção de crescimento e fortalecimento seguida por muitas empresas é a diversificação de atividades, que pode ocorrer por meio de ampliação de mix de produtos, diversificação de mercado ou horizontalização.

O processo de diversificação tem implicações internas e externas à empresa, envolvendo desde a disponibilização de recursos produtivos como máquinas, processos, habilidades e materiais até o conhecimento das necessidades e demanda do novo mercado consumidor em que a empresa pretende atuar (Penrose, 1959Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press.; Singh et al., 2010Singh, D. A., Gaur, A., & Schmid, F. (2010). Corporate Diversification, TMT experience and performance. Management International Review, 50(1), 35-56. http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-0025-4.
http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-002...
; Wiersema & Bowen, 2008Wiersema, M., & Bowen, H. (2008). Corporate diversification: the impact of foreign competition, industry globalization and product diversification. Strategic Management Journal, 29(2), 115-136. http://dx.doi.org/10.1002/smj.653.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.653...
).

O desafio às empresas que optam por este processo está relacionado principalmente à coordenação de suas atividades e à avaliação da possibilidade de aquisição de empresas ou tecnologias de produto para diversificação, de forma a competir eficazmente em mercados diversos e muitas vezes correlatos, em virtude das possíveis necessidades diferenciadas de estrutura produtiva, assim como do comportamento do mercado consumidor.

O ponto principal no processo de diversificação é identificar de que forma ocorrerá a relação entre mercado e base tecnológica, ditas áreas de especialização, que, segundo Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., pode ser de três formas:

a) Atuação em um novo mercado, com novos produtos, usando a mesma base tecnológica;

b) Expansão no mercado em que atua, com novos produtos, baseados em uma tecnologia diferente da que possui;

c) Entrada em novo mercado, com novos produtos, baseados em área tecnológica diferente.

Considerando que a análise das áreas de especialização, tecnologia e mercado nos quais a empresa atua, é apontada como elemento principal no processo decisório da empresa que pretende diversificar suas atividades e que a estratégia de operações tem como desafio conciliar a base tecnológica com as necessidades do mercado de atuação, este trabalho analisa o impacto da diversificação na estratégia de operações em 3 empresas multinacionais líderes de bens de capital que atuam no Brasil.

Para tal, avalia o impacto dos recursos e competências (perspectiva interna) e a demanda do mercado consumidor (perspectiva externa) na estratégia de operações de empresas que passaram processos de diversificação.

Este artigo está estruturado em sete seções. A seção 2 revisa a literatura de diversificação, enquanto que a seção 3 versa sobre a estratégia de operações. A seção 4 descreve o método empregado na pesquisa. A seção 5 apresenta a compilação dos dados e, finalmente, a seção 6 discute os resultados. As considerações finais serão tratadas na seção 7.

2 Diversificação produtiva e a RBV

Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press. afirma que as empresas diversificam suas atividades produtivas sempre que, sem abandonar completamente suas linhas antigas de produto, iniciam a produção de novos produtos, incluindo produtos intermediários, que são suficientemente diferentes dos produzidos de forma a implicar alguma diferença significativa nos programas de produção ou distribuição da empresa. Deste modo, diversificação inclui incrementos na variedade de produtos finais, na integração vertical e no número de áreas básicas de produção em que a empresa opera.

A definição de diversificação afirma que há incremento no número de áreas básicas de produção em que a empresa opera. A forma como as empresas diversificam suas atividades determina quais serão as novas áreas básicas e, consequentemente, as conduz a uma estratégia de diversificação, em virtude de seus recursos internos e mercado no qual está inserida.

Segundo Brost & Kleiner (1995)Brost, M. A., & Kleiner, B. H. (1995). New developments in corporate diversification strategies. Management Research News, 18(3-5), 24-33. http://dx.doi.org/10.1108/eb028402.
http://dx.doi.org/10.1108/eb028402...
, a diversificação pode ser simplesmente definida como a entrada em uma nova atividade de negócios por meio de uma empresa ou unidade de negócios existente e, a partir daí, o método de entrada no novo negócio (aquisição, desenvolvimento interno, etc.), as forças motrizes para diversificação (como sinergia, compartilhamento de recursos, redução de risco) e os níveis de relacionamento entre a linha de produto que a empresa comercializa e o mercado atual com os produtos e mercado do novo negócio são pontos que determinarão todo o processo.

A compreensão dos motivos pelos quais as empresas diversificam e como isso afeta o gerenciamento de seus recursos são temas abordados por diversos autores (Doving & Gooderham, 2008Doving, E., & Gooderham, P. (2008). Dynamic Capabilities as antecedents of the scope of related diversification: the case of small firms’ accountancy practices. Strategic Management Journal, 29(8), 841-857. http://dx.doi.org/10.1002/smj.683.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.683...
; Kor & Leblebici, 2005Kor, Y., & Leblebici, H. (2005). How do interdependencies among human capital deployment, development, and diversification strategies affect firms’ financial performance? Strategic Management Journal, 26(10), 967-985. http://dx.doi.org/10.1002/smj.485.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.485...
; Mota & Castro, 2004Mota, J., & Castro, L. (2004). A capabilities perspective on the evolution of firm boundaries: a comparative case exemple from Portuguese moulds industry. Journal of Management Studies, 41(2), 295-316. http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-6486.2004.00433.x.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-6486.20...
) que destacam que as decisões estratégicas para diversificação tendem a ser orientadas por fatores organizacionais (recursos internos) como estrutura de marketing, disponibilidade de tecnologia própria, disponibilidade de recursos, proteção por patentes e por fatores ambientais (externos) como oportunidade tecnológica apresentada para que resulte em novo produto.

De fato, as questões de como e por que uma organização diversifica têm sido foco central de estudos sobre estratégia (Singh et al., 2010Singh, D. A., Gaur, A., & Schmid, F. (2010). Corporate Diversification, TMT experience and performance. Management International Review, 50(1), 35-56. http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-0025-4.
http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-002...
; Wiersema & Bowen, 2008Wiersema, M., & Bowen, H. (2008). Corporate diversification: the impact of foreign competition, industry globalization and product diversification. Strategic Management Journal, 29(2), 115-136. http://dx.doi.org/10.1002/smj.653.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.653...
). A diversificação está relacionada ao grau em que produtos e serviços são lançados com base nos recursos e capacidades das empresas (Penrose, 1959Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press.; Rumelt, 1974Rumelt, R. (1974). Strategy, structure and economic performance. Cambridge: Harvard Univeristy Press.; Teece, 1982Teece, D. (1982). Towards an economic theory of the multi-product firm. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-62. http://dx.doi.org/10.1016/0167-2681(82)90003-8.
http://dx.doi.org/10.1016/0167-2681(82)9...
).

