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Dinâmica tecnológica da Indústria Brasileira de Alimentos e Bebidas (2000-2011)

Resumo

A Indústria Brasileira de Alimentos e Bebidas (IAB) tem uma forte importância social e econômica no cenário nacional, e a tecnologia tem papel fundamental em sua competitividade. Ao estudar aspectos da dinâmica tecnológica da IAB, pretende-se identificar e analisar elementos que incrementem a competitividade do setor. Este trabalho discute a dinâmica tecnológica e inovadora das IBA no período de 2000 a 2011, com base nos indicadores fornecidos pela Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (PINTEC). Os resultados permitem afirmar que prevalece no setor o caráter incorporador em detrimento do gerador de novas tecnologias. O investimento em P&D das firmas ainda é relativamente baixo, sendo a estratégia tecnológica majoritária do setor a imitativa. No entanto, houve uma dinamização positiva dos esforços tecnológicos nesse período, principalmente a fim de aumentar a eficiência e eficácia produtivas, bem como para reduzir o impacto ambiental e atender às normas regulatórias nacionais.

Palavras-chave:
Agroindústria; Indústria de alimentos; Atividade inovadora; Esforços tecnológicos

Abstract

The Brazilian food and beverage industry is of great social and economic importance to the nation, and technology represents a key factor for competitiveness in the sector. Learning about the past and recent technological dynamics of this industry enables the identification of trends and perspectives that enhance its competitiveness. Based on indicators from the Industrial Survey of Technological Innovation (Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica - PINTEC), the present paper discusses the technological and innovative dynamics of the Brazilian food and beverage sector between 2000 and 2011. In general, new technology within the sector has been incorporated rather than created. Enterprise investment in R&D is still low and the sector’s technology strategy is mostly imitative. However, this period presented positive dynamization of technological efforts, with the primary goal of increasing productive efficiency and effectiveness, but with additional goals of reducing environmental impacts and meeting regulatory standards.

Keywords:
Agribusiness; Food industry; Innovative activity; Technological efforts

1 Introdução e objetivo

A tecnologia, compreendendo o conjunto de conhecimentos utilizados na produção e fator integrante do processo de interação da empresa com o seu ambiente, é elemento vital para a competitividade de qualquer organização (Rosenthal & Moreira, 1992Rosenthal, D., & Moreira, I. L. (1992). Algumas considerações sobre a natureza do processo de capacitação tecnológica: “Fontes de inovação. Revista de Administração Pública, 26(4), 145-160.). A tecnologia empregada por uma empresa representa uma das principais fontes de vantagem competitiva diante das concorrentes, e a introdução exitosa de novas tecnologias resulta em incrementos de competividade importantes.

A definição do caráter inovador de uma tecnologia pode variar segundo a forma pela qual ela é analisada. Uma nova tecnologia não é, necessariamente, uma tecnologia inédita no mercado, mas pode ser, segundo o interesse da análise a ser realizada, aquela que é nova para uma determinada empresa (Gonçalves & Gomes, 1993Gonçalves, J. E. L., & Gomes, C. A. (1993). A tecnologia e a realização do trabalho. Revista de Administração de Empresas, 33(1), 106-121., p. 109). Neste caso, a tecnologia é inovadora para a empresa em foco. De forma resumida, Rosenthal & Moreira (1992Rosenthal, D., & Moreira, I. L. (1992). Algumas considerações sobre a natureza do processo de capacitação tecnológica: “Fontes de inovação. Revista de Administração Pública, 26(4), 145-160., p. 155) definem a inovação tecnológica como sendo

[...] a aplicação de um novo conjunto de conhecimentos ao processo produtivo, que resulta em um novo produto, em alterações em algum atributo do produto antigo e/ou no grau de aceitação do produto pelo mercado, traduzindo-se, em geral, em uma elevação do nível de lucratividade e/ou posição da empresa no mercado.

Assim, de acordo com Carvalho & Furtado (2013Carvalho, S.A.D., & Furtado, A.T. (2013). Estratégias tecnológicas e dinâmica de inovação das empresas agroalimentares no Brasil. Revista Gestão & Conexões, 2(1), 47-75., p. 48-49), a intensificação da dinâmica tecnológica e inovadora pode ser entendida como sendo

[...] uma evolução positiva e simultânea dos indicadores de esforços e resultados da inovação, envolvendo também o estabelecimento de estratégias tecnológicas com tendências mais ofensivas ou defensivas e menos dependentes ou imitativas.

De Paula & Bastos (2009)De Paula, N., & Bastos, L. (2009). Inserção do agronegócio alimentar brasileiro nos mercados mundiais. Estudos Sociedade e Agricultura, 17(2), 304-331. Recuperado em 19 de janeiro de 2015, de http://r1.ufrrj.br/esa/art/200910-304-331.pdf
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salientam que, no setor agroindustrial, a conquista de espaços no mercado internacional depende diretamente da capacidade inovadora dos agentes e do grau de coordenação entre “indústrias de apoio” que contribuem para a inovação no setor (embalagens, aditivos, máquinas e equipamentos, tecnologia da informação, etc.). Consequentemente, para as IABs os desafios se situam na necessidade de combinar ganhos de escala com diferenciação de produto de forma a agregar valor e atingir mercados segmentados. Já em 1984, Pavitt (1984)Pavitt, K. (1984). Sectoral patterns of technical change: towards a taxonomy and a theory. Research Policy, 13(6), 343-373. http://dx.doi.org/10.1016/0048-7333(84)90018-0.
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havia classificado a indústria de alimentos como sendo “intensiva em escala”.

Por outro lado, o crescimento constante da concorrência global e as demandas cada vez mais fortes de variedade, conveniência e qualidade pelos consumidores, pressionam a indústria produtora de alimentos e bebidas a diferenciar seus produtos e aumentar a qualidade de seus processos inovativos. A pressão vem também da necessidade de garantir a segurança alimentar e a qualidade nutricional dos produtos, aliada à revolução biotecnológica e a todas as novas possibilidades de processamento que esta propõe (Fortuin & Omta, 2009Fortuin, F. T. J. M., & Omta, S. W. F. (2009). Innovation drivers and barriers in food processing. British Food Journal, 111(8), 839-851. http://dx.doi.org/10.1108/00070700910980955.
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).

