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Desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita na dislexia familial

Resumos

TEMA: dislexia familial. OBJETIVO: caracterizar o desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita do probando com dislexia e de seus familiares afetados. MÉTODO: participaram deste estudo 10 núcleos familiais de parentesco natural de indivíduos com queixa específica de problemas de leitura e compreensão. Foram selecionadas famílias de probandos naturais e residentes na região do oeste do estado de São Paulo. Os requisitos de inclusão dos probandos foram: ser falante nativo do Português Brasileiro, ter idade acima de oito anos, apresentar histórico familial positivo para os problemas de aprendizagem, ou seja, apresentar no mínimo um outro parente com dificuldade para aprender em três gerações. Os critérios de exclusão para o grupo de probandos foram: apresentar qualquer distúrbio neurológico-genético tais como distonia, doenças extras piramidais, deficiência mental, epilepsia, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH); sintomas ou condições psiquiátricas; ou outras condições pertinentes que poderiam gerar erros no diagnóstico. Para o diagnóstico de dislexia do desenvolvimento foram coletados dados de antecedente familial na histórica clínica com os pais das crianças e adolescentes para realização do heredograma. Foram realizadas avaliações neurológica, fonoaudiológica, psicológica e de desempenho escolar nos probandos e em seus parentes. RESULTADOS: os resultados deste estudo sugeriram que os probandos e seus familiares com dislexia apresentaram desempenho inferior ao grupo controle quanto à nomeação rápida, leitura, escrita e consciência fonológica. CONCLUSÃO: alterações em consciência fonológica, memória de trabalho, leitura e escrita tem susceptibilidade genética que possivelmente em interação com o meio ambiente determinam o quadro de dislexia.

Dislexia; Aprendizagem; Leitura


BACKGROUND: familial dyslexia. AIM: to characterize and compare the phonological awareness, working memory, reading and writing abilities of individuals whose family members are also affected. METHOD: in this study 10 familial nuclei of natural family relationship of individuals with dyslexia were analyzed. Families of natural individuals living in the west region of the state of São Paulo were selected. Inclusion criteria were: to be a native speaker of the Brazilian Portuguese language, to have 8 years of age or more, to present positive familial history for learning disabilities, that is, to present at least one relative with difficulties in learning. Exclusion criteria were: to present any neurological disorder genetically caused or not, in any of the family members, such as dystonia, extra pyramidal diseases, mental disorder, epilepsy, attention deficit and hyperactivity disorder (ADHA); psychiatric symptoms or conditions; or any other pertinent conditions that could cause errors in the diagnosis. As for the diagnosis of developmental dyslexia, information about the familial history of the adolescents and children was gathered with the parents, so that a detailed pedigree could be delineated. Neurological, psychological, speech-language, and school performance evaluations were made with the individuals and their families. RESULTS: the results of this study suggest that the dyslexic individuals and their respective relatives, also with dyslexia, presented lower performances than the control group in terms of rapid automatic naming, reading, writing and phonological awareness. CONCLUSION: deficits in phonological awareness, working memory, reading and writing seem to have genetic susceptibility that possibly determine, when in interaction with the environment, the manifestation of dyslexia.

Dyslexia; Learning; Reading


ARTIGO ORIGINAL DE PESQUISA

Desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita na dislexia familial* * Trabalho Realizado no Ambulatório de Neurologia Infantil do HC da FM - Unesp Botucatu e Centro de Estudos da Educação e Saúde da Unesp Marília.