Os aspectos relevantes no processo de diversificação são, segundo Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., a análise das áreas de especialização, a identificação de oportunidades específicas para diversificação, a P&D, a utilização dos esforços de vendas, a avaliação da base tecnológica e as aquisições de firmas.

Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press. defende que as áreas de especialização, ou seja, os recursos e competências podem definir o sucesso do processo de diversificação e são definidas pelos tipos de produção e de mercado em que a empresa possui sua base de operações.

As atividades produtivas que utilizam habilidades, processos, matérias-primas, máquinas que são específicas a um processo de produção são a base de produção ou base tecnológica da empresa. Enquanto que o grupo de consumidores que a empresa espera influenciar com o mesmo programa ou plano de vendas é chamado de mercado de atuação.

Com isso, o processo de diversificação pode envolver a fabricação de produtos que utilizem a mesma base tecnológica ou a atuação em um mercado no qual já atua. A avaliação destes aspectos pode ser um fator determinante no processo, pois está diretamente relacionada à capacidade da empresa em explorar seus recursos e competências.

A mudança dos processos produtivos e dos fornecedores, o conhecimento adquirido pela empresa, mudanças percebidas do mercado e possibilidades de inovação são oportunidades específicas para diversificação. Tais oportunidades impulsionam as empresas a este processo, entretanto não é possível precisar quão lucrativo será investir em novas oportunidades, o que conduz muitas destas empresas a ignorá-las, para não se expor a este risco.

Contudo, a pesquisa de novos materiais, novos métodos e meios de produção, ou seja, a exploração das capacidades dinâmicas da empresa pode criar novas necessidades ou antecipar tendências no mercado, gerando diversificação pela inovação, ao produzir novas versões de produtos.

A utilização dos esforços de vendas para divulgar novos produtos traz a vantagem do relacionamento pré-estabelecido com o cliente, a qual novos entrantes não possuem. Este relacionamento contribui com o processo de diversificação devido à possibilidade de adequação dos produtos ofertados e desenvolvimento e oferta de novos produtos, contribuindo também para a solução de problemas do cliente.

Apesar da possibilidade de sucesso da diversificação baseada na forte presença em um determinado mercado, é preciso que a empresa possua ou busque o desenvolvimento de suas bases tecnológicas (ou, em outras palavras, de suas capacidades) para obter habilidades que sustentem sua entrada e posicionamento em novos campos de tecnologia diferenciada, seja de materiais, processos ou produtos. Em casos em que há necessidade de mudanças na base tecnológica, é muito comum a aquisição de empresas que as possuam.

Com isso, a análise da área de especialização é apontada como elemento principal no processo decisório da empresa que pretende diversificar suas atividades. A equalização do possível trade off entre base tecnológica que envolve capacidades, recursos e competências e as necessidades do mercado é o desafio para a estratégia de operações.

3 Estratégia de operações e a RBV

Slack & Lewis (2001Slack, N., & Lewis, M. (2001). Operations strategy. New York: Financial Times Prentice Hall., p. 15) afirmam que:

[...] estratégia de operações é o padrão total de decisões que forma as capacidades de longo prazo para qualquer tipo de operações e sua contribuição para toda a estratégia, através da conciliação das necessidades de mercados e recursos de operações.

O conceito é ilustrado na Figura 1.

Figura 1
Estratégia de operações reconcilia as necessidades de mercado com os recursos de operação. Fonte: Adaptada de Slack & Lewis (2001)Slack, N., & Lewis, M. (2001). Operations strategy. New York: Financial Times Prentice Hall..

Desta forma, o gerenciamento estratégico operacional deve estar atento às necessidades do mercado e, principalmente, às capacidades ou recursos de operação que permitirão tal conciliação (Slack & Lewis, 2001Slack, N., & Lewis, M. (2001). Operations strategy. New York: Financial Times Prentice Hall.).

Assim, percebe-se que o conceito de estratégia de operações surge de duas vertentes teóricas: a visão orientada pelo mercado representada basicamente pelo trabalho de Porter (1996)Porter, M. (1996). What is strategy? Harvard Business Review, 74(4), 8-17. PMid:10158475. e a visão baseada em recursos tendo como pioneiros os estudos de Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., Barney (1991)Barney, J. (1991). Firms resources and sustained competitive advantage. Journal of Management, 17(1), 99-120. http://dx.doi.org/10.1177/014920639101700108.
http://dx.doi.org/10.1177/01492063910170...
e Rumelt (1974)Rumelt, R. (1974). Strategy, structure and economic performance. Cambridge: Harvard Univeristy Press..

Teece et al. (1997)Teece, D. J., Pisano, G. P., & Shuen, A. (1997). Dynamic capabilities and strategic management. Strategic Management Journal, 18(7), 509-534. http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1097-0266(199708)18:7<509::AID-SMJ882>3.0.CO;2-Z.
http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1097-026...
indicam a importância da análise dos recursos e das capacidades como elementos centrais do gerenciamento estratégico operacional, citando a necessidade de analisar como estão relacionadas com o desempenho e resultados da empresa, de forma a alinhá-los aos seus objetivos estratégicos.

De fato, conforme apontam Santos et al. (2011Santos, L., Gohr, C., & Varvakis, G. (2011). Um método para Identificação e Análise de Competências e Recursos Estratégicos das Operações de Serviços. Gestão & Produção, 18(4), 791-808., p. 793), “[...] utilizar os princípios da RBV não significa abandonar a visão orientada pelo mercado, mas sim integrar as duas abordagens em um processo de formulação (de estratégia) mais equilibrado.”