Além disto, vale lembrar que a baixa complexidade das tecnologias de transformação alimentar as torna mais vulneráveis a processos imitativos e diminui suas apropriabilidades (Sidonio et al., 2013Sidonio, L., Capanema, L., Guimarães, D. D., & Carneiro, J. V. A. (2013). Inovação na indústria de alimentos: importância e dinâmica no complexo groindustrial brasileiro. Rio de Janeiro: BNDES. Recuperado em 30 agosto 2015, de https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/1512/1/A%20mar37_08_Inova%C3%A7%C3%A3o%20na%20ind%C3%BAstria%20de%20alimentos_P.pdf
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). Desta forma, o setor se caracteriza pela ausência significativa de rupturas tecnológicas de produto. Como será visto mais à frente, grande parte dos avanços tecnológicos do setor são de caráter incremental, desenvolvidos internamente nas empresas do setor. Por outro lado, rupturas tecnológicas estão normalmente ligadas a novas tecnologias de processo e gestão, sendo estas desenvolvidas pelas chamadas indústrias de apoio às empresas agroindustriais.

De Mori (2011)De Mori, C. (2011) Capacidade tecnológica em sistemas agroindustriais: proposição de índice e aplicação a empresas dos segmentos de trigo e leite (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos. considera que estudos acerca de padrões tecnológicos e mudanças técnicas em sistemas produtivos agroindustriais promovem a compreensão da evolução da dinâmica setorial, permitindo assim o monitoramento e o direcionamento de atividades estratégicas relacionadas à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Tais estudos serviriam, entre outros fins, à definição de indicadores e parâmetros de análise de conduta e de posicionamento competitivo das empresas em relação às suas estratégias tecnológicas. Salienta-se que cada setor possui especificidades no processo de desenvolvimento e evolução tecnológica, sendo que as particularidades do processo produtivo e do perfil do produto final condicionam a intensidade e o dinamismo tecnológico deste mesmo setor.

A IAB detém grande importância na economia nacional, além de desempenhar papel central no processamento e no provisionamento de alimentos. Nesse contexto, este artigo objetiva descrever e analisar a dinâmica tecnológica e inovadora das empresas de alimentos e bebidas no Brasil entre 2000 e 2011, por meio dos dados provenientes das Pesquisas Industriais de Inovação Tecnológica (PINTEC), conduzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Este setor corresponde à seção 15 da versão 1.0 (aplicada até o ano de 2007) e pela soma das seções 10 e 11 da versão 2.0 (aplicada de 2007 até o presente) da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) no Brasil.

Além desta introdução, este artigo contém cinco seções. A segunda seção traz considerações sobre o setor de alimentos e bebidas no mundo, com foco nas suas principais estratégias de inovação em um contexto global de mudanças no padrão de concorrência e competitividade. A terceira seção discute o setor de alimentos e bebidas no momento atual da economia brasileira, trazendo números de sua evolução e representatividade. A quarta seção trata da metodologia, enquanto a quinta apresenta as principais análises sobre os indicadores de inovação das empresas de produção de alimentos e bebidas no Brasil. A sexta seção traz as considerações finais do artigo.

2 Aspectos tecnológicos do setor de alimentos e bebidas

A definição de processo inovativo admite processos nos quais as empresas desenvolvem e implementam inovações em bens e serviços que sejam novos para elas, independentemente do fato de serem novos para seus concorrentes (Cassiolato & Lastres, 2000Cassiolato, J. E., & Lastres, H. M. M. (2000). Sistemas de inovação: Políticas e Perspectivas. Parcerias Estratégicas, 8, 237-255.). De acordo com o Manual de Oslo (FINEP, 2005Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP. (2005). Manual de Oslo: diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação (3. ed). Rio de Janeiro: FINEP.), as atividades que compõem o processo inovativo incluem todas as etapas científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais que efetivamente conduzem, ou que pretendem conduzir, à implementação de inovações. Em termos gerais, tais atividades objetivam a melhoria do desempenho da empresa, podendo visar ao desenvolvimento e implementação de novos produtos e processos, novos métodos de promoção e vendas dos produtos e/ou mudanças nas práticas e na estrutura organizacional da empresa.

De acordo com De Mori (2011)De Mori, C. (2011) Capacidade tecnológica em sistemas agroindustriais: proposição de índice e aplicação a empresas dos segmentos de trigo e leite (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos., a atuação sobre o processo de inovação tecnológica de uma determinada empresa do sistema agroindustrial, que inclui as alimentares e de bebidas, pressupõe a avaliação do processo de geração, difusão e incorporação do progresso tecnológico no setor ou setores em que atuam. A autora salienta que, ao compreender a dinâmica e as mudanças técnicas de determinado setor, pode-se identificar a existência de gargalos tecnológicos e gerar subsídios às empresas, setores e governos que buscam maior produtividade e competitividade em suas atividades.