Simone Aparecida CapelliniI,1 1 Endereço para correspondência: R. Bartolomeu de Gusmão, 10-84 - Bauru - SP - CEP 17017-326 ( sacap@uol.com.br). ; Niura Aparecida de Mouro Ribeiro PadulaII; Lara Cristina Antunes dos SantosIII; Maria Dalva LourencetiIV; Erika Hasse CarrenhoIV; Lucilene Arilho RibeiroV

IFonoaudióloga. Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (FCM - Unicamp). Docente do Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC - Unesp)

IINeurologista. Doutora em Ciências Médicas pela FCM - Unicamp. Docente do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina (FM) da Unesp Botucatu

IIINeurologista do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM - Unesp Botucatu

IVMédica. Especializanda em Neuropsicologia pela FCM - Unicamp. Psicóloga do Ambulatório de Neurologia Infantil do Hospital das Clínicas (HC) da FM - Unesp Botucatu

VMédica. Doutora em Genética pelo Instituto de Biociências da Unesp Botucatu. Bióloga do Setor de Genética do Hospital de Reabilitação Craniofacial de Bauru

RESUMO

TEMA: dislexia familial.

OBJETIVO: caracterizar o desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita do probando com dislexia e de seus familiares afetados.

MÉTODO: participaram deste estudo 10 núcleos familiais de parentesco natural de indivíduos com queixa específica de problemas de leitura e compreensão. Foram selecionadas famílias de probandos naturais e residentes na região do oeste do estado de São Paulo. Os requisitos de inclusão dos probandos foram: ser falante nativo do Português Brasileiro, ter idade acima de oito anos, apresentar histórico familial positivo para os problemas de aprendizagem, ou seja, apresentar no mínimo um outro parente com dificuldade para aprender em três gerações. Os critérios de exclusão para o grupo de probandos foram: apresentar qualquer distúrbio neurológico-genético tais como distonia, doenças extras piramidais, deficiência mental, epilepsia, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH); sintomas ou condições psiquiátricas; ou outras condições pertinentes que poderiam gerar erros no diagnóstico. Para o diagnóstico de dislexia do desenvolvimento foram coletados dados de antecedente familial na histórica clínica com os pais das crianças e adolescentes para realização do heredograma. Foram realizadas avaliações neurológica, fonoaudiológica, psicológica e de desempenho escolar nos probandos e em seus parentes.

RESULTADOS: os resultados deste estudo sugeriram que os probandos e seus familiares com dislexia apresentaram desempenho inferior ao grupo controle quanto à nomeação rápida, leitura, escrita e consciência fonológica.

CONCLUSÃO: alterações em consciência fonológica, memória de trabalho, leitura e escrita tem susceptibilidade genética que possivelmente em interação com o meio ambiente determinam o quadro de dislexia.

Palavras-Chave: Dislexia; Aprendizagem; Leitura.

Introdução

A dislexia é tanto familial quanto hereditária. A história familial é um dos mais importantes fatores de risco, sendo que 23 a 65% de crianças com dislexia apresentam pais também com a anormalidade (1,2). A taxa entre irmãos de pessoas afetadas é de aproximadamente 40% e entre pais é de 27% a 49%.

Apesar desse forte envolvimento genético, a dislexia não segrega comumente nas famílias em um simples modo mendeliano (3,4). Além disso, a habilidade para fazer tarefas cognitivas relacionadas à leitura tende a diminuir em função da proximidade no parentesco dos probandos disléxicos. Essa descoberta sugere que diversos fatores podem interagir com outros trazendo influência na habilidade de leitura.

Estudos de ligação e associação têm apontado várias regiões cromossômicas que podem conter genes candidatos à dislexia. Essas regiões incluem os cromossomos 1p (5), 2p (6), 6p (7), 15q (8), e 18p (9). Alguns genes têm sido associados à dislexia tais como: KIAA0319 (10) e DCDC2 (11) no cromossomo 6p e EKN1 no cromossomo 15q (12).

A identificação destes polimorfismos genéticos pode significar que o risco particular de uma criança desenvolver certos tipos de problemas de leitura pode ser estimado antes da criança desenvolver severos problemas de leitura e escrita.

Com base no exposto acima, este artigo apresentará estudo realizado com famílias de crianças com dislexia do desenvolvimento que teve por objetivos:

. investigar a prevalência familial e a razão sexual dos distúrbios de aprendizagem entre os familiares de probandos com dislexia;

. caracterizar o desempenho em consciência fonológica, memória operacional, leitura e escrita do probando com dislexia e de seus familiares afetados.