Os critérios de desempenho também conhecidos como dimensões competitivas ou prioridades competitivas foram inicialmente cunhados por Hayes & Wheelwright (1984)Hayes, R. H., & Wheelwright, S. C. (1984). Restoring our competitive edge: competing through manufacturing. New York: John Wiley & Sons. como custo, qualidade, confiabilidade e flexibilidade. Posteriormente Hill (2000)Hill, T. (2000). Operations management: strategic context and managerial analisys. Great Britain: Macmillan. introduziu a questão relativa à velocidade. Esses critérios, que são originados a partir da visão de mercado, são os elementos básicos para garantia de vantagem competitiva a partir da manufatura, pois, por meio de sua aplicação, é possível traduzir a esta os aspectos da competitividade importantes para os clientes, assim como, determinar a medida de desempenho e as melhorias necessárias, avaliando a atuação dos concorrentes (Slack et al., 2002Slack, N., Chambers, S., & Johnston, R. (2002). Administração da produção (2. ed.). São Paulo: Atlas.). Dangayach & Deshmukh (2001)Dangayach, G. S., & Deshmukh, S. G. (2001). Manufacturing strategy: literature review and some issues. International Journal of Operations & Production Management, 21(7), 884-932. http://dx.doi.org/10.1108/01443570110393414.
http://dx.doi.org/10.1108/01443570110393...
propõem a introdução da questão da inovação.

Paiva et al. (2009)Paiva, E. L., Carvalho, J. M., Jr., & Fensterseifer, J. E. (2009). Estratégia de produção e de operações. Porto Alegre: Bookman. discutem, com relação à inovatividade, se este seria um critério competitivo específico ou um critério básico para suporte aos demais, pois, em linhas gerais, sua aplicação e resultados refletem em melhorias nos demais critérios, ou seja, a melhoria de um determinado critério pode ser resultado de alguma inovação aplicada ao processo ou mesmo ao produto.

Os autores destacam ainda que melhorias de desempenho de qualidade, custo, velocidade, confiabilidade e flexibilidade estão relacionadas à inovação de processo, enquanto que a inovação de produto, como objetivo da empresa, com metas definidas quanto ao desenvolvimento de novos produtos, a qualifica como critério de desempenho competitivo.

Em virtude da abordagem estratégica de operações e a definição prática apresentada em Slack et al. (2002)Slack, N., Chambers, S., & Johnston, R. (2002). Administração da produção (2. ed.). São Paulo: Atlas., em que a estratégia de operações é delineada por meio da escolha dos critérios de desempenho mais relevantes para atender às necessidades do mercado, é preciso observar que a empresa, segundo Paiva et al. (2009Paiva, E. L., Carvalho, J. M., Jr., & Fensterseifer, J. E. (2009). Estratégia de produção e de operações. Porto Alegre: Bookman., p. 45), deve orientar suas decisões e ações internas de forma coerente, para que, ao longo do tempo, essas ações e decisões transformem-se em uma fonte de vantagem competitiva naquela dimensão, ou nas dimensões em que a empresa optou por competir.

As necessidades da estratégia competitiva apontam para os objetivos de desempenho a serem atingidos pela área de operações. E para que esses objetivos sejam alcançados, faz-se necessário o desenvolvimento de um padrão de ações relacionadas a um conjunto de decisões (Maia et al., 2005Maia, J., Cerra, A., & Alves, A., Fo. (2005). Inter-relações entre estratégia de operações e gestão da cadeia de suprimentos: estudo de caso no segmento de motores para automóveis. Gestão & Produção, 12(3), 377-391. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005000300008.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005...
).

Wheelwright & Hayes (1985)Wheelwright, S. C., & Hayes, R. H. (1985). Competing through manufacturing. Harvard Business Review, 63(1), 99-109. classificam as decisões em nove categorias (estruturais e infraestruturais), conforme descrição a seguir:

a) Capacidade: relacionada à capacidade das instalações, determinada pela planta, equipamentos e recursos humanos;

b) Instalações: referentes às decisões sobre a localização geográfica, tipo de processo produtivo, volume e ciclo de vida;

c) Equipamentos e processos tecnológicos: referem-se desde a equipamentos utilizados até a processos produtivos (por projeto, job shop, por lote, linha de montagem ou fluxo contínuo);

d) Integração vertical e relacionamento com fornecedores: relacionam-se com a decisão entre produzir ou comprar;

e) Recursos humanos: atuam sobre as políticas existentes, com o intuito de manter os funcionários motivados e o trabalho em equipe, para atingir as metas da empresa;

f) Qualidade: deve haver um gerenciamento que especifique a alocação das responsabilidades, ferramentas de decisão, medição e controle que serão utilizadas e quais sistemas de treinamento serão instituídos para promover melhoria contínua;

g) Escopo e novos produtos: referem-se ao gerenciamento e à introdução de novos produtos e de operações a partir da amplitude do mix de produtos e processos utilizados;

h) Sistemas gerenciais: devem fornecer suporte às decisões tomadas e a sua implementação. Requerem planejamento, controle, políticas operacionais, linhas de autoridade/responsabilidade;

i) Relação interfuncional: relacionada aos sistemas gerenciais e mecanismos que possibilitam a integração com as diversas áreas funcionais.

Com base nos critérios de desempenho relevantes para a empresa atender ao mercado e nos recursos que ela possui, o gerenciamento estratégico terá condições de avaliar cada categoria e tomar as decisões adequadas. Ainda segundo Wheelwright & Hayes (1985)Wheelwright, S. C., & Hayes, R. H. (1985). Competing through manufacturing. Harvard Business Review, 63(1), 99-109., as categorias de decisão permitirão avaliar o tempo necessário para progredir dentro das alterações identificadas, posto que permite descrever as mudanças necessárias e estabelecer plano de ação, com o intuito de atingir e sustentar os níveis estabelecidos para os critérios de desempenho.

Assim, sob a ótica da RBV, a estratégia de operações diz respeito a decisões, gerenciamento e combinação exclusiva de recursos, competências, capacidades, processos, tecnologia de forma a criar produtos e serviços que atendam às necessidades do consumidor (Maia et al., 2005Maia, J., Cerra, A., & Alves, A., Fo. (2005). Inter-relações entre estratégia de operações e gestão da cadeia de suprimentos: estudo de caso no segmento de motores para automóveis. Gestão & Produção, 12(3), 377-391. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005000300008.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005...
).

