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Coleção de simuliídeos (Diptera - Simuliidae) de Adolpho Lutz, sua história e importância

Adolpho Lutz's collection of black flies (Diptera - Simuliidae), its history and importance

Resumos

O presente trabalho é parte de uma dissertação de mestrado em elaboração no curso de pós-graduação em biologia animal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apoiado pela CAPES. Nele, são apresentadas as espécies de simuliídeos que pertencem à coleção de Adolpho Lutz depositadas no Laboratório de Simuliídeos e Oncocercose do Departamento de Entomologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC). Pioneiro no estudo desses dípteros, Lutz descreveu cerca de 25 espécies de diferentes localidades do Brasil. Vetor da oncocercose, os simuliídeos tiveram sua importância médico-sanitária reconhecida em fins da década de 1920.

simuliídeo; oncocercose; insetos; díptero; Adolpho Lutz


This paper is part of a master's thesis currently being written under the auspices of the Post-Graduate Program in Animal Biology of the Federal University of Rio de Janeiro, with support from CAPES. It presents the species of black flies in Adolpho Lutz's collection, held at the Laboratory of Black Flies and Oncocercosis of the Department of Entomology of the Instituto Oswaldo Cruz. A pioneer in the study of these dipterons, Lutz described about 25 species from different places in Brazil. A vector of round worm, the black fly's importance to public health was recognized at the end of the 1920s.

black fly; round worm; insects; dipteron; Adolpho Lutz


NOTA DE PESQUISA

Coleção de simuliídeos (Diptera - Simuliidae) de Adolpho Lutz, sua história e importância

Adolpho Lutz's collection of black flies (Diptera - Simuliidae), its history and importance

Ana Margarida Ribeiro do Amaral-CalvãoI; Marilza Maia-HerzogII

IMestranda do Programa de Pós-Graduação da Universidade Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), calvao@ioc.fiocruz.br

IIPesquisadora titular do Departamento de Entomologia/IOC/Fiocruz, Doutora em biologia parasitária, Av. Brasil, 4365, 21045-900 Rio de Janeiro — RJ Brasil, mherzog@ioc.fiocruz.br

RESUMO

O presente trabalho é parte de uma dissertação de mestrado em elaboração no curso de pós-graduação em biologia animal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apoiado pela CAPES. Nele, são apresentadas as espécies de simuliídeos que pertencem à coleção de Adolpho Lutz depositadas no Laboratório de Simuliídeos e Oncocercose do Departamento de Entomologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC). Pioneiro no estudo desses dípteros, Lutz descreveu cerca de 25 espécies de diferentes localidades do Brasil. Vetor da oncocercose, os simuliídeos tiveram sua importância médico-sanitária reconhecida em fins da década de 1920.

Palavras-chave: simuliídeo, oncocercose, insetos, díptero, Adolpho Lutz.

ABSTRACT

This paper is part of a master's thesis currently being written under the auspices of the Post-Graduate Program in Animal Biology of the Federal University of Rio de Janeiro, with support from CAPES. It presents the species of black flies in Adolpho Lutz's collection, held at the Laboratory of Black Flies and Oncocercosis of the Department of Entomology of the Instituto Oswaldo Cruz. A pioneer in the study of these dipterons, Lutz described about 25 species from different places in Brazil. A vector of round worm, the black fly's importance to public health was recognized at the end of the 1920s.

Keywords: black fly, round worm, insects, dipteron, Adolpho Lutz.

Introdução

Os simuliídeos são dípteros nematóceros, vulgarmente conhecidos no Brasil como borrachudos, piuns ou casaquinhos-de-couro; nos países de língua hispânica, jejenes, e nos de língua inglesa, black flies. A família Simuliidae possui ampla distribuição geográfica e grande importância médico-veterinária, pois inclui espécies vetoras de agentes etiológicos de doenças, tanto para o homem como para outros animais.

Após a estação chuvosa, as populações de simuliídeos atingem grandes números em áreas propícias às espécies antropofílicas, e suas picadas ocasionam um "ataque-incômodo". A hematofilia dos simuliídeos acarreta sérios prejuízos econômicos, afetando, principalmente, a agropecuária e o turismo.

A coleção de simuliídeos de Adolpho Lutz pertence ao acervo da Coleção Entomológica do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), e encontra-se sob a guarda do Laboratório de Simuliídeos e Oncocercose do Departamento de Entomologia da mesma instituição. Formada entre 1903 e 1925, a coleção possui larvas, pupas, machos e fêmeas coletados em diferentes localidades do Brasil, principalmente na região Sudeste, destacando-se a serra da Bocaina, em São Paulo. O material está conservado de quatro maneiras: sob lâmina e lamínula, em "ampolas" (figs. 1), em álcool (fig.2), ou alfinetados (figs. 3 e 4).





