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Potencial evocado auditivo de tronco encefálico como auxílio diagnóstico de morte encefálica

Resumos

TEMA: Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico aplicado em morte encefálica. OBJETIVO: verificar a concordância entre o resultado do Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico e o desfecho do quadro clínico, em pacientes em coma Glasgow 3, por meio da análise do padrão de resposta elétrica do teste. MÉTODO: estudo tipo transversal realizado em 30 pacientes em coma Glasgow 3 submetidos ao Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico e acompanhados quanto ao desfecho clínico após o teste: recuperação ou óbito. O teste seria considerado positivo para morte encefálica ao registrar com reprodutibilidade ausência de todas as ondas ou presença de apenas a onda I, e considerado negativo na presença de duas ou mais ondas independentes de suas latências. RESULTADOS: entre os pacientes que apresentaram testes positivos para morte encefálica (86,66%), todos foram a óbito e o único paciente que se recuperou apresentou teste negativo indicando especificidade de 100%. Observou-se consistência interna dos dados, com coeficiente de correlação intraclasse de 0,562 por meio do Teste Alfa de Cronbach e concordância significativa entre o teste e o desfecho clínico por meio do Teste de Concordância de Kappa (K = 0,545; p = 0,015), com intervalo de confiança de 95%. CONCLUSÃO: para o presente estudo o Potencial Evocado Auditivo de Tronco encefálico demonstrou ser um teste altamente específico na predição de óbito em pacientes em coma Glasgow 3, e possibilitou auxiliar o diagnóstico de morte encefálica.

Coma; Audiometria de Resposta Evocada; Morte Encefálica; Doação Dirigida de Tecido


BACKGROUND: brainstem auditory evoked potentials in brain death. AIM: to verify the agreement between the response in the auditory brainstem audiometry and the clinical outcome, analyzing the pattern of responses to electric stimulation. METHOD: a cross-sectional study performed in 30 patients with Glasgow coma score of 3, submitted to the auditory brainstem audiometry and followed up until their clinical outcome: recovery or death. The test was considered positive to brain death when there was no registry of waves or when there was only the registry of wave I; and negative when there were two or more waves, independently of their latencies. RESULTS: Among the patients who presented positive results for brain death (86.66%), all died; the only patient who recovered presented a negative result, indicating a specificity of 100%. Internal consistency of data was also observed, with an intraclass correlation coefficient of 0.562, obtained using the Cronbach´s test; and a significant agreement between the test and the clinical outcome using the Kappa´s test, with a confidence interval of 95% (K = 0.545; p = 0.015). CONCLUSION: in the present study, the brainstem auditory evoked potential demonstrated to be highly specific in death prediction of patients in Glasgow coma score of 3, and was useful in assisting the diagnosis of brain death.

Coma; Audiometry Evoked Response; Brain Death; Directed Tissue Donation


ARTIGO ORIGINAL DE PESQUISA

Potencial evocado auditivo de tronco encefálico como auxílio diagnóstico de morte encefálica* * Trabalho Realizado no Hospital Estadual Mario Covas.

Mônica JardimI, 1 1 Endereço para correspondência: R. das Aroeiras, 392 - apto 62 - Santo André - SP - CEP 09090-000 ( m-jardim@ig.com.br). ; Osmar Clayton PersonII; Priscila Bogar RapoportIII

IFonoaudióloga. Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina do ABC. Fonoaudióloga da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina do ABC no Hospital Estadual Mario Covas de Santo André

IIMédico Otorrinolaringologista. Mestre em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Docente da Disciplina de Fonoaudiologia da Faculdade São Camilo

IIIMédica. Doutora em Otorrinolaringologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professora Titular da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina do ABC

RESUMO

TEMA: Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico aplicado em morte encefálica.

OBJETIVO: verificar a concordância entre o resultado do Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico e o desfecho do quadro clínico, em pacientes em coma Glasgow 3, por meio da análise do padrão de resposta elétrica do teste.

MÉTODO: estudo tipo transversal realizado em 30 pacientes em coma Glasgow 3 submetidos ao Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico e acompanhados quanto ao desfecho clínico após o teste: recuperação ou óbito. O teste seria considerado positivo para morte encefálica ao registrar com reprodutibilidade ausência de todas as ondas ou presença de apenas a onda I, e considerado negativo na presença de duas ou mais ondas independentes de suas latências.