4 Procedimentos metodológicos

Quanto à forma de abordagem do problema em estudo, que versava sobre qual o impacto das variáveis internas e variáveis externas na estratégia de operações de empresas que estiveram em um processo de diversificação, este trabalho definiu-se como uma pesquisa qualitativa e exploratória.

A pesquisa qualitativa apresenta as seguintes características: o pesquisador observa os fatos sob a ótica de alguém interno à organização; a pesquisa busca uma profunda compreensão do contexto da situação; e a pesquisa enfatiza o processo dos acontecimentos, isto é, a sequência dos fatos ao longo do tempo (Flick, 2004Flick, U. (2004). Uma introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Bookman.).

Quanto aos meios, utilizou-se o método de estudo de caso com entrevistas presenciais em profundidade complementado por pesquisa bibliográfica em periódicos, relatórios de pesquisa e instituições de classe (Voss et al., 2002Voss, C., Tsikriktsis, N., & Frohlich, M. (2002). Case research: case research in operations management. International Journal of Operations & Production Management, 22(2), 195-219. http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414329.
http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414...
). Segundo Yin (2007)Yin, R. K. (2007). Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman., a essência de um estudo de caso é que ele tenta iluminar uma decisão ou um conjunto de decisões: por que elas foram tomadas, como elas foram implementadas e qual resultado obtiveram.

As críticas quanto ao método escolhido estão relacionadas principalmente à impossibilidade de replicação da pesquisa científica e à generalização dos resultados. No entanto, o objetivo do método é proporcionar generalizações teóricas e isto pode ser beneficiado com a realização de mais de um caso (Easterby-Smith et al., 2002Easterby-Smith, M., Thorpe, R., & Lowe, A. (2002). Management research an introduction. London: Sage.; Voss et al., 2002Voss, C., Tsikriktsis, N., & Frohlich, M. (2002). Case research: case research in operations management. International Journal of Operations & Production Management, 22(2), 195-219. http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414329.
http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414...
).

As empresas participantes do estudo são do setor de bens de capital, devido às características particulares deste setor, descritas em Avelar (2008)Avelar, A. P. (2008). Setor: bens de capital. Brasília: FINEP/Rede DPP. Relatório Setorial Final., como a diversificação de produtos; a forte correlação entre as empresas de bens de capital e seus compradores contribui para o entendimento de outros setores correlacionados e seu papel como difusor de novas tecnologias e dinamizador do crescimento econômico, já que participa de todas as cadeias produtivas da economia fornecendo máquinas e equipamentos. Os desdobramentos decorrentes da manufatura de bens de capital resultam, em maior ou menor medida, na incorporação de novas tecnologias que são repassadas aos seus clientes.

Para atenuar as possibilidades de distorção na captação das informações, como recomendado por Eisenhardt (1989)Eisenhardt, K. M. (1989). Building theories from case study research. Academy of Management Review, 14(4), 532-550., foram aplicadas 15 entrevistas presenciais, as quais foram complementadas posteriormente por meio de e-mail e contato telefônico com executivos de diferentes níveis hierárquicos das empresas (alta e média gerência) ligados à manufatura e vendas, com conhecimento da visão estratégica e história da empresa envolvida no processo de diversificação e adaptação de sua estratégia de operações.

Inicialmente foram convidadas a participar do estudo as 5 empresas líderes de mercado e inovação da CNAE 291 (motores, bombas, compressores) atuantes no Brasil. Entretanto, apenas 3 delas aceitaram participar do estudo. As empresas são todas do ramo metalúrgico, fabricantes de máquinas e equipamentos de médio e grande porte, sendo que as empresas B e C atuam também no ramo metal mecânico.

Há o compromisso de não divulgar o nome das empresas, assim como suas marcas, entretanto, toda a informação descrita nos estudos de caso é fruto da entrevista, observação e material institucional, obtidos na interação pesquisador-empresa.

A empresa A, multinacional pertencente a um grupo escocês, fabrica máquinas de médio porte, além de fabricar e comercializar equipamentos hidráulicos. Possui duas fábricas, localizadas no Estado de São Paulo, uma unidade fabrica bombas centrífugas para polpa, bombas centrífugas para produtos limpos e hidrociclones; e a outra produz válvulas, peças de borracha utilizadas nas bombas centrífugas de polpa e hidrociclones, além de revestimentos de borracha.

A empresa B, multinacional de origem alemã, projeta, produz e comercializa bombas centrífugas para indústria e mineração, válvulas tipo gaveta, esfera, globo, borboleta e retenção, sistemas hidráulicos e serviços relacionados.

Sua estrutura contempla fábricas em Várzea Paulista, Barueri, Americana e Vinhedo; escritórios regionais em Belo Horizonte, Fortaleza, Macaé, Manaus, Recife, Rio de Janeiro, Salvador; centros de serviço em São José dos Campos, Manaus e Recife.

A empresa C, atualmente multinacional de origem finlandesa, está presente no Brasil desde 1919, ano em que iniciou suas atividades como fundição. Aquisições por outros grupos estimularam processos de diversificação, que resultaram no quadro atual, no qual a empresa atua como fabricante de equipamentos para os segmentos de mineração, construção e reciclagem.

Seu parque fabril no Brasil está localizado em Sorocaba, em uma área de 44.000 m2 - considerada a matriz da América do Sul, porém a empresa possui unidades de vendas e serviços localizadas no Pará, em Belém e Parauapebas, e em Minas Gerais, em Belo Horizonte.

Para a construção do plano de análise dos dados, foi elaborado um protocolo de pesquisa com base nas proposições teóricas discutidas ao longo do texto, tendo sido investigadas as dimensões do processo de diversificação e da estratégia de operações. Como orientação para as entrevistas, foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada considerando os constructos que seriam objeto da investigação (Quadro 1).

Quadro 1
Protocolo de pesquisa.

Conforme exposto no arcabouço teórico, o processo de diversificação é caracterizado pela forma como as empresas atuam a partir de suas áreas de especialização - base de mercado e base tecnológica, que determinam o tipo de diversificação. A base de mercado representa o mercado no qual a empresa atua ou pretende atuar, caracterizando as variáveis externas do processo de diversificação, enquanto que a base tecnológica representa as capacitações internas que a empresa possui, caracterizando as variáveis internas.