Em trabalho publicado em 1903 sobre insetos sugadores de sangue observados no Rio de Janeiro e em São Paulo, Lutz (1903) chamou a atenção para o pouco conhecimento que se tinha sobre o grupo, mencionando somente quatro espécies conhecidas e apenas uma descrita cientificamente. Esta era a Simulium nigrimanum descrita por Macquart em 1838. Em 1905, Emílio Goeldi descreveu uma segunda espécie, a Simulium amazonicum.

Lutz passou a estudar os simuliídeos efetivamente alguns anos depois, e em 1909 publicou o primeiro trabalho concernente ao assunto, tratando de algumas espécies que ocorrem no Brasil. Lutz mencionou então 12 espécies e descreveu cinco, nativas: Simulium rubrithorax Lutz, 1909, S. scutistriatum Lutz, 1909, Lutzsimulium hirticosta Lutz, 1909, S. exiguum Roubaud, 1906 (na realidade tratava-se de S. lutzi Knab, 1913) e S. varians Lutz. No referido trabalho, além de fornecer dados que caracterizam a família Simuliidae quanto à morfologia geral, ressaltou aspectos relevantes da fisiologia e biologia desses dípteros, e elaborou uma chave de classificação para as espécies mencionadas. Relatou, ainda, a ocorrência de casos fatais entre animais e humanos atacados por enxames colossais de simuliídeos na Hungria e nos Estados Unidos (Lutz, 1909).

Sentindo necessidade de conhecer melhor o grupo, Lutz passou a arregimentar coletores e cientistas amigos para obter espécimes. Entre os colaboradores no Brasil, destacamos Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Parreiras Horta, Gurgel do Amaral, Arthur Neiva, David Madeira, Von Luetzelburg e J. G. Foetterle. Lutz também manteve intensa troca de materiais e informações com pesquisadores de outros países, e remeteu exemplares de simuliídeos para coleções da Alemanha, Grã-Bretanha e Estados Unidos. Apesar da extensão alcançada por essa rede, a maioria dos exemplares foi coletada pelo próprio Lutz em excursões a arrabaldes do Rio de Janeiro e regiões vizinhas.

Em 1910, publicou trabalho fornecendo novas informações fisiológicas e, principalmente, morfológicas. Redescreveu as espécies S. rubrithorax, L. hirticosta, S. pertinax Kollar, 1832; S. perflavum Roubaud, 1906; S. exiguum, S. varians, S. paraguayense Schrottky, 1909; e ainda a espécie S. pernigrum (Lutz, 1910) atualmente pertencendo ao gênero Lutzsimulium pernigrum. O cientista descreveu ainda as espécies S. orbitale Lutz, 1910; S. infuscatum Lutz, 1909 (na realidade trata-se de S. pertinax), S. subnigrum Lutz, 1910; S. distinctum Lutz, 1910; S. incrustatum Lutz, 1910; e S. auristriatum Lutz, 1910.

Em 1917, Adolpho Lutz publicou outro trabalho sobre o grupo, redescrevendo a espécie S. amazonicum, que havia sido descrita por Goeldi em 1905.

Em viagem científica realizada de março a outubro de 1912, com Astrogildo Machado, pelo rio São Francisco e alguns de seus afluentes, a convite da Inspetoria de Obras contra a Seca, Lutz coletou numerosos insetos, inclusive simuliídeos, em sua maioria formas imaturas obtidas nos criadouros. No relatório da viagem, publicado em 1915, registrou a grande capacidade de dispersão dos simuliídeos através do vôo, tirando proveito dos ventos e da umidade do ar. As espécies que coletou foram: S. brevibranchium n. sp. Lutz e Machado, 1915 (sinonímia de S. brachycladum, Lutz, 1910); S. diversifurcatum Lutz, 1910 (sinonímia de S. subnigrum); S. incrustatum, S. orbitale, S. paraguayense, S. pruinosum Lutz, 1910; (S. pruinosum é sinonímia de S. nigrimanum Macquart, 1838); S. rubrithorax, S. spinibranchium Lutz, 1910; e S. subviride Lutz e Machado, 1915 (S. subviride é sinonímia de S. subpallidum Lutz, 1910) (Crosskey e Howard, 1996).