RESULTADOS: entre os pacientes que apresentaram testes positivos para morte encefálica (86,66%), todos foram a óbito e o único paciente que se recuperou apresentou teste negativo indicando especificidade de 100%. Observou-se consistência interna dos dados, com coeficiente de correlação intraclasse de 0,562 por meio do Teste Alfa de Cronbach e concordância significativa entre o teste e o desfecho clínico por meio do Teste de Concordância de Kappa (K = 0,545; p = 0,015), com intervalo de confiança de 95%.

CONCLUSÃO: para o presente estudo o Potencial Evocado Auditivo de Tronco encefálico demonstrou ser um teste altamente específico na predição de óbito em pacientes em coma Glasgow 3, e possibilitou auxiliar o diagnóstico de morte encefálica.

Palavras-Chave: Coma; Audiometria de Resposta Evocada; Morte Encefálica; Doação Dirigida de Tecido.

Introdução

O coma é um estado de inconsciência sem resposta ao meio causado por distúrbios metabólicos, intoxicações, infecções sistêmicas, lesões intracranianas ou desordens psíquicas (1). O grau do coma é comumente determinado a partir da escala de coma de Glasgow, sendo o escore 3 na escala correspondente ao coma profundo (2).

A recuperação do paciente dependerá da causa e do grau do coma, bem como da localização e extensão do dano neurológico. O coma irreversível é considerado morte encefálica (ME) (1).

A necessidade de criar critérios que definissem a ME, iniciou-se na década de 60, quando o avanço tecnológico da medicina em relação às técnicas de ressuscitação, circulação extra corpórea e respiradores artificiais permitiu manter o paciente com seus órgãos e sistemas íntegros por tempo indeterminado mesmo na presença de perda total das funções encefálicas.

Associa-se este fato a necessidade de se obter o diagnóstico precoce de ME para os procedimentos de transplante de órgãos, objetivando viabilizar os órgãos a serem transplantados, sem que ocorra deteriorações ou danos aos mesmos (3-7).

O Conselho Federal de Medicina, em sua resolução nº. 1480 de 08.08.97 (8), ao definir critérios para a ME, resolve que: a constatação clínica deva necessariamente ser respaldada por um exame subsidiário que demonstre inequivocamente ausência de perfusão sanguínea cerebral, atividade metabólica cerebral ou atividade elétrica cerebral.

O potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE) avalia a atividade elétrica da via auditiva ascendente, que tem como trajeto todo o segmento do tronco encefálico (TE) responsável pela maioria das funções vitais do organismo. O exame é simples, rápido, objetivo, não invasivo e não se altera com hipotermia moderada nem com altas doses de barbitúricos e outros depressores do sistema nervoso central (9-11).

Segundo Hammer e Crippen (12), o TE seria a unidade integradora central indispensável para função vital do organismo. Portanto, o critério clínico para o diagnóstico de ME consistiria na demonstração de ausência de atividade elétrica do TE.

A utilização do PEATE em pacientes em coma como instrumento de aferição de integridade neurofisiológica do TE indicou índices confiáveis na predição do prognóstico do coma e no diagnóstico da ME (13-17).

O presente trabalho tem como objetivo verificar a concordância entre o resultado do PEATE e o desfecho do quadro clínico, em pacientes com escore 3 na escala de coma de Glasgow, por meio da análise do padrão de resposta elétrica do PEATE.

Método

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina do ABC em 02.07.2003 com o número de protocolo 053/2003. Todos os familiares dos pacientes tiveram acesso a informações referentes à pesquisa por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando ou não a inclusão do paciente na pesquisa e a divulgação dos resultados conforme resolução 196/96 (18) sobre ética em pesquisa com seres humanos.

Foi realizado estudo transversal com 30 pacientes em coma Glasgow 3, avaliados pela equipe médica responsável pela UTI do Hospital Estadual Mário Covas de Santo André. Estes pacientes foram submetidos ao PEATE e acompanhados quanto ao desfecho do quadro clínico, no período de março de 2004 a março de 2006. Como metodologia de análise, foi utilizado o teste diagnóstico.

Foram analisados os dados de um total de 30 pacientes, sendo que 19 (63,33%) eram do sexo masculino.