Proença (1996)Proença, R. P. C. (1996). Aspectos organizacionais e inovação tecnológica em processos de transferência de tecnologia: uma abordagem antropotecnológica no setor de alimentação coletiva (Tese de doutorado). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. considera que a tecnologia representa um fator essencial para o desenvolvimento da competitividade. Nesse sentido, ao tratar da formação de vantagens competitivas num contexto global, Porter (1990)Porter, M. E. (1990). Vantagem competitiva das Nações. Rio de Janeiro: Campus. ressalta que a tecnologia é capaz de superar as forças da teoria econômica clássica (capital, trabalho e terras) na determinação da competitividade, sendo a inovação tecnológica a verdadeira e única base de sustentação da vantagem competitiva das firmas. Contudo, uma nova tecnologia não deve consistir na única fonte primária de vantagem competitiva de uma empresa, uma vez que essa pode estar acessível aos seus concorrentes. Para deter uma vantagem sustentada, é necessário acumular competências baseadas na nova tecnologia, dificultando sua cópia pelos competidores (Barbosa, 2009Barbosa, A.P.R. (2009). A formação de competências para inovar através de processos de transferência de tecnologia: um estudo de caso (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.). De forma geral, os efeitos e objetivos mais comuns relacionados à inovação tecnológica incluem: aumento de produtividade, melhor aproveitamento de insumos, melhoria dos produtos (agregação de valor e aumento da margem de contribuição), economia de recursos e redução de riscos e acidentes de trabalho (Rodrigues & Ornellas, 1987Rodrigues, I. P., & Ornellas, E. (1987). Influência da tecnologia na estrutura organizacional e eficácia das empresas. Revista de Administração, 22(2), 25-29., p. 28). Gonçalves (1994Gonçalves, J. E. L. (1994). Os impactos das novas tecnologias nas empresas prestadoras de serviços. Revista de Administração de Empresas, 34(1), 63-81., p. 70, 81) acrescenta ainda a melhoria da agilidade no atendimento aos clientes, a modernização de processos e a exploração de novos segmentos de mercado como efeitos positivos possíveis da inovação em uma organização. Por outro lado, Tushman & Nelson (1990Tushman, M. L., & Nelson, R. R. (1990). Introduction: Technology, Organizations, and Innovation. Administrative Science Quarterly, 35(1), 1-8. http://dx.doi.org/10.2307/2393548.
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, p. 2) salientam que as empresas consideram a tecnologia e a inovação tecnológica como fontes de incertezas. Elas trazem desafios que podem alterar suas características internas, causando impactos nas suas condições de competição, investimento e rentabilidade.

Para Jamrog (2006)Jamrog, J. J. (2006). The quest for innovation: a global study of innovation management (2005-2016). Tampa: University of Tampa., os mais importantes promotores de inovação numa empresa são: o foco no consumidor, o trabalho em equipe, os recursos apropriados e a comunicação organizacional. Outros fatores importantes incluem a capacidade de selecionar as ideias promissoras e liberdade para inovar. Em contrapartida, a insuficiência de recursos e a ausência de uma estratégia formal de inovação, bem como regulamentos administrativos excessivos, consistem nas maiores barreiras para o sucesso do processo inovativo.

O estudo de Batterink et al. (2006)Batterink, M. H., Wubben, E. F. M., & Omta, S. W. F. (2006). Factors related to innovative output in the Dutch agrifood industry. Journal on Chain and Network Science, 6(1), 31-45. http://dx.doi.org/10.3920/JCNS2006.x063.
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indica que as empresas alimentares inovadoras orientadas para o mercado são as que apresentam maior sucesso em inovação. Nesse contexto, Costa & Jongen (2006)Costa, A. I. A., & Jongen, W. M. F. (2006). New insights into consumer-led food product development. Trends in Food Science & Technology, 17(8), 457-465. http://dx.doi.org/10.1016/j.tifs.2006.02.003.
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salientam que as maiores barreiras à inovação no setor alimentar são: (1) a falta de diretrizes concretas para a implementação eficaz de desenvolvimento, orientada para o consumidor final, (2) a abordagem sequencial do processo de inovação, e (3) a falta de coordenação ou integração entre o setor de P&D, as atividades de marketing e o know-how da empresa.

O estudo de Fortuin & Omta (2009)Fortuin, F. T. J. M., & Omta, S. W. F. (2009). Innovation drivers and barriers in food processing. British Food Journal, 111(8), 839-851. http://dx.doi.org/10.1108/00070700910980955.
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, baseado num survey com empresas agroalimentares multinacionais na Holanda, apontou que existe uma forte pressão para inovação por parte do varejo. Essa distribuição desigual de poder na cadeia produtiva se mostra como um dos mais poderosos estimuladores à inovação para as empresas agroalimentares.

Na IAB, as grandes firmas – posicionadas na linha de frente da concorrência oligopolista – detêm maior autonomia quanto ao desenvolvimento de novos produtos e processos. Em contrapartida, um grande número de firmas se comporta como receptores e usuários de inovação, contribuindo apenas marginalmente para as eventuais mudanças inovadoras (De Paula & Bastos, 2009De Paula, N., & Bastos, L. (2009). Inserção do agronegócio alimentar brasileiro nos mercados mundiais. Estudos Sociedade e Agricultura, 17(2), 304-331. Recuperado em 19 de janeiro de 2015, de http://r1.ufrrj.br/esa/art/200910-304-331.pdf
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). Nesse contexto, Cabral (2001)Cabral, J. E. O. (2001). Natureza da inovação tecnológica na indústria de alimentos do Brasil. Fortaleza: Embrapa Agroindústria Tropical. Recuperado em 18 de outubro de 2014, de http://pessoal.utfpr.edu.br/sant/arquivos/Natureza%20da%20inovacao%20na%20Industria%20de%20Alimentos.pdf
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salienta que no segmento de insumos da IAB predominam as inovações de processo, geralmente motivadas por questões de custo de produção. Já as inovações de produto são costumeiramente de natureza incremental e realizadas pelo próprio setor, sendo condicionadas pelas propriedades básicas do alimento e também pelas questões de comportamento dos consumidores e pressões do mercado.

Ao estudar as ações inovadoras das empresas alimentícias baseadas nos dados da Community Innovation Survey (CIS), Christensen et al. (1996)Christensen, J. L., Rama, R., & Von Tunzelmann, N. (1996). Innovation in the European food products and beverage industry: Industry studies of innovation using CIS data (Project 94/111, EIMS Publication, 35). Bruxelles: European Information Monitoring System. identificaram as principais estratégias associadas aos seus processos inovativos. Segundo os autores, o setor utiliza uma estratégia ofensiva de inovação quando há grandes vantagens em ser o primeiro no mercado, atingindo a liderança tecnológica. Já a estratégia defensiva torna a empresa capaz de eliminar grandes incertezas, pelo desenvolvimento ou re-design de produtos que foram introduzidos por outros. Em termos de posicionamento no mercado, as empresas com estratégias defensivas aceitam estar logo atrás das first-comers, e utilizam sua experiência para se beneficiar dos erros cometidos por estas e reagir de acordo com as respostas do mercado, principalmente àquelas ligadas à diferenciação de produtos.