Método

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - CEP/FFC/Unesp - Marília sob o protocolo de número 2231/2006.

No presente estudo foram analisados dez núcleos familiais de parentesco natural de indivíduos com queixa específica de problemas de leitura e compreensão. Os requisitos de inclusão dos probandos foram: ser falante nativo do Português Brasileiro, ter idade acima de oito anos, apresentar histórico familial positivo, ou seja, apresentar no mínimo um outro parente com dificuldade para aprender em três gerações. Os critérios de exclusão para o grupo de probandos foram: apresentar qualquer distúrbio neurológico-genético tais como distonia, doenças extras piramidais, deficiência mental, epilepsia, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade e condições psiquiátricas.

A história clínica foi realizada com os pais dos probandos, com a finalidade de detectar aspectos que poderiam interferir no resultado da avaliação como, deficiência auditiva, visual, alterações práxicas de fala.

Dados específicos sobre a história natural da dislexia do desenvolvimento foram investigados, como época do aparecimento e dificuldades específicas relacionadas ao ato de ler e escrever.

Os dados de antecedentes familiais para realização do heredograma foram coletados no final da história clínica. As informações dos heredogramas foram utilizadas para determinar a prevalência familial e a razão sexual da dislexia do desenvolvimento nos parentes de primeiro grau.

Os probandos e seus familiares foram avaliados no Ambulatório de Neuro-Aprendizagem do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual Paulista (Unesp - Botucatu - São Paulo) e Centro de Estudos da Educação e Saúde (CEES/FFC/Unesp-Marília). Foram avaliados apenas os parentes do probando que apresentavam queixa de dificuldades de leitura e compreensão.

Os probandos foram considerados disléxicos quando apresentaram os seguintes critérios em situação de avaliação interdisciplinar: alteração quanto ao equilíbrio estático, à coordenação apendicular, persistência motora, equilíbrio dinâmico, coordenação tronco-membro e sensibilidade no exame neurológico evolutivo, discrepância entre coeficiente intelectual verbal e execução na avaliação psicológica, alteração quanto à memória, leitura e escrita na bateria neuropsicológica, alterações fonêmicas, silábicas, rima e aliteração em provas de consciência fonológica, nível de leitura alfabético, velocidade de leitura oral abaixo do esperado para idade e escolaridade, transtorno fonológico evidenciado na avaliação fonológica, na leitura oral de textos e na leitura oral de palavras isoladas e na escrita sob ditado de palavras e pseudo-palavras e na redação temática, compreensão parcial do texto lido.

O diagnóstico interdisciplinar de distúrbio de aprendizagem foi considerado quando os probandos ou seus familiares apresentaram além dos critérios acima descritos, alterações na estruturação sintático-semântica evidenciada tanto na linguagem oral como na redação temática, além de dificuldade na realização do cálculo-matemático, tanto para resolução de cálculos isolados como para resolução de cálculos que dependiam da leitura e compreensão do enunciado.

Para melhor confiabilidade dos dados deste estudo foram realizadas coletas de dados com grupo-controle. Desta forma, os grupos deste estudo ficaram assim distribuídos:

. Grupo 1: composto por dez probandos disléxicos, na faixa etária de oito a quinze anos de idade, sendo oito (80%) do sexo masculino e dois (20%) do sexo feminino, matriculados da 2ª a 6ª série do ensino fundamental;

. Grupo 2: composto por dez escolares sem problemas de aprendizagem pareados segundo sexo, faixa etária e escolaridade com o Grupo 1;

. Grupo 3: composto por vinte e dois familiares dos probandos disléxicos, na faixa etária de oito a setenta anos de idade, sendo seis (27,2%) do sexo masculino e deseseis (72,8%) do sexo feminino, que cursavam de da 2ª a 5ª série do ensino fundamental;

. Grupo 4: composto por vinte e dois indivíduos sem problemas de aprendizagem pareados segundo sexo, faixa etária e escolaridade com o Grupo 3.