Dos 30 pacientes avaliados, 20 deles (66,66%) teve como causa do coma, lesões intracranianas (traumatismo crânio-encefálico, acidente vascular encefálico, tumor cerebral, aneurisma cerebral) e 10 deles (33,33%) teveram como causa alterações metabólicas, tóxicas e infecciosas.

A idade dos pacientes variou de 0,054 (20 dias) há 92 anos, sendo que 14 (46,66%) pacientes encontravam-se entre 41 e 60 anos. A relação entre faixas etárias e causa do coma pode ser vista na Tabela 1.

Os critérios empregados para a inclusão e exclusão dos pacientes são detalhados a seguir.

Critérios de inclusão:

1. Diagnóstico clínico de coma com escore 3, segundo a escala de coma de Glasgow (2).

2. Meatoscopia normal.

Critérios de exclusão:

Prejuízo do sistema auditivo como:

1. Perdas auditivas ou outras patologias da orelha que pudessem comprometer a presença das ondas do PEATE. Informação obtida por meio de anamnese e/ou exames anteriores.

2. Fraturas em ossos temporais demonstráveis pela tomografia computadorizada documentada em prontuário médico, nos pacientes com história de traumatismo crânio-encefálico.

3. Doenças infecciosas do sistema nervoso central.

4. Doenças desmielinizantes, acidente vascular cerebral de TE ou tumores locados próximo ao nervo auditivo ou ao longo do trato auditivo, por meio de anamnese obtida com os familiares e/ou exames anteriores.

5. Hipertensão intracraniana.

6. Pacientes em hipotermia.

7. Artefato e ruído de fundo que exceda a 30%.

Equipamentos

O equipamento utilizado para a realização do PEATE foi da marca Biologic Evoked Potential System Navigator®, modelo AUDX Plus, programa EP 317 versão 5.70, protocolo AEP. A caixa de eletrodos é composta por quatro eletrodos de superfície de prata, sendo um terra, um ativo e dois de referência. A pasta abrasiva utilizada para a esfoliação da derme foi de marca Nuprep® e os eletrodos umedecidos com pasta condutora de marca Ten 20 Conductive®, sendo fixados por fita adesiva Micropore®. O transdutor utilizado foi o fone de ouvido modelo TDH 39P marca Telephonics®. Os equipamentos foram transportados da sala de exames para a UTI por meio de mesa móvel apropriada. A instalação foi feita por entrada de eletricidade única com aterramento próprio e uso de estabilizador de voltagem e filtro de linha.

Procedimento

A seleção dos pacientes foi realizada pelo pesquisador por meio de visitas periódicas na UTI adulta e infantil do hospital, verificando a existência de pacientes que apresentassem escore 3 na escala de Glasgow avaliados pelo médico responsável e que se enquadrassem nos critérios de inclusão da pesquisa.

Após a seleção do paciente, os familiares tiveram acesso às informações referentes à pesquisa pelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e ainda antes da realização do teste, foi realizada uma anamnese com os familiares do paciente com o objetivo de identificar algum fator de exclusão.

Após a inspeção de meato acústico externo, o local na derme a ser colocados os eletrodos foi preparado por meio de esfoliação com pasta abrasiva, e só então os eletrodos foram umedecidos com pasta condutora, fixados e derivados da seguinte forma: um eletrodo terra derivado em Fpz, um ativo em Fz e dois de referência derivados em M1 e M2 (compondo dois canais: Fz/M1 e Fz/M2) conforme a Norma IES 10/20 (International Electrode System) (19). Foram checados os valores da impedância dos eletrodos, devendo situar-se abaixo de 5 Kohms. O estímulo acústico foi apresentado em forma de clicks breves de 100 milissegundos, em um ritmo de 13 estímulos por segundo perfazendo um total de 1.024 estímulos, em uma janela de 10,24 milissegundos, polaridade rarefeita na intensidade de 90dB NA, em ambas as orelhas separadamente. Foram realizados dois registros para cada orelha, com a finalidade de evidenciar a presença de reprodutibilidade das ondas e sobreposição do traçado. O ganho utilizado foi de 150.000 com filtros passa alto de 3.000Hz, filtro passa baixo de 100 Hz e filtro de entalhe de 60 Hz acionado.

