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Da enxada à colher de pedreiro: trajetórias de vulnerabilidade social na construção civil

TESES

Da enxada à colher de pedreiro: trajetórias de vulnerabilidade social na construção civil

Fernanda Flávia Cockell

Tese de Doutorado Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção/Universidade Federal de São Carlos. São Carlos, 2008 fercockell@yahoo.com.br

O objetivo da tese é estudar as trajetórias ocupacionais de trabalhadores instáveis da construção de edificações. Analiso as estratégias utilizadas e/ou planejadas por esses operários, diante da precariedade dos contratos de trabalho e da ausência ou dificuldade de acesso à proteção social exercida pelo Estado. Investigo como lidam com acasos naturais ou sociais da existência, tais como a procura por trabalho, o desemprego, a instabilidade de renda, o envelhecimento ou afastamento por doenças ou acidentes ocupacionais, e o recurso às redes sociais informais na resolução dessas questões. Analiso ainda a percepção dos trabalhadores sobre como esse contexto afeta suas condições de trabalho e sua saúde, bem como sua reprodução social. Foram entrevistados vinte operários da construção de edificações da cidade de São Carlos (SP, Brasil), com mais de 25 anos e, no mínimo, cinco anos de trabalho no setor. A escolha desse setor justifica-se pelo alto índice de instabilidade, grande contingente de trabalhadores informais - terceirizados e subcontratados -, alta rotatividade, nocividade das condições de trabalho e precariedade dos contratos de trabalho. Os resultados apontam que a construção de edificações, além de historicamente ser uma oportunidade de trabalho para jovens migrantes de origem rural recém-desempregados e para indivíduos sem experiência de trabalho, torna-se uma opção (ou falta de opção) de trabalho para aposentados e operários fabris, demitidos com o processo de reestruturação produtiva, marcado pelo fechamento de plantas na cidade e pela fusão ou mesmo aquisição de empresas nacionais por multinacionais. Parte dos entrevistados, que ao longo de suas trajetórias ocupacionais usufruíram direitos trabalhistas e previdenciários, passa a vivenciar, na construção de edificações, a precarização econômica e social resultante da perda de direitos. Constato que as redes sociais informais são fundamentais no enfrentamento da vulnerabilidade profissional e da inconstância de serviços, nos períodos de afastamento, enfim, na sobrevivência cotidiana. Prevalece o apoio da família nuclear e das redes formadas por consanguinidade, identificação comunal e identificação religiosa. O Estado encontra-se cada vez menos presente, e as instituições públicas não-estatais, como o sindicato, não fazem parte da rede desses trabalhadores. Não dispõem de condições financeiras para contratar planos privados de aposentadoria e saúde, e diante da instabilidade da vida sobrevivem com dupla jornada de trabalho, bicos, busca de aquisição de bens rentáveis e, em alguns casos, com o trabalho após a aposentadoria. A vulnerabilidade presente em toda a trajetória faz com que a percepção de sua condição misture impotência, revolta e resignação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jul 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009
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