Em outra viagem científica, desta vez à Argentina, ao Uruguai e ao Paraguai, entre janeiro e março de 1918, em companhia de Heráclides César de Souza Araújo e Olympio da Fonseca Filho, Adolpho Lutz coletou mais exemplares de simuliídeos, entre eles S. pertinax, S. orbitale, S. amazonicum, S. incrustatum, S. subviride e S. rubrithorax. No trabalho publicado em 1918, redescreveu três espécies: S. paraguayense Schrottky, 1909, S. inexorabile Schrottky, 1909 [sinonímia de S. pertinax (Crosskey e Howard, 1996)] e S. paranaense Schrottky, 1909.

É importante ressaltar a acuidade das observações feitas pelo cientista, que, já naquela época, chamava a atenção para as modificações morfológicas sofridas no padrão de desenhos do escudo dos simuliídeos de acordo com a incidência da luz, e o estado de conservação dos exemplares observados. Relatou as mudanças observadas na coloração do corpo desses dípteros devido ao depósito de pigmento nos tecidos após a hemólise da hemoglobina contida no sangue ingurgitado pelas fêmeas. O aparelho bucal de nematóceros hematófagos foi descrito por Lutz em 1912. Neste artigo, observou que machos do gênero Simulium apresentam todas as partes bucais apesar de não se alimentarem de sangue, e descreveu parcialmente a postura de ovos de algumas espécies indígenas de Simulium.

Segundo Crosskey e Howard (1996), existem atualmente 1.663 espécies de simuliídeos cientificamente nomeadas, com cerca de seiscentas sinonímias. No Brasil até 1967 tinham sido catalogadas, aproximadamente, 55 espécies (Vulcano, 1967), dessas, 25 descritas por Lutz. Crosskey e Howard (1996) e Crosskey (2002) referem-se a cerca de 83 espécies de simuliídeos descritas no país.

Ainda hoje há controvérsias quanto à situação taxonômica de várias espécies descritas no Brasil, pois o grupo apresenta características morfológicas homogêneas. Shelley et al. (1987, 1982) suspeitam da existência de complexos de espécies entre os simuliídeos no país. São escassas as descrições apropriadas, as chaves viáveis para identificação e monografias sobre o assunto. Para uma compreensão mais completa empregam-se, hoje, conhecimentos em âmbito citogenético, microscopia mais refinada e associação com a biologia de cada espécie (Maia-Herzog, 1991).

Trabalhos com a Coleção de Adolpho Lutz já foram realizados por Vulcano, Py-Daniel, Hamada, Shelley, Coscarón e ainda Maia-Herzog (1991) e Maia-Herzog et al. (1985).

Lutz prosseguiu os estudos sobre insetos nematóceros, publicando, em 1922, mais um artigo dedicado a estes dípteros. Dedica aí grande espaço aos simuliídeos, fornecendo dados sobre sua taxonomia, morfologia e biologia. Ainda não se havia provado o papel destes insetos como vetores de doença humana, mas Lutz (op. cit.) levantava essa hipótese, visto que as fêmeas se alimentam em intervalos bastante longos, favorecendo o desenvolvimento de parasitos.

Não se deve omitir sua contribuição ao conhecimento da simulio-fauna de outros países da América do Sul. Em importante trabalho sobre dípteros hematófagos na Venezuela, publicado em 1928, apresentou algumas redescrições e descreveu duas espécies novas: S. lugubre Lutz e Nuñes Továr, 1928 (sinonímia de S. mexicanum Bellardi, 1862) e S. versicolor Lutz e Nuñes Továr, 1928 (sinonímia de S. metallicum Bellardi, 1859). Neste trabalho, analisou o método utilizado para conservar e observar estes dípteros e produzir estampas representando-os.

Em artigo dedicado à biologia de ambientes lóticos (Lutz, 1930) tratou mais uma vez dos simuliídeos, dando ênfase aos aspectos biológicos. No trabalho sobre a transmissão de doenças através de "sugadores de sangue", mencionou a participação das espécies antropofílicas como vetoras da "filariose" humana causada por Onchocerca (Lutz, 1936).1 1 A confirmação dos simuliídeos como vetores da Onchocerca volvulus se deu em 1926, em Serra Leoa, pelo médico inglês B. Backlock. O primeiro caso de oncocercose reportado e confirmado no Brasil foi descrito por Bearzoti et al. (1967). Mas os estudos sobre simuliídeos só passaram a ter maior importância médica após a confirmação de um foco amazônico da doença em Roraima, por Moraes e Chaves (1974). Em 1986, foi descrito o primeiro caso autóctone de oncocercose fora do foco amazônico, procedente de Goiás (Gerais e Ribeiro, 1986). Maia-Herzog (1999) relata o histórico da oncocercose no Brasil e a distribuição e expansão da doença no país através dos movimentos migratórios de garimpeiros.