Para efeito de análise dos componentes do PEATE com o objetivo do estudo em questão e baseado em dados significativos da literatura, os resultados obtidos foram divididos em dois grupos:

Teste positivo para ME:

1. Ausência de todas as ondas do PEATE (ausência de resposta elétrica do TE).

2. Ou presença de somente a onda I (componente originado em porção periférica do nervo coclear).

Presença necessária de um ou outro traçado bilateralmente.

Teste negativo para ME:

1. Presença de pelo menos duas ondas reprodutíveis registradas no PEATE sejam elas em latências normais ou não.

O teste foi aplicado pelo pesquisador e os resultados foram relacionados com o desfecho clínico. Para verificar a consistência interna dos dados foi utilizado o coeficiente de correlação intraclasse Alfa de Cronbach e para a análise de concordância foi utilizado o teste de Kappa, calculado pela média e desvio padrão, ambos com intervalo de confiança de 95 %.

Resultados

Foram obtidos 26 testes positivos (86,66%) para ME e 4 testes negativos (13,33%). Em relação ao total de pacientes, 29 (96,66%) foram a óbito e 1 (3,33%) se recuperou. Dentre os resultados positivos para o teste aplicado, todos os pacientes foram a óbito e entre os negativos, três (10%) foram a óbito e um (3,33%) recuperou-se. Quanto ao desfecho da evolução do quadro clínico, entre os pacientes que foram a óbito, 26 (86,66%) apresentaram teste positivo e 3 (10%) apresentaram teste negativo. O único paciente que se recuperou (3,33%) apresentou teste negativo (Tabela 2). A relação dos resultados obtidos no teste e o desfecho clínico são demonstrados na Figura 1.


O teste apresentou sensibilidade de 89% e especificidade de 100%, além de valor preditivo positivo de 100%, valor preditivo negativo de 25%, com acurácia de 90%. Demonstrou também razão de verossimilhança positiva de 0 e negativa de 0,11. Dos pacientes que apresentaram teste positivo para ME, 21 (80,76%) pacientes apresentaram ausência de todas as ondas do PEATE e 5 (19,23%) obtiveram presença da onda I, sendo que: um (3,84%) deles obteve onda I unilateral em latência normal, dois (7,69%) apresentaram presença de onda I em latência normal a direita e latência aumentada a esquerda, um (3,84%) apresentou latência aumentada bilateralmente e finalmente um (3,84%) apresentou onda I bilateralmente em latência normal.

Em relação aos testes negativos para ME, quatro pacientes (13,33%) apresentaram este resultado, sendo que dois deles apresentaram PEATE com ondas III e V em latências aumentadas bilateralmente e um paciente apresentou latência das ondas III e V aumentadas na orelha direita e ausência de todas as ondas na orelha esquerda. Todos esses pacientes foram a óbito. O paciente que apresentou teste negativo com presença das ondas I, III e V em latências normais recuperou-se sem seqüelas.

O Teste Alfa de Cronbach, constatou consistência interna, com coeficiente de correlação intraclasse de 0,562. Pelo Teste de concordância de Kappa, observou-se que há concordância significativa entre o teste e o desfecho clínico (Kappa = 0,545; p = 0,015), com intervalo de confiança de 95%.

Discussão

A angiografia cerebral, exame que avalia a perfusão sanguínea cerebral, apesar de ser considerado "padrão ouro" para a determinação da ME, não é realizada rotineiramente devido às dificuldades inerentes ao procedimento e ao seu alto custo financeiro (17). Por outro lado, o eletroencefalograma, exame que avalia atividade elétrica cerebral (EEG) espontânea dos hemisférios cerebrais, é o mais utilizado para a determinação de ME, porém sofre influências de condições potencialmente reversíveis e alguns autores afirmam ser um teste de baixa especificidade e que não deveria ser aplicado como exame único para este propósito (3).

Embora o PEATE não sofra alterações mediante drogas depressoras do sistema nervoso central, em nossa casuística não haviam pacientes sedados. Tendo em vista que a escala de coma de Glasgow só se aplica a pacientes sem sedação. Foi adotado como fator de inclusão para a pesquisa a presença de coma Glasgow 3, por ser este o estágio mais profundo do coma e mais se assemelhar ao estado de ME.