O desenvolvimento de produtos na indústria de alimentos pode ser dividido, de acordo com Fuller (1994)Fuller, W. G. (1994). New food product development: from concept to marketplace. Florida: CRC Press., em sete classes distintas: (1) extensões de linha, (2) reposicionamento de produtos existentes, (3) nova forma de produtos existentes, (4) reformulação de produtos existentes, (5) novas embalagens de produtos existentes, (6) produtos inovadores e (7) produtos inteiramente novos. Dentre estas, as mais comuns são as de reposicionamento, de reformulações e de novas embalagens. Este fato pode ser associado ao perfil do “saber fazer” de grande parte das indústrias do setor, cujas origens estão num ofício familiar. As opções tecnológicas utilizadas por essas indústrias visam predominantemente ao aumento de produtividade, à redução de custos e às adequações dos produtos para satisfação de consumidores específicos de um mercado maduro, objetivos que, muitas vezes, utilizam as referidas classes de desenvolvimento como elementos de auxílio à definição de estratégias.

A proporção do investimento em P&D sobre vendas na indústria de alimentos é relativamente baixa quando comparada a de outras indústrias. Geralmente, a atividade de pesquisa não é considerada como um ativo importante para inovação na referida indústria. Entretanto, a emergência de novos paradigmas tecnológicos para a indústria de processamento de alimentos tem motivado empresas do setor a desenvolverem internamente suas pesquisas, ou mesmo contratarem o desenvolvimento por meio de empresas ou instituições independentes, elevando de um lado seus gastos em P&D e, de outro, sua capacidade tecnológica (Cabral, 2007Cabral, J. E. O. (2007). Determinantes da propensão para inovar e da intensidade inovativa em empresas da indústria de alimentos do Brasil. Revista de Administração Contemporânea, 11(4), 87-108. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-65552007000400005.
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). Esta é definida por De Mori (2011De Mori, C. (2011) Capacidade tecnológica em sistemas agroindustriais: proposição de índice e aplicação a empresas dos segmentos de trigo e leite (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos., p. 70) como

[...] um conjunto de esforços, de habilidades (operativas, organizacionais e relacionais) e de conhecimentos ancorados num constante fluxo de aprendizagem necessários para absorção, uso, adaptação, desenvolvimento e transferência de tecnologias.

O setor de produção de alimentos e bebidas, no Brasil e no exterior, apresenta igualmente um baixo nível de investimento em P&D, caracterizando-se predominantemente por avanços tecnológicos incrementais e tecnologias de capital (Cabral, 2007Cabral, J. E. O. (2007). Determinantes da propensão para inovar e da intensidade inovativa em empresas da indústria de alimentos do Brasil. Revista de Administração Contemporânea, 11(4), 87-108. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-65552007000400005.
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). Assim, o processo inovativo na indústria alimentícia se caracteriza por uma extensa, intensa e intrincada interface tecnológica com outras indústrias que desenvolvem inovações ao longo da cadeia produtiva, desde o segmento de matérias-primas (agricultura e pecuária) até o segmento de insumos de produção e bens de capital. Grandes inovações ocorrem principalmente na área de formulação de ingredientes e aditivos, alimentos funcionais, transgênicos e embalagens.

Santini et al. (2005)Santini, G. A., Schiavi, S. M. A., & Souza, H. M., Fo (2005). Inovações tecnológicas em cadeias agroindustriais: alguns casos do segmento de processamento de carnes, leite e café no Brasil. In Anais do XII Simpósio de Engenharia de Produção – SIMPEP. Bauru: UNESP. salientam que o processo inovativo na indústria alimentícia brasileira segue quatro padrões distintos: 1) adaptação de produtos e processos por multinacionais (geradas na matriz no exterior e adaptadas pelas filiais nacionais); 2) inovações nacionais espelhadas no mercado externo (cópias ou imitações de produtos existentes no exterior, geralmente criadas por empresas nacionais de grande e médio porte); 3) inovações espelhadas no mercado nacional (cópias ou imitações de produtos e processos de empresas nacionais de grande porte, realizadas por empresas de menor porte e atuação regional); 4) inovações genuinamente nacionais (bastante raras e geralmente introduzidas por empresas com forte know-how e capacidade financeira).

Ainda sobre inovações no setor, De Mori (2011)De Mori, C. (2011) Capacidade tecnológica em sistemas agroindustriais: proposição de índice e aplicação a empresas dos segmentos de trigo e leite (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos. ressalta a importância dada às exigências higiênico-sanitárias, regulamentações e normas-padrão referentes à produção e comercialização de produtos alimentícios, tanto em âmbito nacional como internacional, como forças motrizes de desenvolvimento e implementação de inovações. Nesse sentido, são comuns as inovações em aspectos organizacionais, tais como implantação de boas práticas de fabricação e análise de perigos e pontos críticos de controle (APPCC). Segundo a autora, a perecibilidade dos produtos alimentares e os longos caminhos que os produtos percorrem para chegar ao consumidor, demandam inovações em termos de logística, de processo, organizacionais e de marketing. Estas observações são importantes, pois evidenciam claramente que inovações em termos de tecnologias de gestão devem se aliar àquelas de produto e processo para construírem a competitividade das IAB.

Sobre o potencial de inovação na indústria de alimentos, Christensen et al. (1996)Christensen, J. L., Rama, R., & Von Tunzelmann, N. (1996). Innovation in the European food products and beverage industry: Industry studies of innovation using CIS data (Project 94/111, EIMS Publication, 35). Bruxelles: European Information Monitoring System. salientam que mudanças incrementais de produtos e de processos requerem menor suporte de P&D e tem menos chances de serem protegidas por patentes quando comparadas às inovações radicais observadas nas indústrias de alta tecnologia. De acordo com os autores, inovação na indústria de alimentos e bebidas são eventos isolados e resultados de um processo open-ended – processo evolucionário que faz com que seja difícil marcar o início e o fim da inovação no tempo. No setor, as inovações tecnológicas resultam de um processo aberto e revolucionário, bem como de aprendizados rotineiros, juntamente com elementos de incrementalismo. O processo imitativo é amplamente utilizado, uma vez que informações sobre os competidores são de fácil obtenção e barreiras à entrada, em termos de custo, não são sempre elevadas.