Os procedimentos de avaliação utilizados neste estudo, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96), foram os seguintes:

. avaliação neurológica tradicional: composta por provas neurológicas que avaliam: formato do crânio, perímetro craniano, estado de consciência, movimentação involuntária espontânea, passiva, automática e reflexa, equilíbrio estático e dinâmico, coordenação apendicular, coordenação tronco/membro, sensibilidade geral e especial, nervos cranianos e sinais meningorradiculares, esfíncteres, segundo normas utilizadas na Faculdade de Medicina da Unesp - Botucatu - SP- Brasil. Esta avaliação foi realizada por médico neurologista infantil para descartar presença de alterações neurológicas;

. escala Wechsler de inteligência para crianças - WISC-II (13): realizada nos probandos e familiares dos probandos de seis a dezesseis anos de idade, cujo objetivo básico foi medir quantitativamente o nível cognitivo geral, através de operações mentais como associações, deduções, tipo de raciocínio, entre outras;

. escala Wechsler de inteligência para adultos - WAIS-III (14): realizada nos familiares dos probandos que apresentavam idade acima de dezessete anos, cujo objetivo básico foi medir quantitativamente o nível cognitivo geral, através de operações mentais como associações, deduções e tipo de raciocínio, entre outras.

A aplicação das escalas do Wisc e Wais foi realizada por psicólogos do ambulatório de neurologia infantil - aprendizagem do Hospital das Clínicas - HC / Unesp - Botucatu-SP:

. teste de desempenho escolar - TDE (15): os sujeitos foram submetidos à avaliação das capacidades fundamentais para o desempenho escolar, especificamente, escrita, aritmética e leitura;

. prova de nomeação automática rápida - RAN (16): os sujeitos foram submetidos à aplicação do Teste de Nomeação Automática Rápida, versão computadorizada, composta dos subtestes de nomeação de cores, dígitos, letras e objetos. Os sujeitos foram orientados de que o tempo seria cronometrado a partir do momento do sinal inicial do teste;

. prova de consciência fonológica - PCF (17): o procedimento utilizado foi a Prova de Consciência Fonológica. Esta prova é composta de dez subtestes, com quatro itens cada, que se referem à verificação da habilidade de síntese, segmentação, manipulação e transposição silábica e fonêmica, rima e aliteração. O resultado da prova é apresentado em forma de escore total.

Os resultados foram analisados estatisticamente, sendo adotado o nível de significância de 5% (= 0,050) para a aplicação dos testes estatísticos deste estudo. Para a análise estatística deste estudo foi utilizado o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 13.0, para a obtenção dos resultados. Os resultados estatisticamente significantes estão marcados com (*).

Resultados

Prevalência sexual e razão sexual

Nos resultados apresentados sobre a prevalência familial e a razão sexual da dislexia foram considerados todos os familiares afetados (n = 38) dos probandos, entretanto, participaram da avaliação apenas vinte e dois familiares dos probandos, pois dezesseis de seus familiares não foram avaliados por alguns motivos como: presença de retardo mental, patologias isquêmicas, traumas encefálicos, morte ou por residirem à distância superiores a três horas de viagem do local da coleta de dados.

A prevalência familial da dislexia nos probandos foi investigada por meio da contagem do número de familiares que apresentavam dislexia para cada probando, o que revelou que a prevalência da dislexia entre os parentes do sexo masculino de todos os probandos foi consideravelmente menor (0,185) do que para os familiares do sexo feminino (0,312). A diferença da prevalência da dislexia entre os dois sexos foi significante (0,001) conforme apresentado na Tabela 1.

Dos vinte e dois familiares avaliados, seis eram do sexo masculino e dezesseis do sexo feminino, que somando aos probandos resultou em um total de trinta e dois afetados (quatorze do sexo masculino e dezoito do sexo feminino). A prevalência sexual de todos os indivíduos afetados avaliados foi de 0,77 indivíduos do sexo masculino para 1,0 do sexo feminino. Entre os familiares dos probandos encontramos doze indivíduos com diagnóstico de dislexia e dez com diagnóstico de distúrbio de aprendizagem. Os dados relativos à razão sexual na dislexia mostraram que houve maior prevalência nos indivíduos do sexo masculino em relação ao feminino (1,75).