Dessa forma, neste trabalho, a análise do impacto das variáveis internas e variáveis externas na estratégia de operações de empresas que estiveram em um processo de diversificação foi efetuada primeiramente pela identificação do tipo de diversificação e, posteriormente, de sua influência na estratégia de operações.

A relação entre áreas de especialização e estratégia de operações foi medida por critérios competitivos e categorias de decisão. Os critérios competitivos tiveram como principal objetivo traduzir as necessidades do mercado no qual a empresa diversificada atua - base de mercado -, para objetivos de desempenho da manufatura, enquanto que as categorias de decisão contribuíram para avaliar as mudanças na base tecnológica da empresa.

Os critérios competitivos utilizados foram os propostos por Slack & Lewis (2001)Slack, N., & Lewis, M. (2001). Operations strategy. New York: Financial Times Prentice Hall., especificamente, pela abordagem de conciliação entre recursos de manufatura e necessidades de mercado. Aspectos relacionados à inovação foram considerados como critério básico de desempenho, fonte de melhoria para os critérios competitivos.

5 Compilação dos casos

As empresas estudadas, apesar de não possuírem um histórico de diversificação idêntico, apresentam algumas similaridades quanto ao seu processo de diversificação. Por serem muitos os tipos de produtos, a análise foi realizada em duas fases: forma de ocorrência, verificada ao longo do histórico da empresa, citada por Paiva et al. (2009)Paiva, E. L., Carvalho, J. M., Jr., & Fensterseifer, J. E. (2009). Estratégia de produção e de operações. Porto Alegre: Bookman., como ampliação de mix de produtos, diversificação de mercado ou horizontalização, e relação entre as áreas de especialização, base de mercado e base tecnológica, citada por Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., esta última, com foco nos produtos e nos mercados de atuação atuais.

A Tabela 1 demonstra, quanto à forma de ocorrência, o processo de diversificação das empresas estudadas. É válido ressaltar que uma empresa pode estar classificada em formas diferentes, dada a diversidade de produtos e fontes de diversificação.

Tabela 1
Processo de diversificação das empresas estudadas quanto à ocorrência.

Com relação às áreas de especialização, a Tabela 2 apresenta a atuação com base nos produtos-mãe fabricados, ou seja, não foram consideradas as variações de configuração destes e mercados de atuação da empresa, indicando, por produto, quais as bases nas quais ocorre a diversificação.

Tabela 2
Processo de diversificação das empresas estudadas quanto às áreas de especialização.

Com o intuito de classificar adequadamente a relação entre produto, empresa e processo de diversificação, foi utilizada a letra “x” para indicar, no processo de diversificação, em qual área de especialização a empresa atua para o produto da linha em referência. As células em branco mostram que a empresa não atua naquela base de especialização para aquele produto. O “0” indica que o produto é considerado pela empresa como parte de seu negócio principal e não produto resultado de algum processo de diversificação; e o “NA” indica que a empresa não fabrica o produto da linha em referência.

Depois da identificação quanto ao tipo e ocorrência e as relações entre as áreas de especialização, outro aspecto relevante a ser observado no processo de diversificação é sua fonte. Esta análise foi efetuada com base nos elementos indicados por Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., a partir dos quais, para os produtos identificados como resultado de diversificação (Tabela 2), a Tabela 3 os classifica como: análise das áreas de especialização (AE); identificação de oportunidades específicas para diversificação (OE); pesquisa industrial (PI); utilização dos esforços de vendas (EV); avaliação da base tecnológica (BT); e aquisições (AQ).

Tabela 3
Fontes dos processos de diversificação das empresas estudadas para cada produto.

De forma similar à tabela anterior, as células com ‘x” indicam, no processo de diversificação, quais são as fontes que o geraram. O ‘0” indica que o produto é considerado pela empresa como parte de seu negócio principal e não produto resultado de algum processo de diversificação.

Identificado o tipo de diversificação, sua fonte e as relações entre as áreas de especialização, foi preciso compreender de que forma se relacionam com a estratégia de operações da empresa.

Inicialmente foi avaliado, por meio dos critérios competitivos, como as empresas, ao iniciarem um processo de diversificação, analisam o desempenho de sua manufatura em detrimento das necessidades do mercado e atuação dos concorrentes.

Com base na entrevista, é possível representar os aspectos considerados pelas empresas, considerando, inclusive, a ordem de importância dada por cada uma delas, sendo que os quadros não marcados na Tabela 4 representam critérios não diretamente avaliados em seus planejamentos.

Tabela 4
Aspecto e importância dos critérios competitivos para as empresas.

Considerando a diversidade de produtos e as características observadas na Tabela 2, as análises prosseguiram considerando o produto bomba centrífuga, pois é um produto comum a todas as empresas e que possui o maior percentual de suas vendas.

Para a empresa A, que apresenta como produto principal as bombas centrífugas para polpa, foi avaliado o processo de diversificação para as bombas centrífugas para água, enquanto que, para as empresas B e C, o processo avaliado foi o das bombas centrífugas de polpa.

Os dados da entrevista foram organizados nas Tabelas 5, 6 e 7 – cada tabela apresenta, respectivamente, as relações avaliadas para cada empresa –, indicando as necessidades do mercado traduzidas para critérios competitivos, avaliando, desta forma, a adequação da estratégia de operações ao processo de diversificação.

Tabela 5
Critérios competitivos traduzindo necessidades do mercado – Empresa A, bombas de água.
Tabela 6
Critérios competitivos traduzindo necessidades do mercado – Empresa B, bombas de polpa.
Tabela 7
Critérios competitivos traduzindo necessidades do mercado – Empresa C, bombas de polpa.

A necessidade do mercado foi identificada com base nas características descritas pelas empresas, identificadas nas solicitações que recebe dos clientes, enquanto que a posição da empresa foi determinada por meio de observação dos processos produtivos, visão da empresa sobre seu desempenho e análise de processos perdidos para a concorrência.

As Tabelas 5, 6 e 7 contribuíram para, com base na posição das respectivas empresas para cada critério competitivo, demonstrar se as ações empreendidas na estratégia de operações permitiram a adequação da base tecnológica.

Com base nos critérios observados, houve avaliação das ações empreendidas com vistas à adequação da base tecnológica, por meio das categorias de decisão, conforme demostram as Tabelas 8, 9 e 10.