Domingues (2008)Domingues, S. A. A. (2008). Indústria de Alimentos e Bebidas no Brasil: uma análise da dinâmica tecnológica e das estratégias de inovação de suas empresas entre 1998 e 2005 (Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, Campinas., ao estudar o comportamento e a dinâmica tecnológica do setor de alimentos e bebidas no Brasil de 1998 a 2005 a partir de dados da PINTEC, constatou que, embora a taxa de inovação da indústria alimentícia observada seja próxima da média da indústria de transformação nacional, os indicadores de esforço analisados foram baixos. Isto significa que as inovações se devem muito mais à aquisição de tecnologia, principalmente de máquinas e equipamentos, que ao desenvolvimento tecnológico endógeno à empresa. A pesquisa aponta ainda um comportamento estratégico dominante claramente direcionado para estratégias imitativas, o que significa que as empresas raramente introduzem inovações radicais, preferindo imitar produtos desenvolvidos por outros, utilizando vantagens de custo por estarem num mercado específico, e adquirindo benefícios de condições especiais de legislação ou demanda do setor público por meio de um canal superior de distribuição ou facilidades de mercado.

3 O setor agroalimentar brasileiro

A indústria de alimentos do Brasil ocupa um lugar de destaque no cenário econômico nacional e internacional. Dado o crescimento das demandas internas e externas, as fabricantes de alimentos e bebidas têm investido em capacidade e eficiência produtivas. Segundo dados do IBGE, considerando todas as pessoas vinculadas à produção industrial, o segmento de alimentos e bebidas é o que mais emprega no País, sendo responsável por, aproximadamente, 20% dos postos de trabalho de todas as atividades de transformação. Em 2014, a indústria empregou 1,66 milhão de trabalhadores, 92% mais que em 1992 (ABIA, 2015Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos – ABIA. (2015). O setor em números. São Paulo: ABIA. Recuperado em 21 de outubro de 2015, de http://www.abia.org.br/anexos/FichaTecnica.pdf
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), como mostra a Tabela 1.

Tabela 1
Indústria nacional de alimentos e bebidas: principais indicadores econômicos.

Segundo dados do IBGE e da ABIA – Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação, a indústria de alimentos e bebidas é responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e por 22% do PIB industrial do País. Ainda de acordo com dados da ABIA, o faturamento das empresas do setor somou quase R$ 526 bilhões em 2014, sendo R$ 424,5 bilhões em alimentos e R$ 101,2 bilhões em bebidas. Esse desempenho coloca o setor como o maior em valor bruto de produção da indústria de transformação.

Em 2014, o setor exportou o equivalente a R$ 96,9 bilhões em alimentos e bebidas, 18,3% das exportações do País. Por outro lado, as importações de alimentos são bem menos significativas e concentradas em trigo, totalizando R$ 13,5 bilhões. Isso faz do setor da alimentação um dos mais relevantes para a geração de saldo comercial positivo, atingindo US$ 83,4 bilhões em 2015, muito superior ao saldo comercial da economia brasileira como um todo, negativo em US$ 4 bilhões (ABIA, 2015Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos – ABIA. (2015). O setor em números. São Paulo: ABIA. Recuperado em 21 de outubro de 2015, de http://www.abia.org.br/anexos/FichaTecnica.pdf
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).

Diante da alta competitividade do setor e do crescimento do consumo de produtos de maior valor agregado, níveis cada vez maiores de tecnologia e gestão são exigidos das firmas. De acordo com dados da ABIA, em 2012, 75% dos alimentos consumidos no País passavam por algum processamento industrial, contra 70% em 1990 e apenas 56% em 1980. Novos nichos de mercado também crescem, potencializando estratégias de diferenciação de produtos. O segmento de produtos relacionados à saúde e bem-estar (diet, light, funcionais, fortificados, naturais e saudáveis) é um bom exemplo deste movimento estratégico de diferenciação de produtos. Em 2012, este segmento apresentou faturamento de R$ 38,4 bilhões, correspondendo a 8,9% das vendas totais de alimentos no País. Convém lembrar que, em grande parte dos casos, produtos diferenciados são mais exigentes em termos de tecnologias de produto e processo.

4 Métodos

Este trabalho empregou duas técnicas metodológicas diferentes. Inicialmente foi realizada uma revisão de literatura sobre inovação e características do processo inovativo que considerasse as peculiaridades da indústria alimentícia. Esta revisão também incluiu um levantamento de estudos setoriais, nacionais e internacionais, sobre a indústria de alimentos e bebidas. Estas informações permitiram a construção de uma breve caracterização do setor industrial brasileiro de alimentos e bebidas, enfatizando e justificando sua importância para o Brasil.

A segunda técnica utilizada foi a de tratamento de dados secundários, obtidos na Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (PINTEC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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, 2005Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2005). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2003. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, de http://www.pintec.ibge.gov.br
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), nos anos de 2000, 2003, 2005, 2008 e 2011, todas disponibilizadas pela instituição. Foram analisados dados das Indústrias de Transformação responsáveis pela fabricação de produtos alimentícios e bebidas, relativos às inovações em produtos e processos, seus graus de novidade e seus principais impactos. A intensidade dos dispêndios dessas indústrias e suas principais relações de cooperação, dentre outros fatores, também foram escrutinados por estas análises.

As principais limitações encontradas neste exercício analítico estão ligadas à existência de variações na nomenclatura das variáveis por parte do Instituto entre os anos, principalmente entre o levantamento de 2005 e 2008. A inexistência de alguns dados na publicação de 2000 também foi observada. Contudo, tais limitações não comprometeram a extensão e a pertinência das análises.

5 A dinâmica tecnológica na IAB

5.1 Esforços tecnológicos da IAB

Como salientado anteriormente, a inovação na indústria de alimentos e bebidas tem grande interface com suas “indústrias de apoio”– aquelas que produzem embalagens, aditivos, maquinário e equipamentos, - principalmente no que tange às inovações em processos, sendo as inovações em produtos em grande parte realizadas pelas próprias IABs. No entanto, Carvalho & Furtado (2013)Carvalho, S.A.D., & Furtado, A.T. (2013). Estratégias tecnológicas e dinâmica de inovação das empresas agroalimentares no Brasil. Revista Gestão & Conexões, 2(1), 47-75. consideram que a independência tecnológica das IABs no exterior vem aumentando em relação aos seus tradicionais fornecedores de tecnologia, ou seja, um volume maior de inovações de processo vem sendo desenvolvido nas próprias IABs. Estes mesmos autores consideram que movimento semelhante está ocorrendo no Brasil.