Caracterização dos achados fonológicos, de acesso ao léxico mental, leitura e escrita

A seguir serão apresentados os resultados do desempenho dos dez núcleos familiais nas habilidades de cognitivas e lingüísticas dos testes e provas aplicados neste estudo.

Quando aplicados o Teste Mann-Whitney e o Teste Friedman para comparação entre as médias do Wisc para o Grupo 1 e entre as médias do Wais para o Grupo 3 verificou-se diferença estatisticamente significante no desempenho dos probandos e familiares dos probandos quanto ao QIV e QIE (Tabela 2). Nesta mesma tabela também é possível observar a comparação do desempenho do Grupo 1 e do Grupo 3, quanto no TDE por meio do uso do Teste controlado de Levene, que evidenciou diferença estatisticamente significante entre os escores obtidos e esperados em leitura, escrita e escore total.

A Tabela 3 apresenta os resultados da comparação entre o Grupo 1 e Grupo 2, Grupo 3 e Grupo 4 nas habilidades de consciência fonológica, nomeação rápida e memória de trabalho do Wisc e Wais.

Na Tabela 3, verificou-se diferença estatisticamente significante no desempenho dos probandos e familiares dos probandos quanto aos subtestes de dígitos, completar figuras e códigos quando comparados o desempenho do Grupo 1 e Grupo 3 com os respectivos grupos controles Grupo 2 e Grupo 4.

Os resultados apontaram diferença estatisticamente significante nos subtestes de síntese e transposição silábica e todos os fonêmicos da PCF quando utilizado o Teste t de Student e controlado pelo Teste de Levene. Quando comparado os resultados do Grupo 3 e Grupo 4, verificou-se que não ocorreu diferença estatisticamente significante apenas no subteste de manipulação silábica quando utilizado o Teste t de Student e controlado pelo Teste de Levene.

Comparando o desempenho do Grupo 1 com o Grupo 2 no RAN utilizando o Teste de Friedman e o Teste t de Student controlado por Levene observa-se diferença estatisticamente significante nos subtestes de nomeação de letras, de números e de objetos. Na comparação do desempenho do Grupo 3 e Grupo 4 observou-se diferença estatisticamente significante em todos os subtestes.

Discussão

O presente estudo apontou que, das dez famílias participantes, um total de doze familiares apresentavam dislexia e dez apresentavam distúrbio de aprendizagem, corroborando achados de estudo anterior (10) quanto à evidência de que as famílias que apresentam um membro com dislexia, pelo menos um outro membro também apresenta queixa ou dificuldades de aprendizagem semelhante.

A razão sexual encontrada neste estudo para dislexia do desenvolvimento nos probandos foi de 4:1, mostrando prevalência para o sexo masculino (razão masculino / feminino = 0,52). Apesar deste estudo não ser conclusivo devido ao número pequeno de núcleos familiais, o mesmo aponta maior prevalência de dislexia do desenvolvimento em indivíduos do sexo masculino e alta freqüência de probandos do sexo masculino filhos de mães com dislexia do desenvolvimento, sugerindo que a dislexia é uma desordem que pode ser relacionada ao cromossomo X. Estudos de segregação indicam que a dislexia é usualmente uma desordem de herança autossômica dominante (4). Recentemente, estudo realizado na Inglaterra evidenciou que a dificuldade para leitura de palavras isoladas está relacionada ao Xq 26 (9) e ao Xq 27 (18). O gene alelo recessivo do cromossomo X aumenta o risco para dislexia, o que poderia explicar o porquê de o sexo masculino ser mais afetado ou mais severamente afetado que o sexo feminino.

Os achados deste estudo em relação ao desempenho cognitivo corroboraram com estudos anteriores (19, 20) os quais evidenciaram em seu estudo com disléxicos QIV inferior ao QIE. Essa discrepância que evidencia alteração em velocidade de processamento da informação e em memória de trabalho aponta que este é o perfil de indivíduos disléxicos e de seus familiares afetados.