Tabela 8
Categorias de decisão e a adequação da base tecnológica – Empresa A.
Tabela 9
Categorias de decisão e a adequação da base tecnológica – Empresa B.
Tabela 10
Categorias de decisão e a adequação da base tecnológica – Empresa C.

A avaliação de estrutura produtiva não tem sido efetuada para os últimos produtos agregados ao escopo atual. A última verificação da estrutura produtiva com base na comparação entre a estrutura atual e as necessidades identificadas pelo mercado, por meio das categorias de decisão, ocorreu para a implantação de uma nova fábrica. Neste sentido, uma adequação da base tecnológica para todos as categorias de decisão (Tabela 8).

Para as empresas B e C, foram descritos, além dos itens já contemplados por elas, as devidas adequações para suprir as deficiências identificadas nos critérios competitivos para estes itens (ver Tabelas 9 e 10).

Com relação à presença da inovação e do aprendizado organizacional, os dados foram organizados quanto às fontes e formas de introdução de inovação identificadas para cada uma das empresas, descritos na Tabela 11.

Tabela 11
Fontes de introdução de inovação identificadas e utilizadas em cada uma das empresas.

6 Discussão dos resultados

Os tipos de diversificação observados nas empresas demonstram que, com exceção da empresa B, que não praticou diversificação por horizontalização – ou seja, não buscou ampliação de sua participação de mercado com a aquisição de concorrentes diretos – as empresas atuaram de todas as formas com processos de diversificação para ampliação do mix de produtos, diversificação de mercado e horizontalização.

Neste sentido, é possível afirmar que, segundo o grau de similaridade entre as atividades originais e pós-diversificação das empresas, em termos de recursos e competências exigidas pelo processo de diversificação, esse processo pode ser caracterizado como diversificação concêntrica (Britto, 2013Britto, J. (2013). Diversificação, competências e coerência produtiva. In D. Kupfer & L. Hasenclever, editores. Economia Industrial: fundamentos teóricos e práticas no Brasil (2. ed.). Rio de Janeiro: Elsevier.) na medida em que ele é dirigido a um core restrito de atividades compatíveis com as competências definidas pela base de especialização tecnológica e de mercado da empresa. Somado a isso, claramente é possível identificar que o objetivo básico dos processos de diversificação estudados é o de exploração máxima do potencial de competências acumuladas pelas empresas como fonte de vantagem competitiva.

Com relação às áreas de especialização, observou-se na Tabela 2, dentre os produtos fabricados e comercializados atualmente pelas empresas, que a empresa C é a que apresenta maior número de produtos resultantes de processos de diversificação, 13, enquanto que a empresa A possui 8 e a empresa B, apenas 5. Ainda com base na Tabela 2, todas as empresas estudadas consideraram que todos os processos de diversificação que efetuaram foram fora de sua base tecnológica, enquanto que o valor relativo à base de mercado varia de 20% para a empresa B, que apresenta menor número de produtos resultantes deste processo; 53,8% para a empresa C, que apresenta o maior número de produtos resultantes de diversificação; e 62,5% para a empresa A, que apresenta o número intermediário de produtos resultantes de diversificação.

Esse resultado vai ao encontro da literatura, pois a capacidade de diversificação da empresa e a direção dessa diversificação serão condicionadas pelas áreas de especialização. Ao introduzir novos produtos ou buscar novos mercados, a empresa deve respeitar os limites da sua fronteira de especialização, não se afastando da sua base de especialização, sob pena de sofrer perda de eficiência devido à redução progressiva de sinergias produtivas à medida que se distancia dessa fronteira. Assim, pode-se concluir que esses processos de diversificação fazem parte de uma estratégia em que a empresa explora seus recursos, capacidades ou competências em busca de competitividade e redução de riscos, baseados em similaridade entre os produtos, serviços, mercados e processos (Barney & Hesterly, 2011Barney, J. B., & Hesterly, W. S. (2011). Administração estratégia e vantagem competiviva (3. ed.). São Paulo: Pearson Prentice-Hall.).

Quanto às principais fontes do processo de diversificação, observou-se, na Tabela 3, a seguinte distribuição: a) análise das áreas de especialização, indicado como AE: 14% dos produtos; b) identificação de oportunidades específicas para diversificação, indicado como OE: 22% dos produtos; c) pesquisa industrial, indicado como PI: 12% dos produtos; d) utilização dos esforços de vendas, indicado como EV: 21% dos produtos; e) avaliação da base tecnológica, indicado como BT: 19% dos produtos; f) aquisições, indicado como AQ: 12% dos produtos.

Com o intuito de identificar eventuais particularidades do processo de diversificação, foram desmembradas as fontes quanto à ocorrência para cada empresa na Tabela 12. Observa-se que a empresa C apresenta os maiores índices, acompanhada pela empresa A, lembrando que ambas são mais diversificadas que a empresa B, que possui os menores índices.

Tabela 12
Percentual observado das fontes de diversificação para cada empresa.

Considerando os dados sobre as principais fontes observadas, oportunidades específicas e esforços de vendas possuem os maiores percentuais. Estas fontes estão relacionadas à mudança de processos produtivos e de fornecedores, conhecimento adquirido pela empresa, mudanças percebidas no mercado e possibilidades de inovação.

Dessa forma, é possível afirmar que o processo de diversificação está diretamente relacionado a uma estratégia de crescimento baseada no conhecimento, uma vez que as fontes de diversificação levantadas no campo se relacionam diretamente a esse recurso. Além das fontes de diversificação, as características do processo dependem também da avaliação da empresa com relação às necessidades do mercado e à sua capacidade produtiva, verificada neste trabalho por meio dos critérios competitivos.

Com base nos critérios competitivos, é possível afirmar que todos parecem extremamente próximos, sendo que a qualidade aparece em todos os casos como qualificadora, uma vez que os produtos são certificados e normatizados. A velocidade é reconhecida como importante e as empresas trabalham com prazos que atendem às necessidades do mercado. O custo aparece como relevante à A e B em detrimento da confiabilidade para C, entretanto tem disparidade na prática, pois para B e C há uma paridade (mercado exige baixo custo e a empresa consegue atender), já a empresa A assume custo como importante, porém admite custo alto.