Na Tabela 2, é possível observar a acentuada diferença entre inovações em produto e em processo quanto ao principal agente responsável. As inovações em produto são principalmente desenvolvidas internamente às IAB, chegando a mais de 80% do total em 2011. Por outro lado, aquelas que nascem de relações de cooperação com outras empresas/institutos ou as adquiridas de outras empresas/institutos têm ocorrência consideravelmente inferior. Já as inovações em processo são majoritariamente desenvolvidas e adquiridas de fontes externas às IAB. Contudo, desde 2003, observa-se um crescimento considerável das inovações em processo realizadas internamente. Este fato revela certo crescimento da independência tecnológica das firmas do setor em relação às suas indústrias de apoio, tradicionalmente desenvolvedoras de tecnologias para o setor.

Tabela 2
Principal responsável pelo desenvolvimento de produto/processo nas empresas inovadoras – Indústria brasileira de alimentos e bebidas.

Até o ano de 2005, houve uma crescente internalização das atividades inovativas de produtos por parte das empresas. No entanto, após 2005, notam-se taxas menores neste quesito. Em contrapartida, as inovações em processo que, no geral, envolvem maiores níveis de capacidade tecnológica (De Mori, 2011De Mori, C. (2011) Capacidade tecnológica em sistemas agroindustriais: proposição de índice e aplicação a empresas dos segmentos de trigo e leite (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos.) sofreram uma transferência de agentes externos para as próprias IABs, o que reflete os investimentos feitos no setor.

O investimento total das IABs em inovação decresceu 15% entre 2008 e 2011, atingindo 2,05% da receita das empresas inovadoras em 2011. A Figura 1 relaciona o quanto da receita líquida das firmas inovadoras é direcionado para as diversas atividades inovativas.

Figura 1
Intensidade dos dispêndios com atividades inovativas em empresas inovadoras - Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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). Nota: dados referentes à “Aquisição de software” foram disponibilizados a partir de 2005.

A aquisição de máquinas e equipamentos foi a atividade inovadora mais importante em todos os períodos analisados, atingindo 1,51% da receita das empresas em 2011. Contudo, foi o quesito que apresentou maior queda entre as duas últimas pesquisas. Tanto a introdução das inovações tecnológicas no mercado como a aquisição de conhecimentos externos apresentaram crescimento de 0,7% entre 2008 e 2011, o maior no período. Ao observar as taxas da aquisição de conhecimentos externos para inovação e da aquisição de máquinas e equipamentos para o mesmo fim, pode-se supor que houve decréscimo do esforço em favor da independência inovativa das firmas entre 2008 e 2011.

Esse fato pode ser um reflexo decorrente de políticas governamentais recentes, as quais estimulam a cooperação de empresas com universidades e institutos de pesquisa visando alavancar seu potencial inovativo. Além disso, o modelo de inovação aberta, no qual a empresa recebe, em seu processo inovativo, contribuição de parceiros externos (clientes, fornecedores, universidades e até mesmo concorrentes) tem sido crescentemente adotado pelas empresas.

A Tabela 3 mostra que o pessoal ocupado em atividades internas de P&D nas empresas inovadoras, em termos absolutos ou relativos, apresentou crescimento entre 2008 e 2011. Entre 2005 e 2008, o forte crescimento observado na aquisição de máquinas e equipamentos, aliado ao crescimento absoluto de pessoas trabalhando na indústria alimentícia, diminuiu a intensidade de pessoas ocupadas nas atividades de P&D.

Tabela 3
Pessoal ocupado e intensidade de pessoas ocupadas em P&D – Indústria brasileira de alimentos e bebidas.

Este indicador é dado pela divisão do total de pessoal ocupado em P&D (em equivalente tempo integral) pelo total de pessoas ocupadas no setor. Esta constatação vai de encontro ao fato de que as IABs vêm cada vez mais desenvolvendo atividades inovativas internamente. Uma explicação para todo este quadro seria o aumento da produtividade dos empregados das IABs envolvidos com P&D. No entanto, a confirmação para esta suposição escapa ao que os dados disponibilizados pelo IBGE podem fornecer.

Desde 2005, cresceu consideravelmente a importância das redes de informação e pesquisa como fontes de informação para o desenvolvimento inovativo. Os avanços tecnológicos em termos de tecnologia de informação, bem como a importância de licenciamentos e patentes e de instituições de testes, ensaios e certificações, explicam e justificam esta situação. Ainda se tratando das principais fontes de informação para o desenvolvimento de inovações, a Figura 2 mostra que, juntamente com outras áreas das empresas, os clientes e fornecedores despontam como fortes fontes de informação da atividade inovativa na indústria alimentícia.

Figura 2
Fontes de informação muito importantes para as empresas inovadoras – Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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).

Observa-se que, entre 2005 e 2008, algumas fontes de informação externas à empresa (feiras, conferências, centros de capacitação profissional, universidades, etc.) ganharam importância, da mesma forma que as internas, como os departamentos de P&D. Tais dados indicam que o setor apresenta forte envolvimento com os sistemas locais de inovação, uma vez que cresce progressivamente a importância das fontes nacionais de informação, como mostra a maioria das categorias da Tabela 4.

Tabela 4
Localização das fontes de informação para a inovação: indústria brasileira de alimentos e bebidas (%).

Depois de uma diminuição considerável entre 2000 e 2005, os níveis de cooperação para inovação tiveram aumento significativo de 2005 a 2011, chegando a 17,8% nesse ano. A cooperação visando desenvolvimento tecnológico pode promover maior rapidez no processo inovativo, de forma que o crescimento notado nesse último período pode ser reflexo do aumento da competitividade no setor, o qual impele as empresas a um comportamento de mercado mais agressivo.