César Pinto deu continuidade aos trabalhos de Lutz publicando artigo dedicado exclusivamente aos simuliídeos em 1930, no qual relatou aspectos de sua biologia e morfologia, fazendo comentários sobre o órgão descoberto por Lutz no terceiro segmento dos palpos maxilares. Pinto reeditou, neste trabalho, a chave para a classificação das fêmeas de Simulium existentes no Brasil publicada por Lutz em 1910, e mencionou importante trabalho de Breadbane Blacklock publicado em 1926 sobre a transmissão de Onchocerca volvulus pela picada de Simulium damnosum Theobald. Apresentou, também, a distribuição geográfica dos simuliídeos na região neotropical (Argentina, Brasil, Chile, México, Paraguai e Venezuela). O artigo é, na verdade, uma súmula de informações obtidas anteriormente por Lutz.

Em 1932, Pinto publicou trabalho mais detalhado e importante sobre as espécies de simuliídeos da América Central e do Sul, registrando que totalizavam "cento e poucas espécies, sendo o Brasil o país onde melhor foram estudados, graças aos trabalhos básicos de Adolpho Lutz, realizados durante muitos anos e firmados em estupendo material colecionado por este eminentíssimo sábio dotado de invulgar capacidade e invejável tenacidade ao estudo da zoologia e parasitologia sul-americanas".

Das 36 espécies encontradas no Brasil, 25 tinham sido descritas por Lutz, dez por outros pesquisadores, e uma por Lutz e Pinto. Hoje se sabe que entre elas encontram-se seis sinonímias (o S. pruinosum, por exemplo, é sinonímia de S. nigrimanum).

César Pinto continuou debruçado sobre a família Simuliidae nos trabalhos publicados em 1936 e 1940, cedendo o bastão, de 1940 a 1950, a. Vulcano e D'Andretta Jr., que redescreveram algumas das espécies de Lutz.

Levantamento dos exemplares depositados na Coleção de Simuliídeos de Adolpho Lutz

A Coleção de Lutz possui material coletado em diferentes localidades do Brasil, principalmente na região Sudeste, destacando-se a Fazenda do Bonito, de propriedade de um dos irmãos de Adolpho Lutz, na serra da Bocaina, em São Paulo, de onde provêm muitos dos exemplares-tipo das espécies descritas por Lutz.

O material, coletado no período de 1903 a 1925, contém aproximadamente 1.400 exemplares distribuídos em dois gêneros (Simulium e Lutzsimulium), 12 subgêneros (Chirostilbia, Hellichiella, Hemicnetha, Inaequalium, Kempfsimulium, Latreille, Notolepria, Psaroniocompsa, Psilopelmia, Pternaspatha, Trichodagmia e Wtzsimulium), e 41 espécies. Destes, 518 exemplares encontram-se conservados sob lâmina/lamínula (dois gêneros e nove subgêneros), distribuídos em 29 espécies, 18 tipos, entre três holótipos; 830 exemplares alfinetados (dois gêneros e 12 subgêneros), sendo 48 tipos, distribuídos em 35 espécies; totalizando 51 exemplares-tipo, destes, sete holótipos, distribuídos em 35 espécies.

Em 1909, Lutz citou S. montanum Philippi, 1865, e traduziu a descrição original feita em língua alemã por Philippi num catálogo de dípteros chilenos. S. montanum teria sido encontrada picando o homem na serra da Bocaina, a 1.500 metros acima do nível do mar. Talvez por achar estranho o fato de esta espécie ter sido coletada no Brasil, Lutz declarou que se esta fosse idêntica à espécie de Philippi deveria ter transposto os Andes, algo excepcional, que talvez se explicasse pela facilidade com que a mesma se criava em lugares elevados.

Porém, em 1910, Lutz restituiu ao material identificado como S. montanum o nome de S. pernigrum (atualmente Lutzsimulium pernigrum), visto que sua identidade com a espécie chilena era bastante duvidosa, acrescentando apenas poucos detalhes à descrição. O material reunido era composto por um grande número de fêmeas realizando repasto sanguíneo na barriga de cavalos, e em larvas e pupas provenientes da serra da Bocaina.

Pinto (1932, 1930) mencionou, de forma breve, S. pernigrum, citando a localidade da espécie descrita por Philippi (montanhas de Chacabuco, perto de Catemu, no Chile), mas também se referiu a S. montanum Kertész, 1902.