A confiabilidade é o critério competitivo que apresenta mais discordância entre as empresas. Na empresa A, ela é extremamente baixa, pois produz mediante encomenda, sem manter estoques de peças ou subconjunto, assim, fica sujeita às variações dos fornecedores. Na empresa B, é vista como moderada pois depende da importação de peças. Já a empresa C é a única que adequou seus processos para atender aos requisitos impostos pelo mercado quando criou uma área específica para produção de itens nacionais, planejou seu estoque e conduz um eficiente programa de importação.

Finalmente a flexibilidade é o último critério de importância, todavia a única empresa que apresenta uma flexibilidade moderada é a C. As demais admitem ter baixa flexibilidade principalmente quanto às questões relacionadas ao desembaraço de produtos importados. Em outras palavras, de forma similar à análise do desempenho nos critérios competitivos, efetuou-se a verificação das ações empreendidas por cada empresa na adequação da estratégia operacional, por meio das categorias de decisão. Com exceção da empresa A que fez uma total revisão das categorias de decisão e, assim, teve que readequar toda sua base tecnológica por conta da abertura de uma nova fábrica, as empresas B e C já atuam de forma planejada e possuem políticas claras e bem delimitadas em todas as categorias de decisão. Dessa forma, é possível afirmar que existem semelhanças importantes entre os critérios competitivos e as categorias de decisão estruturais e infraestruturais das empresas estudadas.

No que se refere às políticas e sistemas infraestruturais, a semelhança entre as ferramentas de qualidade, políticas de recursos humanos, integração vertical, escopo de novos produtos e de planejamento da produção, pode ser atribuída à grande difusão de ferramentas de gestão de operações, principalmente as melhores práticas de empresas classe mundial, as quais foram implantadas, sobretudo na indústria de bens de capital, com o intuito de garantir vantagem competitiva sustentável.

Apesar de o estudo não se aprofundar na avaliação das fontes de inovação ou de aprendizado organizacional, o trabalho avaliou, ainda que superficialmente, como ocorre o processo de inovação na empresa, sua direção, assim como se há procedimentos que contribuam para o aprendizado organizacional, buscando evidências que qualifiquem sua presença, visando relacioná-las às características encontradas nos processos de diversificação.

Dentre as fontes de inovação identificadas nas entrevistas e listadas para cada empresa, observou-se que somente a empresa C apresenta 100% delas, enquanto que a empresa A apresenta 53,8% e a empresa B, 38,5%. Se avaliado, conforme indicado pelas empresas, como inovações de processo ou produto, não há alteração das posições, apenas pequena variação dos percentuais.

Os dados com relação à inovação e aprendizado organizacional contribuem ao processo de diversificação, posto que corroboram em casos como os das empresas A e C, que apresentam a maior parte destes vestígios e também maior número de produtos diversificados.

Dessa forma, é possível afirmar que o recurso conhecimento seja ele tácito ou explícito, e que ao fim e ao cabo leva à inovação, representa um ativo importante para as empresas.

7 Considerações finais

Este estudo buscou trazer algumas reflexões acerca do impacto da diversificação na estratégia de operações por meio da conciliação entre as áreas de especialização, que têm a ver com os recursos das empresas e suas estratégias de operações, calcadas na visão de mercado.

O processo de diversificação encontrado nos casos é do tipo concêntrico, pois é dirigido a um core de atividades compatíveis com as competências definidas pela base de especialização tecnológica e de mercado da empresa. Assim, foi possível afirmar que o processo de diversificação está diretamente relacionado a uma estratégia de crescimento baseada no conhecimento, indo ao encontro da teoria escolhida para dar suporte à argumentação dos resultados empíricos.

Neste sentido, optou-se em utilizar o arcabouço teórico da RBV, fundamentado basicamente pelo trabalho seminal de Penrose (1959)Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press., que trouxe inspiração ao desenvolvimento de uma abordagem essencialmente dirigida ao âmbito interno das organizações. A RBV acaba sendo confrontada com uma perspectiva que atribui ao ambiente externo um maior grau de responsabilidade sobre as opções estratégicas que possam levar as empresas a um desempenho superior no mercado. Mesmo com a aparente paradoxal dicotomia entre as duas abordagens, é possível observar, na prática e nos estudos empíricos, esforços que procuram desenvolver uma abordagem integradora entre elas com o objetivo de entender melhor os elementos que dão suporte a uma vantagem competitiva duradoura e sustentável.

Em relação às estratégias de diversificação das empresas estudadas, é possível afirmar que ocorrem em função dos custos de oportunidade em que ela incorre quando entra em um novo negócio, acreditando, assim, que não há, dentre as possibilidades de investimento de seu capital, nenhum outro negócio que lhe dará o mesmo retorno quanto aquele em que ela decidiu investir. Outro ponto importante são as economias de escopo e escala obtidas através dos processos de diversificação. Vale ressaltar que tais economias são cruciais para manter a competitividade das empresas.

A principal contribuição do estudo de Penrose para este trabalho diz respeito ao entendimento de que diferentes processos de diversificação podem ajudar a expansão da empresa no mesmo mercado por meio de novos produtos baseados em diferente base tecnológica e/ou podem ajudar a empresa a entrar em um novo mercado com produtos totalmente novos e de diferentes tecnologias. Portanto, os processos de diversificação das empresas devem ser analisados sob a ótica de uma estratégia de crescimento baseada no conhecimento, de tal modo que o gerenciamento desse recurso deve ocorrer em condições de máxima eficiência, uma vez que esse crescimento está diretamente relacionado ao controle eficiente das competências e conhecimento técnico em áreas especializadas da manufatura.

Foi possível perceber também que, além das oportunidades de diversificação advindas da experiência e conhecimento acumulado resultante de operações passadas, as exigências da competição e a existência de problemas específicos proporcionam razões adicionais para que as empresas diversifiquem suas atividades. É válido ressaltar que o emprego do estudo de caso reforçou a importância da conciliação entre necessidades de mercado e base tecnológica por meio da estratégia de operações no processo de diversificação ao delinear a existência e causa de problemas advindos da interpretação incorreta ou da não observância das áreas de especialização em que a empresa efetua a diversificação, permitindo ainda, com as categorias de decisão, identificar as mudanças necessárias para adequação, considerando recursos existentes e necessidades do mercado.