A Figura 3 apresenta as relações de cooperação para inovação das empresas pesquisadas com outras organizações. Nela, podem ser observadas mudanças em termos de importância dessas organizações, destacando-se o crescimento percentual da importância das instituições de testes, das universidades e dos clientes entre as duas últimas pesquisas realizadas. Este fato mostra os esforços na aquisição de recursos humanos qualificados para o empreendimento de atividades inovativas, ponto importante para a diminuição de riscos envolvidos no desenvolvimento de inovações.

Figura 3
Relações de cooperação mais importantes para empresas inovadoras – Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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). *Dado disponível desde a PINTEC de 2008.

Os fornecedores mostram-se, historicamente, como os principais agentes de cooperação para inovação na indústria alimentícia. Este é o reflexo da já aludida múltipla interface do processo inovativo desta indústria.

5.2 Resultados da atividade inovadora na IAB

O papel cada vez mais importante da inovação nas estratégias competitivas das empresas alimentícias se reflete no crescimento das suas taxas de inovação. O número de empresas consideradas inovadoras no setor de alimentos e bebidas cresceu mais de 10% entre 2000 e 2011. Contudo, neste intervalo, as empresas tornaram suas atividades inovativas menos diversificadas. O período assistiu a um decréscimo significativo do percentual de empresas que inovam em produtos e também em processos. Entre 2008 e 2011, reduziu-se o número daquelas com atividades inovativas unicamente em produto, mas cresceu o número das que inovam apenas em processo (ver Tabela 5).

Tabela 5
Empresas inovadoras em produto e processo, por abrangência de inovações realizadas – Indústria brasileira de alimentos e bebidas (%).

Sobre a abrangência dessas inovações, cabe ressaltar o elevado percentual de processos e produtos novos para a empresa (mais de 85% em ambos os casos). Esta condição contrasta com a baixa ocorrência de inovações consideradas novas não somente para a empresa em questão, mas também para o mercado nacional. Com base nesses dados, pode-se sugerir que muitas das inovações são de caráter incremental ou são imitações/cópias de produtos já existentes no mercado brasileiro, corroborando os resultados de Domingues (2008)Domingues, S. A. A. (2008). Indústria de Alimentos e Bebidas no Brasil: uma análise da dinâmica tecnológica e das estratégias de inovação de suas empresas entre 1998 e 2005 (Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas, Campinas.. A Tabela 6 aponta o crescimento do processo imitativo de produtos e processos estrangeiros.

Tabela 6
Grau de novidade do principal produto/processo das empresas inovadoras – Indústria brasileira de alimentos e bebidas (%).

Apesar deste quadro, entre 2005 e 2008 cresceu o número de empresas com atividades de patenteamento (Figura 4). Carvalho & Furtado (2013)Carvalho, S.A.D., & Furtado, A.T. (2013). Estratégias tecnológicas e dinâmica de inovação das empresas agroalimentares no Brasil. Revista Gestão & Conexões, 2(1), 47-75. salientam que na IAB a proteção por patentes é muito dispendiosa, dada a alta rotatividade e elevado grau de diferenciação inerentes aos produtos. Dessa forma, os métodos de proteção à inovação mais utilizados pelas firmas ainda são as marcas e os segredos industriais, os quais promovem maior apropriabilidade e lucratividade, além de, tradicionalmente, fidelizarem mais fortemente os consumidores.

Figura 4
Métodos de proteção empregados por empresas inovadoras – Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2005Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2005). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2003. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, de http://www.pintec.ibge.gov.br
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).

Os principais motivos que levam as empresas a inovar estão ligados às percepções que elas têm do impacto das inovações nos seus negócios. A Figura 5 revela que, entre 2008 e 2011, cresceu consideravelmente a preocupação com o mercado consumidor, dado o incremento das variáveis de ampliação da gama de produtos ofertados, manutenção e ampliação da participação da empresa no mercado e abertura de novos mercados. Cresceram também as preocupações ligadas à capacidade produtiva e à redução dos custos de produção, bem como aquelas relacionadas à redução de impacto ambiental. Ressalta-se ainda que os investimentos ligados à produção sejam condizentes com o incremento dos investimentos em máquinas e equipamentos, observados anteriormente, bem como à importância dada aos fornecedores como fontes de informação para a inovação.

Figura 5
Impactos de alta importância causados pelas inovações – Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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). Nota: na PINTEC de 2008 os dados sobre “enquadramento em regulações relativas ao mercado interno e externo” são unificados.

A Figura 6 apresenta os principais problemas e obstáculos que as IABs brasileiras enfrentam nos seus processos inovativos. Vale dizer que a maioria destes fatores negativos foram minorados entre os anos de 2008 e 2011. Esta situação reflete um ambiente mais favorável à inovação promovido principalmente por políticas públicas de incentivos fiscais e melhoria do sistema de garantia de apropriabilidade e retornos sobre as inovações (Lei da Inovação), as quais vigoram desde 2004.

Figura 6
Problemas e obstáculos mais importantes relacionados à inovação – Indústria brasileira de alimentos e bebidas. Fonte: IBGE (2002Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2002). Pesquisa industrial: Inovação tecnológica 2000. Rio de Janeiro: IBGE. Recuperado em 30 de julho 2015, dehttp://www.pintec.ibge.gov.br
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). *Dados não constaram na PINTEC 2000.

A maior disponibilidade de incentivos fiscais e as maiores garantias de retornos sobre os investimentos podem ser refletidas na diminuição das preocupações com a escassez de fontes de financiamento e a abundância de riscos econômicos (Figura 6). O crescimento da avidez dos consumidores por novos produtos de maior valor agregado pode ser confirmado pela diminuição das preocupações com possíveis respostas fracas ao lançamento destes produtos no mercado diante de 2005. Em contrapartida, cresceu consideravelmente o problema de escassez de pessoal qualificado, o que reflete a necessidade nacional de investimento em educação e capacitação de qualidade.