Outra característica encontrada na população disléxica deste estudo foi a dificuldade em relação ao cálculo matemático.

Conforme descrito na literatura (21), indivíduos com dificuldade de leitura apresentam alterações no processamento da informação e, como esse processamento é baseado em aspectos cognitivos e lingüísticos, a compreensão de problemas com enunciados e cálculos matemáticos, os quais necessitam de correspondência léxico-mental e representação numérica, comprometem a realização da atividade matemática.

Quanto ao desempenho dos indivíduos deste estudo na prova de consciência fonológica verificou-se que todos os indivíduos probandos ou familiares disléxicos apresentaram melhor desempenho silábico do que fonêmico (22, 23).

Existe um consenso entre os pesquisadores de que a habilidade fonológica é importante para a aquisição da leitura. A hipótese do déficit fonológico tem sido sustentada por inúmeros trabalhos que tem identificado atrasos quanto à sensibilidade a rima, aliteração e segmentação fonêmica durante o desenvolvimento da leitura (24). No Brasil, os estudos da dislexia têm evidenciado atraso em aliteração, manipulação e segmentação fonêmicas (19-22).

Os achados sobre a hipótese do déficit fonológico têm sido estendidos para a população de adultos. Estudo recente (25) descreveu que o déficit fonológico pode ser encontrado em adultos que apresentam dislexia.

Nesse estudo os probandos e seus familiares apresentaram desempenho inferior quando comparado com os respectivos grupos controles no RAN, o mesmo acontecendo em tarefas de leitura, escrita, aritmética e prova fonológica, evidenciando que há dificuldades no processamento fonológico da informação, armazenamento e velocidade de processamento da informação, além de dificuldades em atenção, habilidades fonológicas, nomeação rápida e memória de trabalho (26, 27).

Os achados deste estudo evidenciaram a relação entre o RAN, o processamento fonológico, a leitura e a escrita, pois os indivíduos com dislexia e seus familiares apresentaram velocidade de nomeação, memória de trabalho e habilidade fonológica alteradas, que refletiu diretamente no desempenho inferior dos mesmos em leitura, escrita e cálculo matemático (21, 23, 24, 28).

Nos casos de dislexia geralmente ocorrem alterações de base fonológica. Essas alterações são relacionadas à dificuldade de acessar e recuperar informações fonológica, necessárias para o bom desempenho em tarefas de leitura e escrita. Entretanto, considera-se que essas alterações têm origem familial, conforme descrito na literatura (5-7), corroborando com a etiologia genética do déficit fonológico nos probandos e nos membros das famílias dos probandos.

Conclusão

A razão sexual encontrada neste estudo para os probandos disléxicos evidenciou alta prevalência no sexo masculino. Ocorreu menor prevalência de dislexia entre os familiares do sexo masculino de todos os probandos em relação ao sexo feminino e alta freqüência de probandos do sexo masculino com dislexia.

Os indivíduos com dislexia apresentaram dificuldade para recuperação fonológica da informação, em velocidade de processamento temporal, em memória de trabalho, em estocagem fonológica, que estão diretamente relacionadas com fracasso para realização de associações e memorização, que resultam em alterações na linguagem escrita e no cálculo matemático.

Recebido em 03.08.2006.

Revisado em 06.09.2006; 18.09.2006; 28.05.2007; 10.07.2007; 18.09.2007; 06.11.2007.

Aceito para Publicação em 06.11.2007.

Artigo Submetido a Avaliação por Pares

Conflito de Interesse: não

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    Trabalho Realizado no Ambulatório de Neurologia Infantil do HC da FM - Unesp Botucatu e Centro de Estudos da Educação e Saúde da Unesp Marília.
  • 1
    Endereço para correspondência: R. Bartolomeu de Gusmão, 10-84 - Bauru - SP - CEP 17017-326 (
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      06 Nov 2007
    • Revisado
      06 Set 2006
    • Recebido
      03 Ago 2006
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