O presente trabalho é um precedente para a aplicação de um modelo que estruture e quantifique os pontos de avaliação para a formulação da estratégia de operações para empresas que iniciarão ou estão em um processo de diversificação, permitindo uma análise mais precisa dos aspectos relevantes de mercado, cliente e concorrentes, com uma ponderação das competências requeridas e nível de serviço necessário para a base tecnológica.

  • Suporte financeiro: Nenhum.

Referências

  • Avelar, A. P. (2008). Setor: bens de capital. Brasília: FINEP/Rede DPP. Relatório Setorial Final.
  • Barney, J. (1991). Firms resources and sustained competitive advantage. Journal of Management, 17(1), 99-120. http://dx.doi.org/10.1177/014920639101700108
    » http://dx.doi.org/10.1177/014920639101700108
  • Barney, J. B., & Hesterly, W. S. (2011). Administração estratégia e vantagem competiviva (3. ed.). São Paulo: Pearson Prentice-Hall.
  • Britto, J. (2013). Diversificação, competências e coerência produtiva. In D. Kupfer & L. Hasenclever, editores. Economia Industrial: fundamentos teóricos e práticas no Brasil (2. ed.). Rio de Janeiro: Elsevier.
  • Brost, M. A., & Kleiner, B. H. (1995). New developments in corporate diversification strategies. Management Research News, 18(3-5), 24-33. http://dx.doi.org/10.1108/eb028402
    » http://dx.doi.org/10.1108/eb028402
  • Dangayach, G. S., & Deshmukh, S. G. (2001). Manufacturing strategy: literature review and some issues. International Journal of Operations & Production Management, 21(7), 884-932. http://dx.doi.org/10.1108/01443570110393414
    » http://dx.doi.org/10.1108/01443570110393414
  • Doving, E., & Gooderham, P. (2008). Dynamic Capabilities as antecedents of the scope of related diversification: the case of small firms’ accountancy practices. Strategic Management Journal, 29(8), 841-857. http://dx.doi.org/10.1002/smj.683
    » http://dx.doi.org/10.1002/smj.683
  • Easterby-Smith, M., Thorpe, R., & Lowe, A. (2002). Management research an introduction. London: Sage.
  • Eisenhardt, K. M. (1989). Building theories from case study research. Academy of Management Review, 14(4), 532-550.
  • Flick, U. (2004). Uma introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Bookman.
  • Hayes, R. H., & Wheelwright, S. C. (1984). Restoring our competitive edge: competing through manufacturing. New York: John Wiley & Sons.
  • Hill, T. (2000). Operations management: strategic context and managerial analisys. Great Britain: Macmillan.
  • Kor, Y., & Leblebici, H. (2005). How do interdependencies among human capital deployment, development, and diversification strategies affect firms’ financial performance? Strategic Management Journal, 26(10), 967-985. http://dx.doi.org/10.1002/smj.485
    » http://dx.doi.org/10.1002/smj.485
  • Maia, J., Cerra, A., & Alves, A., Fo. (2005). Inter-relações entre estratégia de operações e gestão da cadeia de suprimentos: estudo de caso no segmento de motores para automóveis. Gestão & Produção, 12(3), 377-391. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005000300008
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0104-530X2005000300008
  • Mota, J., & Castro, L. (2004). A capabilities perspective on the evolution of firm boundaries: a comparative case exemple from Portuguese moulds industry. Journal of Management Studies, 41(2), 295-316. http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-6486.2004.00433.x
    » http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-6486.2004.00433.x
  • Paiva, E. L., Carvalho, J. M., Jr., & Fensterseifer, J. E. (2009). Estratégia de produção e de operações. Porto Alegre: Bookman.
  • Penrose, E. D. (1959). The theory of the growth of the firm. New York: Oxford University Press.
  • Porter, M. (1996). What is strategy? Harvard Business Review, 74(4), 8-17. PMid:10158475.
  • Rumelt, R. (1974). Strategy, structure and economic performance. Cambridge: Harvard Univeristy Press.
  • Santos, L., Gohr, C., & Varvakis, G. (2011). Um método para Identificação e Análise de Competências e Recursos Estratégicos das Operações de Serviços. Gestão & Produção, 18(4), 791-808.
  • Singh, D. A., Gaur, A., & Schmid, F. (2010). Corporate Diversification, TMT experience and performance. Management International Review, 50(1), 35-56. http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-0025-4
    » http://dx.doi.org/10.1007/s11575-009-0025-4
  • Slack, N., & Lewis, M. (2001). Operations strategy. New York: Financial Times Prentice Hall.
  • Slack, N., Chambers, S., & Johnston, R. (2002). Administração da produção (2. ed.). São Paulo: Atlas.
  • Teece, D. (1982). Towards an economic theory of the multi-product firm. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-62. http://dx.doi.org/10.1016/0167-2681(82)90003-8
    » http://dx.doi.org/10.1016/0167-2681(82)90003-8
  • Teece, D. J., Pisano, G. P., & Shuen, A. (1997). Dynamic capabilities and strategic management. Strategic Management Journal, 18(7), 509-534. http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1097-0266(199708)18:7<509::AID-SMJ882>3.0.CO;2-Z
    » http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1097-0266(199708)18:7<509::AID-SMJ882>3.0.CO;2-Z
  • Voss, C., Tsikriktsis, N., & Frohlich, M. (2002). Case research: case research in operations management. International Journal of Operations & Production Management, 22(2), 195-219. http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414329
    » http://dx.doi.org/10.1108/01443570210414329
  • Wheelwright, S. C., & Hayes, R. H. (1985). Competing through manufacturing. Harvard Business Review, 63(1), 99-109.
  • Wiersema, M., & Bowen, H. (2008). Corporate diversification: the impact of foreign competition, industry globalization and product diversification. Strategic Management Journal, 29(2), 115-136. http://dx.doi.org/10.1002/smj.653
    » http://dx.doi.org/10.1002/smj.653
  • Yin, R. K. (2007). Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Fev 2017
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    25 Out 2013
  • Aceito
    18 Jun 2015
Universidade Federal de São Carlos Departamento de Engenharia de Produção , Caixa Postal 676 , 13.565-905 São Carlos SP Brazil, Tel.: +55 16 3351 8471 - São Carlos - SP - Brazil
E-mail: gp@dep.ufscar.br