6 Considerações finais

Este trabalho buscou, por meio de um recorte de dados da PINTEC (2000 a 2011), observar a dinâmica tecnológica da IAB de forma específica e profunda. O setor de alimentos e bebidas tem fundamental importância social e econômica no Brasil, sendo responsável por 10% do PIB nacional e 20% do PIB da indústria de transformação. Todavia, o setor apresenta fragilidades tecnológicas intrínsecas e as inovações, entendidas como novos produtos, processos ou serviços, são reconhecidamente importantes para se manter à frente dos concorrentes e satisfazer as necessidades dos consumidores (Menrad, 2004Menrad, K. (2004). Innovations in the food industry in Germany. Research Policy, 33(6-7), 845-878. http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2004.01.012.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2004....
).

O crescimento da taxa de inovação da indústria alimentícia reflete esforços em aprimoramentos de processos e produtos, com maior ênfase nos primeiros. Apesar disto, o fato de grande parte das inovações serem novidades apenas no âmbito interno da empresa denota, de certa forma, a baixa capacidade tecnológica das IAB. Esta situação mostra que a geração de conhecimentos tecnológicos no setor manteve-se baixa nos últimos anos. O fato de que é crescente o número de empresas que realiza inovações, mas decrescente a quantidade de empresas que inovam simultaneamente em produto e processo, indica continuidade da tendência de esforços incrementais por parte da IAB e mostra contenção na ampliação da linha de produtos e na agregação de valor, uma vez que novos produtos exigem modificações mais importantes nos seus processos de produção e intensificam a dinâmica tecnológica da indústria alimentícia.

No geral, os indicadores mostram que o setor ainda atua muito mais como incorporador do que como gerador de tecnologia e inovação. O forte investimento na aquisição de máquinas e equipamentos mostra claramente que o setor adquire mais tecnologia externa do que desenvolve. O baixo percentual de pessoal ocupado em P&D dentro das empresas, a grande importância de clientes, fornecedores e concorrentes como fontes de informação para inovação, e ainda o fato de as inovações representarem, em sua grande maioria, novidade apenas para a empresa, sendo grande parte desta apenas um aprimoramento de produto e/ou processo já existente, ainda aponta uma situação indesejada de dependência tecnológica em relação aos fornecedores.

Nesse contexto, dado o relativo baixo investimento em P&D, a crescente importância de redes informatizadas como fonte de informação para desenvolvimento – que indica busca por informações de mercado e de tecnologia –, o caráter majoritariamente incremental de produtos e processos, e ainda a grande importância dos impactos tecnológicos nos aspectos de eficácia e eficiência produtivas, pode-se afirmar que a estratégia tecnológica do setor de alimentos e bebidas ainda é majoritariamente imitativa.

Entretanto, pode-se observar maior dinamização nos esforços tecnológicos no período de 2008 a 2011, principalmente no âmbito desenvolvimento de novos processos, bem como sua maior internalização. Os dispêndios com atividades internas de P&D apresentaram incremento considerável e cresceu a representatividade das fontes nacionais de informações para desenvolvimento de inovações. Registrou-se ainda, entre 2005 e 2008, o aumento da utilização de patentes como método de proteção, o que significa que houve a geração de novos conhecimentos para a indústria passíveis de serem protegidos.

No mesmo período, observou-se que a indústria alimentícia procurou melhorar sua eficácia e eficiência produtivas, principalmente pela redução dos custos de produção, e realizar a manutenção de sua imagem no mercado por meio de esforços inovativos. O crescimento desses esforços reflete, dentre outras coisas, a melhoria do ambiente institucional para o desenvolvimento tecnológico, dada por leis de incentivo a inovações vigentes desde a década passada. Dessa forma, mesmo com o caráter inovativo imitativo, aumenta a interação dessa indústria com o sistema nacional de inovação e também seu envolvimento com agentes diversos, o que gera aprendizado tecnológico e contribui para os resultados das atividades inovativas desse setor.

Fortes tendências tecnológicas, econômicas, políticas e institucionais vêm transformando o sistema de produção alimentar por meio de tecnologias de informação e comunicação, biotecnologia, sistemas de pesquisa e desenvolvimento, globalização de cadeias agroalimentares, investimento estrangeiro direto e comércio internacional (Caiazza et al., 2014Caiazza, R., Volpe, T., & Audretsch, D. (2014). Innovation in agro-food chain. Journal of Enterprising Communities: People and Places in the Global Economy, 8(3), 180-187. http://dx.doi.org/10.1108/JEC-06-2014-0009.
http://dx.doi.org/10.1108/JEC-06-2014-00...
). Nesse contexto, incrementos mais promissores na competitividade do setor podem ser alcançados via investimentos maiores em P&D, os quais aumentem o desempenho inovador das empresas e, consequentemente, promovam o desenvolvimento interno de tecnologias e inovações. Salienta-se que o foco apenas na redução de custos e na eficiência de processos produtivos, normalmente focados pelas empresas, pode colocar suas vantagens competitivas sob pressão no longo prazo (van Galen et al., 2013van Galen, M., Logatcheva, K., Bakker, T., Oosterkamp, E., & Jukema, G. (2013). Innovation in the food industry: an internationl benchmark study (Project code 2273000201). The Hague: LEI Wageningen UR.).

Modelos de inovação aberta mais integrados e eficientes também podem ser explorados (Bigliardi & Galati, 2013Bigliardi, B., & Galati, F. (2013). Models of adoption of open innovation within the food industry. Trends in Food Science & Technology, 30(1), 16-26. http://dx.doi.org/10.1016/j.tifs.2012.11.001.
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), por meio da intensificação de colaborações sistemáticas com Universidades e outros centros de pesquisa. Ainda, Flipse et al. (2014)Flipse, S., van der Sanden, M., Fortuin, F. T. J. M., & Omta, S. W. F. (2014). Enhancing responsible innovation in Food Industry. In Proceedings of the WICaNeM 2014. Wageningen: Wageningen University & Research. salientam que é crescente o interesse de consumidores e empresas por produtos mais sustentáveis e éticos, o que deve encorajar as empresas a adotar práticas socialmente responsáveis de inovação, visando à diferenciação do seu portfólio sob perspectivas de sustentabilidade, saúde, segurança e equidade social.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) o apoio oferecido no desenvolvimento desta pesquisa.

  • Suporte financeiro: CNPq.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2017
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    10 Nov 2015
  • Aceito
    17 Set 2016
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