Os registros obtidos do PEATE realizados em pacientes em coma profundo em estado pré-terminal são relacionados com bastante freqüência pelos autores por apresentar ausência de todas as ondas ou presença apenas da onda I (3, 5, 17). Por este motivo, neste trabalho foram considerados como teste positivo para ME os achados relatados acima e o teste negativo correspondeu à presença de ao menos duas ondas.

No presente estudo contou-se com 30 pacientes em coma Glasgow 3, sendo que 29 (96,66%) foram a óbito e 1 (3,33%) recuperou-se. Estes dados demonstram que o paciente neste estágio de coma já tem, por si só, fator preditivo para o óbito. Estudos semelhantes concluem que a associação da escala de coma de Glasgow ao PEATE determina índices na predição no prognóstico do coma e no diagnóstico de ME (13).

Entre os 29 pacientes que foram a óbito, 26 apresentaram teste positivo (86,66%), dado comparável ao obtido em estudos semelhantes realizado com crianças na Espanha (90%) (3). Entre os pacientes que foram a óbito, três (10%) apresentaram teste negativo, o que implica em testes falso-negativos, indicando sensibilidade do teste de 89%. Dos testes positivos de PEATE, todos tiveram como desfecho o óbito, demonstrando improbabilidade de testes falso-positivos (valor preditivo positivo de 100%), corroboram com os resultados obtidos por Souza et al. (17). O PEATE demonstrou ser um teste altamente específico (100%) para o diagnóstico de ME, com acurácia de 90%, e novamente em concordância com estudos sobre o tema (13-14, 17).

Se a monitorização pelo PEATE fosse realizada nos pacientes que apresentaram resultados negativos para a ME e foram a óbito, acredita-se ser possível observar o momento exato do colapso do TE, constatando ausência de resposta elétrica. Outro fator primordial é a possibilidade de identificar ausência de resposta evocada com eventual recuperação, devido a fatores aleatórios à lesão de TE (3, 15-17).

No presente estudo, o único paciente que não foi a óbito apresentou teste negativo com presença das ondas I, III e V em latências normais. Despertou no dia seguinte ao exame, se recuperando normalmente com alta da UTI. A sedação foi interrompida 24 horas antes da realização do exame, momento em que o paciente foi considerado em coma Glasgow 3, segundo a avaliação clínica realizada pela equipe médica. A explicação pode ser baseada no fato de tratar-se de paciente obesa e os agentes sedativos apresentarem maior predileção por tecido adiposo (20). Isto favoreceria a manutenção de altas concentrações do agente na circulação sanguínea por maior período de tempo, suficiente para mascarar a avaliação clínica, porém incapaz de alterar as respostas do PEATE.

Ao propor um teste simples, rápido e altamente específico no auxílio do diagnóstico de ME propõem-se um novo campo para a audiologia em um tema tão importante para a humanidade.

Por se tratar de um dos temas mais complexos da bioética (6), aponta-se para a necessidade da realização de mais pesquisas envolvendo também a monitorização contínua do PEATE, com o aprimoramento da análise e classificação dos traçados, adequando-os, não só para o diagnóstico de ME como também para o prognóstico do coma.

Á partir dos resultados obtidos no presente estudo, acredita-se que o PEATE poderá auxiliar a equipe médica, na maioria dos casos, a investir terapeuticamente em pacientes potencialmente recuperáveis, além de otimizar os programas de transplantes de órgãos em pacientes irrecuperáveis.

Conclusão

Dentro da casuística apresentada, o PEATE apresentou concordância significativa (p = 0,015) com o desfecho clínico. Demonstrou alta especificidade (100%) na predição de óbito em pacientes em coma Glasgow 3 e, portanto, sugere a possibilidade de auxiliar o diagnóstico de morte encefálica.

Recebido em 14.05.2007.

Revisado em 29.03.2008; 13.05.2008.

Aceito para Publicação em 13.05.2008.

Artigo Submetido a Avaliação por Pares

Conflito de Interesse: não

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  • *
    Trabalho Realizado no Hospital Estadual Mario Covas.
  • 1
    Endereço para correspondência: R. das Aroeiras, 392 - apto 62 - Santo André - SP - CEP 09090-000 (
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      13 Maio 2008
    • Revisado
      13 Maio 2008
    • Recebido
      14 Maio 2007
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