Edwards (1931) colocou S. montanum no subgênero Cnephia. Mais tarde, Smart (1945) transferiu a espécie para Cnephia montanum. Porém Wygodzinsky e Coscarón (1973) passaram a espécie ao gênero Araucnephia montana (Philippi) (Coscarón, 1991).

D'Andretta e D'Andretta (1952) transferiram a espécie de gênero e redescreveram Lutzsimulium pernigrum, tendo como base material de larvas e pupas capturadas entre 1.800 e 2.200 metros de altitude e proveniente de Itatiaia, Rio de Janeiro. Em 1962, Vulcano fez nova menção à L. pernigrum, desta vez com exemplares coletados em diversos pontos da localidade tipo, e comentou o fato de a espécie ter sido originalmente descrita como S. montanum.

Não tivemos como acessar os catálogos aos quais Lutz e Pinto se referem, não encontrando, na literatura, nenhuma menção ao S. montanum descrito no Chile por Philippi, em 1865. Os catálogos de Crosskey e Howard (1996) e Vulcano (1967) não mencionam qual seria a espécie que estaria em sinonímia com S. montanum Philippi, 1865.

Os exemplares de S. annulatum Philippi, 1865, encontrados na coleção de simuliídeos de Lutz não possuem nenhuma informação sobre sua origem. A literatura, até o momento, só menciona esta espécie em localidades do Chile e Argentina. Caso seja confirmada a identificação, podem ser exemplares coletados por Lutz na expedição científica ao rio Paraná e a Assunção, com volta por Buenos Aires, Montevidéu e Rio Grande. O material pode ainda ter sido enviado a Lutz por algum pesquisador.

S. clavigerum não consta na literatura. Trata-se de uma simples sinonímia ou de uma espécie válida, que Lutz nomeou mas não teve tempo de descrever. Acreditamos que seja mais provável a primeira hipótese, já que as localidades de coleta são Petrópolis e serra da Bocaina, duas regiões com grande histórico de estudos no que se refere aos simuliídeos.

Do material depositado entre lâmina/lamínula, podemos destacar S. quinquefurcatum. Apesar de possuirmos apenas uma lâmina de filamentos respiratórios da pupa, acreditamos ser uma espécie válida devido à forma distinta e disposição dos ramos destes filamentos. No entanto, não podemos sustentar tal afirmação com apenas um exemplar de parte de um imaturo.

S. latipes (Meigen, 1804) (International Commission on Zoological Nomenclature), e que, segundo Crosskey e Howard (1996), é holótipo válido na opinião da ICZN, 1416, de procedência alemã. O exemplar contido na coleção de Lutz consta como sintipo, proveniente da localidade de Rio Grande, Minas Gerais, em 23.9.1903.

O levantamento da coleção resultou na elaboração de uma chave simplificada das espécies do Brasil descritas por Lutz. Foi elaborada uma tabela de distribuição destas espécies (tabelas 1 e 2) a partir dos dados obtidos através do levantamento da coleção de simuliídeos de Adolpho Lutz e de dados levantados na Coleção de Referência do Laboratório de Simuliídeos e Oncocercose, cujo patrimônio inclui exemplares obtidos em diversas localidades do Brasil, com amostras significativas de todas as suas regiões.

Conclusão

Não deixa de ser surpreendente o fato de Lutz conseguir tempo para observações tão peculiares e detalhadas dos simuliídeos, quando se sabe que, concomitantemente, desenvolvia numerosos trabalhos sobre temas muito distintos. As lâminas das coleções de Lutz e Pinto foram montadas no início do século XX com técnicas e equipamentos rudimentares. Além disso, muitas estão malconservadas, impregnadas por fungos, o que prejudica e/ou impossibilita a observação do material. Apesar disso, podemos afirmar que os artigos de Lutz ainda representam as contribuições mais importantes para o conhecimento dos simuliídeos no Brasil.

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  • 1
    A confirmação dos simuliídeos como vetores da
    Onchocerca volvulus se deu em 1926, em Serra Leoa, pelo médico inglês B. Backlock. O primeiro caso de oncocercose reportado e confirmado no Brasil foi descrito por Bearzoti
    et al. (1967). Mas os estudos sobre simuliídeos só passaram a ter maior importância médica após a confirmação de um foco amazônico da doença em Roraima, por Moraes e Chaves (1974). Em 1986, foi descrito o primeiro caso autóctone de oncocercose fora do foco amazônico, procedente de Goiás (Gerais e Ribeiro, 1986). Maia-Herzog (1999) relata o histórico da oncocercose no Brasil e a distribuição e expansão da doença no país através dos movimentos migratórios de garimpeiros.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jan 2004
    • Data do Fascículo
      Abr 2003
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